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No período após as chuvas, a análise dos dados também nos mostrou uma simetria da respiração sincrônica dos golfinhos em todas as categorias

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Período 2 No período após as chuvas, a análise dos dados também nos mostrou uma simetria da respiração sincrônica dos golfinhos em todas as categorias

comportamentais. Estatisticamente não houve diferença significativa entre a respiração sincrônica realizada no início e no final das atividades: deslocamento (z= -0,015; n= 33 e p= 0,988), socialização (z= -0,422; n= 18 e p= 0,673), descanso (z= -0,560; n= 19 e p= 0,575) e forrageio (z= -0,754; n= 37 e p= 0,451) (figura 23b). 71% 70% 8% 5% 95% 98% 55% 49%

Deslocamento Socialização Descanso Forrageio

Início Fim

Figura 23. Simetria na respiração sincrônica dos golfinhos no período antes das chuvas (a) e no período após as chuvas (b).

– Freqüência de eventos sincrônicos

Período 1 – Um total de 84 eventos sincrônicos ocorreram no período antes das chuvas, sendo 22 em deslocamento, 10 em socialização, e 52 em forrageio, o que corresponde a: deslocamento = 26%; socialização = 12%; forrageio = 62%. Entretanto, se o sincronismo em eventos comportamentais segue o número de intervalos de registro em sincronismo de atividades teríamos a seguinte freqüência esperada: deslocamento = 53% (ou 45 eventos); socialização = 8% (ou 7 eventos); forrageio = 39% (ou 32 eventos). Verificamos que o número de eventos observado difere significativamente do esperado (Ȥ2= 24,605; gl.= 2 e p< 0,05). Com eventos em deslocamento ocorrendo abaixo do esperado e eventos sincrônicos de forrageio ocorrendo acima do esperado (tabela 10).

Período 2 – Um total de 93 eventos sincrônicos ocorreram no período antes das chuvas, sendo 32 em deslocamento, 8 em socialização, e 53 em forrageio, o que corresponde a: deslocamento = 34,4%; socialização = 8,6%; forrageio = 57%. Entretanto, se o sincronismo em eventos comportamentais segue o número de intervalos de registro em sincronismo de atividades teríamos a seguinte freqüência esperada: deslocamento = 22% (ou 20 eventos); socialização = 7% (ou 7 eventos); forrageio = 71% (ou 66 eventos). Verificamos que o número de eventos observado difere significativamente do esperado (Ȥ2= 9,184; gl.= 2 e p< 0,05). Com eventos

71% 73%

11% 9%

88% 90%

56% 56%

Deslocamento Socialização Descanso Forrageio

em deslocamento ocorrendo acima do esperado e eventos sincrônicos de forrageio ocorrendo abaixo do esperado (tabela 11).

Comparação entre os períodos: Dividindo-se o número de eventos sincrônicos pelo total de registros sincrônicos em cada categoria comportamental, verificamos uma maior freqüência no período 1 para o forrageio e uma menor freqüência para o deslocamento, já no período 2 está freqüência se inverte com uma maior proporção no deslocamento e uma menor no forrageio (figura 24).

Tabela 10. Valores observados e esperados de eventos sincrônicos no período antes das chuvas. deslocamento socialização forrageio total Registros em sincronismo de atividades 930 (53%) 142 (8%) 677 (39%) 1749 Eventos observados 22 (26%) 10 (12%) 52 (62%) 84 Eventos esperados 45 (53%) 7 (8%) 32 (39%) 84

Eventos esperados = (registros em sincronismo de atividade / total registros sincrônicos ) x total de eventos sincrônicos observados em todos os comportamentos

Tabela 11. Valores observados e esperados de eventos sincrônicos no período após as chuvas. deslocamento socialização forrageio total Registros em sincronismo de atividades 533 (22%) 174 (7%) 1700 (71%) 2407 Eventos observados 32 (34,4%) 8 (8,6%) 53 (57%) 93 Eventos esperados 20 (22%) 7 (7%) 66 (71%) 93

Eventos esperados = (registros em sincronismo de atividade / total registros sincrônicos ) x total de eventos sincrônicos observados em todos os comportamentos

Figura 24. Freqüência de eventos sincrônicos nos períodos de estudo.

2% 6% 7% 5% 8% 3%

Deslocamento Socialização Forrageio

4.2 Discussão

A análise da proporção de respiração sincrônica mostra que em menos de 20% da socialização os indivíduos também apresentaram respiração sincrônica. À princípio este dado rejeita a hipótese 5 de que a respiração sincrônica seja um display social. Entretanto, alguns outros fatores devem ser levados em consideração. Primeiro, a respiração sincrônica pode ser um display social utilizado menos freqüentemente que outros comportamentos. Neste caso, as análises deveriam comparar a freqüência de todos os eventos da socialização e compará-los à freqüência de respiração sincrônica. Segundo, ao sugerir que a respiração sincrônica seja um display social Connor et al. (2006) refere-se explicitamente a grupos de machos. Connor et al. (2005) sugere que o sincronismo de respiração com contato entre peitorais (“contact swim”) é um display social exclusivo de fêmeas adultas. Neste caso, nossos dados teriam que ser separados em grupos compostos apenas por machos, e grupos com outras composições para permitir uma comparação mais direta dos dados. De forma geral, podemos dizer que a respiração sincrônica está presente no comportamento de socialização, mas não é componente determinante deste.

Com relação aos outros comportamentos verificamos que o sincronismo de respiração é preponderante no descanso (85% a 95%), devido à definição adotada neste trabalho, não sendo, entretanto, componente definidor deste comportamento (isto é, é possível haver descanso em grupo sem haver sincronia de respiração). O sincronismo de respiração ocorre numa proporção de 80% durante o deslocamento, possivelmente refletindo similaridade de necessidade de oxigênio entre indivíduos (Connor et al., 2006). No comportamento de forrageio, o sincronismo de respiração apresenta um percentual elevado, entre 60 e 70%, o que nos faz supor que a caça cooperativa (com coordenação de movimentos) é um comportamento freqüente no dia-a-dia destes indivíduos (apesar de não seguir variações sazonais).

Assim sendo, o sincronismo de respiração no forrageio e no deslocamento oferece suporte à hipótese 6, de que à semelhança do que foi sugerido por Connor

para focas e pingüins, o sincronismo de respiração reflete uma necessidade dos animais de obtenção de oxigênio, para estarem submersos por tempo similar e para realização embaixo da água de ações simultâneas.

Análises acerca da faixa etária indicam que dos quatro comportamentos estudados, a respiração sincrônica em grupos compostos por adultos e imaturos foi maior que o esperado apenas no comportamento de deslocamento. A respiração sincrônica em forrageio foi maior em grupos só de adultos, e ocorreu como esperado nos outros dois. A hipótese 7 é, portanto, parcialmente rejeitada, não sendo sugerido o ensino (pela ausência de sincronismo respiratório em forrageio), mas podendo haver o cuidado durante o deslocamento. Cabe ressaltar que Mann & Smuts (1999) sugerem que o cuidado em forma de respiração sincrônica no deslocamento é verificado apenas em imaturos de até um mês de idade, decaindo depois disto. Nossos dados não refinam a faixa etária dos indivíduos, sendo todos os indivíduos não adultos agrupados na categoria “imaturo”.

Por outro lado, o grande sincronismo de respiração em forrageio só de adultos reforça a sugestão acima de que os animais coordenam o tempo de mergulho para realização de caça cooperativa.

O número de golfinhos em sincronismo de respiração é maior em descanso (cerca de 90% dos animais apresentam respiração sincrônica). Este valor cai para 70% em deslocamento, 50% em forrageio e 16% em socialização. Isto quer dizer que mesmo que ocorra o sincronismo de respiração durante um estado sincrônico, nem todos os indivíduos do grupo sincronizam a respiração. Destacam-se os menores valores para forrageio e socialização, o que sugere que o sincronismo de respiração nestes comportamentos tenha um componente mais individualizado do que nos outros comportamentos.

O sincronismo de respiração ocorre tanto em surtos curtos quanto em surtos longos, em ambos os períodos, à exceção da socialização que ocorreu em surtos rápidos no período antes das chuvas e do deslocamento que ocorreu em surtos rápidos no período após as chuvas. Desta forma, não foi possível detectar uma duração típica do sincronismo de respiração em nenhum comportamento. Do mesmo modo, não há diferença na proporção de sincronismo respiratório do início

para o fim do surto, ou seja, os indivíduos não aumentam nem diminuem o sincronismo de respiração no decorrer da atividade sincrônica. Isto contrasta com o trabalho de Coté et al. (1997), realizado com ungulados, onde os autores verificaram uma assimetria comportamental, com um maior sincronismo dos indivíduos no início das atividades, este sincronismo decaia progressivamente, se tornando menos intenso no decorrer da atividade, e com cada indivíduo finalizando o comportamento a seu tempo. Esta assimetria foi sugerida pelos autores como tendo um cunho social, onde supõe-se que os animais iniciavam as atividades sincronicamente devido a facilitação social. Isto ocorre porque os ungulados não precisam ficar em apnéia para executar qualquer comportamento.

O número total de eventos sincrônicos foi baixo (n= 84 no período antes das chuvas e n= 93 no período após as chuvas). O sincronismo de eventos apresentou uma clara influência ambiental, com os eventos de deslocamento sincrônico (ex. surf, saltos) ocorrendo abaixo do esperado, e os eventos de forrageio (ex. bote, perseguição) acima do esperado no período 1. Já no período após as chuvas, este padrão é invertido, com eventos de forrageio ocorrendo abaixo do esperado e o deslocamento acima do esperado. Isto sugere que, apesar de no período 2 ocorrer um maior forrageio total, eles estão realizando menor caça cooperativa.

Relativo à dinâmica social cabe destacar que o sincronismo de eventos em socialização ocorreu como esperado em ambos os períodos. Connor et al. (2001; 2005; 2006; 2007), sugerem que a respiração sincrônica complementa o sincronismo de eventos como forma de display social. Novamente, nossos dados não suportam perfeitamente esta sugestão tendo em vista a baixa proporção de eventos de socialização sincrônicos.

No geral, verifica-se que a respiração sincrônica está mais relacionada aos comportamentos de descanso, deslocamento e forrageio que à socialização, podendo ser, entretanto, mais seletiva (individualizada) nestes dois últimos comportamentos dado o menor número de indivíduos que apresentam o sincronismo de respiração.

Apesar de infrequêntes, constatamos haver componentes sociais no sincronismo dos animais. Porém, vale relembrar que este trabalho oferece uma

primeira caracterização da dinâmica social do comportamento sincrônico dos botos cinza, recomendando-se desta forma estudos mais detalhados focando em eventos sincrônicos e duração da respiração sincrônica sejam realizados.

CONCLUSÕES

1. O orçamento de atividades de golfinhos solitários difere significativamente do orçamento de atividades de indivíduos em grupo, o que sugere que indivíduos precisam compatibilizar seus orçamentos de atividades para a manutenção da vida em grupo. Indivíduos solitários forrageiam mais e indivíduos em grupo deslocam e descansam mais.

2. Os grupos observados apresentam poucos indivíduos (moda = 2; máxima = 11), que formam grupos coesos (cerca de 70% dos indivíduos presentes na enseada distam até 20m entre si). Existe uma maior proporção de adultos (aproximadamente 60%) do que imaturos (15%).

3. O comportamento é semelhante nas duas enseadas, mas verifica-se variação com relação ao período de chuvas: os animais forrageiam mais e deslocam menos no período após as chuvas. Entretanto, este aumento no forrageio deve-se a um aumento na procura, não havendo variação no forrageio efetivo (caça e perseguição) no período após as chuvas. É sugerido que isto se deva a uma diminuição na oferta de alimentos nesta época devido ao carreamento de material particulado da terra para o mar. Assim sendo, o período após as chuvas representaria um período de baixa disponibilidade alimentar, com os animais despendendo mais tempo em procura para obter o mesmo sucesso de forrageio.

4. Não foi verificada influência da embarcação no comportamento dos indivíduos. Sugere-se que isto ocorra devido ao controle do número de embarcações e tempo de permanência das mesmas nas enseadas.

5. A análise do número de indivíduos em sincronismo oferece suporte à hipótese 1 de que fatores externos têm forte influência na exibição dos comportamentos: verifica-se uma mudança no número de indivíduos sincrônicos nos comportamentos de forrageio e deslocamento, acompanhando o padrão do orçamento de atividades geral. Hipótese 1 aceita.

6. Os dados oferecem suporte à hipótese 2 de que animais agrupam-se para efetivação de comportamentos similares, e afastam-se para a efetivação de comportamentos distintos. Hipótese 2 aceita.

7. As análises de faixa etária oferecem suporte à hipótese 3 de que a similaridade de necessidades energéticas influencia o sincronismo, pois ocorreu maior forrageio entre os adultos que entre adultos e imaturos. Hipótese 3 aceita.

8. Rejeita-se a hipótese 4 de que haveria um componente de ensino no sincronismo de forrageio, pois foi verificado baixo sincronismo entre adulto e imaturo neste comportamento. Por outro lado, um aspecto de cuidado pode ser inferido pelo maior sincronismo de socialização e deslocamento entre adulto e imaturo. Hipótese 4 parcialmente rejeitada.

9. Foi verificado baixo sincronismo de respiração durante atividades sociais, indicando que o sincronismo de respiração não é um componente determinante das demonstrações sociais destes animais. Assim sendo, com base na predição formulada a hipótese 5 é rejeitada. Porém, sugere-se que futuros trabalhos refinem as análises sobre o sincronismo de respiração. Hipótese 5 rejeitada.

10. O sincronismo de respiração no forrageio oferece suporte à hipótese 6 de que o sincronismo de respiração reflete uma necessidade dos animais estarem submersos por tempo similar. Hipótese 6 aceita.

11. A respiração sincrônica em grupos compostos por adultos e imaturos foi maior que o esperado apenas no comportamento de deslocamento. Isto rejeita parcialmente a hipótese 7 de que o sincronismo de respiração reflita o ensino de técnicas de forrageio. Entretanto, este dado pode significar o cuidado do filhote durante o deslocamento. Hipótese 7 parcialmente rejeitada.

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