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A percepção do saber científico e o cotidiano no ensino de Química e Biologia: desafios da

No documento Ensino médio 3: desafios e perspectivas (páginas 184-200)

interdisciplinaridade para a Educação do Campo

Welson Barbosa Santos1

Rosana Maria Sant’Ana Cotrim2

Vitor de Almeida Silva3

Juliano da Silva Martins de Almeida4

Este texto é resultado de uma análise circunstancial e discursiva da percepção de uma proposta de uso de uma pesquisa sobre poluição de corpos hídricos para fundamentar o ensino acadêmico de Química e Biologia na Educação do Campo. O desafio partiu do princípio de que há um distanciamento entre as pesquisas que ocorrem no meio acadê- mico e seu retorno à sociedade. Assim, compreendemos que uma pro- posta interdisciplinar do ensino das ciências da natureza se configura como uma alternativa para que possamos fazer aproximações entre as pesquisas acadêmicas e a comunidade, ou, especificamente, entre o sa- ber científico e o cotidiano.

Para tanto, tomou-se como referência um trabalho de disser- tação de mestrado que discute a poluição hídrica no município de Uberlândia – MG, pesquisa essa apresentada como subsídio didático para dois docentes das disciplinas de Química e de Biologia do curso de Licenciatura em Educação do Campo: Ciências da Natureza, for- mação pautada na Pedagogia da Alternância5. Foram feitas ainda en-

1 Professor da Universidade Federal de Goiás, Regional Goiás . 2 Universidade Federal de Goiás, Regional Goiás.

3 Professor da Universidade Federal de Goiás, Regional Goiás.

4 Pós-doutorando em Educação pela Universidade Federal de Catalão – UFCat. 5 Compreende-se, em acordo com Ribeiro (2008), que a Pedagogia da

trevistas com os sujeitos citados, e transcritas e selecionadas algumas sequências discursivas (SD) para cotejamento e análise à luz da subje- tividade em relação à aplicabilidade e viabilidade da proposta sob um viés interdisciplinar.

Nesse caminho, por ser um trabalho centrado na valorização das subjetividades, entende-se que este se localiza no campo das aborda- gens qualitativas, as quais favorecem uma visão ampla do objeto estu- dado e o envolvimento do pesquisador com a realidade social, política, econômica e cultural que o cerca. Confirmando essa visão, Pais (2001, p. 110) assegura que “em ambiências qualitativas os critérios de seleção são critérios de compreensão, pertinência e não os de representativida- de estatística”. Por ser assim, considera-se que a abordagem qualitativa não se resume a aspectos superficiais e limitados, mas permite conside- rar e respeitar a subjetividade dos sujeitos da pesquisa.

Diante disso, propomo-nos a discutir a formação inicial de pro- fessores que atuarão no Ensino Médio tendo por base as falas de edu- cadores, considerando as análises de discursos e os aspectos que regem a subjetividade desses docentes, assim como a articulação dos saberes acadêmicos e dos conhecimentos cotidianos apoiada em uma compre- ensão interdisciplinar das ciências da natureza.

Na perspectiva discursiva, Fischer (2001) entende que, para se observar um discurso, é preciso recusar explicações unívocas, fáceis e a busca insistente do sentido último ou oculto das coisas, pois esta é uma prática bastante comum e incorreta. Em contrapartida, a au- tora afirma que alcançar tal empreitada exige o desprender-se de um longo aprendizado que gera um olhar sobre o discurso apenas como conjunto de signos e/ou significantes que se referem a determinados do campo pela utilização de um método diferenciado que articula um Tempo Escola (TE) em que os educandos permanecem na unidade escolar, em geral em forma de internato, e um Tempo Comunidade (TC), em que eles retornam às propriedades familiares, comunidades ou assentamentos para colocarem em prática, com base nos problemas anteriormente levantados no TC, os conhecimentos que foram objeto de estudo no TE. Desse modo, acrescenta a autora, “a Pedagogia da Alternância tem o trabalho produtivo como o princípio de uma formação humanista que articula dialeticamente ensino formal e trabalho [...], prática e teoria, numa práxis e realiza-se em tempos e espaços que se alternam entre escola e propriedade, comunidade, assentamento, acampamento ou movimento social ao qual o educando está vinculado” (Ribeiro, 2008, p. 29-30).

conteúdos, carregando tal ou qual significado, quase sempre oculto, dissimulado, distorcido, intencionalmente deturpado, cheio de reais intenções, conteúdos e representações escondidas em textos e pelos textos e, logo, não visíveis.

Usando-se o discurso, é preciso não ficar no nível da existência das palavras e coisas ditas, e isso equivale a trabalhar arduamente, dei- xando que o discurso se mostre na sua complexidade peculiar, como afirma Fernandes (2012). Nesse particular, Fernandes (2012, 2008) ainda destaca que é como se no interior do discurso, ou em tempos an- teriores a ele, fosse possível encontrar verdades intocadas. Além disso, é importante perceber, assim como afirma Foucault (2008), que nada há por detrás das cortinas do discurso nem sob o chão que se pisa, o que existem são enunciados e relações que o próprio discurso põe em funcionamento.

O objetivo deste trabalho é, portanto, discutir as análises de dis- curso e os aspectos da subjetividade que subsidiam a formação inicial docente a partir da utilização de uma pesquisa acadêmica (dissertação de mestrado) e de sua relação com os saberes cotidianos por intermédio de uma perspectiva interdisciplinar de ensino voltado à formação de professores que atuarão no Ensino Médio em escolas do campo.

Essa relação entre as pesquisas acadêmicas e os saberes cotidia- nos corresponde a uma alternativa de aproximação entre o que é feito na academia e o que se faz na escola. Nesse processo, a interdisciplina- ridade se estabelece como a interface que poderá promover uma relação entre as diferentes disciplinas. Além disso, o trabalho busca evidenciar a necessidade de uma aprendizagem para além de um saber científico, em que os conhecimentos da ciência e do cotidiano se complementem e se configurem como fundamentais para a vida dos sujeitos.

Relações entre saberes científicos e o cotidiano

Partindo do reconhecimento da existência de um distanciamen- to entre os conhecimentos científicos e cotidianos, entende-se, com Krasilchik e Trivelato (1995), que a percepção tradicional de educação é equivocada, pois leva o sujeito a compreender os conhecimentos cien- tíficos como verdades totalizantes e a sustentar-se segundo o princípio de que os autorizados a falar de ciência são os cientistas, por compreen- derem essa atividade detalhadamente.

Para Oliveira (2003), essas questões fortalecem o conceito de que o cientista seria o legítimo portador de verdades absolutas, da efici- ência, da neutralidade e da objetividade total a respeito dos fenômenos naturais, desmerecendo com isso os saberes culturais presentes nas ati- vidades cotidianas dos sujeitos. Com isso, a herança dessa postura tem ainda fortalecido a ideia de neutralidade científica e a hierarquização do saber científico sobre as demais formas de conhecimento.

No campo dos saberes totalizantes, embora sejam conceitos historicamente estabelecidos e difundidos pelos diferentes espaços da sociedade, tais preceitos são carentes de desconstrução e superação. Nessa perspectiva, Krasilchik (2000) afirma que o ensino articulado de forma coerente com o cotidiano pode contribuir para o entendimento de que os saberes científicos são humanos, temporais, parciais, incon- clusos e associados a interesses econômicos e políticos.

De forma mais ampla, a autora ainda afirma que é a articulação da filosofia e da história, auxiliando e complementando diferentes sabe- res, como o da Química e o da Biologia no ensino, que pode respaldar a desconstrução conceitual de ciência como detentora de um saber sobe- rano, completo, absoluto, perfeito e total.

Sabe-se que essa concepção tem também como fator limitan- te o nível de formação disponibilizada ao educador, questão também evidenciada nas licenciaturas do campo. Nesse sentido, Krasilchik e Marandino (2004) confirmam que a formação de professores é defi- ciente, e que as áreas das ciências, incluindo-se a Química e a Biologia, apresentam currículos limitados e conteúdos ministrados de for- ma fragmentada e isolada. Na afirmação de Tardif (2004), e Cunha e Krasilchick (2000), as licenciaturas valorizam o cientificismo e o tec- nicismo, distanciando o saber científico do saber cotidiano, sendo esse um fator comprometedor na formação para a Educação do Campo.

Ao propormos uma aproximação entre os saberes científicos e o cotidiano, assumimos a concepção explicitada por Cavalcanti (2005, p. 197), a qual considera que

o processo de formação de conceitos cotidianos é “ascendente”, surgindo impregnado de experiência, mas de uma forma ainda não-consciente e “ascendendo” para um conceito conscientemente definido; os conceitos científicos surgem de modo contrário, seu movimento é “descendente”,

começando com uma definição verbal com aplicações não espontâneas e posteriormente podendo adquirir um nível de concretude impregnan- do-se na experiência.

Os movimentos “ascendentes” e “descendentes” dos saberes científicos e do cotidiano podem se interseccionar por meio de uma abordagem interdisciplinar dos processos de ensino e aprendizagem. O indivíduo, com seu conhecimento já estruturado cognitivamente e as experiências de vivências, poderá visualizar significado no conheci- mento científico a partir do momento em que as diferentes formas de saberes estejam em consonância e sejam compreendidas como comple- mentares.

Dias (2008) considera que o saber cotidiano é aquele gerado pela observação de fatores naturais para depois tornar-se (ou não) científi- co. Sua base não se fundamenta somente na experimentação, ele está relacionado também a fatos vivenciados por alguém que pode (ou não) possuir a pretensão de tornar aquele conhecimento científico. O conhe- cimento cotidiano convive com outras fontes de conhecimento, tornan- do-se contraditório em certas ocasiões. Podemos afirmar ainda que é necessário um contexto para que seja produzido.

A definição que Dias (2008) apresenta a respeito do saber cien- tífico o estabelece como lócus privilegiado de um conjunto de ativida- des e conhecimentos que, de forma metódica e sistemática, é produzido pela ciência, tendo o papel de promover avanços tecnológicos e sociais proporcionais aos interesses que os envolvem. No entanto, apesar de ter base experimental, não é inquestionável, podendo ser contestado e perder a sua suposta veracidade. Trata-se de um conhecimento que pode ser completamente independente de um contexto predetermina- do, utilizando-se afirmações generalizadas e podendo ser aplicado a di- ferentes situações e épocas.

Ao fazermos tais considerações sobre os saberes e o Ensino Fundamental e Médio para o campo, o papel da educação é desempe- nhar uma reflexão, pois as análises epistemológicas da ciência encon- traram diretrizes para orientarem a abordagem tanto do conhecimento cotidiano quanto do conhecimento científico e, consequentemente, de sua estruturação para um conhecimento escolar.

Ensino Fundamental e Médio no campo, Caldart (2002) afirma tratar- se de um trabalho acadêmico em que os profissionais envolvidos têm muito a aprender, sobre o que refletir e a ensinar. Nesse raciocínio, a autora permite afirmar que não há como educar o povo do campo de forma verdadeira sem que sejam transformadas as condições atuais de sua existência e feita a adequada valorização de seus saberes, de sua cultura e identidade como campesinos. Para Molina (2006), essa cons- cientização é conquista do campo, decorrente das reivindicações dos movimentos sociais gradativamente fortalecidas nas duas últimas dé- cadas e meia.

Partindo desses aspectos, acreditamos que uma formação inicial que valorize o saber cotidiano relacionando-o aos saberes científicos e tendo por perspectiva um ensino interdisciplinar possa ser um caminho para contribuir com a formação teórica e prática de futuros professo- res que atuarão no Ensino Médio em escolas do campo. O ensino de ciências assume uma importância fundamental nesse processo, pois as disciplinas que a subsidiam apresentam características que as entrela- çam, permitindo o desenvolvimento de conhecimentos com significado. A interdisciplinaridade é vista como um caminho para um ensino de ciências com significado.

No caso específico da Licenciatura em Educação do Campo, o que se tem constatado é, portanto, o isolamento desses saberes já no mo- mento da formação docente. Isso é, pois, o que nos leva a refletir sobre os modos como esse processo se dá e, por outro lado, como ele pode tornar-se efetivo, o que, pelo recorte analítico que se propõe, conduz a uma reflexão sobre o aspecto da interdisciplinaridade.

Dimensão e modalidades da interdisciplinaridade nos processos de ensino e aprendizagem

Quando pensamos em uma proposta de ensino que tenha signifi- cado para os alunos, precisamos direcionar a concepção de aprendiza- gem para além do desenvolvimento do cognitivo e baseada na fragmen- tação do conhecimento em disciplinas. É preciso visualizarmos os pro- cessos de ensino e aprendizagem de uma forma menos compartimenta- da, isto é, distanciarmo-nos da disciplinarização do conhecimento.

conhecimento corresponde a uma sintetização de informações fun- damentais e necessárias para que os sujeitos possam compreender e propor intervenções em determinadas situações sociais. No entanto, o autor destaca que sozinhos os alunos não são capazes de reorganizar as informações fragmentadas nas diferentes disciplinas, o que significa que não compreendem seus significados e sentidos.

A interação entre disciplinas significa centrarmos o aluno em uma perspectiva de aprendizagem globalizadora, respeitando as limita- ções dos sujeitos e propondo ações capazes de explorar os conhecimen- tos já estabelecidos cognitivamente pelos alunos e, assim, desenvolver os conceitos científicos apoiados nas particularidades evidenciadas.

Para que possamos desenvolver um processo de ensino e apren- dizagem que confira significado a questões sociocientíficas, não pode- mos simplesmente fragmentá-lo em diferentes partes, conferindo a cada uma delas uma especificidade do saber. Frigotto (2008) considera que assumir a delimitação de um objeto de estudo não significa ter que abandonar as múltiplas determinações que o constituem.

A fim de corrigir essa característica de fragmentação do conhe- cimento, cada vez mais presente na ciência, é que se recorre à inter- disciplinaridade. Para Santomé (1998, p. 62), o termo interdisciplina- ridade surge

ligado à finalidade de corrigir possíveis erros e a esterilidade acarretada por uma ciência excessivamente compartimentada e sem comunicação interdisciplinar. Nesse sentido, a crítica à compartimentação das maté- rias será igual à dirigida ao trabalho fragmentado nos sistemas de pro- dução da sociedade capitalista, à separação entre trabalho intelectual e manual, entre a teoria e a prática, à hierarquização e ausência de co- municação democrática entre os diferentes cargos de trabalho em uma estrutura de produção capitalista, entre humano e técnica, etc.

Para que possamos ultrapassar a fragmentação do conhecimen- to, geralmente pensamos em conferir significado à disciplina a partir de um problema, visando a contemplar uma dimensão globalizadora. Contudo, esbarramos na metodologia baseada na peculiaridade do “problema” a ser resolvido. Tal metodologia destaca o problema a ser enfrentado, porém sua solução encontra subsídios nos aspectos espe-

cíficos de cada disciplina ao qual está diretamente ligado. A comparti- mentalização se mascara na esfera de solução e trabalho em conjunto, tendo por base um problema em comum.

A interdisciplinaridade vai muito além dessa caracterização. Quando propomos um trabalho interdisciplinar, pressupomos uma mudança de comportamento dos sujeitos envolvidos nesse processo. Devemos levar em consideração que a interdisciplinaridade está as- sociada ao

desenvolvimento de certos traços da personalidade, tais como a flexi- bilidade, confiança, paciência, intuição, pensamento divergente, ca- pacidade de adaptação, sensibilidade com relação às demais pessoas, aceitação de riscos, aprender a agir na diversidade, aceitar novos papéis (Santomé, 1998, p. 64-65).

Além disso, é importante destacar que o trabalho interdiscipli- nar não considera o fim das disciplinas, muito pelo contrário. Podemos falar em fragmentação, porém uma compartimentalização excessiva provocará uma perda de sentido do conteúdo ministrado. O trabalho interdisciplinar propõe-se a reestruturar os conteúdos para que se apresentem de forma relevante e com significado para o estudante. Baliza-se em uma espiral de conhecimento que inicia a partir do que sabe o sujeito e vai se desenvolvendo em uma construção significativa que desconhece as fronteiras disciplinares.

É importante compreender que apenas a “inter-relação” de dis- ciplinas não se configura como interdisciplinaridade. A colaboração e integração entre disciplinas delimita modalidades de interdisciplinari- dade, distinguidas por Santomé (1998) apoiadas nos estudos de Jean Piaget e Erich Jantsch.

Santomé (1998, p. 69) lista a hierarquização das modalidades de interdisciplinaridade, segundo Piaget, distinguindo-as assim:

1. Multidisciplinaridade: ocorre quando, para solucionar um proble- ma, busca-se informação e ajuda em várias disciplinas, sem que tal in- teração contribua para modificá-las ou enriquecê-las. É o nível inferior de integração entre disciplinas.

em que a cooperação entre várias delas provoca intercâmbios reais e, consequentemente, enriquecimento mútuo.

3. Transdisciplinaridade: é a etapa superior de integração. Trata-se da construção de um sistema total, sem fronteiras sólidas entre as disciplinas.

Ao elencar a hierarquização feita por Erich Jantsch, Santomé (1998, p. 70-74) refere-se às diversas etapas de colaboração e coordena- ção entre as diferentes disciplinas. Assim, organiza de forma crescente os seguintes níveis de modalidade de interdisciplinaridade:

1. Multidisciplinaridade: a comunicação entre as diversas disciplinas ficaria reduzida a um mínimo. Corresponde a uma justaposição de ma- térias diferentes, oferecidas de maneira simultânea, com a intenção de esclarecer alguns dos seus elementos comuns, mas na verdade nunca se explicitam claramente as possíveis relações entre elas.

2. Pluridisciplinaridade: é a justaposição de disciplinas mais ou menos próximas dentro de um mesmo setor de conhecimentos. É uma forma de cooperação que visa a melhorar as relações entre essas disciplinas. Vem a ser uma relação de mera troca de informações, uma simples acumulação de conhecimentos. Não há imposição de uma disciplina sobre a outra.

3. Disciplinaridade cruzada: abordagem baseada em postura de for- ça; a possibilidade de comunicação está desequilibrada, pois uma das disciplinas dominará as outras. A matéria considerada importante de- terminará o que as demais disciplinas deverão assumir. Cria-se uma polarização que cruza as disciplinas rumo à axiomática da disciplina de maior prestígio e poder.

4. Interdisciplinaridade: implica uma vontade e um compromisso de elaborar um contexto mais geral, no qual cada uma das disciplinas em contato é por sua vez modificada, passando cada uma a depender claramente das outras. Isso resulta em intercomunicação e enrique- cimento recíproco e, consequentemente, em uma transformação de suas metodologias de pesquisa, em uma modificação de conceitos e de terminologias fundamentais, existindo um equilíbrio de forças nas relações estabelecidas.

transcendência, de uma modalidade de relação entre as disciplinas que as superem. É o nível superior da interdisciplinaridade, da coor- denação, em que desaparecem os limites entre as diversas disciplinas, constituindo-se um sistema total que ultrapassa o plano das relações e interações entre elas. A integração ocorre dentro de um sistema oni- compreensivo, na perseguição de objetivos comuns e de um ideal de unificação epistemológico e cultural.

Discutir a interdisciplinaridade no processo de ensino e aprendi- zagem para nos distanciarmos de uma fragmentação do conhecimento não significa apenas concentrar forças para resolver um problema ou simplesmente direcionar nossos esforços para trabalharmos um tema comum a diferentes disciplinas.

Por ser assim, a interdisciplinaridade pressupõe uma mudan- ça de comportamento no sujeito que ensina e naquele que aprende. Corresponde ao exercício de ações subjetivas que não visualizam as fronteiras disciplinares, fundamentando-se em um comportamento or- ganizado em estruturas conceituais e metodológicas capazes de perpas- sar disciplinas distintas.

Marcas de subjetividade na percepção do ensino de Química e Biologia na Educação do Campo: entre saberes científicos e o cotidiano

Esta análise tem como pressuposto o conceito de que a subjetivi- dade é a capacidade que o locutor tem de se apresentar como sujeito de seu discurso por meio de determinados índices típicos da enunciação. Mas pressupõe também que esse sujeito da enunciação trava relações, num nível interdiscursivo, com o meio, com a sociedade, isto é, com o

outro com quem o sujeito se relaciona, seu destinatário, e com o outro

historicamente constituído em seu discurso.

Assim, pode-se dizer que a subjetivação do docente dá-se pela heterogeneidade, e o seu discurso resulta “de uma pluralidade de vozes que se cruzam em consonância ou em dissonância” (Coracini, 2003, p. 319). Portanto, assim como seu discurso, o sujeito é constitutivamente heterogêneo (Authier-Revuz, 1982).

tor concebido ao mesmo tempo como um elemento ativo, que oferece a possibilidade de um contradiscurso e constituído historicamente, e em cujo discurso se entrecruzam os vários sentidos acumulados em deter- minado tempo. Assim, num jogo de vozes cruzadas – complementares, concorrentes, contraditórias –, o discurso se tece polifonicamente, dei- xando marcas irrefutáveis da ideologia e da historicidade do sujeito do discurso. Ou seja, o discurso, embora o sujeito acredite ser dono dele, irrompe das formações discursivas que o compõem.

Concebida por Foucault (2008) num momento de investiga-

No documento Ensino médio 3: desafios e perspectivas (páginas 184-200)