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CAPÍTULO II Inclusão Escolar

I. Percurso Histórico da Educação Especial

A Educação Especial é assumida como uma área da educação especializada no lidar com crianças que apresentam deficiências e necessidades especiais (Tilstone, 2003). Tal como qualquer outro domínio da educação a Educação Especial não tem sido excepção às profundas alterações (Florian, Rose & Tilstone, 2003) que resultaram em modos diferenciados de encarar as pessoas com necessidades específicas de educação e, consequentemente, nas práticas a adoptar. Vejamos alguns momentos mais marcantes na história do percurso da educação especial.

Inicialmente, as crianças que apresentavam alguma deficiência eram excluídas dos sistemas regulares de ensino (Karagiannis, Stainback & Stainback, 1999) e sendo consideradas ineducáveis eram colocadas à margem de qualquer participação a nível escolar e social, internadas muitas vezes em hospitais longe da comunidade (Tilstone, 2003).

Mais tarde, esta visão foi um pouco alterada e passaram a ser educadas em centros especializados, mas o enfoque na diferença resultava na separação entre os sistemas de ensino especiais e os sistemas de ensino regulares (Florian, Rose & Tilstone, 2003) assumindo esta segregação atitudes muito negativas em relação à sua situação de dificiência (Sprinthall & Sprinthall, 2000). Como defendido por Niza (1996) o movimento segregador baseava-se no modelo médico que partia de uma concepção de doença da deficiência. Assim, a preocupação residia na classificação e categorização da deficiência da criança para, posteriormente, ser colocada em sistemas escolares diferenciados (cit. por Camisão, 2004).

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Apesar de vigorar durante algum tempo este tipo de práticas segregadoras foram avaliadas como discriminatórias, sendo os principais alvos de crítica o facto de proporcionar um ambiente restrito e empobrecedor, tornando-se, desse modo, inadequadas (Sprinthall & Sprinthall, 2000).

Assim, foram postas em prática experiências integradoras que permitiam a estas crianças frequentar parcialmente escolas de ensino regular, baseadas sobretudo no conceito de normalização, isto é, na ideia de que cada criança deve ser educada num contexto o mais normal possível aos modos de vida comuns da sociedade (Florian, 2003; Sprinthall & Sprinthall, 2000). Deste modo, de acordo com o modelo de integração na tentativa de se ultrapassar a diferença procurava-se aproximar o aluno com necessidades especiais do aluno normal (Freire, 2008).

Estas práticas de integração foram desenvolvidas inicialmente nos países nórdicos (Suécia, Dinamarca, Noruega) e a partir dos anos 60 e 70 estendeu-se progressivamente a outros países europeus (Camisão, 2004).

No início dos anos 70 são publicados dois documentos legislativos importantes e que apoiam a integração em sistemas de ensino regulares. Nos Estados Unidos da América destaca-se a Education for Handicapped Children Act (1975), onde é estabelecido o direito a crianças com deficiências frequentarem escolas regulares, assim como serviços de apoio às suas necessidades especiais. Em 1978, surge no Reino Unido o documento Warnock Report que defendia os mesmos aspectos do Education for

Handicapped Children Act (1975) (Bairrão, 1998).

O Warnock Report descreve o processo de integração de acordo com três aspectos: situacionais, sociais e funcionais. A integração situacional refere-se à partilha do mesmo espaço físico para as estruturas especiais e normais. A integração social refere-se à partilha de um mesmo local para realização de actividades fora do espaço escolar. Por último, a integração funcional caracteriza-se pela participação de todas as crianças nos mesmos programas educativos em aulas de escolaridade regular (Florian, 2003).

Este documento introduziu o conceito de necessidades educativas especiais (NEE) e o atendimento a estas crianças passou a centrar-se numa intervenção que visava ofertar uma resposta adequada às necessidades educativas das crianças (Bairrão, 1998).

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Apesar de importantes contributos para a educação especial as práticas de integração passaram a ser questionadas e colocadas em causa (Tilstone, 2003).

Em 1995, Lewis apresenta duas principais razões que sustentam a necessidade de repensar e reformular as práticas de integração. A primeira prende-se com o facto da integração se limitar à colocação sem consideração das condições adequadas a essa colocação. A segunda razão refere-se ao conceito de normalização por ser entendido como uma negação da diferença conduzindo, de acordo com vários autores, à desvalorização de sujeitos diferentes (cit. por Florian, 2003).

Na década de 80 do século XX surge, na América do Norte, o termo inclusão que conduziu ao desenvolvimento de programas inclusivos em várias províncias do Canadá (Florian, 2003).

Esta filosofia inclusiva passou a ser considerada e foi incorporada em diversos documentos políticos internacionais e alvo de inúmeras investigações (Florian, Rose & Tilstone, 2003).

Destacamos, nomeadamente, o movimento Regular Education Iniciative (REI) desenvolvido nos EUA que apelava para a necessidade de findar com os obstáculos que eram colocados a crianças e jovens com necessidades especiais, impossibilitando-os de uma participação plena a nível escolar e social. O REI apelava ao investimento no sistema regular de ensino ao invés de um melhoramento separadamente em cada um dos sistemas regular e especial (Camisão, 2004).

Em 1990 na Tailândia foi assinado um compromisso entre a comunidade internacional na Conferência Mundial sobre Educação para Todos. Nesta Conferência estiveram presentes 60 países que subescreveram a Declaração Mundial de Educação

para todos na qual se defendia a importância de assegurar a frequência escolar a todas

as crianças, independentemente da sua condição de deficiência (Hegarty, 2006).

O Relatório da UNESCO de 1994 sobre a educação de crianças com deficiências – Declaração de Salamanca – traduz igualmente numa etapa determinante neste movimento inclusivo (Florian, 2003). Esta Declaração foi aprovada na Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais, organizada pelo Governo de Espanha, a qual contou com a presença de 92 países, de onde destacamos Portugal, e

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25 organizações internacionais. Este documento pretende estabelecer uma política e orientar os governos e organizações no sentido de garantir a todas as crianças, jovens e adultos com necessidades específicas de educação o direito a frequentar escolas de ensino regular (Declaração de Salamanca, 1994).

Outro documento importante neste processo foi o Livro Verde (1997) no qual se considera que as escolas especiais enquanto especializadas no trabalho com crianças com necessidades especiais têm um papel determinante e devem trabalhar comumente com as escolas de ensino regular no incremento da inclusão escolar (Tilstone, 2003), assim como os profissionais devem ter formação que os auxilie neste processo (Wolger, 2003).

Em 2000 foi realizada em Dakar uma Conferência Mundial que contou com a presença de 1100 pessoas de 164 países. Neste Congresso foi defenido o “Plano de Acção de Dakar Educação para todos: Encontrando os Nossos Compromissos Colectivos”. Esta Conferência define alguns objectivos que se prendem fundamentalmente com a necessidade de expandir e melhorar a compreensão da educação na primeira infância; assegurar que até 2015 todas as crianças tenham acesso a uma educação de qualidade; necessidade de se reconhecerem direitos básicos de crianças e adultos proporcionando-lhes meios que potenciem as suas capacidades; atingir até 2015 uma percentagem de 50% na melhoria dos níveis de literacia em adultos; eliminar até 2015 possíveis disparidades relativamente à condição de género e, por fim, permitir uma melhoria ao nível da educação assegurando aprendizagens satisfatórias e reconhecíveis em áreas básicas consideradas essenciais para a vida de cada sujeito (Hegarty, 2006).

Apesar de várias posições relativamente às práticas inclusivas, estas assumem- se como um marco determinante para possibilitar uma melhoria na qualidade de vida de pessoas com deficiência (Florian, Rose & Tilstone, 2003), pois tornou-se evidente que a colocação de alunos com maiores dificuldades em meios segregados não era uma situação viável e promotora do seu desenvolvimento. Assim, a inclusão é assumida como uma resposta adequada não somente por fornecer uma educação básica de qualidade para todos, mas também por evitar o problema da exclusão educacional (Freire, 2008).

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Esta reformulação a nível escolar prende-se com questões de justiça social e valorização de direitos humanos, assim como questões de nível ético, económico, cultural e religioso (Florian, Rose & Tilstone, 2003; Freire, 2008). Assim, defende-se que as crianças com necessidades específicas de educação devem ser tratadas de acordo com as suas necessidades e capacidades (Gerschel, 2003) e ter oportunidade de aceder ao currículo oferecido por escolas de ensino regular (Florian, Rose & Tilstone, 2003; Florian, 2003) devendo ser maximizadas as oportunidades que beneficiem na escola (Gerschel, 2003).

Seguidamente exploramos com maior pormenor o processo de inclusão escolar.