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Os diversos autores que se têm debruçado sobre o estudo da contrafação, preocupam-se igualmente em conhecer o conjunto de traços, psíquicos ou físicos do infrator, o designado “perfil do delinquente”92. Devido à diversidade de intervenções é difícil definir concretamente o perfil do criminoso.

Os contrafatores são os chamados “cucos”93 e cigarras do comércio, uma vez que se apropriam do esforço e do sucesso dos titulares do direito. Aproveitam-se também do facto dos consumidores procurarem a qualidade e o prestígio de certa marca a um preço baixo, por não terem capacidade económica de adquirirem o original.

A contrafação está cada vez mais associada ao crime organizado e à lavagem de dinheiro, pelo que, pressupõe que os contrafatores seja essencialmente alguém que trabalhe como mentor de uma organização, logo, têm que ter capacidade e facilidade em

91 VIDAL, José Alberto Marques, “Mercadorias em Contrafação e Violação de Direitos Industriais”, ob. Cit., p.21.

92 Neste sentido consulte-se o “Estudo sobre Contrafação”, realizado pela UACS- União De Associações Do Comércio e Serviços, capítulo 8, 2001, disponível em WWW<URL: www.uacs. pt/pdfs/ 11255 86282 contrafaccao.pdf, acedido e consultado em 23/11/2015.

93 MONOT, Bleuzenn, “La Guerre de la Contrefaçon. Le grand pillage des marques”, Paris, Elipses, 2009, p.25.

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se movimentar no meio financeiro, normalmente com grandes conhecimentos nessa área e com bons contactos comerciais a nível nacional e internacional que lhes permita distribuir os produtos.

Pode ainda ser alguém que tenha em regra um elevado nível académico e cultural, com domínio de várias línguas e grande capacidade de expressão, de desenvolvimento e manutenção de relações sociais com os estratos com maior poder de compra, de domínio da “bolsa” dessas mercadorias e conhecimento da rede de retalho para distribuição. São indivíduos que devido à sua influência e capacidade financeira conseguirão por norma movimentar-se facilmente junto das entidades públicas, muitas vezes graças à corrupção e que desenvolvem esta atividade criminosa provavelmente com o apoio de técnicos especializados nos vários ramos.

Associados aos contrafatores estão, muitas vezes sem o saber, dependendo se conhecem ou não a atividade ilícita, os intermediários, nomeadamente transportadores, armazenistas, bancos ou os servidores de internet onde são disponibilizados grande parte das vezes os produtos para venda.

Relativamente à contrafação dos produtos cosméticos, julgamos que poderá estar mais associado ao chamado contrafator de “garagem”94, que fabrica isoladamente ou que importa pequenas quantidades de produtos contrafeitos e os revende, ignorando até por vezes o seu fornecedor.

O perfil do consumidor regular das marcas contrafeitas será por norma o oposto do contrafator, uma vez que este tipo de consumo abrange normalmente um público com menor poder de compra, com menos informação sobre a realidade económica, menos formação escolar e cultural, mas que quer, no entanto, “aparentar” um nível superior de consumo àquele que consegue comportar. Este tipo de pessoas acaba por compactuar com os contrafatores, denotando até reações favoráveis a este tipo de atuação, uma vez que este tipo de consumidor tem assim a possibilidade de adquirir um produto de marca a baixo custo, podendo assim ostentar uma imagem pública e social elevada pela utilização dessas marcas. Podemos eventualmente distinguir os consumidores que fazem questão de comprar apenas os produtos legítimos, aqueles em que em certas condições, querem e compram marcas contrafeitas e os que não se interessam ou estão indiferentes aos DPI.

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Como afirma David C. Hilliard, “There are two state of mind elements of criminal counterfeiting: intentional trafficking and knowing use of a counterfeit mark”95. Assim, por vezes ao adquirir estes artigos os compradores tornam-se, de facto, cúmplices do roubo de propriedade intelectual, que não é um crime sem vítimas. Umas vezes em consciência, outras (e queremos acreditar que seja a maioria das vezes) ingenuamente.

O erro do consumidor ao adquirir marcas contrafeitas pode ser devido a confusão ou pode ser enganado intencionalmente pelo vendedor. Não podemos presumir que o consumidor saiba que o produto é contrafeito apenas porque está a preço muito reduzido, pois pode desconhecer o valor da marca original, ou pensar estar perante liquidações e limpezas de stock das marcas, que fazem reduzir o preço, além de que nem sempre as marcas contrafeitas são vendidas a tão baixo preço quanto seria de esperar. Se a qualidade apresentada e as caraterísticas do produto forem muito idênticas, o consumidor poderá ser facilmente induzido em erro e aí estará a ser conivente com o ilícito sem o saber.

5.1 O consumidor enquanto agente anti contrafação

Os consumidores podem ter cada vez mais um papel ativo na luta contra a contrafação e ajudar a União Europeia a combater este crime, se não adquirirem artigos contrafeitos. Afinal, se não houver destinatários para os produtos contrafeitos, deixará de fazer sentido a fabricação, pois deixa de haver mercado para o seu escoamento.

No sentido de sensibilizar os consumidores para o facto de a compra de produtos falsificados poder servir para financiar grupos criminosos organizados, além de que coloca em risco a saúde e a segurança dos consumidores, a Organização das Nações Unidas (ONU) lançou a nível mundial uma campanha em 14 de janeiro de 2014, que tinha como lema “Contrafação: Não financie o crime organizado”. Esta campanha teve a iniciativa do Departamento de Drogas e Crimes (UNODC) da ONU96.

Esta campanha pretende levar os consumidores a “olhar para além” dos produtos contrafeitos, para que possam entender as “graves repercussões” deste comércio ilícito. Além de destacar que o tráfico e venda de produtos falsificados “facilita a lavagem de

95 Cf. HILLIARDD, David C. and others, “Trademarks and Unfair Competition”, Deskbook, Seventh Edition, Lexis Net, 2015, p.233.

96 Disponível na internet em WWW<URL: http://www.unodc.org/counterfeit/, acedido e consultado em 08/10/2016.

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outros rendimentos ilícitos”, as Nações Unidas fazem ainda o alerta para o risco para a saúde e segurança que estes produtos representam, na medida em que “sem regulação legal e muito poucos recursos”, os consumidores correm o risco de comprar produtos perigosos e ineficazes ou com defeito, que “podem levar a lesões e, em alguns casos, à morte” 97.

Infelizmente os consumidores iludidos pelo mercado, pela moda, pelo status, e pelos rótulos sociais são bastante recetivos à compra de marcas contrafeitas. E como já referimos, enquanto houver procura haverá a oferta correspondente, até porque, este é um crime bem tolerado pela população, pois é aparentemente um crime branco, sem sangue. Muitos dos consumidores julgam que ninguém será lesado com a compra do produto contrafeito. Não nos esqueçamos, no entanto, que poderá ser o próprio consumidor o mais lesado ainda que disso não tenha consciência, nomeadamente se falarmos dos produtos cosméticos pois, mais do que falarmos de falta de qualidade, pouca durabilidade do produto ou de implicações económicas para as empresas, falamos de problemas de saúde graves que podem advir deste consumo.

O facto é que, mesmo por vezes, independentemente do nível económico, se o consumidor estiver perante uma réplica verdadeiramente perfeita, até aquele com mais capacidade económica tenderá a não hesitar comprar.

97 Dinheiro Vivo- Lusa, (15/01/2016), publicação disponível em WWW<URL: https://www.dinheirovivo.pt / economia/campanha-da-onu-comprar-falsificacoes-e-financiar-o-crime organizado/ , acedido e consultado em 13/08/2016.

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