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4 DISCUTINDO A TRAJETÓRIA ESCOLAR E OCUPACIONAL DAS

4.1 PERFIL GERAL: QUEM SÃO AS ENTREVISTADAS?

Para caracterizar as mulheres que participaram da pesquisa, procuraremos construir o seu perfil a partir de alguns eixos: faixa etária, número de filhos, conjugalidade, momento no curso de vida da família, escolaridade, renda e ocupação.

Confirmando o que outros estudos já observaram em relação à maior freqüência de mulheres maduras chefes de família, a maior parte das nossas entrevistadas encontra-se na faixa de adultas maduras, de 40 a 59 anos de idade, faixa que abriga 19 das 32 entrevistadas. São em geral (embora não totalmente) mulheres que já têm filhos jovens ou adultos, sendo que uma parte destas mulheres abriga em seus domicílios netos menores de 15 anos.

As chefes de família jovens entrevistadas, com idade de 20 a 39 anos, somam apenas cinco das 32 entrevistadas. Apesar de buscar abranger todas as faixas etárias de modo mais equilibrado possível, sugerimos que a dificuldade de encontrar mais mulheres chefes nessa faixa etária, se deve justamente ao critério por nós utilizado, no que se refere à chefia da

família e do domicílio. Assim, era muito mais freqüente encontrar mulheres chefes de família

jovens em casas onde a chefia era atribuída à outra pessoa, do ponto de vista tanto financeiro quanto do poder decisório. Geralmente essas pessoas eram mães ou pais, ou outros parentes.

Na faixa etária correspondente à das idosas, a partir de 60 anos a 84 anos, encontramos 8 mulheres das 32 que totalizavam a seleção. Parte dessas mulheres eram viúvas, ou separadas. Nessa faixa de idade não encontramos nenhuma mulher convivendo com companheiro, situação encontrada apenas entre as mulheres das duas primeiras faixas etárias.

O tamanho da família é um fator importante para termos a dimensão da carga de dependência e, no que diz respeito ao número de filhos, a variação é bastante relevante, encontrando-se quatro das mulheres com até um filho. Entre essas a idade variava de 26 a 56 anos. Na faixa de 2 a 3 filhos, correspondente ao tamanho médio da família brasileira, encontramos 12 mulheres, situadas em diferentes faixas etárias, de 20 a 84 anos de idade, mas com uma concentração maior nas mulheres até 50 anos. Interessante notar que também na faixa de 4 a 6 filhos encontramos o mesmo número de mulheres, cujas idades variavam entre 26 e 62 anos de idade. As maiores famílias, de 7 a 12 filhos correspondem a quatro mulheres, de idade variando entre 43 e 74 anos12.

A situação em relação à conjugalidade nos aponta para um dado já evidenciado por outras pesquisas sobre chefia familiar feminina. Embora a maioria de mulheres chefes de família sejam aquelas que não convivem com cônjuge ou companheiro, encontramos um número relevante de situações em que as mulheres se identificam como chefes de família e têm companheiro. Como afirmam algumas autoras, a ideologia de gênero ainda persistente tende a obscurecer estas situações, embora transformações na própria família e no âmbito das representações sociais estejam permitindo que as mulheres se assumam enquanto chefes apesar da convivência conjugal, o que corresponde a sete das entrevistadas dessa pesquisa, sendo que duas destas estavam vivendo uma segunda união.

Mas a maior parte das mulheres, como sinalizam os dados provenientes de pesquisas qualitativas e quantitativas, continua a situar-se entre as que não convivem com companheiro

12 Importante salientar que estes dados são sobre o número de filhos tidos pelas mulheres ao longo de sua trajetória, e fizeram parte do grupo doméstico, não significando, sobretudo no caso das mais velhas, que ainda residam no mesmo domicílio atualmente.

(25 mulheres), sendo que destas apenas três nunca conviveram. As viúvas, duas das quais viviam uma segunda união no momento da pesquisa, totalizavam 6 entrevistadas.

Os níveis de escolaridade das entrevistadas acompanham os dados mais gerais sobre chefia familiar feminina em contexto de pobreza. Das 32 entrevistadas, 20 não completaram o ensino fundamental, e das 12 restantes apenas seis chegaram a concluir o ensino médio, duas das quais possuem formação técnica. Apenas uma das mulheres entrevistadas chegou a cursar e concluir o nível superior, exatamente aquela que em sua entrevista afirma ter colocado como projeto de vida abdicar da maternidade, e dedicar-se à sua carreira apesar de dois casamentos. A distribuição por renda e ocupação evidencia algumas das dificuldades encontradas pela maioria das entrevistadas, semelhante a muitas mulheres chefes de família pobres que vivem com baixos rendimentos e estão inseridas em ocupações precárias e desvalorizadas socialmente. Destacamos, inicialmente, aquelas que recebem pensão do marido (viúvas legalmente) e as aposentadas que somam oito casos, quatro em cada uma das situações. Entre as que afirmaram possuir um emprego fixo encontramos cinco mulheres, sendo que destas uma era empregada doméstica há mais de 10 anos, na mesma residência. As mulheres inseridas em atividades informais totalizaram 16 casos, sendo que oito destas tiravam seu sustento exclusivamente dessas atividades, enquanto as outras oito contavam com a ajuda de programas do governo (principalmente o Bolsa Família13) ou de ONG’s para manter o sustento da família. Outras três mulheres afirmaram ter outras fontes de renda, uma vez que sem emprego, nem trabalho remunerado, auferiam seus rendimentos de pensão do pai, de ajuda de parentes, e de renda de aluguel de imóvel respectivamente.

Diante da exposição deste perfil de ocupação em que estavam inseridas as mulheres no momento da pesquisa, aprofundaremos nas próximas seções deste capítulo a discussão com base na sua trajetória em relação ao trabalho.

No critério metodológico, a renda total do domicílio foi calculada a partir da soma dos rendimentos declarados pela entrevistada como sendo oriundos dela, e/ou de algum outro membro quando este contribuía nas despesas. Assim, a renda total do domicílio era inferior a um Salário Mínimo em 14 dos domicílios visitados, variava de 1 a 2 salários em 15 dos domicílios e superava 2 salários mínimos em apenas 3 domicílios.

Como se pode entrever, ainda que mantidas constantes como cor/raça e a região da

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Programa de transferência de renda direcionado a famílias em situação de pobreza e extrema pobreza. Este programa foi implementado em 2003 durante o primeiro mandato do Presidente Lula, centralizando inúmeros programas de distribuição de renda criados principalmente no governo anterior, entre eles: Bolsa Escola, Cartão Alimentação, Auxílio Gás e Bolsa Alimentação.

cidade, há uma pluralidade de realidades que atravessam as trajetórias dessas mulheres e com o decorrer da discussão nos permitirá conhecer um pouco mais da experiência concreta das mulheres negras chefes de família residentes em bairros urbanos e periféricos.

A análise do perfil apresentado, assim como das entrevistas realizadas, nos permite falar na existência de dois principais eixos que estruturam as trajetórias das mulheres que assumem a responsabilidade pela casa e pela família: a dimensão da posse da casa e a relação com o trabalho. A discussão acerca da trajetória de busca e/ou permanência no trabalho que as mulheres entrevistadas partilham conosco nos permitem aprofundar o que já era um tanto esperado acerca da relação com o trabalho, considerando-o como um dos principais eixos que estruturam não só as trajetórias das mulheres chefes, como sua própria identificação como alguém que “precisa levar a casa”, precisa assumir a família, tanto do ponto de vista do cuidado, como substancialmente, do ponto de vista material.

4.2 PRETERIDAS NO TRABALHO? TRAJETÓRIAS DAS MULHERES NEGRAS