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2. ANÁLISE DOS DADOS PRIMÁRIOS: PESQUISA SEMIESTRUTURADA

2.1 Perfil da população entrevistada

O perfil dos entrevistados indicou caracteres bastante específicos daquele grupo, embora haja consonâncias com os dados nacionais. À exceção do Entrevistado n. 13, todos os participantes integravam a Administração Pública, entre civis e militares, com preponderância no período noturno. A maioria já trabalhava quando do ingresso na autarquia federal e, com frequência, havia concluído curso de graduação com maior ou menor relação com a esfera jurídica.

Os dados do Fórum Nacional de Pró-reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (FONAPRACE, 2016), por sua vez, indicaram que a participação de funcionários públicos na composição dos graduandos com trabalho remunerado na região Sudeste é bem menos significativa, importando apenas 16,58% do corpo discente. Prevalece para os estudantes dessa área a categoria estágio (33,44%), seguida por trabalho com carteira assinada (26,35%).

Dada a vedação à sindicalização e ao exercício do direito de greve, aos militares foi aplicado formulário diferenciado, por meio do qual se questiona não a relação com a entidade representativa, mas os canais políticos existentes para suprir essa lacuna.

A faixa etária variou entre 23 e 37 anos, com predomínio no número de homens em relação às mulheres entre os pesquisados, com índices de 55% e 45%, respectivamente.

47 Também quanto à raça, percebeu-se idêntica margem entre alunos brancos e não-brancos. Todavia, quando associada à renda, concluiu-se que aqueles autodeclarados brancos, em sua quase totalidade (81,82%), auferem mais de quatro salários-mínimos per capita, enquanto entre pardos/morenos/pretos/negros esse percentual decresce sensivelmente (66,67%).

No âmbito nacional (FONAPRACE, 2016), a presença feminina na área de Ciências Sociais Aplicadas é significativamente maior que a masculina, constituindo 61% dos graduandos. A idade média dos alunos de Instituições de Ensino Superior federais é de 24,54 anos, portanto, bem abaixo daquela verificada entre a maioria dos entrevistados nesta pesquisa (superior a 30 anos em 68,43% do grupo amostral) e a faixa etária de ingresso predominante se concentra entre 18 e 24 anos (72,7%).

Quanto à raça, percebeu-se o crescimento nacional das categorias parda e negra, se analisados historicamente os dados levantados, o que foi associado às políticas públicas de democratização de acesso às vagas, em especial à introdução de cotas para minorias étnicas e raciais em diversas Universidades públicas. Ainda assim, os alunos autodeclarados brancos constituíam, em 2014, 45,67% do grupo discente, enquanto pardos e pretos representavam, conjuntamente, 47,57% dos estudantes.

As diferenças mais significativas em relação aos entrevistados para esta pesquisa relacionam-se à renda. A renda familiar per capita (2014) teve média de 1,26 salário mínimo. Na análise da renda familiar bruta, por sua vez, a FONAPRACE verificou o crescimento, entre 2010 e 2014, da proporção de estudantes sem renda familiar ou com renda de até 03 salários mínimos, representando 51% dos graduandos. Essa conclusão demonstra a fragilidade socioeconômica do corpo estudantil e o descompasso dos Poderes constituídos quanto a propostas que buscam restringir o ensino público gratuito no Ensino Superior.11

Outra questão relevante a destacar quanto aos rendimentos dos entrevistados diz respeito à natureza dos vínculos na relação de trabalho, de caráter estatutário e, por isso, orientados pela impessoalidade e transparência, inclusive no processo de seleção dos candidatos ao posto ofertado. Ali, em tese, não há interferência de outros fatores na apuração do desempenho em certame, considerando-se tão somente a pontuação dos interessados. Tudo indica que essa diferenciação precede o início da vida laboral e sobre ela age diretamente, remetendo às assimetrias quanto à qualidade de vida e ao acesso à educação entre esses

11 Apenas como exemplo, cita-se o Projeto de Lei n. 782/2015, apresentado pelo então senador Marcelo Crivella, que propõe o pagamento de anuidade de instituições públicas de ensino superior por estudantes cuja renda familiar seja superior a trinta salários mínimos. O PLS está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania aguardando designação de relator desde março de 2016.

48 grupos12.

Os dados nacionais subsidiam essa hipótese, ao relacionar as variáveis raça/cor e ensino médio. De acordo com o FONAPRACE (2014), a proporção dos que cursaram o ensino médio exclusivamente na rede pública é superior à média nacional entre pretos, pardos e indígenas, em 07 a 15 pontos percentuais. Por seu turno, a proporção dos graduandos que estudaram apenas na rede privada durante o ensino médio ultrapassa a média nacional entre brancos e amarelos. Outro fator de destaque consiste na modalidade de trabalho remunerado praticada pelos graduandos em relação à cor/raça. Ainda conforme o estudo retrocitado, o maior percentual de estudantes autodeclarados de cor amarela, parda e preta trabalha com carteira assinada, enquanto entre aqueles de raça branca e indígena, o trabalho remunerado decorre de estágios curriculares ou extracurriculares.

A carga horária assumida durante a graduação em atividade remunerada tem impacto direto na dedicação aos estudos e mesmo na continuidade da graduação. Conforme dados nacionais (FONAPRACE, 2014), entre os graduandos que dedicam até cinco horas semanais aos estudos extraclasse, 45,72% têm trabalho remunerado, enquanto isso, entre os graduandos que estudam até 25h por semana fora da sala de aula, 80% não trabalham, somados nesse percentual aqueles que estão e não estão à procura de inserção no mercado de trabalho. Embora não haja dados específicos quanto à jornada de quem tem trabalho remunerado, é de se esperar que os estudantes com estágio, cuja duração diária varia entre 04h e 06h, e aqueles com vínculo formal, cuja regra estabelece jornada de 8h diárias, têm (possibilidade de) dedicação inversamente proporcional – e esses dados podem ser facilmente associados a questões raciais e socioeconômicas.

Ainda quanto ao perfil dos entrevistados para este trabalho, prevaleceu a disposição em permanecer em sua atual função após a formação jurídica, vista majoritariamente como complemento ao exercício das atividades ora desenvolvidas. Aqueles que se manifestaram pelo interesse em outros cargos desejam permanecer estatutários, ligados à Administração Pública lato sensu.

Os dados coletados em 2014 pelo Fórum de Pró-Reitores também trataram do futuro dos estudantes, questionando-se o que pretendem fazer após a formatura. Para 72,72% dos graduandos, o interesse é em conciliar a atividade profissional e os estudos. Na prática,

12 Estudo lançado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), utilizando dados obtidos pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), ao analisar o período compreendido entre 2006 e 2013, constatou que jovens brancos, na faixa etária de 25-29 anos, apresentam 1,72 ano de estudo a mais que jovens pretos e pardos. A mesma pesquisa verificou que a diferença percentual entre brancos e negros com ensino superior se ampliou nesse período, chegando a 14 p.p. em 2013 (OIT, 2015).

49 todavia, a conciliação dessas atividades é bastante problemática.

É o que denota o quesito que aborda as dificuldades que interfiram significativamente na vida ou no contexto acadêmico, respondido positivamente por 86,09% dos graduandos em âmbito nacional. Entre as razões mais destacadas, estão as dificuldades financeiras (42,21%) e a carga excessiva de trabalho (17,45%). Outro dado pertinente consiste no índice de trancamento total de matrícula na graduação, próximo a 10%. Entre as causas apontadas pelos alunos, o trabalho foi citado por 24,13% dos graduandos como motivo para o trancamento. Na área de Ciências Sociais Aplicadas, em que se insere o curso de Direito, esse índice é ainda maior, alcançando 28,39% das respostas coletadas.

Embora nem todas as variáveis presentes no estudo nacional tenham correlatos nesta pesquisa de campo, elas permitem a comparação e a complementação de informações, de maneira a conferir um perfil mais acurado dos estudantes e evidenciar em que aspectos o universo amostral afastou-se daquele delineado pelo FONAPRACE em 2014.