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8 DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO VORAZ E IMPOSSIBILIDADE

8.1 Perpetuação do Desenvolvimento de Risco

Milton Santos, que é citado por Fernando Campos Scaff e por Patrícia Faga Iglesias Lemos, no trabalho intitulado Responsabilidade Civil Contemporânea,

“vivemos o meio técnico-científico-informacional, com o desenvolvimento científico e tecnológico na base da produção, da utilização e do funcionamento do espaço”

(2011, p. 85).

Da afirmação acima há o entendimento da presença de uma integralização do meio denominado técnico-científico-informacional com a sociedade. Onde a sociedade faz, cada vez mais, uso destes meios (técnico-científico-informacional) e dele possui maiores necessidades.

Há, portanto, a ocorrência de dois fatores de grande relevância nas últimas décadas referentes ao fato tecnológico-científico, quais sejam (SCAFF;

LEMOS, 2011, p.85):

1) Desenvolvimento Exponencial (DE);

2) Necessidade cada vez maior por novas tecnologias (NTEC);

Estes dois fatores significam que: as tecnologias avançam exponencialmente, e em mesma medida há o aumento das necessidades sociais por novas e diversificadas tecnologias.

Deste modo há que, o segundo fator (NTEC) fomenta o primeiro (DE) a um novo patamar, este primeiro fator por sua vez amplia o segundo ao chegar ao novo patamar ansiado, criando para a sociedade a expectativa de criação de um novo patamar, desta maneira é mantido esse ciclo de avanços.

Resulta da somatória destes dois fatores, um terceiro fator:

3) a ocorrência do desenvolvimento tecnológico de risco (DTR) Logo temos a fórmula 1:

Todavia, como é possível fazer este apontamento? O de que com o aumento das necessidades tecnológicas e das tecnologias há um desenvolvimento de risco.

É possível de se fazer o apontamento, visto o avanço técnico-científico acabar proporcionando desdobramentos de risco por produtos defeituosos e pela própria falta de normatização quanto a estes produtos inovadores, observa-se que são produtos inéditos e desconhecidos.

Como exemplo há a Europa, que percebeu a problemática acarretada pelo acelerado desenvolvimento, quando dos primeiros problemas e dos riscos oriundos das atividades inovadoras, e pela própria limitação inerente da ciência para conseguir prever todas as consequências que porventura podem advir destas atividades e produtos, conforme mencionado por Renato Neiva Carvalho (2011, p 43).

Ulrich Beck explica em seu trabalho intitulado, Risk society: towards a new modernity (Sociedade de risco: rumo a nova modernidade – tradução desse trabalho) e acaba por endossar o posicionamento, ao afirmar estar o desenvolvimento atual junto da necessidade tecnológica acarretando no aumento dos riscos, criando uma sociedade que está entrelaçada com a globalização, ao entender haver a ocorrência de uma sociedade ligada intimamente a um mercado consumidor global. A sociedade de produção global está coligada à ciência, esta última possui um exímio domínio da lógica da produção do risco, uma lógica que visa soluções globais, entendendo em resumo ser o risco como natural e inerente ao desenvolvimento tecnológico. Essa argumentação é feita por Ulrich Beck primeiramente, em 1986, visto abordar em seu trabalho o tema dos reflexos da modernização e a questão do risco e seus enlaces à sociedade. A argumentação feita nesse excelente trabalho pode ser relacionada ao entendimento de que, como anteriormente mencionado, vive-se em uma sociedade de produção técnico-científica de grandes avanços, fato do qual resulta ser a ciência jurídica incapaz de regulamentar todos os aspectos do massivo desenvolvimento industrial (BECK, 2005).

Ante ao exposto, retorna-se a premissa estabelecida no início deste trabalho, da falta de normatização há o aumento de um risco natural ao desenvolvimento, este último que se perpetua avançando vorazmente.

Resume-se a resposta da indagação feita4 ao fato de que, no desenvolvimento tecnológico há já a presença natural de riscos, tanto de produção como de inovação, dado a impossibilidade cientifica de prever todas as consequências possíveis dos mais variados fatores que possam ocorrer. Todavia,

4 Cita-se a indagação para entender o exposto: “como é possível fazer este apontamento? O de que com o aumento das necessidades tecnológicas e das tecnologias há um desenvolvimento de risco”.

dado ao advento de dar-se o desenvolvimento tecnológico em um ritmo voraz, tem-se, como será demonstrado, a presença de risco adquirido.

Desta forma, com o intuito de dirimir a problemática do risco do desenvolvimento tecnológico tido como inerente faz-se preciso legislar acerca da responsabilidade do produtor pelo produto defeituoso posto no mercado, para estabelecer as diretrizes da responsabilidade civil nesse aspecto tecnológico, como feito na Europa quando o Conselho da União Europeia aprovou a Diretiva 85/3745.

9 ESTUDO DOS RISCOS

Tem também o direito brasileiro seus meios de responsabilização ao risco, nas diversificadas vertentes deste, ou seja, o ordenamento jurídico brasileiro possui normatização, fato o qual diminui o risco do desenvolvimento tecnológico, isto quando por exemplo, o direito nacional cria normas de responsabilização para o exercício de atividades de risco, como a previsão no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil (BRASIL, 2002):

Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. (Grifo desse trabalho).

Neste artigo há a previsão da existência de determinadas atividades que geram risco, ou seja, há um estudo do risco, mas não necessariamente do risco do desenvolvimento, ou seja, em outras palavras traz o presente artigo uma previsão legal ao risco e impõe ainda uma responsabilidade civil objetiva a este, portanto, toda vez que houver um dano proveniente de atividades de risco deve seu prestador, o da atividade, independentemente de culpa, arcar com as despesas e indenizar os lesados pelos danos sofridos.

Para melhor compreensão do que o artigo supramencionado está a nortear precisa-se entender a mencionada Teoria do Risco do Desenvolvimento.

5 Diretiva 85/374/CEE do Conselho, de 25 de Julho de 1985. Diretiva relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros em matéria de responsabilidade decorrente dos produtos defeituosos, em outras palavras, estabelece o princípio de responsabilidade não culposa aplicável aos produtores europeus. Quando um produto apresentar um defeito que provocar danos a um consumidor, a responsabilidade do produtor pode ser exigida mesmo na ausência de negligência ou culpa da sua parte.

A Teoria do Risco do Desenvolvimento expõe que um produto novo quando posto no mercado pode causar um dano não esperado, por fato de defeito que sobre circunstâncias do conhecimento científico, no momento em que este produto foi posto no mercado consumidor, não era possível de prever.

Nas palavras de Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin a Teoria do Risco compreende o “defeito que, em face do estado da ciência e da técnica à época da colocação do produto ou serviço em circulação, era desconhecido ou imprevisível” (1991, p. 62).

Em síntese é a ocorrência de um risco oriundo de um fato de um produto novo que é desconhecido ao atual momento de desenvolvimento técnico-científico.

Deve-se salientar a importância do fator de se desconhecer o risco, ou melhor, o defeito do produto pelo fato específico do estágio do desenvolvimento científico, no momento em que foi posto à disponibilização o produto.

A relevância para tanto dá-se ao fator de que tendo a ocorrência da mencionada teoria, não haveria que se falar na responsabilização do desenvolvedor.

Nesse sentido a União Europeia editou a mencionada Diretiva 85/374, que em seu art. 7º, alínea “e”, como pode ser lida abaixo, expôs a possibilidade da exclusão da responsabilidade (COMUNIDADES EUROPEIAS, 1985, p. 10):

Art. 7º. O produtor não é responsável nos termos da presente directiva se prove:

e) Que o estado dos conhecimentos científicos e técnicos no momento da colocação em circulação do produto não permitiu detectar a existência de defeito,

Por ser uma diretiva nem todos os países adotaram como excludente plena, são exemplos de exclusão da responsabilidade Portugal e Itália, alguns adotaram como excludente parcial, como Alemanha e França, sendo exemplos de adoção da responsabilização total, Luxemburgo (POLICARPO, 2012).

Sob o presente escopo, ao haver o risco previsto no 927 o oposto a Teoria do Desenvolvimento do Risco (conforme mais afrente debateremos), onde no risco do 927, Código Civil ocorre quando o produto não segue as regras dos produtos e serviços postos no mercado, enquanto que na Teoria do Desenvolvimento do Risco tem-se a ocorrência de um fator, ou melhor, vício inesperado e imprevisto dado ao estado do desenvolvimento tecnológico.

Entende-se, nessa esteira que nosso ordenamento não adota o posicionamento de excluir a responsabilização a presente teoria em discussão.

Mas, deve ser feito um estudo detalhado dessa teoria como do parágrafo único do artigo 927, Código Civil para entender a posição adotada por nosso pátrio ordenamento e assim tecer as devidas críticas.

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