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2. LEITURA E ESCRITA: NOVOS PARADIGMAS

2.1 Leitura: perpectiva tradicional

2.1.2 Perspectiva sociointeracionista

A despeito das valiosas contribuições das pesquisas cognitivistas para o entendimento do processo de leitura, o que se observa mais recentemente, é uma concentração maior de investigações direcionadas à perspectiva sociointeracionista. O enfoque passa a ser não apenas no aluno e na aprendizagem (como determina a perspectiva cognitivista), mas, fundamentalmente, na interação entre professor / aluno(s), assim como entre aluno / aluno(s), que são, em última instância, os maiores responsáveis pelo sucesso ou insucesso na construção de significado do texto.

Nas abordagens psicolingüísticas e sociais da leitura, a linha teórica que se destaca é a que concebe o processo da leitura como uma forma de apropriação da experiência e do conhecimento humano. Perez e Garcia (2001) entendem que tal processo de apropriação é feito de modo dialógico, pois no contato com o texto, o leitor acessa novos conceitos, informações, concepções e representações de mundo. Por esse ponto de vista, a leitura torna- se o instrumento que proporcionará ao leitor essa interação com o texto e com a cultura letrada na qual está inserido. Essa interação facilita a participação social do sujeito leitor e amplia seu conhecimento de mundo.

Segundo Leffa (1999), é dentro desse parâmetro social que a leitura deixa de ser apenas uma atividade mental para se tornar essencialmente uma atividade interativa, onde a

presença e o papel do outro adquirem fundamental importância. Esse outro pode ser o autor do texto, o próprio texto, uma autoridade capaz de auxiliar o leitor em sua busca pela compreensão da leitura, como, por exemplo, o professor, ou um colega de sala de aula, capaz de trocar idéias com o leitor e, de forma colaborativa, chegar ao significado do texto.

O ato de ler, por conseguinte, anteriormente visto somente como uma atividade individual, reveste-se de uma interatividade que aproxima a leitura a um comportamento social, onde o significado não se encontra apenas no texto ou no leitor, mas nos processos de interação social em que a leitura se desenvolve. Ao interagirem, os leitores mudam e, com isso, a esfera social onde estão circunscritos também muda.

Se reduzirmos esse meio social à sala de aula, e destacarmos os fatores que constituem o processo de ensino-aprendizagem da leitura, esta terá de incluir quatro componentes básicos: o leitor (aprendiz), o texto, o professor e o contexto de sala de aula.

Ruddell e Unrau (1994) construíram um modelo sócio-construtivista de leitura, por meio do qual o ato de ler é entendido como um processo de construção de significados dentro de um contexto de sala de aula, no qual professor e aprendizes interagem ativamente na busca pelo sentido do texto. Nesse modelo, as crenças e os conhecimentos prévios do leitor e do professor constituem os fatores afetivos e cognitivos pré-exixtentes.

As condições afetivas englobam as opiniões, suposições e convicções que, por sua vez, determinam os fatores motivacionais, as atitudes em relação à leitura e ao conteúdo, as crenças e os valores socioculturais. Assim, uma condição afetiva favorável afetará positivamente o desempenho acadêmico de aprendizes e professor, enquanto que uma atitude negativa, por parte de aluno(s) e/ou professor, resultaria em uma queda no aproveitamento acadêmico e, conseqüentemente, no fracasso na construção do significado do texto.

As condições cognitivas envolvem, entre outras, a identificação e a classificação da informação, as hipóteses, a análise, a síntese, a organização textual, o reconhecimento das relações temporais e espaciais e as estruturas metacognitivas. Aqui, fatores como a atenção, a percepção e a memória apresentam-se como cruciais para a compreensão da leitura e facilitam a conscientização do leitor do modo como a informação se processa em sua mente.

Vale lembrar que essas condições afetivas e cognitivas estão em constante interação, ou seja, não agem separadamente, mas se inter-relacionam e interagem de forma interdependente. Assim, a motivação do leitor, seus valores e sua atitude para com o conteúdo da leitura exercem forte influência sobre a aquisição de novas idéias e conceitos, sobre o processamento textual e sobre o uso das estratégias metacognitivas.

O conhecimento a que Ruddell e Unrau (1994) referem-se e que muito influencia as condições cognitivas são divididos em três: declarativo, procedural e condicional. O conhecimento declarativo inclui o conhecimento do leitor dos fatos, eventos, conceitos e o próprio conhecimento lingüístico. As formas de conhecimento procedural englobam a capacidade do leitor de identificar as habilidades e estratégias necessárias para a aplicação de seu conhecimento. Por fim, o conhecimento condicional refere-se à consciência do leitor e ao uso de seu conhecimento, isto é, o conhecimento do “quando”, do “onde” e do “porquê” que gera as condições ideais para a aplicação de formas declarativas e procedurais de conhecimento. É o conhecimento condicional, portanto, o responsável pelo entendimento do contexto social onde ocorre a leitura, e do propósito que tem o leitor ao realizar o ato de ler. Esses três tipos de conhecimento são armazenados na memória do leitor em forma de esquemas.

Para uma compreensão bem sucedida dos textos em sala de aula, além dos fatores afetivos e cognitivos, é necessário também que o leitor (aprendiz) desenvolva uma competência pragmática que o habilite a fazer uso de padrões de interação social e de interação em sala de aula. Esses padrões incluem a forma e o conteúdo das mensagens, ou seja, o emissor, o receptor, a audiência e a mensagem.

Com base nesse modelo sociointeracionista, Pinto (2002), ressalta que o ideal seria que o aprendiz internalizasse os padrões interativos e aprendesse os valores e crenças socioculturais para adquirir uma competência comunicativa e interagir apropriada e significativamente em sala de aula. Para tanto, o aprendiz deve saber como responder aos textos, ao professor e à comunidade em sala de aula. São os momentos de discussões em sala de aula que podem proporcionar a interação do aprendiz com o texto, com o professor e com os colegas. Sob tais condições, serão ativadas as funções cognitivas e afetivas de aprendizes e professor. Além disso, é também durante a interação em sala de aula que as estruturas metacognitivas do aprendiz se fazem sobremaneira presentes, já que a representação mental do significado do texto, que está sendo construída na mente do aprendiz, vai requerer uma constante revisão que, por sua vez, estará sob o controle da metacognição.

O professor também passa por processo semelhante ao do aprendiz. A ele caberá a função de controlar a atenção durante o ensino, revisar as interações e o conteúdo discutido, guiar a reconstrução das inferências e a conclusão. Dito de outra maneira, é papel do professor a mediação da construção do significado do texto feita pelos aprendizes, no sentido de torná-los conscientes dos novos conhecimentos adquiridos.

O propósito do ensino-aprendizagem da leitura, por esse viés, passa a centrar-se na ação coletiva de aprendizes e professor, objetivando a transformação do pensamento em ação, e não mais na mera explicitação de respostas prontas e definitivas. Em outras palavras, o aprendiz deve estar livre para descobrir suas próprias respostas e, através de negociações com a comunidade em sala de aula, será, então, possível a construção do significado do texto. Tais negociações devem ser viabilizadas pela ação da linguagem, que, evidentemente, possui importância capital nas interações dialógicas entre os participantes. Ao final dessas negociações, toda comunidade deverá ter acesso a um conhecimento comum, o qual terá sido construído mediante um processo dialógico que envolve controle, negociação, compreensão e falhas na compreensão.

Ruddell e Unrau (1994) ressaltam que, nesse processo, os aprendizes trazem seus próprios significados para a interação em sala de aula; o professor traz sua compreensão da leitura e todos interagem com o texto para construir e reconstruir significados.