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Neste tópico serão colocadas algumas das explanações de PEREIRA e LA ROVERE (2007), que colocam como um cenário possível para o segundo período do Protocolo de Quito (pós-2012) um regime idêntico do primeiro período, entretanto com novas metas quantitativas para os países do Anexo I. Neste cenário haverá uma pressão para que os países em desenvolvimento acedam ao Anexo I quando algum limiar for ultrapassado. Ou, alternativamente, haverá uma pressão para que os países em desenvolvimento adotem metas de inflexão, ou seja, metas quantitativas de limitação não das emissões, mas da taxa de crescimento de suas emissões.

Por outro lado, é possível que um futuro regime tenha por base a adoção de determinadas políticas e medidas pelos países, como considerado no Mandato de Berlim, no lugar de metas quantitativas para as emissões nacionais, como o que ocorre no Protocolo de Quioto. Nesse cenário, é razoável supor que se esperaria que países em desenvolvimento, inclusive o Brasil, adotem pelo menos algumas dessas políticas e medidas.

Pode ser também que tenhamos no futuro mais de um regime. De fato, é o que está ocorrendo hoje, com Europa, Japão e Canadá no regime de Quioto, e

Estados Unidos com seu regime próprio, buscando cooptar parceiros para um sistema de “pledge and review” (promessa e revisão) ou, diriam alguns, um regime de “pledge and no review” (promessa sem revisão). Neste cenário, haveria que buscar uma forma de negociação entre os dois regimes, o que interessa ao Brasil, para permitir a aceitação mútua de créditos do tipo do MDL.

De qualquer forma, se for confirmada a tendência de buscar no futuro regime um aprofundamento das medidas de mitigação, é inevitável que se coloque a questão da repartição do ônus da mitigação entre os países. É difícil imaginar que se logre repetir o Mandato de Berlim com uma resolução do tipo – não haverá novos compromissos para países em desenvolvimento. Neste sentido, a presença da China – o segundo maior emissor mundial – no grupo de países em desenvolvimento nos é desfavorável porque a atenção sobre a China deverá arrastar também Índia e Brasil, além de outros.

A Convenção prevê que o esforço de mitigação nos países em desenvolvimento seja feito pela inflexão da curva de crescimento de suas emissões. A Convenção reconhece que as emissões per capita desses países devem crescer. Assim a mitigação consistiria em fazer com que as emissões crescessem mais lentamente. Além disso, a Convenção prevê que os países industrializados forneçam os recursos necessários para tal inflexão. O instrumento atual que operacionalizou esse dispositivo da Convenção é o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. No regime pós-Quioto se houver um desvio em relação ao regime de Quioto, convém que sejam buscadas as alternativas equivalentes apropriadas que garantam na prática, a transferência de recursos que no regime de Quioto são proporcionadas pelo MDL.

Num regime pós-Quioto, o ideal seria que toda a arquitetura do Protocolo de Quioto fosse mantida com a ratificação dos Estados Unidos, além da adoção de novas metas de limitação ou redução de emissões para os países industrializados, com a manutenção do MDL. Um aprofundamento das metas de redução dos países industrializados aumentaria e muito a demanda por certificados do MDL, o que traria muitos benefícios. A razão para tal é explicada a seguir.

Em valores aproximados, as emissões dos países industrializados são de 4,5 GtC/ano (bilhões de toneladas de carbono por ano). As emissões dos países em desenvolvimento são de 1,5 GtC/ano. Uma meta de redução de emissões para o conjunto dos países do Anexo I da Convenção de 10% corresponderia a 0,45 GtC/ano. Projetos de MDL correspondentes a 10% das emissões dos países não do Anexo I corresponderiam a somente 0,15 GtC/ano. Isso seria suficiente para caracterizar um mercado com excesso de demanda sobre a oferta. Nestas condições, a tendência do mercado seria a de elevar o preço dos certificados do MDL até um valor igual ao custo médio de mitigação nos países do Anexo I, menos os custos de transação, e menos um fator de risco. Ora, o custo marginal de mitigação é sabidamente crescente com a profundidade da redução de emissões. Portanto, metas aprofundadas de redução, 10% neste exemplo, tenderiam a resultar num valor dos certificados do MDL de mais de US$ 100 por tonelada de carbono, podendo com facilidade chegar a US$ 200.

Se o regime pós-Quioto for caracterizado pela predominância de políticas e medidas não obrigatórias desaparecerá a possibilidade de persistência do MDL.

Ou, alternativamente, poderia haver mecanismos fragmentados pelos quais países industrializados, individualmente poderiam decidir aceitar certificados de um MDL modificado. De certa forma, isso já está ocorrendo, por exemplo, com o regime da Bolsa de Chicago que não está vinculado ao Protocolo de Quioto.

Na atual fase de negociações, é natural que o Brasil busque coordenar suas posições de negociação com certos países em desenvolvimento, que necessariamente serão os mais procurados na busca do desenho de um regime pós-Quioto. Esses países são hoje a China, Índia e África do Sul, além do México e Coréia do Sul, estes dois últimos membros da OCDE. No plano regional, a crescente integração energética com certos países do Mercosul e arranjos com outros países sul-americanos no mesmo setor, dita a conveniência de estabelecimento de programas crescentemente integrados de mitigação. A peculiaridade do Brasil no que diz respeito à floresta amazônica, dita ainda a conveniência de nesse tema manter relacionamento com outros países florestais, sejam em desenvolvimento ou sejam industrializados.