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Perturbações de desenvolvimento sócio comunicacional

A PROBLEMÁTICA DA MULTIDEFICIÊNCIA: DA CONCETUALIZAÇÃO AO PAPEL DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

2.1.4. Perturbações de desenvolvimento sócio comunicacional

Como temos vindo a referir, as crianças com PDI demonstram dificuldades de elaboração intelectual da generalização, ou seja, na aplicação a novas situações de aquisições e comportamentos anteriormente experimentados. A esta dificuldade vem juntar-se os problemas na comunicação durante as interações sociais. Ora, estes dois aspetos são de capital importância no plano psicossocial, condicionando a concretização de uma real e efetiva inserção no meio escolar em particular e na sociedade em geral. Segundo o guia dos CRTIC do ME,

As tecnologias de apoio poderão ser um meio necessário para certos alunos acederem a um computador, ou conseguirem comunicar através de sistemas de símbolos, ou através de sintetizadores de fala, ou através de outros dispositivos que facilitem a sua participação na atividade escolar. (2012, p.12) É de notar que há uma discrepância significativa entre a idade mental e a cronológica, em resultado das C/J com NEE terem tempos de aprendizagem muito prolongados, o que se reflete diretamente na diminuição da capacidade de interação e integração sociais. Esta situação é ainda agravada pelo facto de estas crianças, serem perspetivadas, muitas vezes, apenas de acordo com a sua idade mental, sem ter tomada em conta a sua idade cronológica, pelo que são colocadas em grupos de aprendizagem fora da sua faixa etária. Isto acontece, apesar da literatura científica referir que é através da interação com os seus pares e da participação nas mesmas atividades, que as C/J com NEE aprendem os comportamentos, os valores e as atitudes apropriados à interação social esperada para a sua idade. A aprendizagem de competências sociais é, pois, fundamental para as crianças com deficiência, com

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vista à sua inclusão quer na comunidade escolar, quer na sociedade global.

Por isso, é tão importante o escrutínio dos critérios que presidem à referenciação de C/J com perturbações do desenvolvimento. Esta função é desempenhada atualmente pelos CRTIC que avaliam os alunos com NEE de caráter permanente, para definir as tecnologias de apoio adequadas. Mas esta referenciação tem por base uma caracterização dos alunos segundo um grau de PDI, a qual tem vindo a ser constantemente modificada em função das investigações e das diretivas nacionais e internacionais.

Em 1989, foi publicada pelo então INR (Instituto Nacional de Reabilitação) a CIDID - Classificação Internacional das Deficiências, Incapacidades e Desvantagens, que é a versão portuguesa da International Classification of Impairments, Disabilities

and Handicaps, conhecida pela sigla inglesa ICIDH, versão experimental publicada

em 1980 pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

Mais tarde, em 1993, a OMS deu início a um longo e aprofundado processo de revisão da ICIDH que contou com uma ampla participação internacional de diferentes países e entidades, grupos de trabalho, elevado número de especialistas e de organizações não-governamentais. A própria OMS realçou como particularmente significativos no desenvolvimento da CIF os contributos e a participação ativa das próprias pessoas com incapacidades e das suas organizações.

Em maio de 2001, na 54ª Assembleia Mundial de Saúde foi aprovado o novo sistema de classificação com a designação de International Classification of

Functioning, Disabilities and Health, conhecida abreviadamente na sigla inglesa

por ICF, visando uma utilização pelos diferentes países membros. Na sua versão oficial para a língua portuguesa, aprovada pela OMS, ela intitula-se CIF -

Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde, e representa

um passo decisivo na consolidação e operacionalização de um novo quadro concetual acerca da funcionalidade, da incapacidade humana e da saúde.

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Com a CIF ultrapassaram-se muitas das críticas dirigidas à anterior classificação ICIDH de 1980, nomeadamente a sua conotação com o "modelo médico" e o não ter acompanhado as evoluções conceptuais, científicas e sociais, relacionadas com as questões da deficiência e da incapacidade. Especificamente, as críticas mais frequentemente apontadas à ICIDH, residem no facto de:

Estabelecer uma relação causal e unidirecional entre: deficiência  incapacidade  desvantagem;

Centrar-se nas limitações "dentro" da pessoa e apenas nos aspetos

negativos;

Não contemplar o papel essencial dos fatores ambientais.

Com a CIF, pelo contrário, estabelece-se uma nova conceção de limitação intelectual e passa-se de uma classificação de "consequência das doenças" (versão de 1980) para uma classificação de "componentes da saúde" (CIF), mudança decisiva para mudar as representações sociais sobre a funcionalidade, a incapacidade humana e a saúde.

Contrariamente a outras classificações da OMS, destinadas a ser utilizadas apenas pelo setor da saúde, a CIF é uma classificação passível de ser utilizada em diferentes domínios setoriais, direta ou indiretamente relacionados com a funcionalidade e a incapacidade. A CIF não classifica as pessoas nem tem como objetivo o diagnóstico de doenças ou perturbações, mas faz a descrição da situação de cada pessoa dentro de uma gama de domínios, permitindo identificar o seu perfil de funcionalidade.

A CIF encontra-se ancorada no modelo biopsicossocial, o qual pressupõe uma abordagem sistémica, ecológica e interdisciplinar para a compreensão do funcionamento humano, permitindo descrever o nível de funcionalidade e incapacidade dos alunos, bem como identificar os fatores ambientais que constituem barreiras ou facilitadores à funcionalidade. Pode dizer-se, resumidamente, que a CIF

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representa um progresso, quer em relação aos modelos que se focalizam apenas em aspetos individuais e nas incapacidades (os chamados modelos biopsicológicos ou médico-psicológicos), quer em relação aos modelos sociais que colocam todo o foco no funcionamento das estruturas e instituições sociais.