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5. A componente artefactual

5.1. Cerâmicas

5.1.2. Pesos de tear

Os pesos de tear, contrariamente ao que se realizou para os recipientes cerâmicos, serão brevemente apresentados enquanto um todo, valorizando-se a apresentação das características de cada fase (anexo 4.22). Nesta opção pesa, principalmente, a dimensão do conjunto. Assim sendo, foram identificados 183 fragmentos de pesos de tear, onde apenas um exemplar se encontrava parcialmente fragmentado, referente à primeira fase. O restante conjunto corresponde na sua maioria a fragmentos mesiais (com percentagens sempre a cima dos 50% nas três fases), recuperando-se ainda vários fragmentos onde foi possível identificar entre uma e duas perfurações (contando com 43% na 1ª fase, 40% na segunda e 37% na 3ª). A nível morfológico foram seguidas as tipologias e terminologias previamente aplicadas aos contextos do Alentejo - placas e

0,0 10,0 20,0 30,0 40,0 50,0 60,0 70,0 80,0 90,0 100,0 Placas Crescentes %

Fase 1 - 51 Fase 2 - 45 Fase 3 - 87

68 crescentes, posteriormente subdivididos consoante as formas das secções (0- placa rectangular, 3- crescente de secção ovalada, 4- crescente de secção achatada, 5- crescente de secção circular).

A distribuição dos fragmentos nestas duas grandes formas é muito variada, ainda assim uma tendência geral é facilmente legível. Na 1ª fase a aproximação que se verifica entre os crescentes e as placas é vincada, ainda que os segundos contem com um ligeiro destaque. Por sua vez, a fase 2 e 3 ilustram claramente o processo de substituição dos elementos de tear de tipo placa, ganhando um esmagador destaque os elementos de tipo crescente. Novamente, menciona- se a tipologia dos contextos, que pode deturpar estes valores, no entanto, esta realidade tem vindo a ser confirmada, ainda que não seja uma questão taxativa. Verifica-se, também uma coexistência entre ambos os tipos de pesos de tear, como evidenciado para São Pedro (Costeira, 2010), Mercador e Porto Torrão (Valera e Filipa, 2004), também nos sítios localizados na Serra d’Ossa (Calado, 2001) e Porto das Carretas (Soares, 2013). Por sua vez, o comportamento destas formas em relação às suas tipologias, não permite uma individualização clara, sendo correspondente nas três fases. O único ponto divergente acontece, em todas as fases, nos crescentes de secção circular (na 1ª há um aumento, na 2ª uma manutenção e na 3ª uma diminuição da representatividade), ainda que não se verifiquem grandes alterações numéricas.

As questões tecnológicas não permitem delimitar alterações nos gestos e técnicas produtivas destes artefactos, identificando-se os mesmos padrões nas três fases, contrastando com os resultados identificados no caso dos recipientes, onde se verificou uma quebra entre a 2ª fase e a 3ª no fabrico. As pastas deste tipo de artefactos são semelhantes à dos recipientes, essencialmente compactas e de textura homogénea (percentagens acima dos 85% nas três fases para ambos os casos), com poucos elementos não plásticos de pequenas dimensões (entre os 60% e os 90% nas várias fases). A composição petrográfica das pastas é também ela igual à dos recipientes cerâmicos, apontando para a utilização das mesmas pastas no fabrico de ambas as categorias artefactuais. As superfícies encontram-se transversalmente em bom estado, sendo os elementos com sinais de erosão ou erosão intensa raros (15,3% na primeira fase e 21,8% na terceira), não tendo sido identificados elementos com indicadores de erosão nas fossas 44, 45 e 73 (fase 2). A geral continuidade entre as produções das três fases mantém-se também nos tratamentos de superfície, registando-se o alisamento das superfícies, exclusivo na fase 1 e dominante na 2ª e 3ª, e o recurso a engobe, identificado em 20% dos fragmentos da fase 2 e 16% da fase 3. Assim sendo, as pastas dos elementos de tear sugerem que estes artefactos eram produzidos com o mesmo cuidado identificado nos recipientes cerâmicos, com pastas de boa qualidade com poucos e pequenos elementos não plásticos, contrastando com os resultados obtidos, por exemplo, para o sítio de São Pedro (Costeira, 2010).

69 Uma das perguntas mais salientes para o conjunto dos pesos aqui estudados prende-se com a questão da funcionalidade destas peças. Este assunto deve ser considerado, uma vez que os dados apresentados, tendo sempre presente a dimensão do conjunto, apontam para uma alteração clara nas representatividades das diferentes morfologias de pesos de tear, entre a fase 1 e as restantes. Podem ser conjecturados cenários de substituição, como sugeridos para os sítios do Porto das Carretas (Silva e Soares, 2002; Soares, 2013) ou São Pedro (Costeira, 2010), que podem não reflectir as típicas alterações culturais associadas a estes objectos. Os pesos de tear têm servindo, em muitos trabalhos, como elementos que potenciam considerações identitárias e facilitam a compreensão de diferenças culturais e regionais, em especial pela oposição placa, que surge maioritariamente em contextos estremenhos e a Norte do país (Sousa, 2010, p. 341), e crescentes, bem patentes em contextos alentejanos. Isto significa que dois tipos de elementos de tear apresentariam diferentes aplicabilidades e objectivos, sendo tendencialmente relacionados com a exploração dos recursos secundários animais. As alterações estariam assim relacionadas com utilização/alterações nos diferentes tipos de teares teorizados - verticais (Diniz, 1993, p. 241), horizontais (Boaventura, 2001; Gomes, 2013) ou em “prancheta” (Cardoso, Carreira, 2003) – com a utilização de fibras diferentes ou ainda outro tipo de aplicação, que o registo arqueológico não permite aceder. Esta ultima ideia é igualmente aplicável à associação destes artefactos à tecelagem, carecendo de sustentação empírica – um dos factores a mencionar é a inexistência de desgaste na totalidade das perfurações identificadas, assim como nos fragmentos mesiais de crescentes. A esta constatação podemos também adicionar a questão decorativa que, ainda que surja essencialmente nos pesos de tipo placa, não tendo sido identificada no conjunto em estudo, pode contribuir para o avançar de outras linhas interpretativas sobre estes artefactos, podendo funcionar enquanto componentes ritualizados que agiriam sobre um processo produtivo específico (não totalmente definido), relacionando-se com a interferência humana nos processos de metamorfose dos elementos disponíveis, assim como com a ritualização de actividades transformativas, a conotação com um possível ciclo produtivo (Lopes, 2016) ou ainda mecanismos supersticiosos (Valera, 1997; Diniz, 1994). Esta abordagem pode ser encontrada para sítios como o Castelo Velho de Freixo Numão, onde se identificou uma estrutura com ossos humanos em associação contextual com elementos de tear (Jorge et al., 1998/1999), sendo igualmente de sublinhar os próprios motivos decorativos, que normalmente são assumidos como simbólicos na Estremadura portuguesa (Paço, 1940). Pode reconhecer-se o mesmo processo de desconstrução para outros processos onde há modificações nos estados dos materiais, nomeadamente na obtenção do Sal (Delibes de Castro et al., 2016) e transformação metalúrgica (Valera e Basílio, no prelo). São então necessárias outras aproximações ao tema dos “pesos de tear”, sustentadas por diversos tipos de dados arqueológicos, não nos sendo possível avançar mais do que hipóteses, considerando-se o contexto disponível.

70 Em suma, os pesos apresentam comportamentos formais bastante díspares entre a 1ª e 2ª/3ª fases, que evidenciam essencialmente questões cronológicas, que não se encontram tão vincadas nos tipos de pesos utilizados – mantém-se, possivelmente, a mesma utilização dos crescentes, alterando-se as práticas associadas às placas. A alteração funcional não se verifica nas questões tecnológicas, indiciando uma manutenção das técnicas associadas ao fabrico destes artefactos, contrastando com a ruptura acentuada entre as duas primeiras fases e a terceira, atestada nos recipientes.