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Pintura cromossômica e o estudo dos cromossomos sexuais em vertebrados

No documento UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS (páginas 59-64)

Capítulo 3. DNAs repetitivos e diferenciação dos cromossomos sexuais em peixes Neotropicais

1.5 Pintura cromossômica e o estudo dos cromossomos sexuais em vertebrados

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A citogenética molecular tem proporcionado avanços significativos nos estudos da 2

evolução cromossômica, onde a pintura cromossômica se destaca como poderosa auxiliar para 3

o alcance deste objetivo. Esta tecnologia permite a uso de cromossomos totais (wcp- whole 4

chromosome painting) ou de parte dos cromossomos (pcp – partial chromosome painting), que

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podem ser obtidos por métodos de microdissecção cromossômica ou por citometria de fluxo. O 6

aprimoramento da técnica de hibridização “in situ” fluorescente (FISH) e das reações de DOP- 7

PCR (Telenius et al. 1992), permitiram o uso das sondas cromossômicas obtidas em 8

experimentos de FISH. É importante destacar que a pintura cromossômica vem sendo 9

crescentemente utilizada para se ampliar os conhecimentos sobre a evolução cariotípica e dos 10

cromossomos sexuais em diversos grupos biológicos (Grützner et al. 2004; Rens et al. 2004; 11

Ráb et al. 2008; Ventura et al. 2009; Nagamachi et al. 2010; Beklemisheva et al. 2011; Pokorná 12

et al. 2011, entre outros). De fato, trabalhos científicos em diferentes organismos, como 13

plantas, insetos e animais, vem empregando a pintura cromossômica para estas finalidades, 14

especialmente enfocando na evolução dos cromossomos sexuais (Figura 6). 15

No ornitorrinco, Ornithorhynchus anatinus, o emprego da pintura cromossômica a partir 16

do isolamento de cromossomos individuais revelou a presença de um sistema sexual atípico 17

(X1X2X3X4X5/Y1Y2Y3Y4Y5) presente nesta espécie, formando uma cadeia cromossômica na

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meiose masculina (Rens et al. 2004). Esta cadeia de cromossomos sexuais teria evoluído a 19

partir de um par de cromossomos sexuais homólogos ao par ZW presente nas aves e, durante o 20

início da evolução dos mamíferos, quatro pares autossômicos foram translocados para este 21

sistema, dando origem ao sistema sexual múltiplo presente nessa espécie (Grützner et al. 2004, 22

Graves, 2008). 23

© Marcelo de Bello Cioffi, Tese de Doutorado - 2011

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Figura 6: Experimentos de pintura cromossômica em diferentes espéceis de vertebrados. (a) 1

Sonda derivada do cromossomo X de Microtus cabrerae hibridizada com os cromossomos de 2

Arvicola sapidus; (b) Sonda derivada do cromossomo Z de Gallus gallus hibridizadas com os

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cromossomos do lagarto Eremias velox; (c) Sonda derivada do cromossomo Y de Coleonyx 4

elegans hibridizada com os cromossomos da mesma espécie; (d) Sonda derivada do

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cromossomo Z de Triportheus nematurus hibridizada com os cromossomos da mesma espécie. 6

As imagens são cortesia de (a) Antonio Sanchez (Universidad de Jaén, Espanha) e (b e c) de 7

Martina Pokorná (University of Prague, República Tcheca). 8

Nas aves, uma sonda do cromosomo Z de Gallus gallus domesticus pintou ambos os 9

cromossomos Z e W do emu, Dromaius novaehollandiae, mostrando uma conservação dos 10

cromossomos Z entre estas duas espécies, bem como a conservação entre as seqüências 11

presentes nos cromossomos Z e W nas aves (Shetty et al. 1999). Esta mesma sonda foi 12

hibridizada em 28 espécies de 17 famílias das principais linhagens de Squamata, crocodilos e 13

tartarugas. Em quase todas as espéceis o cromossomo Z se mostrou conservado apesar do 14

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grande tempo de divergência entre as linhagens de Sauropsida (répteis, aves e seus 1

antepassados fósseis, incluindo os dinossauros). Além disso, a sonda hibridizou com 2

autossomos em 7 espécies que possuem um sistema ZW. O cromossomo Z mostra-se portanto 3

conservado nesse grupo, ainda que não corresponda ao cromossomo sexual em algumas 4

espécies de Squamata (Pokorná et al. 2011). Adicionalmente, o cromossomo Y do lagarto 5

mexicano Coleonyx elegan foi isolado por citometria de fluxo e também utilizado em 6

experimentos de pintura cromossômica. A sonda derivada deste cromossomo hibridizou não 7

somente com o cromossomo Y metacêntrico, mas também com dois cromossomos 8

acrocêntricos, possibilitando concluir que essa espécie de lagarto possui um sistema múltiplo 9

de cromossomos sexuais X1X2Y, que evoluíu de forma independente na linhagem dos

10

Squamata (Pokorná et al. 2010). 11

Cromossomos sexuais em espécies de roedores do gênero Microtus apresentam algumas 12

características que os tornam um grupo muito interessante para estudar a composição e 13

evolução dos cromossomos sexuais. Duas espécies (M. cabrerae e M. agrestis) apresentam 14

cromossomos sexuais muitos grande (conhecido como "cromossomos sexuais gigantes”), 15

devido à presença de grandes blocos heterocromáticos. Por microdissecção cromossômica, 16

sondas foram geradas a partir do cromossomo X de ambas as espécies e hibridizadas em 17

cromossomos de várias espécies do gênero Microtus. Os resultados demonstraram que as 18

regiões eucromáticas dos cromossomos X são altamente conservadas em Microtus, como 19

ocorre em outros grupos de mamíferos. Além disso, a presença de sinais em autossomos de 20

diversas espécies sugere que durante a evolução cariotípica desse gênero ocorreram alguns 21

rearranjos entre cromossomos sexuais e autossomos (Marchal et al. 2004). 22

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Entretanto, existam poucos trabalhos envolvendo experimentos de pintura cromossômica 1

em peixes. No peixe Triportheus nematurus, com um sistema de cromossomos sexuais ZZ/ZW, 2

uma sonda específica para o cromossomo Z foi obtida por microdissecção cromossômica, 3

seguido por uma amplificação inespecífica via DOP-PCR (Diniz et al. 2008). Esta sonda foi 4

utilizada em experimentos de FISH em outras espécies do gênero, bem como em espécies de 5

outros gêneros de Characidae relacionados a Triportheus, com o intuito de investigar a 6

diferenciação do sistema de cromossomos sexuais. Foi observada uma completa homologia 7

entre os cromossomos Z de todas as espécies de Triportheus, enquanto que sinais de hibridação 8

não foram evidenciados nas espécies dos demais gêneros, reforçando a natureza conservada do 9

cromossomo Z, bem como a condição sinapomórfica do sistema ZZ/ZW para o gênero 10

Triportheus.

11

Diferentemente das aves e dos mamíferos, que apresentam cromossomos sexuais na base 12

de sua filogenia, os peixes evidenciam um surgimento independente de sistemas de 13

cromossomos sexuais ao longo do processo evolutivo, como observado em Salmonídeos. 14

Phillips et al. (2001), isolaram duas sondas específicas dos braços curtos (Yp) e dos braços 15

longos (Yq) do cromossomo Y de Salvelinus namaycush, obtidas por microdissecção. Estas 16

sondas foram hibridadas nos cromossomos de Oncorhynchus mykiss e O. tshawytscha e os 17

sinais de hibridação foram detectados em dois pares distintos de autossomos em cada espécie, 18

mostrando a ausência de homologia entre os cromossomos sexuais de Salvelinus e 19

Oncorhynchus. Em espécies do gênero Eigenmannia, foi testada a homologia de dois sistemas

20

XX/XY heteromórficos, presentes em duas populações simpátricas de E. virescens e 21

Eigenmannia sp. 2, utilizando experimentos de hibridação cruzada com sondas derivadas por

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microdissecção dos cromossomos X e Y (Henning et al. 2008). Enquanto que as sondas X e Y 23

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hibridizaram nos cromossomos sexuais espécie-específicos, nos testes cruzados de FISH ambas 1

as sondas hibridizaram exclusivamente em autossomos, sugerindo origens independentes dos 2

sistemas XY nas populações analisadas. 3

Acredita-se que a tilápia do Nilo, Oreochromis niloticuss, apresente um sistema XY de 4

cromossomos sexuais (o maior par de cromossomos), proposto pela análise do complexo 5

sinaptonêmico (Carrasco et al. 1999). Harvey et al. (2002), produziram sondas dos 6

cromossomos X e Y da tilápia do Nilo e mostraram que estas sondas são, de fato, específicas 7

para o maior par de cromossomos, existindo diferenças em relação às seqüências presentes nos 8

dois cromossomos desse par do cariótipo. 9

Assim sendo, o emprego da pintura cromossômica vem fornecendo importantes 10

contribuições para o conhecimento do genoma de diversos grupos de peixes, particularmente 11

no que se refere à origem, diferenciação e organização dos cromossomos sexuais. Justificam- 12

se, assim, os esforços para que essa metodologia possa ser mais amplamente utilizada, com a 13

perspectiva de significativos avanços no tocante à diferenciação e evolução dos sistemas de 14

cromossomos sexuais nas espécies de nossa ictiofauna. 15

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