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PJE -JT e a nova realidade da gestão dos autos judiciais

No documento DIREITO À MEMÓRIA E À VERDADE (páginas 63-67)

Um grande esforço de estruturação normativa precedeu a efetiva implantação do PJe-JT. A Lei nº 11.419 é o marco da informatização do processo no Brasil, no entanto apenas em 2010 a JT começou a se organizar em torno da implantação efetiva de um software de processamento de autos digitais. Em 2010, o CNJ, o TST e o CSJT celebraram acordo de cooperação técnica10 com o objetivo inserir a JT no projeto de construção de um sistema único de tramitação de autos.

10BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Termo de Acordo de Cooperação Técnica nº 51/2010. Disponível em: http://www.csjt. jus.br/c/document_library/get_file?uuid=31bc9b7b-4e7b-47ef-8ea8-4fa0347b41ee&groupId=955023. Acesso em: 02/09/2013.

Houve outros termos de cooperação e atos organizatórios dos grupos de trabalho e de questões operacionais do sistema. Porém, em março de 2012 é que se publicou a Resolução n° 94 instituindo efetivamente o Sistema de Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho (PJe-JT). O art. 1° da Resolução dispôs que:

A tramitação do processo judicial no âmbito da Justiça do Trabalho, a prática de atos processuais e sua representação por meio eletrônico, nos termos da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006, serão realizadas exclusivamente por intermédio do Sistema Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho - PJe-JT regulamentado por esta Resolução.

A tabela 1 indica também as datas de implantação do PJe em cada TRT. Segundo dados do CSJT, considerando apenas o segundo grau de jurisdição, o PJe-JT armazena atualmente mais de 635 mil autos digitais e é utilizado por 28 mil servidores e 186 mil advogados. A partir de uma rápida pesquisa na web é possível perceber que o PJe-JT ainda divide opiniões, sendo bastante criticado principalmente por advogados, em razão de problemas relacionados à lentidão e, muitas vezes, indisponibilidade do sistema, situação que mereceu considerações até mesmo do Ministro Presidente do TST e do CSJT11.

Na tentativa de compreender melhor as perspectivas de preservação dos autos digitais armazenados no PJe-JT, encaminhou-se a todos os TRT, via e-mail, um questionário endereçados aos gestores dos memoriais contendo cinco questões fechadas, solicitando informações sobre particularidades relacionadas tanto ao software PJe, quanto aos tipos de pesquisa que têm incidido sobre os autos. Sendo um questionário com questões fechadas, estas foram respondidas apenas em termos de SIM ou NÃO e resultaram na tabela 2:

PERGUNTAS TRT 1 TRT 2 TRT 12 TRT 15 TRT 20 TRT 24

1. No âmbito do TRT, há casos de solicitação de acesso a processos históricos FÍSICOS para realização de pesquisas científicas?

SIM SIM SIM SIM SIM SIM

2. No âmbito do TRT, há casos de solicitação de acesso a processos históricos ELETRÔNICOS para realização de pesquisas científicas?

NÃO NÃO NÃO NÃO NÃO NÃO

3. O TRT conta com planejamento específico para preservação de processos eletrônicos históricos, armazenados no sistema PJe-JT?

NÃO SIM NÃO NÃO NÃO NÃO

11A nota de esclarecimento publicada em 10 de janeiro de 2013 está disponível no site do TST no link: http://www.tst.jus.br/en/ pmnoticias/-/asset_publisher/89Dk/content/id/3436039.

PERGUNTAS TRT 1 TRT 2 TRT 12 TRT 15 TRT 20 TRT 24

4. O ambiente PJe-JT é adequado para o acesso de pesquisadores que buscam utilizar processos como fontes de pesquisa?

NÃO NÃO NÃO NÃO SIM NÃO

5. Existe previsão de desenvolvimento de sistemas específicos para preservação e acesso aos processos eletrônicos históricos produzidos no ambiente PJe-JT?

NÃO NÃO NÃO NÃO NÃO NÃO

Tabela 2: Perspectivas de preservação dos autos digitais do PJe-JT na visão de gestores dos memoriais.

Fonte: Elaboração própria.

Dos 24 TRT, 6 responderam à pesquisa. Desses, todos afirmaram receber solicitações de pesquisas relacionadas a processos judiciais históricos em suporte papel, ou seja, os produzidos e armazenados antes do início de funcionamento do PJe-JT. Já no tocante a processos exclusivamente eletrônicos, os TRT confirmaram que esse tipo de pesquisa ainda não é algo comum. Fato que provavelmente decorre do pouco tempo de funcionamento do PJe-JT, como se verifica na tabela 1, o software foi instalado nos TRT ao longo de 2012, portanto bem recente. Dessa forma, os processos constantes nesse sistema ainda estão em fase corrente, ou intermediária, com forte potencial de uso nas atividades próprias de prestação jurisdicional.

Mas, obviamente, se hoje os processos físicos de 30, 40 anos atrás são pesquisados, daqui a alguns anos esses primeiros processos eletrônicos (determinantes para compreensão das relações trabalhistas no início do século XXI) também sofrerão demandas de pesquisa. Essa constatação deve impulsionar não só estudos mais completos acerca da natureza dos autos judiciais digitais, mas também ações práticas por parte do Poder Público no sentido de implantar uma lógica de gestão documental no PJe-JT. Para os arquivos digitais, a falta de um planejamento bem estruturado de gestão e preservação pode ter efeitos tão ou mais danosos que os da controversa Lei n° 7627 de 1987.

Porém, como se observa nas respostas à questão n° 3, esse tipo de planejamento visando à preservação de autos considerados históricos ainda não existe na maioria dos TRT que responderam. A preocupação primeira do software PJe-JT (assim como a de tantos outros sistemas análogos do Poder Judiciário) é prover celeridade à tramitação processual, através da visualização dos autos por meio da tela do computador, automatização de procedimentos e compartilhamento do processo em rede. Essa celeridade impacta positivamente no andamento das ações judiciais, na resolução dos conflitos trabalhistas e, em última instância, faz o Judiciário corresponder melhor às inúmeras expectativas sociais em relação à sua atuação.

Assim, os esforços e investimentos no PJe-JT parecem estar concentrados na melhora das funções relativas ao processamento da ação judicial, pois a necessidade que se apresenta ao Judiciário é o julgamento de um número de processos cada vez maior, no menor tempo possível, para atender a demandas sociais prementes. Ou seja, nesse momento, a preocupação com a preservação dos autos para fins de pesquisa é incidental. O que não quer dizer que esse aspecto deva ser menosprezado dentro do plano geral de desenvolvimento do software.

A questão da gestão documental deve ganhar bastante espaço nos próximos anos. Com milhões de processos sendo iniciados a cada ano, a massa documental digital cresce

vertiginosamente comprometendo o funcionamento dos sistemas. Ironicamente, um raciocínio antigo novamente toma corpo: é impraticável preservar todos os processos dentro dos sistemas, mas também é impossível eliminar todos. Reflexões e esforços práticos decorrentes do ferramental teórico e metodológico da Arquivologia, conjugado com os avanços da tecnologia da informação e da ciência da informação, podem contribuir para uma resolução satisfatória desse dilema.

As respostas às questões n° 4 e 5 merecem uma análise conjunta. A grande maioria dos TRT que responderam à pesquisa considera o ambiente PJe-JT inadequado para acesso dos pesquisadores. Uma percepção que faz muito sentido, já que está claro que o software direciona-se basicamente à criação de rotinas que promovam um julgamento mais célere das ações judiciais. Admitir a dificuldade de implantar rotinas de gestão documental nesses sistemas significa também direcionar o pensamento em busca de medidas alternativas para solução do problema.

Uma proposta que tem ganhado espaço nesse debate é a de criação de softwares específicos para os quais seriam migrados os autos considerados de caráter permanente. Esses sistemas estão longe de ser uma realidade, como comprovam as respostas dos TRT à pergunta nº 4. No entanto, a ideia não parece ruim; esses sistemas seriam uma alternativa plausível, se desenvolvidos desde o início conforme as disposições do Modelo de Requisitos para Sistemas Informatizados de Gestão de Processos e Documentos do Judiciário brasileiro (MoReq-Jus).

A Tabela de Temporalidade12 da área fim do Poder Judiciário foi produzida por um grupo de trabalho do Programa Nacional de Gestão Documental e Memória do Poder Judiciário (Proname) e instituída pelo CNJ por meio da Recomendação n° 37. Essa tabela estabelece temporalidades para classes processuais, na tabela de número 1 e para assuntos (temas) tratados nos processos na tabela de número 2. Assim, os prazos das duas tabelas devem ser somados.

A tabela 1 prevê 76 classes processuais, dessas 61 (80,2%) devem ser guardadas por apenas 5 anos após o arquivamento e 15 (19,8%) devem ser preservadas em caráter permanente. Já a tabela 2 apresenta 129 temas, dos quais 122 (94,5%) são de guarda por 5 anos, 2 (1,5%) são de guarda por 10 anos e 5 (4%) são de guarda permanente13. Cabe salientar que esses critérios foram elaborados no âmbito do Proname por grupos de trabalho nos quais todos os tribunais do país tiveram representação.

É possível afirmar que, com um estudo estatístico consistente acerca da média de autos digitais criados a cada ano e com análise desses percentuais de autos a serem preservados, é possível projetar a dimensão e os requisitos necessários a um sistema específico para preservação de autos de caráter permanente. No entanto, o perfeito funcionamento dessa proposta dependeria muito de que o atual PJe-JT possibilitasse no mínimo a realização da classificação do processo ainda em sua fase corrente. Pois seria inviável deixar o trabalho de classificar milhares de processos apenas para o setor gestor do software de armazenamento permanente, no caso provavelmente as unidades de gestão documental, ou os memoriais.

Também seria necessário que o PJe-JT, com base na classificação efetuada durante o trâmite ainda em fase corrente, pudesse gerar relatórios constando os processos que deveriam ser preservados permanentemente. Isso permitiria à unidade gestora programar o recolhimento/migração dos autos para o repositório específico. Essa é uma proposta ainda sem precedentes em termos tecnológicos no Brasil; no entanto, é um ponto de partida que pode ser mais bem desenvolvido.

12Instrumento de gestão arquivística que define os prazos de guarda e a destinação (eliminação ou guarda permanente) dos documentos de uma determinada instituição. As tabelas do poder judiciário podem ser acessadas em: http://www.cnj.jus.br/sgt/ relatorio.php

No documento DIREITO À MEMÓRIA E À VERDADE (páginas 63-67)