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PLANEJAMENTO E GESTÃO DE PROJETOS NO BRASIL

2. UM ESTUDO SOBRE O TRANSPORTE SUBTERRÂNEO

2.3 PLANEJAMENTO E GESTÃO DE PROJETOS NO BRASIL

Um bom planejamento de uma obra pode ser a diferença entre o sucesso e o fracasso da mesma. Essa etapa é extremamente importante, e deve ser realizada com muita cautela, para que se possam prever todos os problemas em potencial que podem ocorrer durante a construção. A necessidade de um bom planejamento é maior ainda quando a obra em questão for abaixo da superfície. Como já citado anteriormente, obras subterrâneas são extremamente dependentes da geologia local, e, por isso, exigem que uma vasta gama de ensaios seja realizada para que se possa levantar o modelo geológico-geotécnico com precisão. E, além disso, mesmo que todos os ensaios sejam realizados minunciosamente e em quantidade adequada, ainda sim não é possível garantir que não haverá condições geológicas diferentes na fase de construção.

De acordo com a Logística da Fundação Dom Cabral, acessado por meio da Revista Exame (2016b), a fase de planejamento no Japão consome 40% do tempo total previsto para a obra, enquanto que, na Alemanha, esse valor sobe para 50%. Já no Brasil, apenas 15% do tempo é gasto com as etapas iniciais. Na maioria das vezes a obra é licitada sem que se tenha uma real noção das suas proporções, custos e detalhamento, e o empreiteiro descobre ao longo da construção os problemas que deveriam ter sido previstos, e, consequentemente, evitados, antes do início das obras. Esse desleixo durante a realização do projeto gera atrasos, aumento do custo total da obra e, em alguns casos, chegam a prejudicar a utilização da mesma. Em Natal, por exemplo, o porto foi reformado, mas navios das principais operadoras de cruzeiros não podem atracar nele, pois existe uma ponte no trajeto que não possui altura suficiente para a passagem dessas embarcações.

Uma explicação para essa pressa para o início da construção é a falta de maturidade da democracia brasileira. O governante que aprova uma obra quer que ela seja finalizada ainda no seu mandato, para que todo o prestígio da inauguração da mesma possa ir para ele, gerando, assim, maior capital político. A cada troca de poderes há uma troca dos projetos que serão priorizados, assim como das pessoas que irão realizá-los. Não existe ainda no governo brasileiro a visão de que vale a pena gastar um tempo maior planejando para que se tenha uma construção mais otimizada, sem maiores imprevistos, dentro do prazo e, principalmente, dentro dos custos previstos. A necessidade do fim da obra dentro dos quatros anos de mandato é maior, gerando, assim, obras mal feitas, com alta necessidade de manutenção em curto prazo ou, pior ainda, obras inacabadas.

20 Outro problema no Brasil que atrapalha as obras públicas é a forma como todo o processo licitatório é realizado. Primeiramente, há o conceito errôneo de que o projeto básico, pelo qual a obra é licitada, deve ser básico; um melhor nome para ele seria projeto de base. O artigo IX da lei 8666 define projeto básico como "conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra [...], elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento, e que possibilite a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução...". Em outras palavras, não há a necessidade dele conter todos os detalhamentos e pormenores da obra, mas nele devem estar descritos sim todos os componentes do projeto, de forma que seja possível programar o plano de construção e estimar o custo total de uma forma precisa. Hoje os projetos básicos são realmente básicos, sem planejamento prévio devido, o que faz com que haja imprevistos durante a construção e, consequentemente, quantidades exorbitantes de aditivos.

Em segundo lugar, tem-se a divisão de grandes projetos em lotes, divididos entre diferentes construtoras. Isso não seria um problema se o governo fosse capaz de gerir todos eles de forma eficiente. Em vários casos a obra tem que ser interrompida porque uma das etapas não foi concluída, o que gera uma reação em cadeia e atrapalha o andamento de todas as outras.

Um grande exemplo de obra mal planejada e mal gerida no Brasil hoje é a Ferrovia Transnordestina. O projeto previa uma ferrovia de 1753 km de extensão cruzando o sertão nordestino, com capacidade de carga de 30 milhões de toneladas por ano e com uma geração de meio milhão de empregos. Em 2016 a obra completa 10 anos, ou seja, 7 anos de atraso, e sem previsão para o seu término. O seu orçamento inicial de R$ 4,5 bilhões já chegou aos R$

11,2 bilhões, e apenas metade do seu trajeto foi concluído. Houve vários problemas de traçado, incluindo mais de 5000 desapropriações, trilhos que separavam cidades dos seus açudes e trajetos atravessando os centros urbanos das cidades. Contudo, o mais marcante de todos foi o trecho no qual havia uma igreja no meio do caminho: após dois anos de paralização das obras e a construção de uma nova igreja, a solução final foi ajustar a rota em 14 m para desviar do prédio.

Inicialmente a obra era administrada por uma siderúrgica, que contratou uma construtora para se responsabilizar pela obra. Entretanto, por conta de problemas de repasse do dinheiro do governo para empreiteiras envolvidas, houve atrasos, paralizações e processos

21 na justiça, culminando na saída da construtora (apenas o processo da saída da construtora paralisou as obras por 1 ano). A solução encontrada pela siderúrgica foi lotear e distribuir entre várias empresas, mas a falta de gerenciamento e de repasse do dinheiro continuaram atrapalhando o andamento da obra, e resultaram em duas dessas empresas pedindo recuperação judicial (Exame, 2016c).

Hoje o contrato está sendo rediscutido de forma a minimizar os danos, mas os estragos causados pela falta de planejamento e pela má gestão já estão feitos. Quantidades exorbitantes de dinheiro público já foram gastas, vários processos ainda correm na justiça e sem uma data de inauguração em um futuro próximo. Após tantas experiências negativas, têm-se a lição:

para que uma obra seja bem sucedida, é essencial que as fases inicias de estudo prévio e planejamento sejam priorizadas.

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3. OBRAS SUBTERRÂNEAS: PLANEJAMENTO E

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