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Capítulo II – A Polícia Municipal em Portugal

2.4. A PM até à IV Revisão Constitucional

Diz-nos Valente (2019) que “a génese das polícias municipais não emerge no Séc. XX, pois a origem da própria polícia em um enquadramento histórico-geográfico prende-se com a sua visualização local e/ou municipal” (p. 85).

A primeira Constituição portuguesa6 destacou o poder local através do Título VI, denominado “Do Governo Administrativo e Económico”, prevendo a criação de Câmaras (art.º 219.º, Constituição de 1822), as quais detinham atribuições em matérias de segurança municipal (art.º 223.º, Constituição de 1822), e cujo presidente seria o Vereador eleito com mais votos (art.º 220.º, Constituição de 1822).

Após a divisão administrativa do país através da Carta de Lei de 25 de abril de 1835, e respetiva organização, pelo Decreto de 18 de julho de 1835, foi criado em cada concelho um administrador, junto do qual funcionava a CM. As suas atribuições, no que diz respeito à segurança municipal, incluíam a regulamentação da atividade da polícia no interior do concelho e o seu bom regimento (art.º 23.º do Decreto de 18 de julho de 1835).

Com a publicação do primeiro Código Administrativo, aprovado pelo DL n.º 27.424, de 31 de dezembro de 1836, foi estabelecido que, as CM quando julgassem necessário, criavam uma Guarda Municipal, incumbida do serviço de Polícia e da segurança do Concelho (art.º 91.º do DL n.º 27.424, de 31 de dezembro de 1836).

Na reforma administrativa introduzida pela Lei de 20 de outubro de 1840, a autoridade do administrador do concelho é reforçada. Esta reforma vai caracterizar o segundo Código Administrativo, segundo o qual a administração municipal continua na CM e compete ao Presidente da Câmara, de acordo com o art.º 120.º, a elaboração de posturas e regulamentos que enformam a atuação da PM.

Com a publicação da Carta de Lei de 26 de junho de 1867, Lei de Administração Civil, passa a ser competência do governador do concelho, de acordo com o n.º 9 do art.º 195.º, “dirigir a Polícia do concelho, dando todas as providencias (…) que julgar necessárias para segurança das pessoas e da propriedade e manutenção da ordem pública”.

A Carta de Lei de 2 de julho de 1867, a Lei de Polícia Civil vem determinar a criação de corpos de Polícia Civil em Lisboa e Porto (Lapa, 1964), e guardas campestres em todos os concelhos, à exceção de Lisboa, nomeados pela CM, conforme o art.º 33.º.

Estes guardas assumiam “o carácter de agentes de polícia civil, e (…) da força publica” (art.º 36.º, Carta de Lei de 2 de julho de 1867), cujas competências consistiam no auxílio das autoridades administrativas e policiais (Castro, 2003).

Através da entrada em vigor dos Códigos Administrativos de 1878, 1886 e 18967, foi alargada a participação dos cidadãos na administração local e o Presidente da Câmara constituía-se como Autoridade Policial do Concelho encarregado dos assuntos de polícia.

Com a reformulação da organização, atividade, atribuições e competência dos corpos administrativos através da Lei n.º 88, de 7 de agosto de 1913, torna-se responsabilidade das CM a criação e o funcionamento de uma polícia urbana e rural e as suas respetivas posturas e regulamentos, de acordo com os artigos 91.º e 97.º, respetivamente.

Em 1918, tem lugar a reforma dos serviços policiais, através do Decreto n.º 4:116, de 29 de abril. O art.º 1.º criou a Direção-Geral da Segurança Pública, na dependência direta do Ministro do Interior (Clemente, 1998), o qual exerceria o seu cargo por intermédio de várias repartições, umas das quais, a “Repartição da Polícia Municipal” conforme a alínea g) do art.º 2.º. A estes corpos de PM e aos seus agentes estavam destinadas as mesmas “atribuições dos corpos de polícia cívica e ainda a polícia rural” (art.º 84.º, do Decreto n.º 4:116, de 29 de abril de 1918).

Na vigência da Constituição de 1933, o DL n.º 27.424, de 31 de dezembro de 1936, aprovou o Código Administrativo de 1936, concedendo poderes de polícia às CM. Estas, conforme o n.º 6 do art.º 44.º e o n.º 13 do art.º 50.º, podiam deliberar “sobre a criação e sustentação de uma Polícia Municipal”, estando previstos em todos os Concelhos, serviços municipais e de polícia, conforme o art.º 58.º.

Com a publicação do Código Administrativo de 1940, através do DL n.º 31.095, de 31 de dezembro de 1940, foi permitido que as Câmaras instituíssem serviços de PM constituídos por guardas e graduados requisitados à PSP, zeladores ou guardas campestres, “a fim de fiscalizar o cumprimento das posturas e regulamentos policiais e coadjuvar a autoridade policial do concelho no exercício das suas funções”, conforme o n.º 2 do art.º 163.º.

Em 1953, com a reorganização da PSP, por via do DL n.º 39 497, de 31 de dezembro, os corpos privativos da PM para Lisboa e Porto, a cargo das respetivas CM, são constituídos por polícias da PSP, os quais não perderiam o respetivo vínculo, continuando obrigados à disciplina e restantes obrigações da PSP, conforme o art.º 54.º.

7 Aprovados, respetivamente, pela Carta de Lei de 6 de maio de 1878, Decreto de 17 de julho de 1886 e Lei de 4 de maio de 1896.

Até à entrada em vigor da Constituição de 19768, a PM não detinha verdadeiros poderes de segurança, uma vez que estes corpos dependiam, do poder do Estado central ou, porque os órgãos municipais aos quais estavam subordinados “não desempenhavam funções com verdadeira autonomia (…) não tinham autogoverno nem autodeterminação” (Castro, 2003, p. 153).

Na vigência da atual Constituição, a Assembleia da República (AR) aprovou a Lei n.º 32/94, de 29 de agosto, disciplinando as atribuições competências e limites dos serviços municipais de polícia. De acordo com o n.º 1 e 2 do art.º 3.º, os Municípios podiam criar serviços especialmente vocacionados para o desempenho das suas atribuições em matéria de PA, através da respetiva AM, sob proposta da CM. As suas competências, traduziam-se na fiscalização dos regulamentos e posturas da autarquia local (Clemente, 2000), excluindo-se as atividades de segurança interna e as previstas nas leis orgânicas das FSS (Castro, 2003).

Só após a IV Revisão Constitucional9 foi consagrada a possibilidade de criação de PM, respeitando o princípio da reserva relativa de competência da AR10, através da inscrição

do n.º 3, no art.º 237.º da CRP11, permitindo-lhes o desempenho não só de meras atividades de PA, mas também de tarefas de garantia da tranquilidade pública e de proteção da comunidade (Castro, 2003).

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