• Nenhum resultado encontrado

2. A estética da recepção: a interação texto-leitor

2.5. Poesia na sala de aula

A discussão em torno do ensino de poesia em sala de aula é uma questão que envolve vários aspectos metodológicos. Nesse sentido, propor uma experiência de leitura literária aos discentes de Nível Médio, a partir da interação texto-leitor, é um desafio para

o docente, uma vez que pode exigir do professor um conhecimento acerca da teoria literária, de seu próprio repertório de leitura poética e de algumas reflexões metodológicas sobre o ensino de poesia no âmbito escolar.

No artigo Caminhos da abordagem do poema em sala de aula, Pinheiro (2008) expõe alguns percursos metodológicos para a experiência de leitura de poesia no âmbito escolar. Nesse caminhar, o estudioso discute que o desafio inicial do professor está calcado na sua própria formação como leitor. Com efeito, subtende-se que o docente da área de Letras é um leitor de poesia, que conhece minimamente os nossos poetas e algumas nuances da linguagem poética. A partir desse viés, o professor pode sugerir a leitura de um determinado poema e propor um fazer pedagógico que privilegie uma experiência estético-temática em sala de aula.

Em um segundo momento, Pinheiro (2008) faz uma reflexão em torno da formação metodológica do professor, evidenciando que o fazer pedagógico contribui, de maneira significativa, para a formação do aluno. Dessa forma, o docente é um sujeito que propõe, no âmbito escolar, a vivência e a experiência de leitura com a poesia.

Nesse sentido, o professor, de acordo com Rouxel (2012), é um sujeito leitor, que se apropria do seu repertório literário para sugerir algumas estratégias de leitura de poesia em sala de aula. A partir desta sensibilidade metodológica, o docente pode mediar à leitura dos poemas no âmbito escolar de maneira significativa, já que a experiência estética, a interação texto-leitor, a leitura em voz alta e a socialização das diversas interpretações dos alunos sejam evidenciadas no fazer pedagógico do educador.

Para que a metodologia seja inserida no contexto escolar, bem como as estratégias de leituras de poesia em sala de aula, seria necessário um olhar atento para as diversas necessidades dos alunos. Com efeito, a preocupação com o leitor escolar direciona o docente a sondar os horizontes de expectativa dos estudantes, assim como propor estratégias de mediação que insira o aluno à leitura literária.

Além da preocupação com o leitor escolar e de algumas questões metodológicas, vale ressaltar alguns dos problemas em torno da dificuldade de propor a leitura de poema lírico em classe.

Em Poesia na sala de aula, Pinheiro (2007)29 comenta que poema lírico não é contemplado no fazer pedagógico de modo mais consistente por alguns critérios, tais como: a inexperiência com leitura poética por parte do professor, dificuldade do docente de se apropriar de uma perspectiva metodológica para o ensino, problemas em lidar, em sala de aula, com as nuances estilísticas do poema (som, imagem e discurso) etc.

Rouxel (2012), em Aspectos metodológicos do ensino da literatura, ressalva que o professor é um sujeito leitor, que se apropria de seu repertório de leitura e de sua reflexão metodológica para elaborar, de forma contundente, uma mediação e uma experiência de leitura em sala de aula. Dessa maneira,

O professor é um sujeito leitor que tem sua própria leitura do texto. [...] Sua ética profissional o impede de expor, sem meditação, sua própria leitura: é preciso efetuar acomodações (no sentido óptico e fotográfico do termo) e antecipar as dificuldades dos alunos. É preciso também renunciar a algumas singularidades de sua leitura pessoal. De todo modo, diante de um público mais velho, não se exclui a possibilidade de compartilhar sua leitura, contudo, sem impô-la (ROUXEL, 2012, p.29).

Com efeito, o docente antecipa as inquietações e as dificuldades dos estudantes por meio de sua leitura literária. Desse modo, o professor poderá elaborar uma metodologia de ensino que favoreça a incursão do leitor escolar no texto, a fim de privilegiar os debates em torno de algumas questões temáticas ou de algumas especificidades do texto literário sala de aula.

29

Pinheiro (2007) faz algumas considerações em torno das dificuldades do docente de mediar à poesia em sala de aula a partir do contexto brasileiro, sugerindo, portanto, alguns percursos metodológicos; já Rouxel (2012) sugere alternativas metodológicas para o ensino de literatura em escolas francesas.

No que se concerne às especificidades do poema lírico, uma questão que sobressai é: quais são os elementos estéticos e estilísticos do poema lírico que poderiam ser explorados no trabalho do professor em sala de aula?

Dessa forma, estendemos a nossa reflexão em três instâncias: a) som; b) imagem; c) discurso poético. No que diz respeito à musicalidade do poema, Cohen (1974) analisa o som do texto poético a partir do nível sintático. Na perspectiva sintática, o estudioso se dispõe das figuras de linguagem que proporciona, ao poema, o efeito da musicalidade, como, por exemplo, as assonâncias, as aliterações e os paralelismos.

A partir desse viés, o professor poderia sugerir uma leitura silenciosa e, posteriormente, uma leitura oral30. Desse modo, o leitor escolar experimentaria o texto, as disposições rítmicas e melódicas do poema.

No que se refere às imagens poéticas, o desvio – que é, de acordo com Cohen (1974), uma das categorias de análise estilística – provoca, no leitor, um efeito de estranhamento31, já que oferece, ao sujeito, múltiplas leituras. Paz (1982) comenta que as disposições imagéticas disponibilizam, ao receptor, uma pluralidade de significados, configurando, portanto, uma perspectiva dialógica, uma vez que o leitor, por meio de sua percepção estética e de seu conhecimento mundo, preenche o sentido da imagem.

Desse modo, o professor poderia mediar algumas discussões em torno das imagens poéticas por meio de questionamentos de leitura, a fim de instigar os alunos a atribuir significados, ampliando, por sua vez, os horizontes dos estudantes em sala de aula.

Na perspectiva do discurso poético, Cohen (1974, p.158) comenta que a poesia nos revela conteúdos mentais por meio de uma ordem ou de uma expressão deslocada.

30

Algumas estratégias de leitura mencionadas nesta seção – tais como: leitura silenciosa, leitura oral, círculo de leitura e leitura compartilhada – serão discutidas e fundamentadas no terceiro capítulo.

31

Eagleton (2003) faz uma reflexão em torno do estranhamento, enfatizando que este efeito se dá a partir da desfamiliarização da linguagem. Dessa forma, o poema deforma a linguagem comum de diversas maneiras, através das intensas pressões dos elementos/artifícios literários (som, imagem, ritmo, sintaxe, métrica, discurso).

Com efeito, a figura do hipérbato – que é a inversão sintática – pode embotar a leitura literária, tornando o discurso opaco para o leitor.

Nesse sentido, o docente pode optar pela estratégia do círculo de leitura e da leitura compartilhada, a fim de contribuir e instigar os discentes a construir múltiplas interpretações do texto poético em sala de aula, levando em consideração que os alunos podem se apropriar de suas experiências de mundo para interagir com o poema.

No terceiro capítulo, abordamos a experiência com a poesia literária no âmbito escolar. Nesse contexto, dialogamos os dados obtidos da intervenção com o respaldo teórico elaborado no primeiro e no segundo capítulo, a fim de realizarmos uma leitura coerente em torno da recepção dos poemas de Alice Ruiz em sala de aula.

CAPÍTULO III