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POLÍTICAS EM CUIDADOS PALIATIVOS

No documento O processo de morrer no domicílio (páginas 72-77)

PARTE I – O PROCESSO DE MORRER NO DOMICÍLIO

5 POLÍTICAS EM CUIDADOS PALIATIVOS

“Acompanhar com competência e amor o doente em fase terminal constitui hoje um repto para a nossa sociedade”

Angelo Brusco (1999)

Os cuidados paliativos representam a tomada de consciência de que quando não é possível curar é fundamental cuidar. A filosofia dos cuidados paliativos, a sua essência, dirige-se mais para o doente que a doença, aceita a inevitabilidade da morte mas também melhora a vida, partindo de uma aliança entre pessoa em fim de vida e prestadores de cuidados, em que se preocupa mais com a reconciliação pessoal do que com a cura impossível da doença (Capelas e Neto, 2010).

Os cuidados paliativos como já referimos, orientam-se no sentido de aumentar a qualidade de vida na fase final da vida, e os objetivos terapêuticos são formulados de acordo com as necessidades da pessoa e a fase clínica paliativa em que se encontra. Desta forma, compreende-se que uma pessoa em fase agónica necessita de cuidados diferentes de uma pessoa em fim de vida com prognóstico de vida de meses ou anos. Genericamente, os cuidados paliativos podem incluir desde cuidados intensivos de conforto, alívio de sintomas, redução do impacto da doença na pessoa e família, restauração da autonomia, proteção do barulho e agitação quando a fadiga se intensifica, presença atenta e amiga quando o isolamento seria difícil de suportar e estima por parte da família, amigos e prestadores de cuidados.

Todos estes aspetos só serão possíveis de alcançar se atendermos a pessoa na sua totalidade, como ser único e irrepetível, e conjugando as capacidades interdisciplinares de uma equipa motivada e direcionada para a consecução do máximo conforto e bem- estar da pessoa em fim de vida.

São várias as modalidades através das quais os cuidados paliativos podem ser colocados em prática: unidades integradas em hospitais de agudos, unidades de cuidados paliativos e unidades de apoio domiciliário.

A Associação Europeia de Cuidados Paliativos propõe a estratificação dos tipos de cuidados em quatro níveis, que se distinguem entre si pela capacidade de responder a situações mais ou menos complexas e pela especialização e formação dos profissionais.

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As ações paliativas representam o nível básico de paliação, e insere-se neste âmbito a responsabilidade individual de cada profissional de disponibilizar e prestar cuidados humanizados, em qualquer tipo de recurso de saúde, sem recurso a equipas/estruturas diferenciadas e específicas de cuidados paliativos. Para que estas ações sejam uma realidade, é fundamental uma adequada formação dos profissionais no sentido de melhorar os conhecimentos, competências, mas acima de tudo as atitudes, pois são estas que influenciam a mudança. A Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos assim como outras organizações internacionais definem os conteúdos programáticos necessários para quem presta assistência na área dos cuidados paliativos (DGS, 2010). Os recursos que constem de uma equipa móvel básica, com formação diferenciada em cuidados paliativos e que podem prestar cuidados diretamente ou exercer funções de aconselhamento, são designados por Unidades de Cuidados Paliativos de Nível I. Estruturam-se habitualmente como equipas intrahospitalares ou domiciliárias de Suporte em Cuidados Paliativos.

Quando a equipa interdisciplinar é consideravelmente alargada e os cuidados prestados garantem uma cobertura efetiva de 24horas, seja ao nível domiciliário ou internamento, considera-se recurso de Nível II. Estruturam-se normalmente em Unidades de Cuidados Paliativos, com internamento próprio, podendo incluir atendimento em ambulatório e no domicílio.

Quando às características assistenciais e organizacionais dos recursos de nível II se associa programas regulares e estruturados de formação diferenciada ou avançada em Cuidados Paliativos e atividades de investigação, estes serão considerados de Nível III. Compete a estes últimos a abordagem das situações de elevada exigência e complexidade. São localizados preferencialmente em centros universitários (DGS,2010). Independentemente da tipologia de Unidade, existem características mínimas e recursos que todas as Unidades devem contemplar, e que foram divulgadas pela Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos nas suas recomendações para a Organização de Serviços em Cuidados Paliativos.

Todos estes recursos deverão estar devidamente articulados de forma a promover um continuum de cuidados, garantindo a obtenção de um elemento chave da qualidade dos serviços, que é a continuidade no tempo, na prestação e na adequação às necessidades das pessoas em fim de vida e suas famílias (Capelas e Neto, 2010).

A admissão das pessoas em fim de vida nas diversas estruturas ou níveis organizacionais deverá estar dependente não apenas da sua vontade ou da avaliação por parte do médico, mas também ter em conta o estado geral da pessoa e

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contextualizando as possibilidades existentes – ou seja, recursos da comunidade onde a pessoa está inserida, o acesso aos cuidados de saúde, as possibilidades económicas da pessoa e família, etc.

De facto, o ideal seria permitir a cada pessoa devidamente conhecedora da sua situação, que escolhesse o lugar onde preferiam viver os últimos dias, porém esta possibilidade verifica-se muito remota e pouco realista.

Em Portugal, os cuidados paliativos já iniciaram a sua trajetória e verifica-se a existência de alguma preocupação relativamente à pessoa em fim de vida. Em 2010, o Programa Nacional de Cuidados Paliativos emanado pela Direção Geral de Saúde veio alertar para a necessidade de ser entendido como elemento essencial dos cuidados de saúde, como uma necessidade em termos de saúde pública, como imperativo ético que promove os direitos fundamentais e, portanto, como obrigação social prioritária.

Em 2012, através da Lei de Bases dos Cuidados Paliativos, Lei n-º 52/2012 de 5 de setembro, o Estado Português dá um passo na direção de regulamentar estes cuidados e assume a sua responsabilidade em matéria de cuidados paliativos. É constituída a Rede Nacional de Cuidados Paliativos que coordenada as equipas existentes de cuidados paliativos, com vista a uma melhoria da qualidade.

As equipas que no nosso país se dedicam especificamente à prestação de cuidados a pessoas em fim de vida, são (APCP):

• Equipa de Cuidados Continuados do Centro de Saúde Odivelas;

• Unidade de Assistência Domiciliária do IPO de Lisboa Francisco Gentil, E.P.E.; • Unidade da Santa Casa da Misericórdia de Azeitão;

• Serviço de Cuidados Paliativos do IPO do Porto, E.P.E.;

• Serviço de Medicina Paliativa do Hospital do Fundão (Centro Hospitalar da Cova

da Beira, EPE);

• Unidade de Cuidados Paliativos S. Bento de Menni, IHSCJ, Casa de Saúde da

Idanha;

• Serviço de Cuidados Paliativos do IPO de Coimbra-FG, E.P.E.; • Unidade de Cuidados Paliativos do Hospital da Luz;

• Equipa Intrahospitalar de Suporte em Cuidados Paliativos do Hospital de Santa

Maria;

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• Equipa Intrahospitalar de Suporte em Cuidados Paliativos do Hospital de Elvas; • Unidade de Cuidados Paliativos do Hospital do Litoral Alentejano, EPE - Santiago

do Cacém;

• Unidade de Cuidados Paliativos da Rede (UCP-R) no IPO-Porto;

• Equipa Intra-Hospitalar de Suporte em Cuidados Paliativos do Centro Hospitalar

de Lisboa Zona Central (CHLC);

• Equipa Comunitária de Suporte em Cuidados Paliativos do Algarve; • Serviço de Cuidados Paliativos do Hospital de S. João;

• Equipa Intra-Hospitalar de Suporte em Cuidados Paliativos do IPOLFG, EPE; • Equipa Intra-Hospitalar de Suporte em Cuidados Paliativos do Hospital Reynaldo

dos Santos, V. F. de Xira;

• Equipa de Suporte em Cuidados Paliativos da Unidade Local de Saúde

Matosinhos;

• Equipa Comunitária de Suporte em Cuidados Paliativos Beja;

• Equipa Intra-Hospitalar de Cuidados Paliativos do H. G. S. António (Porto) ; • Unidade Domiciliaria de Cuidados Paliativos –Planalto Mirandês;

• Unidade de Cuidados Paliativos do Hospital Arcebispo João Crisóstomo –

Cantanhede.

Torna-se necessário e urgente seguir estes exemplos, criando mais unidades de cuidados paliativos em todo o país com respostas eficazes e humanas para as pessoas em fim de vida. De facto, é crescente o número de doentes incuráveis cuja fase final de vida é longa e que necessitam de resposta atempada.

No nosso país ainda é deficiente a articulação entre os dois níveis de cuidados, cuidados diferenciados prestados por hospitais e os cuidados de saúde primários, e o apoio domiciliário prestado por cada um individualmente ou por ambos de forma concertada, continua a ser insuficiente para as enormes carências verificadas na zona geográfica onde se realizou este estudo.

Como nos alerta Capelas e Neto (2010) ao nível dos cuidados primários preconiza-se que se promovam os cuidados domiciliários com acessibilidade e presença das equipas multiprofissionais; uma maior flexibilidade na organização do trabalho; protocolos com os recursos específicos de cuidados paliativos, com acessibilidade em tempo útil das pessoas que necessitem, especialmente situações de urgência; e incremento dos

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cuidados à família, numa perspetiva de prevenção de crises e de exaustão familiar, em que o plano de cuidados no luto é obrigatório.

Analisando estes pressupostos e avaliando os recursos disponíveis em cuidados paliativos, facilmente identificamos que na área geográfica do estudo muitas dificuldades e necessidades são nomeadas pelas pessoas em fim de vida e seus familiares cuidadores. O acompanhamento e o bem-estar da pessoa em fim de vida confina-se à presença e destreza da família, que se transforma a cada dia para conseguir corresponder às exigências do cuidar. Por isso, torna-se necessária uma mudança de atitudes nos profissionais de saúde, no sentido de valorizarmos primeiro cada pessoa individualmente, sermos capazes de encarar a morte com naturalidade, e colocarmo-nos no lugar do outro, oferecendo e disponibilizando as nossas capacidades para cuidar da pessoa que está a morrer. Decerto que estes sentir-se-ão menos infelizes e menos sós, o que ajudará a uma melhor aceitação da sua morte.

No documento O processo de morrer no domicílio (páginas 72-77)

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