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Esquema 2 – Impactos Locais do Turismo

1.2 POLÍTICAS PÚBLICAS DE TURISMO

1.2.2 POLÍTICAS PÚBLICAS DE TURISMO NA AMÉRICA LATINA

Assim como existe uma divisão internacional do trabalho, para Molina (2000), a partir da segunda metade do século XX, também se constitui uma divisão internacional do tempo livre, em que foram definidos os papéis para que certos países se transformem em países de ócio42 e outros, de trabalho. Nesse sentido, um grande número de países aptos para a prática do ócio e do tempo livre se localizam na periferia, como os latino-americanos que “são conduzidos por interesses internos e externos a converter-se em um terreno de jogo (no sentido pejorativo do termo) das potências” 43 (tradução nossa). Embora, nesses termos, não seja definido um

produto turístico, fundamentalmente, dirigido à exportação e à satisfação das necessidades de turistas residentes dos países centrais.

Segundo Molina e Rodríguez (2001), o turismo foi concebido pela superestrutura latino-americana como um fator de desenvolvimento, em virtude de seus possíveis efeitos econômicos. Além disso, também lhe foi atribuída uma relevante tarefa no esforço de integração nacional, mediante o mútuo conhecimento e identificação entre os nacionais e suas realidades.

Como modelo econômico, a indústria44 turística surgiu após a Segunda

Guerra Mundial como uma opção para diminuir as distâncias econômicas e sociais entre os países periféricos e centrais, principalmente, através da intervenção do Estado. À medida que esse modelo foi se expandindo, as companhias transnacionais, associadas com grupos intervencionistas locais, foram influenciando cada vez mais essas localidades com seu conteúdo ideológico, político, comercial e financeiro, de maneira que, o controle estatal foi diminuindo paulatinamente.

42Existem indivíduos que, além de suas obrigações habituais, estão capacitados e dispostos a realizar atividades que lhes permitam descansar além da reposição de suas forças para continuar produzindo ou que lhes permitam divertir-se, saindo da rotina, e desenvolver habilidades intelectuais ou manuais que favoreçam seu aperfeiçoamento. As pessoas que exercem este tipo de atividades (descanso, diversão e desenvolvimento pessoal) praticam o ócio. González Llaca (1975 apud MOLINA; RODRÍGUEZ, 2001)

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“son conducidos por intereses internos y externos a convertirse en terreno de juego (em el sentido pejorativo del termino) de las potencias” (MOULIN, 1984 apud MOLINA, 2000, p.47).

44A concepção de turismo enquanto indústria não reconhece o processo sistêmico e integrador dos setores sociais, culturais e ambientais abarcados por ele, mas sim a ideia de negócio. A indústria do turismo se alicerça no desenvolvimento econômico, no lucro, nas técnicas e nas tecnologias para a exploração dos lugares, adequando-se às necessidades de consumo dos países desenvolvidos, especialmente os EUA. Infelizmente, em função do momento político e econômico em que se encontrava a América Latina ao longo do século XX, a concepção de turismo assimilada pelos países da região foi, justamente, essa ideia de turismo enquanto indústria.

O sucesso da inserção do modelo de indústria turística nas economias latino- americanas pode se explicar pelo caráter das relações de dependência estabelecidas entre o centro e a periferia e pela necessidade de reverter o empobrecimento constante dos países latino-americanos, como nação vencedora na Segunda Guerra, os EUA viram suas rendas aumentarem consideravelmente, em relação aos demais países. Este fato foi apoiado pela posterior integração das economias periféricas ao processo conhecido como transnacionalização do capital norte-americano. Segundo Molina e Rodríguez (2001), esta estratégia de expansão teve como base, a necessidade desse país tornar-se presente e controlar de perto as áreas-chaves para sua segurança nacional, caso, por exemplo, do Caribe45.

O turismo, ao converter-se num setor explorador, adequou-se às necessidades de consumo de países desenvolvidos, especialmente dos EUA46, tendo em vista que o modelo de indústria turística apresentada na América Latina tem um alto componente estadunidense dominante em países, como: Brasil, México, Venezuela, Colômbia e em alguns destinos da Argentina, Uruguai e Chile. Revelando que as políticas de desenvolvimento turístico latino-americanas também são orientadas conforme os interesses e as necessidades dos países centrais.

Consequentemente, a concepção de turismo assimilada pelos países latino- americanos foi e ainda é a ideia de lucro, no qual a atenção dispensada aos turistas constituía um excelente negócio. Tal quadro gerou um modelo ascendente de evolução do turismo que foi denominado indústria turística. Os critérios de maximização financeira que deram origem e sustentação ao modelo industrial do turismo levaram as empresas e, inclusive, os governos a fomentarem entre os turistas uma atitude de evasão da realidade mediante o consumismo, evasão esta que constituiu o fundamento do turismo nos países latino-americanos.

45O cidadão norte-americano experimentou uma variação das condições econômicas, sociais e políticas favoráveis à utilização do tempo livre e continuou a viajar para o exterior. Como resultado de seu interesse crescente em conhecer os países periféricos e de sua desconfiança pelo estado material de coisas existentes nestes, os norte-americanos começaram a procurar uma série de serviços, os quais só eles próprios estavam em condições de oferecer. Por seu turno, os países pobres perceberam a presença de estrangeiros em seus espaços vitais, especialmente a grande quantidade de norte-americanos dispostos a pagar por bens e serviços um preço maior que o considerado normal pela população local. (MOLINA; RODRÍGUEZ, 2001, p.49)

46O governo norte-americano dirigiu esforços para desenvolver o turismo receptivo nos países latino- americanos, contudo, a situação de dependência não permitiu esse quadro. Segundo Molina e Rodríguez (2001), a participação de empresas transnacionais estrangeiras no controle dos fluxos turísticos e na captação dos investimentos de divisas geradas por este tipo de turismo levou a um lucro muito menor que o esperado.

Na América Latina não existe, a nível nacional, um país que se encontre estruturalmente comprometido em um esforço por desenvolver o turismo, no sentido e significado rigoroso que se tem dado ao conceito de desenvolvimento. O feito de fomentar modelos urbanos e arquitetônicos dos países do centro em seus espaços turísticos, subordinar suas próprias capacidades a dos interesses dos grandes consórcios turísticos transnacionais, de contaminar de modo quase irreversível ecossistemas de apoio ao turismo são indícios determinantes desse processo.47 (tradução nossa)

Numa perspectiva macro, observa-se que existe uma inclinação dos países latino-americanos em especializar o turismo, ao reunir um alto componente de praia- mar na estrutura de seu produto global. Assim, a maioria dos destinos turísticos mais importantes é de praia: Cancun e Acapulco (México), Contadora (Panamá), San Andrés (Colômbia), Rio de Janeiro e Bahia (Brasil), Punta del Este (Uruguai), Viñadel Mar (Chile) e Mar del Plata (Argentina). Esta especialização limita, em paralelo, o pleno aproveitamento do potencial turístico dos países da região e a possibilidade de construir alternativas para o desenvolvimento, mas completo e orgânico. Contudo, há exceções, como os modelos turístico-hoteleiros na região dos lagos chilenos e argentinos, onde domina um modelo de alojamento que gera emprego familiar e que oferece uma ampla gama de alimentos com alto componente local, promovendo e privilegiando atividades turísticas vinculadas às condições naturais e arquitetônicas dos locais, o que se pode chamar de tendência ao desenvolvimento endógeno.

Portanto, para Molina (2000), na América Latina, o turismo constitui apenas uma atividade complementar da economia dos países desenvolvidos, com a qual se reforça a relação dominação-dependência, tendo em vista que a política turística vigente nos países da região tem buscado exclusivamente facilitar à população dos países industrializados o desfruto de seu tempo livre.

[...] o turismo (em nossas comunidades) é planejado sempre baseado na obtenção de divisas, na geração de empregos e na redistribuição dos investimentos internos nunca como resposta à necessidade de distribuição de um povo. (FUENTES, 1979 apud MOLINA; RODRÍGUEZ, 2001, p.55)

47En la Latinoamérica no existe, a nivel nacional, un país que se encuentre estructuralmente comprometido en un esfuerzo por desarrollar el turismo, en el sentido y significado riguroso que se ha dado al concepto de desarrollo. El hecho de fomentar modelos urbanos y arquitectónicos de los países del centro en sus espacios turísticos, subordinar sus propias capacidades a los intereses de los grandes consorcios turísticos transnacionales, de contaminar de modo casi irreversible ecosistemas de apoyo al turismo son muestras fehacientes de ello. (MOLINA, 2000, p. 52)

Na América Latina, o planejamento do turismo apresenta suas primeiras iniciativas em 1961, quando o poder executivo do México encarrega o Departamento de Turismo de elaborar o plano nacional, promulgado em 1968, sob a coordenação do Engenheiro Raimundo Curvo. Já no ano de 1968, a Argentina celebra um convênio com a Secretaria de Difusão e Turismo, a ONU e o Centro de Investigação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo48, e inicia a elaboração de seu Plano Nacional de Turismo, sendo este plano promulgado em 1973. O terceiro país latino- americano a planejar o desenvolvimento do turístico foi o Peru que, em 1969, seguindo recomendações da missão enviada pelo programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, criou uma comissão especial para coordenar o Plano Turístico e Cultural do Peru-UNESCO, conhecido como Projeto COPESCO.

Um dos exemplos clássicos de gestão pública do turismo na América Latina foi o planejamento ocorrido no México. Nesse país, o turismo começou como uma atividade totalmente do setor privado. Seu crescimento era de tamanho limitado (basicamente na área de Acapulco), o produto em oferta era geralmente de baixa qualidade e os empreendimentos não eram planejados. Para reagir, em 1974, o governo do México criou o Fundo Nacional de Fomento ao Turismo (FONATUR), com o objetivo de desenvolver resorts. Além de tentar regular os empreendimentos, as principais razões para o envolvimento do Estado eram: tornar real a demanda potencial ao aumentar o número de resorts; gerar ganhos com câmbio de moeda estrangeira; criar empregos; e promover o desenvolvimento regional, em especial deslocando os desempregados da Cidade do México em direção aos novos resorts e aumentar o Produto Interno Bruto (PIB) regional.

Segundo Cooper et al. (2007), a abordagem do governo mexicano nesse caso, por ter uma longa experiência em termos de políticas de desenvolvimento, se baseia no princípio do “polo de crescimento”, com o objetivo de elevar os valores das exportações regionais através do turismo. O foco é a criação de um destino (polo de crescimento) através de uma estratégia de investimento que oferece uma gama equilibrada de instalações para atender às exigências dos visitantes e a um

48Deste grupo faziam parte José Maria Oliver, que passou a conduzir a sessão de turismo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Arquiteto Roberto Boullón. Em 1973, Boullón passa a dirigir o Centro Interamericano de Capacitação Turística (CICATUR) com unidades na Argentina e Barbados, que integram o sistema de capacitação e assessoramento a nível interamericano, empreendido pelo então programa de Desenvolvimento Turístico da Organização dos Estados Americanos (OEA).

nível que dê à área “presença turística” no mercado. A um nível mais local, o mesmo princípio pode ser encontrado na formação de parcerias para promover o desenvolvimento do turismo nas comunidades.