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Políticas Públicas na Educação

2.2 Políticas Públicas

2.2.4 Políticas Públicas na Educação

Antes da abordagem das políticas públicas na educação, é importante apresentar a forma com que se desenvolveu o ensino superior no Brasil. Embora de forma breve, esta abordagem contextualiza a importância e os objetivos das políticas públicas na educação.

Inicialmente é importante destacar que o Brasil nunca teve um modelo próprio de universidade, valendo-se sempre de exemplos e de experiências de países centrais, podendo constatar-se uma superposição de modelos entre as IES públicas e privadas (APRILIE; BARONE, 2009; SGUISSARDI, 2004). Talvez essas condições tenham motivado a configuração do ensino superior no Brasil até os dias atuais que, desde a sua origem, foi elitizada. O acesso a uma IES é mais simples aos mais ricos, mesmo nas universidades públicas (VONBUN; MENDONÇA, 2012).

A história da concepção das universidades no Brasil demonstra, inicialmente, enorme resistência, seja de Portugal, como resultado de sua política de colonização, seja da parte de brasileiros, que não viam motivo para a concepção de uma instituição desse gênero na então “Colônia” (FÁVERO, 2006). Essa condição pode ser observada no Brasil Colônia, em que as famílias enviavam seus filhos para universidades em Coimbra, Portugal. Sendo raros filhos provindos de famílias menos favorecidas obterem a mesma condição, a não ser que recebessem ajuda da igreja pelo ingresso na vida religiosa (APRILE; BARONE, 2009).

Em torno de 1808 a Corte Portuguesa chega ao Brasil, na qual se dá a criação das primeiras escolas isoladas de educação superior, cujo modelo de desenvolvimento teve, como características essenciais, seu foco para a formação profissional e o controle do Estado sobre o sistema (SAMPAIO, 1991). Essas são originadas pelo modelo napoleônico, focadas em cursos e faculdades, organizadas de maneira independente e não exatamente a partir da concepção da universidade (APRILE; BARONE, 2009).

O modelo napoleônico, segundo Silveira e Banchetti (2013), denota a concepção educacional de seu âmbito sociopolítico, econômico e tecnológico, tal como as demandas imediatas da classe dominante, considerado um dos modelos mais antigos de instrumentalização da universidade pelo Estado, praticada por intermediação da legislação, controle financeiro e de nomeações em todo o território nacional, visando à modernização da sociedade, à construção de uma identidade nacional e à (con) formação da classe trabalhadora.

Segundo esta concepção, a universidade de Minas Gerais, em 1927, foi inaugurada, com base no modelo neonapoleônico, engendrando cinco faculdades - Engenharia, Medicina, Direito, Farmácia e Odontologia. O modelo aplicado valorizava a administração no topo, centralizada, o qual imaginava alguma coordenação dos cursos. Também essa faculdade vigora a herança do velho modelo francês (SGUISSARDI, 2004).

Dois projetos foram registrados com modelos similares no contexto da Revolução de 1930: o projeto da Universidade de São Paulo (USP), em 1934, e o modelo da Universidade do Distrito Federal (UDF), em 1935. Esta última não se consolida devido às ideias liberais de seus dirigentes, em criar uma universidade autônoma, independente na produção do conhecimento e pela formação de indivíduos críticos, a Igreja e o Estado a consideravam uma ameaça à sociedade (APRILE; BARONE, 2009).

Ainda que tenha perdurado por um tempo inferior a quatro anos, a UDF marcou a história da universidade no Brasil, pela maneira engenhosa com que a experiência se desenvolveu. Desde o princípio, mesmo com todos os percalços, a universidade se manifesta não apenas com um conceito preciso e original do aspecto e das funções da instituição, mas também antecipa os instrumentos que se fazem importantes, em termos de recursos humanos materiais, para a realização de seus objetivos (FÁVERO, 2006).

Apesar dos fatores desfavoráveis, no início década de 1960, novos ideais sobre a concepção e os modelos, ora em vigor vão surgindo. Atores da classe intelectualizada brasileira e os estudantes debatem sobre um novo modelo de universidade para o País em torno do crescimento natural e desorganizado das IES. Para brindar esta nova etapa, em 1962, é fundada a Universidade de Brasília (UnB) que trouxe, em sua essência, sinais de modernidade. A UnB apresenta a concepção de um projeto coletivo, baseado na relação do ensino e da pesquisa, e de uma arquitetura integrada por intermédio da articulação das atividades das várias unidades de ensino (APRILE; BARONE, 2009). Esta universidade foi idealizada para modernizar o ensino superior, visando atender às exigências do desenvolvimento do país, ou seja, criar conhecimentos científicos e tecnológicos essenciais à independência do Brasil no campo cultural e científico (ROCHA, 2002). No entanto, sua modernidade apresenta uma possível ameaça ao modelo tradicional e a universidade de Brasília é extinta pelo golpe militar de 1964. Nessas condições, seus idealizadores foram demitidos e alguns deles obrigados a se exilar no exterior (APRILE; BARONE, 2009).

Contudo, tal situação não perdura muito tempo. Segundo Aprile e Barone (2009), novos contextos e acordos surgem obrigando o governo militar a promover mudanças significativas no setor de ensino superior. Assim, em 1968, o governo implementa a Reforma Universitária por intermédio de Lei n.º 5.540, motivado pelo acordo entre Ministério da Educação e Cultura e a United States Agency for International Development (USAID), que estabelecia diretrizes à produção do conhecimento e ao sistema de pesquisa a serem desenvolvidos pelas universidades brasileiras. A pesquisa necessitava de um espaço mais afastado de resultados práticos, e com mais liberdade de experimentação e pensamento, como apontado por Sampaio (1991, p. 8). Diante desses acontecimentos, o modelo neo-humboldtiano é rompido, a responsabilidade pelo desenvolvimento da pesquisa passa a ser da pós-graduação, e a graduação responsável pela formação de profissionais especializados para atender o mercado.

É nesse contexto que se coloca o debate sobre o acesso ao ensino superior, temática que engendra não só os estudos das políticas públicas e dos instrumentos que impulsionam a tomada de decisões, como também suas implicações nos modelos de avaliação em educação.

Desta forma, os programas de acesso ao ensino superior estabelecem-se no âmbito das políticas inclusivas compensatórias. As políticas inclusivas compensatórias têm como propósito corrigir os espaços provocados pela ineficiência das políticas universalistas (APRILE; BARONE, 2009). O desenvolvimento de políticas inclusivas presume o desafio de vencer a contradição de sua aplicação no campo tradicionalmente refratário a tendências igualitárias, como a educação no ensino superior (CHIROLEU, 2009).

Na perspectiva universalista, segundo Theodoro e Delgado (2003), o mercado não está isento a mecanismos regulatórios do Estado, com relação às políticas econômicas – políticas fiscais que têm como objetivo manter o nível da demanda; e sociais – universalização do acesso aos serviços públicos nos âmbitos da educação, saúde e emprego. Nesta visão, o mercado surge como foco privilegiado da disputa distributiva, no qual o mais forte se impõe e, em consequência, as desigualdades se atenuariam. Situação que exige a regulação do Estado. Os argumentos usados dos focalistas omitem a razão de que, sem os instrumentos de controle, o mercado segue a aumentar as distorções e as desigualdades, favorecendo os mais bem instalados e servidos (THEODORO; DELGADO, 2003).

Segundo Cury (2005), as políticas inclusivas são ações dirigidas para a universalização de direitos civis, políticos e sociais. São políticas que buscam, pela

intervenção do estado, uma situação de igualdade. Ou seja, elas são sustentadas pelo Estado, o princípio de igualdade de oportunidade para todos diante da lei. Sendo que uma política inclusiva deve envolver-se com desinstitucionalização da exclusão, seja ela no espaço da escola ou em outras estruturas sociais (PAULON, FREITAS; PINHO, 2005). Deste modo, essas políticas públicas não são destinadas a grupos por causa de suas raízes culturais, ética ou religiosa. Elas têm como foco combater a discriminação que obstaculize o acesso à igualdade de oportunidades e de condições. Nesse aspecto, as políticas públicas includentes reparam as fragilidades de uma universidade focalizada em todo o indivíduo, isto porque uma sociedade de classe apresenta consideráveis níveis de desigualdade (CURY, 2005).

Sendo que tais políticas sustentam-se em ações para a focalização de direitos para grupos que possuem diferenças específicas, ou seja, a situação desses grupos é compreendida como socialmente vulnerável, devido a uma trajetória marcada pela exclusão. Segundo Cury (2005), a focalização se fortalece na insuficiência das políticas universalistas. De acordo com o autor, focalizar esses grupos permitiria, então, “distribuir mais a quem mais necessita”, corrigindo ou reparando consequências do passado. Nesse sentido, isso se fundamenta no princípio de equidade, uma das maneiras de praticar-se justiça é “tratar desigualmente os desiguais”. Uma das maneiras mais explicita dessas políticas pode ser constata na emblemática questão das “cotas” como expressão de “ações afirmativas”.