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Politicas públicas que promovam uma gestão sustentável do solo

Francisco Avillez (AGRO.GES) Mário de Carvalho (ICAAM)

4. Politicas públicas que promovam uma gestão sustentável do solo

De acordo com o anteriormente exposto é nossa opinião que o crescimento económico fu- turo da agricultura portuguesa vai depender, no essencial, de uma utilização mais eficiente dos fa- tores de produção agrícola e da melhoria da qua- lidade dos solos portugueses em geral e dos mais degradados em particular.

A qualidade dos solos agrícolas depende dos fa- tores naturais da sua formação e da atividade do homem. Quanto mais desfavoráveis são os fatores naturais maior importância assume o nosso papel. Associado às causas naturais, os sistemas de agri- cultura tradicionalmente praticados, na maior par- te do território, não têm acautelado a conservação do solo e da água, contribuindo para a degradação dos nossos solos. É necessário e urgente colocar o solo no centro das preocupações da nossa agri-

cultura. É indispensável desenvolver sistemas e tecnologias de produ- ção de controlem a ero- são do solo e aumentem o seu teor de matéria orgânica. É igualmen- te importante atender à melhoria da drenagem, muito em particular dos Luvissolos, dada a sua importância no contexto nacional. A solução para todas estas questões passa pela redução drástica da intensidade dos sis- temas de mobilização, pela cobertura permanente do solo com os resíduos das culturas e por incluir nas rotações culturas capazes de crescerem raí- zes em profundidade, de forma a desenvolver uma rede abundante e extensa de canais contínuos no solo, que permitam ultrapassar as limitações à sua drenagem interna. Nos solos mais marginais há ainda a necessidade frequente de correção da aci- dez pelas limitações impostas por toxicidades de manganês e ou alumínio. Esta mudança não é fá- cil, pois obriga a repensar os sistemas de culturas e respetivos itinerários técnicos. No entanto, a infor- mação disponível mostra que é possível aumentar de forma considerável o potencial produtivo dos nossos solos e, simultaneamente, aumentar a efici- ência no uso de fatores de produção, como é o caso dos fertilizantes, o que são contribuições decisivas para a sustentabilidade económica e ambiental de muitos sectores da agricultura portuguesa.

A solução para todas estas questões passa pela redução drástica da intensidade dos

sistemas de mobilização, pela cobertura permanente do solo com os resíduos das culturas e por incluir nas rotações culturas capazes de crescerem raízes em

profundidade, de forma a desenvolver uma rede abundante e extensa de canais contínuos no solo, que permitam ultrapassar

Para que estas alterações se venham a concre- tizar vão ser necessárias políticas públicas coeren- tes e estáveis, que sejam capazes de responder às três seguintes principais preocupações.

Em primeiro lugar, vai ser necessário equaci- onar o que nos parece dever ser a preocupação prioritária da política agrícola nacional nos pró- ximos anos, que é a falta de acesso ao conheci- mento e ao apoio técnico especializado por parte dos produtores agrícolas nacionais. Para o efeito, consideramos urgente a criação de uma rede de estações experimentais, distribuídas no território que sirvam, simultaneamente, para o desenvolvi- mento da investigação aplicada a soluções com- provadas no contexto dos diferentes sistemas de agricultura e como base para a aprendizagem de técnicos e produtores. Vai ser, também, indispen- sável repensar as formas de financiamento destas atividades de investigação, desenvolvimento ex- perimental e transferência de conhecimento do modo a que as respetivas prioridades e prazos de realização reflitam este novo paradigma.

Em segundo lugar, vai ser decisivo que as medi- das agroambientais, em vigor no contexto do PDR 2020 estejam orientadas de forma coerente e per- sistente para uma efetiva promoção dos apoios à conservação e à melhoria da qualidade do solo, o que irá passar, necessariamente, por incentivos a uma redução drástica da intensidade dos sistemas de mobilização do solo, à manutenção de resídu- os de culturas na superfície do terreno e à adoção de rotações de culturas consideradas apropriadas às diferentes manchas de solos. Para o efeito, vai ser necessário que os apoios dados a este tipo de soluções agronómicas sejam suficientemente in- centivadoras no contexto dos diferentes tipos pa- gamentos diretos de que os produtores agrícolas portugueses poderão vir a beneficiar.

Em terceiro lugar, vai ser necessário recorrer a medidas de apoio alternativas orientadas para a correção dos solos e para a instalação de pastagens

produtivas, que permitam sustentar uma produção pecuária viável e contrariar o crescente abandono de áreas significativas do novo território.

Será, ainda, necessário que se evitem medidas agroambientais que funcionem como apoio enca- potado ao rendimento dos agricultores e que, não exigindo alteração significativa das tecnologias de produção, desincentivam a adoção das medi- das propostas. Será muitas vezes o caso da ado- ção da produção integrada em culturas arvenses (que pode servir de alternativa às medidas de con- servação do solo) e do pastoreio extensivo (que pode desencorajar o investimento na melhoria das pastagens).

Trata-se, portanto, de um conjunto de preocu- pações que, aparentemente, se encontram refle- tidas em algumas das medidas/ações aprovadas no âmbito do PDR 2020, com especial relevo para:

• as medidas M1 e M2 relativas à Inovação e ao Conhecimento;

• as ações A7.4 – Conservação do Solo e A7.7 – Pastoreio Extensivo, da medida M7 – Agri- cultura e Recursos Naturais;

• um dos critérios de seleção de projetos no âmbito da ação A3.2 – Investimento na Ex- ploração Agrícola, da medida M3 – Valoriza- ção da Produção Agrícola.

Aparentemente, por três ordens de razões. Primeiro, porque apesar das melhorias intro- duzidas face ao PRODER, as medidas agroambi- entais que irão estar em vigor no contexto do PDR 2020 não nos parecem apresentar diferenças su- ficientes em relação ao passado recente que nos permitam concluir que da sua aplicação irá resul- tar, necessariamente, uma inversão das tendênci- as negativas anteriormente sublinhadas.

Segundo, porque não foi incluída na medida M7 – Agricultura e Recursos Naturais, nenhuma

ação orientada para a melhoria da produtividade dos prados e pastagens em solos degradados, li- mita significativamente as possibilidades de uma gestão mais sustentável dos solos.

Este tipo de ação, que foi proposta pela AGRO. GES, enquanto entidade responsável pela Avalia- ção Ex-ante do PDR2020, previa a introdução de um conjunto de práticas agronómicas (aplicação de calcário dolomítico e fósforo e realização de sementeira) sujeitas a um acompanhamento téc- nico qualificado expresso sobre a forma de um iti- nerário técnico adequado de sujeição obrigatória por parte do beneficiário, e tinha por objetivos:

A recuperação de parte significativa das áreas ocupadas por prados e pastagens localizados em solos degradados, de forma a alcançar uma me- lhoria da sua produtividade que assegure a respe- tiva viabilidade económica;

A obtenção de benefícios ambientais associa- dos com o controlo da erosão (mais revestimen- to dos solos), com o sequestro de carbono do solo (maior retorno dos resíduos orgânicos derivados do aumento da produtividade), com uma maior biodiversidade (solos degradados suportam, ape- nas, um número reduzido de espécies adotadas a essa situação) e uma maior proteção dos monta- dos e outros povoamentos florestais com pasta- gens sob coberto.

A introdução na fórmula de cálculo da Valia Global da Operação (VGO) utilizada para a sele- ção e hierarquização dos pedidos de apoio no âm- bito da ação A3.2 – Investimentos na Exploração Agrícola, de um critério de seleção, favorecendo as candidaturas com investimentos na melhoria de fertilidade ou estrutura do solo, não irá, na nos- sa opinião, ser uma solução alternativa à ação pre- viamente identificada.

De facto, não nos parece que a introdução de um ponderador de valor 0,05 venha a constitu-

ir um elemento diferenciador das iniciativas no âmbito da melhoria da qualidade do solo, o que é, ainda, mais agravado pela decisão tomada no sentido de se vir a contabilizar a aquisição de cal- cário em, apenas, 30% do respetivo custo.

Terceiro, as orientações adotadas no âmbito das medidas M1 – Inovação e M2 – Conhecimen- to, podendo constituir condições necessárias para o tipo de melhorias em causa, não são, na nossa opinião, por si só suficientes para promo- verem uma reformulação e reforço do sistema nacional de investigação, de desenvolvimento experimental e de transferência de conhecimen- tos capaz de o colocar ao serviço de um uso mais eficiente dos fatores de produção e dos recursos naturais em geral e de uma melhoria da quali- dade do solo em particular. Seria necessário um esforço concertado entre o Ministério da Agricul- tura e Mar e o Ministério da Educação e Ciência de forma a definir uma política que permitis- se uma distribuição regional das infraestruturas materiais, dos recursos humanos e de programas de investigação e demonstração especificamen- te contratualizados.

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