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CAPÍTULO II DE TODAS AS VELHICES

2.5 PROJETO DE MODERNIDADE

2.5.2 Politizando as velhices

Jurilza Mª de Barros (2015) em sua tese de doutorado no Serviço Social, faz uma reconstituição histórica e linear da promulgação das leis relacionadas ao envelhecimento e à velhice. A autora separa em capítulos as políticas internacionais e as nacionais, não necessariamente em ordem cronológica. Para fins dos objetivos dessa pesquisa, não achei necessário citá-las no texto principal, mas para o(a) leitor(a) interessado(a), dispus em anexo por ordem cronológica todas as políticas citadas pela autora. (Anexo 1) De acordo com Barros (2015, p.15-16):

O controle democrático das políticas destinadas às pessoas idosas, conforme previsto na Constituição Federal vigente, promulgada em 1988, pode ser exercido por vários canais institucionais de participação política direta, tais como o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular; mas são os Conselhos de Defesa de Direitos da Pessoa Idosa, existentes nas três esferas de Governo (União, estados e municípios, além do Distrito Federal), que devem exercitar regularmente essa tarefa. O que nos interessa, sem adentrar em todas as leis desde 1903 levantadas pela autora é ressaltar a 1ª Assembleia Mundial sobre Envelhecimento em Viena, ocorrida em 1982 que, conforme já visto, é o marco classificatório das velhices no mundo ocidental moderno. A partir deste marco, outras políticas surgiram e suas designações respingaram no Brasil. Em 1988 novas normatizações entraram em cena com a Constituição Federal, mas ainda não especificamente em relação à

pessoa idosa, mas contemplando um Sistema de Seguridade Social, composto pelas políticas de Previdência, Saúde e Assistência Social. De acordo com Faria in Netto (1996, p.77):

O conceito de idoso que adotamos no meio jurídico é o conceito cronológico.

De acordo com a Constituição Federal de 1988 em seu artigo 6º define: são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta constituição. Com a promulgação da Constituição, um novo conceito de política social foi materializado no conjunto da Seguridade Social, compreendendo a Saúde e a Previdência Social. Cada um desses elementos particulariza um segmento da população brasileira. A Saúde, direito de todos (art. 196 da Constituição Federal), é universal; a Previdência Social atende aos que lhe são contribuintes e a Assistência Social é prestada aos necessitados e desamparados (art. 203 da Constituição Federal). (FARIA, 1996 p.77).

A Constituição foi resultado também da luta de vários movimentos sociais empreendidos desde a década de 1960 no Brasil. Foi a partir desse momento histórico que o Brasil não só passou a participar com maior regularidade das discussões internacionais sobre a temática do envelhecimento, como também passou a levar em conta as normativas produzidas com base nessas discussões. (BARROS, 2015).

Segundo Nosswitz (2008), a partir da década de 1980 no Brasil, aumentou a importância política dos governos municipais e estaduais, que assumiram novas funções e atribuições, havendo uma abertura para a co-participação da sociedade na gestão pública. A Política Nacional do Idoso (PNI)/1994, incluiu em suas diretrizes a origem dos Conselhos Municipais, Estaduais e Nacionais nas diferentes áreas sociais (criança e adolescente, assistência social, saúde, idoso, entre outros) como órgãos permanentes, paritários e deliberativos, compostos de representantes do governo local e organizações representativas da sociedade civil ligadas à área:

Os conselhos de políticas públicas são espaços públicos de composição plural e paritária entre Estado e sociedade civil, de natureza deliberativa, cuja função é formular e controlar a execução das

políticas públicas setoriais. Os conselhos de gestão de políticas sociais são fundados nos conceitos de democracia, cidadania e participação [...]. (NOSSWITZ, 2008, p.34; p.38).

Portanto, os conselhos de uma dada localidade pretendem ser o órgão democrático intermediário e controlador das políticas nacionais e estaduais. No sentido de Bauman (1999), o lócus de produção e apropriação das decisões institucionalizadas pode ser entendido como determinadas localidades onde políticas públicas se mesclam nos contextos locais, modificando-se, adaptando-se (ou não) às normativas globais.

De acordo com o Mapa das Políticas, Programas e Projetos do Governo Federal para a População Idosa (2014), seguindo os objetivos do Plano Nacional de Direitos Humanos PNDH-3, em comemoração aos 10 anos do Estatuto do Idoso, a então Presidenta Dilma assinou o Decreto Presidencial 8.114, em 30 de setembro/2013, sobre o Compromisso Nacional para Envelhecimento Ativo, coordenado pela Secretaria dos Direitos Humanos e com a participação dos dezessete ministérios. Neste mesmo documento, foi apontado a

predominância feminina entre as pessoas idosas no Brasil como um fenômeno urbano. Nas áreas rurais, predominam os homens. A maior participação das mulheres nesse fluxo migratório explica a diferença. Isto implica em necessidades distintas de cuidados para a população idosa. A predominância masculina nas áreas rurais pode resultar em isolamento e abandono. (BRASIL, 2014, p.15).

No contexto da localidade de São José do Cerrito/SC, as agentes institucionais demonstram em suas falas como a legislação vigente tramita nas atividades com o público idoso:

Nós temos a Lei que foi criada no nosso município, o Conselho Municipal do Idoso que foi criada em 2007, eu tava nessa época trabalhando com a Gestão, me lembro bem. Então foi criado o Conselho Municipal do Idoso, esta é uma das leis mais fortes dentro do município, sem contar o Estatuto do Idoso que a gente trabalha muito em cima e daí a Política Nacional do Idoso (ANA, 2015).

Depois eu vim direto aqui na Prefeitura no prédio como se diz, daí comecei a trabalhar com Bolsa

Família com cadastro único, mais mesmo ... a gente trabalha sempre através do Estatuto, orientações que vem através do próprio Estatuto ... até agora tem a Conferência do Idoso [...]. (REBECA, 2015).

Eu entrei pra representar a secretaria né, como suplente eu participo das reuniões [...] porque eu participei de uma e a outra eu saí na metade, então ... (RAQUEL, 2015).

Sobre as exigências do Estatuto do Idoso, Lia me informa] eles tem privilégio pra pegar a ficha, nós damos dez fichas e uma é do idoso, é um idoso sim e outro não, entendeu. Uma pessoa com mais de 50 anos, outra não. A maior dificuldade é a falta de mais colegas pra trabalhar com a gente pra poder desenvolver bem o serviço com o idoso, carro nós temos, faltam mesmo são pessoas pra trabalhar junto. (LIA, 2015).

Ana, coordenadora do Grupo de Idosos e representante titular do Conselho Municipal do Idoso, demonstra a importância do CMI como um discurso a ser seguido. Rebeca, responsável pela Gestão da Assistência Social, atesta que as atividades do município são seguidas "à risca" pelas orientações do Estatuto e Raquel, representante suplente do CMI e ocupando cargo comissionado na administração da Prefeitura, demonstra a representatividade governamental no Conselho, mas também sua dificuldade em participar das reuniões, devido justamente seu trabalho na Prefeitura. Já a enfermeira Lia ressalta a prioridade do atendimento à pessoa idosa no Posto, mas também as dificuldades estruturais de trabalho pela falta de recursos humanos.

As políticas e sua tramitação local, também puderam ser percebidas em outras instâncias, como a fala do taxista Gabriel, três vezes vereador:

Vereador aqui uma vez e duas vezes em Curitibanos/SC, mas eu não quero mais, sabe como é que funciona na Câmera de Vereadores? funciona através de comissão, vamos supor, tem três membros na comissão, eu muitas vezes me abstive de votar num projeto, porque não se enquadrava num artigo tal, né ... voltava pra mesa. (GABRIEL, 2015).

ele sabe da fogueira da BR 282 quem foi de atrás ali! A Salete me ajudou muito! até nós chegar pra

asfaltar ... eu digo e provo, até nós chegar na Ideli Salvati passamos vergonha por causa dessa 282. À Ideli Salvati nós devemos obrigação pro resto da vida dela. (GABRIEL, 2015).

Nessas falas verifica-se procedimentos internos aos discursos oficiais que escapam ao próprio controle, à demanda que os (as)agentes precisam dar conta. Embora haja uma legitimidade nos discursos da legislação e o seguimento de suas normas seja uma prerrogativa, os imponderáveis da vida social exigem, às vezes, outros posicionamentos, pois fogem do que é homogêneo e coletivo.