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O objetivo da presente sessão é apresentar brevemente os principais fundamentos da teoria de Esser (1998), que servem de apoio para essa pesquisa. Parte-se do princípio de que se pode expandir os postulados de Esser (1998) para o telejornalismo, considerado aqui subgênero do jornalismo. Como já mencionado anteriormente, trata-se de uma atividade que influencia a sociedade, ao mesmo tempo que se configura como uma de suas partes constituintes por sua preponderância na vida de parte considerável das populações.

Esser (1998) estabelece comparações entre o jornalismo inglês e o alemão. Propõe uma reflexão particular sobre fatores que conduziram o fazer jornalístico nesses dois países, direcionando suas discussões para a comparação entre materiais midiáticos impressos em âmbito internacional. Tal abordagem evidencia que cada cultura estabelece parâmetros que acabam se tornando singulares, uma vez que respondem a objetivos específicos.

É importante considerar que os valores culturais muitas vezes emergem naturalmente e de forma inexorável nas diversas cenas que a atividade telejornalística promove sobre a própria sociedade através de seus textos, sejam eles verbais ou não verbais. Assim, de acordo com Esser:

[...] o jornalismo de cada país é marcado por condições emoldurais sociais gerais, por fundamentos históricos e jurídicos, limitações econômicas, bem como por padrões éticos e profissionais de seus agentes. (ESSER apud ZIPSER, 2002, p. 21).

Dessa forma, pode-se dizer que a multiculturalidade e a interculturalidade situam-se sobre as principais linhas norteadoras do fazer jornalístico e, por extensão, do ato interpretativo e tradutório. Quando se comparam notícias veiculadas em países diferentes, na verdade não se está comparando somente fatos, mas sim componentes socioculturais, evidenciando considerações enquadradas ideológica e politicamente sobre o que esses fatos representariam. Os contatos interculturais fazem com que o jornalista se posicione numa espécie de antecâmara, ou seja, um duto de passagem para o universo do outro, no interior do qual se realizam metamorfoses condicionadas. No contato entre culturas haverá sempre alterações do texto em razão das oposições socioculturais. Ao serem traduzidos para o público receptor, os textos se conformarão às configurações definidas em função das características do polo receptor projetado pela empresa midiática. Dessa forma, o conhecimento das propriedades do auditório projetado é essencial para a determinação dos percursos a serem adotados no processo de passagem de um código a outro, de uma língua a outra ou, ainda, de uma cultura a outra. Os condicionamentos e implicações registrados na matéria pronta resultam do processo. A premência e rapidez do telejornalismo não permitem longas reflexões. Recorre-se, pois, às orientações-modelo como forma de acelerar as elaborações textuais e imagéticas.

Para Zipser (2002), com base nos estudos de Esser (1998), o jornalismo constitui um sistema parcial de atuação social. Sua influência se desdobra através dos seus agentes imediatos, a saber: repórteres, redatores, chefes de edição ou o próprio leitor que interfere na reconstrução das realidades. As representações se realizam, em parte, com base na constituição cultural do público receptor. No jornalismo os conceitos de realidade se definem a partir das configurações do público

alvo. Suas conceitualizações prévias, ligadas às formações culturais, definem as linhas a serem adotadas para que aquilo que se diz em uma cultura possa ser dito, de maneira similar, na cultura do Outro. Parafraseando o título do livro de Eco (2007), tudo que se consegue fazer é dizer “Quase a mesma coisa”. Através da obra de Esser (1998) foram demonstrados os constituintes do fazer jornalístico.

Esser subordina o estudo do jornalismo a uma série de condicionantes que o retiram de uma esfera ideal e desatrelada da realidade para colocá-lo ao lado de todas as outras manifestações de produção de sentido na sociedade. (ZIPSER, 2002, p. 25.)

Para Zipser (2002), os estudos comparativistas também de ordem internacional podem ser identificadores de marcas que permitem perceber como cada nação/cultura imprime em seu jornalismo uma identidade condicionada a fatores de ordem cultural. Através da análise de um mesmo fato, veiculado em duas culturas distintas, torna-se possível perceber a pluralidade de fatores, por exemplo, fatores de ordem subjetiva, estrutura de mídia, entre outros aspectos, já citados, a serem levados em conta no fazer jornalístico. De modo paralelo, é possível considerar os impactos gerados nos processo de recepção e interpretação por parte do público receptor.

A função do jornalismo, seja ele impresso, televisivo, radiofônico, via web, etc., é a de informar ao público o que está ocorrendo, configurando-se sempre uma versão do fato noticioso.

Van Dijk (apud OLIVEIRA, 1990), acredita que, em geral, concede-se grande importância ao tratamento de aspectos semânticos quando da elaboração do material relacionado à divulgação de fatos, todavia, para o autor é preciso ir além. Juntamente com o texto jornalístico encontram-se elementos pragmáticos que são diretamente influenciados pelo contexto cultural que circunscreve toda a produção. Partindo dessa premissa, acredita-se que o texto jornalístico, assim como o telejornalístico, apresenta uma visão bidimensional, ou seja, uma visão que emerge a partir daquele que produziu a reportagem, e outra referente à política interna da empresa midiática, no caso deste estudo, as empresas de televisão.

De acordo com Esser (1998), o fazer jornalístico de cada país é constituído, desde sua gênese, por influências de fatores socioculturais, históricos, jurídicos, econômicos, bem como por fatores relacionados à

conduta do profissional, ou seja: ética, competência, comprometimento e responsabilidade. A partir dessa linha de raciocínio, torna-se impossível acreditar que o jornalismo que se constituiu no Brasil seja similar àquele desenvolvido na França, haja vista que um e outro se configuraram a partir de esferas específicas. Esser sistematizou uma gama de fatores influenciadores do fazer jornalístico em um modelo conhecido como: “modelo pluriestratificado integrado”. O autor denominou seu modelo de “metáfora da cebola”, utilizando as ideias de McCombs.

Houve várias tentativas de identificar e classificar esses fatores de influência. Uma maneira simples de classificação desses fatores de influência é a “metáfora da cebola”. Comparamos o jornalismo – retomando a idéia de Maxwell McCombs – com uma cebola, sendo que cada camada da cebola representa um fator de influência do fazer jornalístico. (ESSER apud ZIPSER, 2002, p.21.).

Figura 1: Fatores de Influência no Jornalismo: Modelo Pluriestratificado Integrado (ESSER - 1998)

O modelo de Esser (1998) apresenta instâncias que podem influenciar e interferir no fazer jornalístico. Para o teórico essas instâncias são evidenciadas quando a comunicação ocorre em situações culturais diferentes.

A esfera social, moldura histórico-cultural, é o nível mais periférico de todo o processo. Ele engloba todas as demais camadas e

emoldura todos os fatores que influenciarão o fazer jornalístico. Fazem parte desse patamar as questões que permeiam os valores culturais de cada sociedade ligadas à estruturação da imprensa, bem como a questões ligadas ao jornalismo. Liberdade de imprensa, contexto histórico da sua formação, tradição jornalística, conceitos abstratos de objetividade, verdade, seleção de pautas presentes em cada cultura e questões políticas – condições determinantes da esfera político-social.

A esfera estrutural da mídia consiste na segunda camada do modelo de Esser (1998). Nela estão representadas as condições normativas, econômicas e jurídicas, direito de imprensa, ética profissional, condições econômicas do mercado da mídia, influência dos sindicatos e a formação dos profissionais do jornalismo.

A esfera institucional, ordenações institucionais, compõe a terceira camada do modelo de pluriestratificado integrado. Os fatores abarcados nesse patamar são: estruturas dos veículos de comunicação, seleção, redação e edição e as tecnologias de redação.

Na última camada encontramos a esfera subjetiva, são os elementos de formação individual, valores, crenças, posições políticas, profissionalização do jornalista e sua posição sociodemográfica.

No modelo proposto por Esser (1998) as camadas interagem e se influenciam mutuamente. Podemos aqui fazer uma breve correlação de seus postulados com a teoria proposta por Nord, na qual os fatores do processo se condicionam mutuamente, e qualquer alteração em um dos fatores resulta na alteração do produto final.

Os vários níveis encontram-se numa estreita relação de interação, influenciam-se reciprocamente, nenhum fator atua isoladamente, mas desenvolve sua influência somente em conjunto com as demais forças. As quatro esferas moldam o fazer jornalístico. (ESSER apud ZIPSER, 2002, p. 26).

Os quatro elementos apresentados no modelo pluriestratificado integrado interagem e influenciam os demais, como uma espécie de ciclo permanente. Seguindo essa linha de raciocínio, a camada externa à esfera social impede que os aspectos subjetivos brotem sem prévia seleção. Já os fatores que compõem a esfera da mídia influenciam as camadas externas, impedindo posições generalizadas.

Tanto a atividade tradutória quanto a atividade jornalística acontecem de forma cíclica, na qual os elementos que as constituem e as

influenciam determinarão sua identificação com o contexto no qual estão inseridos e com o público receptor.

No caso do casamento na corte inglesa, o fato representado em duas culturas diferentes externas ao fato, evidencia o fenômeno do olhar estrangeiro. Mesmo no caso do jornalismo que afirma prezar pela verdade, objetividade e imparcialidade, os filtros culturais gerarão reações e se farão perceber em muitas sentenças.

Muito embora se saiba que existam muitas implicações inerentes ao fazer jornalístico, no escopo desta investigação nos interessa considerar o fenômeno da alusão. Naturalmente, trata-se de, apenas, um entre tantos outros aspectos de natureza discursiva presentes no texto jornalístico. Todavia, como marca específica do fenômeno amplo denominado intertextualidade, a ação de aludir ocupa espaço fundamental na composição do texto quando de fricções entre culturas diferentes. O fato de aludir funciona, de certa maneira, como uma espécie de metáfora, ou seja, a partir de orientações textuais recorre-se a elementos de uma cultura como forma de explicar fatos de outra cultura. Por exemplo, pode-se promover interespaços e intercenas para ligar dois fatos, de forma que possam ser melhor compreendidos. A partir de comparações ou referências a objetos e processos conhecidos catalisam- se identificações fundamentais para uma melhor compreensão do material exposto.