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7 - Posicionamento dos Países

No documento Conferência de Kaesong (páginas 29-36)

Antes de mais nada, diferentemente da maioria dos tópicos acerca do posicionamento dos países participantes de um determinado comitê, este não se propõe a explicar de forma absoluta a estratégia política tomada pelo país no comitê para que possa atingir os resultados desejados em uma resolução final. Como se trata de uma reunião extraordinária para a negociação de termos necessários para um tratado de paz, há uma série de motivos escusos e segundas intenções que

Para esse fim, será fornecido para todos os plenipotenciários da conferência um perfil estratégico do país que representa, assim como as diretrizes que deverá seguir nas negociações, os termos que deve tentar alcançar mas que não são necessários e os termos que são impossíveis de aceitar. Claramente, fornecerá uma visão mais profunda acerca do como, o quê e até onde as nações estão dispostas a negociar, ou seja, ceder e tomar obrigações.

Por fim, segue abaixo a posição que cada nação declaradamente toma no cenário inter-nacional em 1951, e como ela se adequa à situação na península coreana.

7.1 - Estados Unidos da América

Representantes: William Kelly Harrison Jr. e Charles Turner Joy

Em primeiro lugar, a política internacional estadunidense na última década, assim como na década de 1950, é marcada fortemente pela lógica da doutrina Truman, nomeada em home-nagem a Harry Truman, presidente do país no momento. Nas palavras do próprio presidente, em tradução livre:

“Creio que deva ser a política dos Estados Unidos apoiar os povos livres que resistem à tentativa de subjugação por parte de minorias armadas ou por pres-sões externas. Acredito que devemos ajudar os povos livres a construir próprios destinos à sua maneira. Acredito que a nossa ajuda deve ser principalmente através de auxílio econômico e financeiro, que é essencial para a estabilidade econômica e para os processos políticos ordeiros.”.

Isso, somado à teoria do dominó – o pensamento de que a queda de um país por influ-ência comunista seria o começo de uma cadeia de quedas, de modo similar a um efeito dominó –, resulta em uma política externa que busca mitigar a expansão geopolítica da União Soviética e nações comunistas. Essa política externa se traduz, na prática, como a política de contenção, baseando-se no suporte fornecido pelos Estados Unidos, tanto econômico quanto bélico, para nações ameaçadas pelo comunismo.

Assim, é interessante que os enviados estadunidenses consigam impor os termos mais severos possíveis sobre a Coreia do Norte e aliados, visto que estão em posição de agressores, e é de suma importância garantir a segurança e integridade futura da República da Coreia assim como sua reestruturação completa de modo a construir uma nação economicamente forte e capaz de repelir a propagação de regimes comunistas.

7.2 - Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte Representantes: Anthony Eden e Gladwyn Jebb

Assim como a maior parte das nações europeias, o Reino Unido passa por um momen-to de dificuldades econômicas e estruturais no cenário pós-Segunda Guerra. Seu exércimomen-to se encontra ainda abalado dos traumáticos confrontos da década passada. Tais fatores somados

proporcionaram um clima de medo do surgimento de um novo conflito na Europa, uma vez que, caso a guerra se escalasse na coreia, a Europa Ocidental seria o alvo principal de uma ofensiva soviética, na visão britânica.

Inicialmente, o Reino Unido tomou uma posição alinhada à posição estadunidense, con-tudo havia algumas ressalvas. Não concordava com a posição agressiva tomada pelo governo americano, principalmente por ter apontado o general MacArthur, que esteve no comando no primeiro ano de guerra, como comandante das forças da ONU. As preocupações aumentaram ainda mais em função de declarações vindas do governo americano e do general, de que estariam dispostos a usar todas as armas possíveis e prontos para destruir todas as bases soviéticas no extremo oriente e até mesmo atacar a China. Assim, o governo britânico diferia de seus aliados ao ver a Coreia como uma “obrigação distante”, ainda que, de todo modo, uma obrigação.

Assim, com a saída de MacArthur do comando e depois de conversas com o presidente Truman, o governo britânico se posicionou fielmente à posição estadunidense em busca de se-gurança em seus territórios no extremo oriente.

Logo, os plenipotenciários britânicos são enviados à conferência com o intuito de fornecer suporte sólido à posição dos Estados Unidos, grande aliado. Quanto à possíveis dissidências, o Reino Unido não se mostra disposto a tomar uma posição agressiva quanto ao lado oposto nas negociações, compreendendo que é mais interessante impedir causalidades e o escalamento do conflito do que causar danos e penas ao lado agressor norte coreano.

7.3 - República da China

Representantes: George Yeh e Tsiang Tingfu

O contexto no qual a República da China se encontra nos anos 50 é extremamente com-plexo, tendo em vista que o governo que possuía a autoridade sob todo território chinês se viu exilado na ilha de Taiwan, perdendo o controle político na parte continental da China com o sucesso da Revolução Chinesa em 1949. Desde então, o país passou a fortalecer a autoridade do governo para impedir a proliferação dos ideais comunistas.

Desde antes da eclosão da Guerra da Coreia, no entanto, os Estados Unidos já viam o caso da República da China como perdido, diminuindo seus laços com a nação. Entretanto, com o início do conflito, apoio militar e financeiro passaram a ser a forma com a qual os Estados Unidos lidariam com o Taiwan, tendo em vista que visavam a conter o avanço chinês como potência dominante na região. Tendo isso em mente, os Estados Unidos se consolidaram como principal aliado nos âmbitos econômico, político e militar, fortalecendo a situação da República da China ante à recém-formada República Popular da China.

Analisando por uma perspectiva de política externa, o governo do partido Guomindang tem preocupações com uma expansão ainda maior do comunismo na Península Coreana, tendo em vista que representaria um fortalecimento geopolítico da China Popular no Nordeste Asiático

e um isolamento regional ainda maior para a República da China. Devido a essas circunstâncias, frear a expansão norte coreana e impedir que Mao atinja seus objetivos na Coreia são as questões que nortearão a política da República da China na conferência.

7.4 - República da Coreia

Representantes: Byeon Yeong-tae e Chang Myon

A República da Coreia surgiu como fruto do governo militar estadunidense no sul da península coreana (USAMGIK) e, em função disso, compartilha uma série de pensamentos políticos e formas de atuação similares ao governo anterior. O sistema de eleição era feito de forma indireta, o que abria margem para um controle autoritário da governança, uma vez que os poucos representantes eleitos eram os responsáveis por eleger o chefe do poder executivo, ao qual era dado uma série de poderes. Isso resultou em um governo forte e autoritário, notoria-mente em suas posições de combate à qualquer ameaça comunista. Estima-se que até o ano de 1950 o governo havia prendido cerca de 60.000 pessoas por conspiração ou subversão à ordem.

Não obstante, o governo sul coreano ostenta uma notória política de “unificação pela força”. Essa se baseia no conceito de que o diálogo com a Coreia do Norte é impossível e que a mesma representa uma ameaça perene à construção de uma democracia estável e represen-tativa na península. Para que a política seja colocada em prática, isto é, para que seja possível o combate (não unicamente militar, mas econômico, cultural, social, etc...) constante aos norte coreanos, a República da Coreia dispunha de suporte constante do governo estadunidense. Des-taca-se, principalmente, os empréstimos concedidos pelos EUA, que atingem, no total, o valor do orçamento público do governo coreano.

Assim sendo, os plenipotenciários responsáveis por representar a República da Coreia possuem como principal objetivo garantir a manutenção de seu governo com um regime forte e autoritário, capaz de combater quaisquer ameaças à ordem, especialmente comunistas. Creem também os representantes que qualquer solução para o fim do conflito, que atenda às necessi-dades do governo vigente, seria aceitável, independente de ganhos ou perdas territoriais pouco significativos. Assim, para os representantes é interessante que a situação seja normalizada o mais rapidamente, pois creem em um embate fora do campo de batalha com a Coreia do Norte.

7.5 - República Francesa

Representantes: Robert Schuman e Jean Joseph Marie Gabriel de Lattre de Tassigny

Para fim de contextualização, a República Francesa, no início da década de 50, se encontra travando uma guerra no continente asiático além da guerra da Coreia, a guerra da Indochina. Pode-se afirmar que era uma guerra impopular na França, em grande parte devido às sequelas deixadas pela Segunda Guerra. Havia no país uma série de problemas econômicos e sociais con-siderados mais relevantes do que uma guerra em um local distante e que colocava em risco uma comunidade local inexpressiva de franceses. Portanto, entende-se que a agenda política francesa estava dominada por questões internas e havia muito pouco interesse em questões internacionais.

Contudo, o pouco interesse em tomar parte em questões internacionais não significou um isolacionismo ou abstenção em questões internacionais. A França votou a favor das resolu-ções 82,83 e 84 do Conselho de Segurança das Naresolu-ções Unidas, sendo ela, em conjunto com a delegação do Reino Unido, a responsável por promover a cláusula que passava o comando das forças da ONU para os Estados Unidos.

Em suma, a França, em questões materiais, não se mostra disposta a conceder qualquer forma de suporte, fora as forças do extremo oriente que já foram encaminhadas para a península. Contudo, de forma simbólica, advoga pelo direito de defesa coletiva e está disposta a promover o diálogo diplomá-tico entre as duas coreias de modo a solucionar o conflito e trazer a paz o mais rapidamente possível. Portanto, os plenipotenciários franceses comparecem à Conferência em Kaesong com o intuito de garantir a sobrevivência e segurança perenes da República da Coreia e conseguir mediar a discussão de modo a atingir os termos necessários para que se possa apaziguar o con-flito o mais rapidamente possível.

7.6 - República Popular da China

Representantes: Zhou En-lai e Hsieh Fung

A República Popular da China se encontra como a posição de uma nação recém fundada e acaba de sair de uma série de conflitos em seu território reconhecidos como a “Guerra Civil Chinesa”. O país não só possui uma economia debilitada e incrivelmente fragilizada como uma infraestrutura, que já era pouca, avassalada pelos combates em seu território. Assim, surge um questionamento: por que a República Popular da China teria interesse em tomar parte em um conflito entre outras nações, sendo que já possui uma série de problemas na esfera interna?

A resposta se resume à dois pontos: a ameaça de uma invasão americana e visão do grande timoneiro Mao Zedong. O primeiro ponto é claro e não exige explicação. Uma vez que há uma ameaça de invasão, é vantajoso que se mobilize e entre em combate o mais rapidamente para que a batalha não ocorra em solo chinês. Contudo, o segundo ponto mostra uma visão para além do óbvio. Mao acreditava que o engajamento do povo chinês na crise da Coreia seria forte o suficiente para unir a população da China sob o ideal comunista e, em última instância, sob o

tância de manter um país tampão entre o território chinês e as zonas de influência dos Estados Unidos. Assim, a manutenção da existência da Coreia do Norte era essencial para a China impedir que uma zona de influência estadunidense pudesse exercer pressão direta em fronteiras chinesas.

Sabendo disso, os enviados chineses comparecem à reunião em Kaesong com intuitos claros. É importante que consigam formular termos claros e capazes de garantir à Coreia do Norte sua soberania militar de modo a servirem como uma zona de segurança estável entre a China e a Coreia do Sul.

7.7 - República Popular Democrática da Coreia

Representantes: Coronel Chang Chun Sun e General Lee Sang Cho

Na posição de país que deu início ao conflito, a República Popular Democrática da Coreia acredita veementemente na importância de levá-lo ao seu extremo. Assim acredita que é capaz de mobilizar a população da península coreana para lutar até a vitória ser atingida.

Assim, sabendo que colocaram grandes “apostas” na mesa ao contar com a ajuda maciça do governo chinês e suporte soviético para travar uma guerra de expansão, concluem que não podem aceitar qualquer forma uma “derrota” diplomática, sendo preferível continuar a travar a guerra, por mais que possa parecer desfavorável e desgastante para o povo da Coreia do Norte.

Assim sendo, os enviados norte coreanos buscam negociar, em Kaesong, sua total e completa soberania militar e política, excluindo assim qualquer possibilidade de reunificação por meios democráticos, assim como qualquer outros pontos que engrandeçam a força e auto-ridade do recém criado Estado comunista. Apenas na pior hipótese, os enviados devem aceitar restabelecer o status quo anterior à guerra.

7.8 - União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

Representantes: Andrei A. Gromyko e Andrey Vyshinsky

A União Soviética foi, em conjunto com os Estados Unidos, uma das Nações a ocupar a península coreana ao final da Segunda Guerra, tendo ficado com a parte ao norte do paralelo 38. Já era historicamente notório o interesse Russo, e agora Soviético, em controlar aquela região. Para Josef Stalin, contudo, tratava-se de criar um limite para o avanço americano durante a campanha do pacífico na Segunda Guerra. Para tal fim, era necessário estabelecer um governo central forte para comandar a parte norte da península e que tivesse algum laço com o comando soviético. Assim, colocou-se no poder uma figura proeminente de 33 anos de idade, Kim Il Sung. Por mais que o líder tenha usufruído do suporte soviético, não confiava em tais camaradas pelo receio de ser anexado ao “império” soviético.

Surgidas as negociações acerca de uma possível reunificação, a URSS novamente se mostra favorável à desocupação da península para que se possa realizar um plebiscito, mas não admite como opção grupos com a tutela de alguma potência, como era o caso do regime monár-quico apoiado pelos Estados Unidos. Entende-se, assim, que a URSS acredita que a Coreia do Norte será capaz de trilhar o seu caminho como nação comunista e combater a oposição para formar uma só Coreia comunista.

Logo, ao passo que a guerra da coreia se inicia, a URSS se exime de qualquer envolvi-mento no ataque ou no planejaenvolvi-mento e declara que fora uma atitude tomada unicamente pelo governo norte coreano. No entanto, entende que os Estados Unidos estariam dispostos a fazer o possível para impedir a queda da República da Coreia e que, portanto, seria necessário oferecer apoio caso necessário nesta empreitada.

Tendo visto o exposto, os plenipotenciários soviéticos pretendem garantir a estabilidade e a segurança do governo norte-coreano, mas também estão dispostos a ceder em prol de uma solução diplomática que lhes permita fortalecer o governo de Pyongyang no longo prazo, visando a uma eventual unificação da península sob a foice e o martelo.

No documento Conferência de Kaesong (páginas 29-36)

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