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2. PATRIMÔNIO GEOLÓGICO E DESENVOLVIMENTO

2.2 POSSÍVEIS IMPLICAÇÕES DO PATRIMÔNIO

NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DE UM

TERRITÓRIO

Mas como “internalizar” o patrimônio geológico como um ativo no desenvolvimento do território? Uma resposta que facilmente surge é a integração de tais geossítios num plano de turismo local, entrelaçado, inclusive, a outras esferas patrimoniais (cultural, ecológica, arquitetônica, etc.). Mas em que aspectos tal oferta turística pode se colocar como um fator diferenciador para “produto” e território, que apresente originalidade e características próprias?

Kastenholz (2008) fala sobre a dinamização e valorização de territórios (sejam eles localidades ou mesmo países) por meio de uma estratégia de marketing, o qual a autora define como uma “imagem de marca” para atingir um “valor de mercado acrescido” para um conjunto de áreas de atuação (econômica social ou cultural).

Um mesmo território, no entanto, está sujeito a “vendas múltiplas” devido a gama diversificada de atividades que abriga, aos diferentes atores locais que incluem os residentes, os agentes econômicos (do setor primário, da indústria, do comércio e outros serviços), os investidores, as organizações sem fins lucrativos, os organismos públicos, os políticos, etc., com interesses, não raro, conflitantes. Neste sentido, Kastenholz (2008) sugere um tipo de “marketing integrado e sustentável do território”, baseado na integração de todos os stakeholders (interessados e afetados pelo desenvolvimento territorial) na definição desta estratégia de marketing por intermédio da formação de uma “rede territorial”.

“Ora, na medida em que os atores locais/regionais reconhecem que são uma comunidade de interesses com objetivos comuns, podem obter grandes benefícios se souberem coordenar-se e desenvolver uma estratégia conjunta, alocando recursos (...) para um fim comum. Igualmente importante é a definição da estratégia com base num bom conhecimento das especificidades do território e das suas populações, dos aspectos únicos a preservar (sobretudo ao nível do

ambiente e da cultura) e das capacidades e potencialidades existentes e por explorar” (KASTENHOLZ, 2008, p. 3).

Levando em consideração os interesses análogos que podem existir entre os diferentes atores do território, o desenvolvimento territorial pressupõe a negociação entre os mesmos, de modo a encontrar uma zona de convergência em relação aos novos projetos (CAZELLA; BONNAL; MALUF, 2009).

Kastenholz (2008) diz que a imagem de marca territorial identificada e promovida tem um impacto tão positivo quanto melhor transmitir uma identidade do lugar, ou seja, corresponder aquilo que mais distingue este território de outros e aquilo com que a população se identifica e de que se orgulha. Segundo Benko e Pecqueur (2001) as especificidades de cada território podem lhes conferir ótimas vantagens competitivas no campo econômico. Fernandez (2008) também menciona que o aproveitamento dos recursos endógenos territorialmente colocados a partir da ação conjunta de atores públicos e privados gera competitividade.

O patrimônio geológico pode significar uma imagem de marca de um território, como o que acontece nas áreas onde se tem implantado geoparques, por exemplo. Uma forma de incorporá-lo seria por meio do geoturismo, que é um segmento capaz de trazer diferenciação tanto para o “produto” (patrimônio geológico) como para o território.

O geoturismo amplia os tipos de aproveitamento dos geossítios e valoriza aqueles que não se pensaria incluir em uma oferta turística tradicional, pois não se baseia somente na apreciação estética ou contemplativa, mas na interpretação daquilo que se vê, na explicação dos materiais, formas e fenômenos, incluindo assim sítios sem um apelo estético, mas com valores principalmente educativos e científicos.

Desta maneira, um território que valoriza e divulga seu patrimônio geológico, além das implicações no turismo, pode também se projetar como uma referência no âmbito da pesquisa e do ensino de Geociências. Promove com isso, tanto impactos na economia como aqueles difíceis de quantificar sob a ótica monetária, mas que também estão diretamente relacionados à ideia de desenvolvimento, como questões de identidade e pertencimento, satisfação e orgulho coletivos, bem-estar social e a própria geração de conhecimento (formação de

novos profissionais, objeto de estudo para projetos de pesquisa, publicações, etc.).

Identificado e promovido como uma imagem de marca territorial, o patrimônio geológico passa a ser um conceito transversal, ou seja, pode ser incorporado em menor ou maior grau pelo conjunto de atores locais em suas atividades econômicas, ampliando-as, diferenciando-as ou mesmo criando novas frentes de atuação.

Em alguns setores esta conexão é mais facilmente construída por conta da íntima relação com a atividade turística em geral (inclusive o geoturismo), como a rede hoteleira, incluindo também pousadas, chalés e campings, os restaurantes, cafés e bares, as agências de transporte local, de turismo e de esportes de aventura e o comércio, com destaque para aquele voltado para fabricação de produtos artesanais e

souvenirs. Tais atividades constituem os serviços básicos para recepção,

condução, hospedagem e alimentação do visitante, além do lazer, aquisição de lembranças e demais produtos locais. Este é um canal de consumo e geração de renda, lembrando que em muitos destes casos haverá também uma demanda por mão de obra qualificada, específica inclusive.

O patrimônio geológico não é o produto de consumo no sentido

stricto sensu, mas consiste no poder de atração do território e que acaba

desencadeando a permanência do visitante no local e os diferentes tipos de consumo por ele realizado. Além disso, elementos do patrimônio geológico local podem ser incorporados na gastronomia (pratos que imitem algum material ou processo geológico) no tipo de artesanato,

slogans relacionados ao comércio, hotéis ou pousadas temáticas, dentre

outras possibilidades que agreguem valor às atividades econômicas já existentes, um diferencial relacionado à imagem de marca construída. Há que se pensar, inclusive, em conexões com atividades não tão facilmente relacionadas, como a indústria, a agricultura e outras que possam existir.

O perfil do território, traçado com base na caracterização natural, econômica, histórica e cultural do mesmo, a definição de quem são os atores locais e como atuam, quais seus interesses, influências e os projetos de desenvolvimento que defendem para o território, permitirá avaliar se a economia é razoavelmente estruturada, se há um tecido social minimamente articulado e atores sociais relativamente capazes de

ação coletivas, de modo que os atributos usualmente destacados para o “sucesso” do desenvolvimento territorial (capital social, identidade territorial, etc.) estão, pelo menos incipientemente, presentes. A partir deste cenário construído será possível analisar e discutir a incorporação da categoria que aqui se ressaltou, o patrimônio geológico, no desenvolvimento de tal território.