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1. GEODIVERSIDADE, PATRIMÔNIO GEOLÓGICO E

1.3 GEOCONSERVAÇÃO: DIFERENTES CONCEPÇÕES E

1.3.2 Uma breve história da geoconservação

Ao tratar da história da geoconservação, alguns autores iniciam seus relatos com a própria história da conservação da natureza. Segundo Gray (2004, p. 175), “a conservação, provavelmente, tem uma longa história, mas, como uma atividade organizada com apoio governamental, tem seu marco inicial nos Estados Unidos”. Esforços conservacionistas em prol da vida selvagem e de outros aspectos naturais se intensificaram a partir da segunda metade do século XIX e como resultado disso, em 1864, o Vale de Yosemite (Califórnia) tornou- se uma área protegida, e posteriormente Parque Nacional. Em 1872 foi criado o primeiro Parque Nacional do mundo em Yellowstone, que de acordo com Moreira (2008) teve uma forte motivação geológica para tal, visto ser o local de uma das maiores concentrações de atividade

geotérmica do Planeta, quedas d’água impressionantes, o Canyon do Rio Yellowstone e uma das maiores caldeiras do mundo, com 75/45 km de diâmetro (GRAY, 2004). Urquí; Martinez e Valsero (2007) também vão dizer que os elementos geológicos estão presentes nos primeiros passos da conservação da natureza e na declaração dos primeiros parques nacionais do mundo, criados nos Estados Unidos. Muito outros parques que foram surgindo depois disso se destacavam pelo apelo geológico e cênico, mesmo que a ênfase subsequente da conservação tenha se pautado sobre a vida selvagem. O primeiro parque do Canadá, criado em 1887 em Banff, é caracterizado por paisagens montanhosas e glaciares, enquanto que o Parque Nacional de Tongariro, criado em 1887 na Nova Zelândia, visava proteger a espetacular paisagem vulcânica.

Na Europa o movimento conservacionista vai ganhar corpo ao longo do século XX e, juntamente com a Austrália e Nova Zelândia, alguns países europeus, como o Reino Unido, vão constituir o “berço” da geoconservação. Não que ações de geoconservação não tivessem existido até então, elas existiram, como foi mencionado acima em relação aos parques americanos, mas tanto o termo geodiversidade como geoconservação ainda não haviam sido mencionados.

Segundo Ellis et al. (2008) em 1912 foi criada no Reino Unido a Sociedade para Proteção das Reservas Naturais, e, gradualmente, os sítios que mereciam ser conservados foram sendo identificados de forma sistemática. Em 1943 foi estabelecido um Comitê de Investigação de Reservas Naturais (NRIC), o qual possuía um braço voltado para as reservas geológicas. Essa comissão identificou 390 sítios geológicos na Inglaterra e País de Gales, sendo que mais 60 foram listados posteriormente na Escócia. De acordo com os autores, este trabalho inicial levou a um maior envolvimento governamental nas questões da conservação, culminando em uma legislação específica (inclusive amparando aspectos abióticos) no final dos anos 40.

Lima (2008) aponta que desde o estabelecimento das bases governamentais de conservação em 1949, a identificação de sítios de proteção tornou-se a principal ferramenta de conservação da natureza no Reino Unido. Grande parte dos sítios levantados se tornaram Locais de Especial Interesse Científico (Sites of Special Scientific Interest – SSSI), um mecanismo de conservação que confere proteção legal aos sítios

identificados com importância científica pela sua flora, fauna, geologia ou características geomorfológicas (ELLIS et al., 2008).

A Inspetoria de Conservação Geológica (Geological

Conservation Review), instituída em 1977, foi um passo importante na

efetividade do sistema de SSSI britânico. Este programa seria responsável por inspecionar, avaliar e selecionar SSSIs de interesse geológico. Após muitos anos de trabalho, um banco com mais de 3000 sítios foi gerado, constituindo um dos principais instrumentos da geoconservação no Reino Unido (ELLIS et al., 2008).

Segundo Pemberton (2007), a conservação de aspectos geológicos significativos na Austrália tem suas raízes na proteção de importantes sítios rupestres em 1870. Nas décadas de 60 e 70 do século XX outras ações pontuais movidas pela Sociedade Geológica da Austrália incentivaram a proteção de sítios como a Hallet Cove (pequena praia rochosa com falésias, estrias glaciais e vestígios arqueológicos), no sul do país. Neste momento, vários estados australianos iniciaram inventários de monumentos geológicos em seus territórios, sendo que algumas das áreas identificadas vieram integrar posteriormente a lista do Patrimônio Mundial, como a região selvagem da Tasmânia (PEMBERTON, 2007).

Em território australiano as iniciativas de geoconservação mais organizadas começaram a ser desenvolvidas justamente na Tasmânia, na década de 80. Inicialmente, sem fazer qualquer referência ao termo, pesquisadores da Sociedade Geológica da Austrália já desenvolviam estudos em torno do “patrimônio geológico” ou “monumentos geológicos” em seu território, e seus estudos possibilitaram a inventariação de um conjunto de sítios com interesse científico e didático, além de contribuir para as discussões sobre a importância da inclusão destes elementos nas políticas de conservação da natureza naquele Estado da Austrália (SHARPLES, 2002).

A Nova Zelândia também possui uma longa história de conservação da natureza que tem como marco a criação do Parque Nacional de Tongariro, em 1887, o qual cobre uma área vulcanicamente ativa, além de possuir reservas com feições cársticas, fenômenos geotérmicos e fósseis. O país possui um inventário de geoconservação com mais de 3500 sítios (DIXON, 1995 apud PEMBERTON, 2007).

Em relação ao continente europeu, outros países se destacaram na vanguarda das iniciativas em geoconservação, pautadas principalmente na criação de parques com apelo geológico e geomorfológico, proteção legal de monumentos geológicos (sítios específicos) e trabalhos de inventariação de geossítios. Espanha, Portugal, França, Itália e Suíça figuram entre os principais.

É neste contexto que o conceito de geoconservação vai sendo construído, conquistando espaço e ganhando força dentro das esferas das instituições de pesquisa e ensino, daquelas ligadas à conservação da natureza e mesmo no meio político.