CAPÍTULO II – O PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE
4.2 POSSE DE ESTADO DE FILHO
4.2.1 INTRODUÇÃO E DIREITO COMPARADO
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Adotado por boa parte das legislações de outros países
28, a teoria da posse do
estado de filho ainda não foi incorporada pelo ordenamento jurídico pátrio.
O seu surgimento se deu a partir do momento em que se pode constatar a
existência de duas realidades no que se refere à paternidade: uma de aspecto biológico
e outra de aspecto psicoafetivo, existente na convivência duradoura e presente no
ambiente social, capaz de assegurar ao filho não só um nome de família, mas amor,
dedicação e abrigo assistencial
29.A paternidade concebida sob o prisma da posse do
estado de filho propiciaria, portanto, a garantia de estabilidade social.
4.2.2 CONCEITO
Para conceituar o que seja posse de estado de filho, é mister que se faça menção
ao que seja posse de estado de pessoa:
São pois atributos que fixam a condição do indivíduo na sociedade, e se pr um lado constituem fonte de direitos e de obrigações, por outro lado fornece as características personativas pelos quais se identifica a pessoa, ou seja, é o retrato que a sociedade faz do indivíduo.30
Possuir um estado é ter de fato o título correspondente, desfrutar das vantagens a
ele ligadas. Para o estado civil é de suma importância o estado de família e, de modo
especial, o estado de filiação, que poderia decorrer tanto do nascimento (fato) quanto
28 O instituto da posse de estado de filho é adotada pelos principais sistemas jurídicos europeus. Na França, deixou de ser um simples meio de prova para sustentar uma declaração de paternidade, tornando-se, logo, um modo autônomo para o estabelecimento da filiação.
Para tanto, o legislador francês estabeleceu o seguinte:
“ Art.334-8: a filiação natural é legalmente estabelecida pelo reconhecimento voluntário.A filiação natural pode também se achar legalmente estabelecida pela posse de estado ou efeito de um julgamento.” 29 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade.Posse de estado de Filho. Paternidade Socioafetiva.pg.53. Editora Livraria do Advogado, 1ª. Edição.Porto Alegre, 1999.
da adoção (ato jurídico).O estado de filho confere, portanto, várias espécies de direitos
ao seu detentor, sendo, ainda, imprescritível, irrenunciável e não admitindo transação.
Posse de Estado de filho seria, portanto, uma relação afetiva, intima e duradoura,
evidenciada pela reputação frente a terceiros como se filho fosse, e pelo tratamento
existente na relação paterno-filial, havendo por parte de ambos os respectivos
chamamentos (pai e filho).
4.2.3 ELEMENTOS
Segundo a doutrina, a posse de estado de filho poderá ser caracterizada por
intermédio dos seguintes elementos:
a)nome:deverá utilizar o nome do pai, ou aquele pelo qual se identifica;
b)trato
31: deverá o genitor tratá-lo como filho e contribuir material e afetivamente
para a sua formação física, intelectual e espiritual;
c)fama: representa a exteriorização daquilo que se tem no interior afetivo, ou seja, a
demonstração pública de consideração e afeição filial.
A estudiosa francesa Martine Rémond, ao analisar o assunto, propõe que existiria
uma certa hierarquia entre os elementos supracitados.Para ela, o trato (tratactus) tem
lugar especial dentre estes requisitos, pois, por intermédio deste seria expressa a
vontade dos interessados, consistindo numa confissão implícita de estado.
31 Distingue-se a reputação do tratamento a partir da constatação de que são duas realidades distintas. Consoante a doutrina de Tomás Oliveira e Silva, em sua obra “Filiação – Constituição e Extinção do respectivo vínculo:
“A reputação é a realidade subjetiva: convicção por parte do investigado de que é o pai do investigante.O tratamento é uma realidade objetiva; um conjunto de manifestações, de atos voluntários do pretenso pai, de cariz moral, econômico e social, tendo como destinatário o pretenso filho, em termos que legitimem o juízo de que a sua motivação é, exatamente aquela convicção de paternidade.”