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5. USO E CONSERVAÇÃO DO BUTIAZEIRO EM SANTA VITÓRIA DO

5.5 Avaliação das potencialidades econômicas, sociais e ambientais de uso

5.5.2 Potencialidades socioculturais

Do ponto de vista sociocultural, verificou-se que a planta do butiazeiro está associada à Santa vitória do Palmar, estando presente na história do município desde a sua formação e dando origem ao seu nome, mas que, atualmente, restam somente alguns exemplares se comparado ao que pode ser um palmar com 200 a 500 plantas por ha de indivíduos do butiazeiro. Neste sentido, Molina (2001) realizou uma pesquisa de campo e quantificou, nos palmares do Uruguai, o seguinte resultado, para os palmares de San Luis e Castilhos, uma quantia de 484 indivíduos de butiazeiro em média por hectare.

Os palmares ainda estão presentes no hino do município, o qual faz menção àqueles que já foram extintos. Além disso, é uma planta típica da cidade desde a sua criação, podendo ser encontrada em muitos lugares, em casas dos moradores da cidade, os quais mantêm as plantas pela sua beleza, com fins paisagísticos e até para consumo do fruto. Para Santos (2009, p. 13-14), o

butiazeiro pertence ao patrimônio cultural e da identidade da população santa- vitorienses, seja através da literatura, música, pintura, teatro e diversas manifestações artísticas do qual o butiazeiro está presente. Estas ações são verificadas através de programas de rádio, onde ressaltam a importância do butiazeiro: ―As palmeiras de Santa Vitória são consideradas patrimônio natural do município, cabe a nós preservá-las.‖ ―Elas são nossa referência, nossa cultura, nosso tesouro‖ (SANTOS, 2009, p. 13-14).

Os cuidados do butiazeiro pelos agricultores com vistas a sua conservação estão mais do que associados à dimensão sociocultural. Neste sentido, quando questionados os agricultores sobre a importância da conservação do butiazeiro, os mesmos afirmaram que:

[...] Santa Vitória é do palmar, palmar já tem no nome, vão mudar se terminar,vai ficar só aquelas que plantaram na entrada de Santa Vitória. Mas é patrimônio nosso. É nosso. Eu desde que me conheço por gente, Santa Vitória do Palmar é palma, é palmeira, então, tem que preservar, tem que haver alguma coisa, alguma ajuda. Alguma coisa como tão ajudando lá para cima a manter áreas nativas, tem que ajuda também Santa Vitória (Agricultor 1).

Já temos a origem Já temos a origem de Santa Vitória do Palmar porque existia palma, infelizmente, agora, não existe nem uma terça parte do que existia antes, mas eu acho importante isso aí de preservar (Agricultor 5).

Eu acredito que, aqui, é tradicional, maioria deve gostar, é da cultura, da tradição, do nome do município, é do povo daqui, é um produto extremamente local, ainda não explorado comercialmente, não sei se vai ser, mas é da nossa cultura, o butiazeiro leva o nome de Santa Vitória onde quer que vá, é Santa Vitória é butiá, é palmar, é que igual o coco na Bahia. Não precisa nem ser comercial, com a função de preservação já é o suficiente, só preservar, eu acho que já é o suficiente. Só usa, só consumir, no mínimo é mais uma fonte de alimento, não sei valor nutritivo, mas só como usa, com prazer de comer a fruta já é interessante(Agricultor 11).

Nesta abordagem, verifica-se que os usos do butiazeiro resistem ao tempo, mas, sobretudo, aqueles cuja vinculação se remete à cultura desta população, a qual se criou desde sua infância em locais onde havia a planta do butiazeiro, os quais procuram manter as tradições de uso dos frutos e das folhas e em certo momento desenvolvendo novas utilidades da planta, desta forma coevoluindo com o ambiente. Estas afirmações colaboram com as evidências descritas por BÜTTOW, (2008) e BÜTTOW et al., (2009) os quais concluíram

que transparece uma relação socioafetiva do ser humano com a planta do butiazeiro, sendo esta estabelecida desde a sua infância. Verifica-se uma relação de afetividade e de respeito à planta do butiazeiro nas comunidades entrevistadas durante a pesquisa.

A relação de respeito e afeto do ser humano com a planta também pode ser evidenciada no trabalho de Oliveira et al. (2009, p. 103) na pesquisa sobre o Palmar de Tiburcio e os Currais de Palma, onde verificaram a maneira como o senhor Tiburcio cuidava das plantas de butiazeiro, procurando aproveitar as mudas que estavam entre outros arbustos e também coletando as plantas que estavam em locais com risco de serem pisoteadas pelo gado. O senhor Tiburcio, a fim de preservar a planta do butiazeiro selecionou uma área de um hectare de terra e plantou entre quinhentas e seiscentas delas. Sendo estes cuidados frutos da experiência sobre como cuidar da planta e principalmente a sua relação de afeto com a planta.Esta relação de cuidado é descrita nas palavras do seu filho ―[...] eu aprecio muito as palmas, não vou deixar que sequem, tão pouco que sejam tiradas ou queimadas‖.

Ainda contribuindo com relação à afetividade do homem como a planta do butiazeiro, Santos (2011, p. 11) descreve os palmares de butiazeiro:

É impressionante como os conjuntos naturais de Butia odorata produzem lugares de grande beleza plástica e agradável sentimento de harmonia, criando patrimônios cênicos incríveis que, sem dúvida pela beleza, raridade e singularidade são patrimônios naturais uruguaios espetaculares que devem ser preservados de qualquer forma (SANTOS, 2011, p.11).

Neste sentido, ainda tratando da questão da afetividade, em sua pesquisa, Chaves (2005, p. 56) entrevistou um engenheiro agrônomo que tem forte ligação afetiva com butiazeiro, podendo destacar a parte de sua fala: ―Vamos à luta e como disse: daqui alguns anos ninguém vai saber porque chamam Santa Vitória do Palmar e nós temos que conservar e manter e vamos brigar, lutar pelos nossos palmares, pelo nosso butiá‖.

O butiazeiro antigamente era utilizado de diversas formas desde o uso das folhas na fabricação de artesanato e até a utilização dos seus frutos. Uma das características peculiares da utilização dos frutos do butiazeiro era amêndoa

do coquinho do butiá, a qual era torrada no forno e, após, quebrado coquinho para retirar amêndoa, a qual era consumida ao natural ou eram preparados produtos como a ―rapadurinha‖ e outros doces que as pessoas mais velhas da região faziam e ensinavam a seus filhos. Atualmente, verifica-se que o uso dessa parte do butiazeiro é pouco aproveitada, ainda que existam relatos, entre os agricultores, sobre a sua efetiva existência. O potencial sociocultural do butiazeiro parece que está adormecido, as pessoas sabem como usá-lo, mas, hoje, como seus pais não estão mais presentes, parece que se perdeu a tradição de fazer tal uso, como é relatado pelo agricultor 8:

A gente faz suco do butiá, come o butiá como fruto e geleias. É a minha mãe, a gente não faz, mas a minha mãe fazia na época da amêndoa que tem dentro do coco, ela fazia rapadura daquilo. Quebrava, moía direitinho e fazia rapadurinha, igual rapadura de coco, se faz do butiazeiro também, hoje não faz mais porque minha mãe faleceu e a gente nunca mais fez.

O butiazeiro tem potencial cultural a ser resgatado, pois verificou-se durante a realização da presente pesquisa com base nos relatos nos relatos dos agricutores que antigamente a planta era mais valorizada, a variedade de usos das plantas era bem maior e, atualmente, percebe-se que embora ele seja reconhecido como parte da identidade da comunidade. O butiazeiro requer novos modos de manuseio, a sua reinserção na rotina das famílias, a sua efetiva utilização como recurso alimentar, a ampliação do seu potencial paisagístico, entre outros aspectos.

Brack (2007, p.1769) ressalta que desconhecimento das frutas nativas não é um fato isolado e desvalorização destas frutas é um fator cultural, resultado de uma cultura imediatista e tem como resultado o que¿. A desvalorização de nosso patrimônio representado pela biodiversidade é algo cultural, resultado de visões imediatistas: ―[...] o modelo agrícola promove, basicamente, o cultivo de espécies exóticas através de monoculturas, com resultados ecológicos e econômicos, geralmente, pouco sustentáveis‖.