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Pré-golpe e os primeiros dias de abril: a ESALQ/USP na mira dos fuzis

Paranoia: “Psicose caracterizada por delírios sistemáticos, mas sem demência, ou muito pouca. O delírio de grandeza ou o de perseguição (um dos dois ou ambos) são as características mais salientes e as que o paciente defende com todas as aparências de lógica e razão em seus argumentos” (CABRAL, 1979).

Bertold Brecht (1898-1956), Intertexto Primeiro levaram os negros Mas não me importei com isso Eu não era negro Em seguida levaram alguns operários Mas não me importei com isso Eu também não era operário Depois prenderam os miseráveis Mas não me importei com isso Porque eu não sou miserável Depois agarraram uns desempregados Mas como tenho meu emprego Também não me importei Agora estão me levando Mas já é tarde. Como eu não me importei com ninguém Ninguém se importa comigo. (UNIOESTE, s/d)

Nos hemos declarado partida partidarios de los que luchan por la paz. Nos hemos declarado dentro del grupo de países no alineados a pesar de ser marxistas leninistas porque los no alineados como nosotros luchan contra el imperialismo. Discurso pronunciado por Ernesto Che Guevara, representante de Cuba, el 11 de diciembre de 1964 ante la Asamblea General de las Naciones Unidas (GUEVARA,2012) “Que falem os acadêmicos. Que se digam aqui palavras brilhantes, mas que ninguém desconheça que lá fora o povo ulula, o povo clama, o povo desperta, o povo se politiza e, na medida em que ele desperta, ulula e se politiza, vai desconhecendo a existência de um Congresso que tem estado alheio às soluções mais profundas exigidas pelo povo. Nós outros, que temos estado em contato com essas camadas mais esmagadas do povo brasileiro, nas poucas vezes em que aqui chegamos não compreendemos mais a linguagem deste Congresso, não mais sentimos este Congresso.” Discurso de Francisco Julião Arruda de Paula (PSB), no dia 31 de Março de 1964 no Congresso Nacional, dias antes de perder os direitos políticos (JULIÃO, apud SANTIAGO, 2001, p.14).

No pós-Segunda Guerra (1945), ocorreram alterações nas relações políticas e econômicas internacionais. Os Estados Unidos da América e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas constituíram-se como superpotências, modificando as relações e o mapa geopolítico internacional. Esse contexto internacional foi conhecido como “Guerra Fria”.

Nesse período, qualquer ameaça aos Estados Unidos e suas zonas de influência eram encaradas de forma agressiva. Por isso, nesse contexto pré-golpe de 1964, as atividades dos serviços secretos estadunidenses estavam operando a todo o vapor no Brasil, inclusive com a colaboração de muitos brasileiros, como foi o caso do tenente-coronel Castelo Branco, posteriormente, agraciado como o primeiro presidente da ditadura. Castelo tinha fortes laços de amizade com seu ex-companheiro de batalha nos campos italianos, durante a segunda guerra mundial, o estadunidense Veron A. Walters, adido militar da embaixada dos Estados Unidos no Rio de Janeiro. Esta relação íntima de amizade entre os ex-combatentes proporcionou ao governo ianque acesso a informações privilegiadas do campo militar brasileiro no contexto do golpe de 1964, facilitando a logística do golpe de Abril. (FICO, 2008, p. 20)

É oportuno mencionar que essa política intervencionista e imperialista dos EUA é anterior e pode ser evidenciada claramente com o “corolário Roosevelt” de 1904, quando o governo ianque permitia-se trabalhar como a polícia das américas, intervindo nos países latino-americanos para prevenção de “ataques externos” ou para coibir casos de “injustiça”. Posteriormente, a política intervencionista continuou com a proclamação da Doutrina Truman em 1947, quando os governos dos Estados Unidos aprofundaram a política imperialista de intervenção em todo globo terrestre, legitimados pelo “destino manifesto”114, a ideologia que expressa a crença de que o povo dos Estados Unidos é eleito por Deus para comandar ou administrar o mundo e expandir sua “raça”. Abençoados divinamente são legitimados a intervir no globo como, onde e quando quiserem. (cf. KARNAL, 2001)

No plano internacional da Guerra Fria, o “vilão” a ser combatido vestia vermelho, era de esquerda e falava russo, hoje isso realternou, o “inimigo” agora é barbudo, árabe e terrorista115. No discurso oficial, tratam-se de povos ultrapassados, incivilizados e que são atormentados por terríveis ditaduras e, portanto, necessitam aprender os valores da “liberdade” e da “democracia”, mesmo que por meio da força bélica. Historicamente, para fomentar seu poder na América Latina, o comando militar das Forças Armadas

114 Sobre o Destino Manifesto ver: (KARNAL, 2001; NARO, 1987)

115 Apesar que no plano nacional brasileiro, as organizações de esquerda ainda são os “bodes expiatórios”, exemplo disso é a perseguição contra os movimentos sociais, como o MST ou o MTST.

estadunidenses foi concentrado no Colégio Interamericano de Defesa, sediado no Forte Lesley J. McNair em Washington, criado em 1950, e na Escola das Américas, situada na Zona do Canal do Panamá, fundado em 1961.

O ano de 1961 é decisivo para compreender a mudança de postura dos EUA com a América Latina, pois foi nesse ano que o governo de Fidel Castro, após a vitória contra o regime ditatorial pró-EUA em 1959, optou em 1961 pelo regime de orientação socialista, “embora já fosse visível desde antes, em função de medidas como a nacionalização de propriedades norte-americanas e a rápida reorientação da venda do açúcar cubano para a União Soviética e a China" (FICO, 2008, p. 23)

Nesse mesmo ano, os Estados Unidos, por meio de um exército mercenário, organizou uma invasão à Cuba na tentativa de derrubar o governo de Castro e retomar suas atividades econômicas na ilha; porém, foram derrotados. Foi também em 1961 que ocorreu a primeira tentativa de golpe de Estado no Brasil, quando as forças militares tentaram impedir a posse de João Goulart que estava em viagem diplomática na China Comunista e deveria assumir o lugar de Jânio Quadros. Na época, o Brasil adotava uma linha política relativamente independente das vontades do imperialismo estadunidense e ousava ter uma dinâmica autônoma e nacionalista, negociando com todos os países com que mantinha relações diplomáticas, fossem capitalistas ou socialistas.

Essa política nacionalista e independente do Brasil não agradou o imperialismo. De acordo com documentação secreta dos arquivos dos Estados Unidos e revelados recentemente, em 1962, o governo de Washington por meio de lobby patrocinava partidos políticos, associações e outras entidades para derrotar o governo brasileiro, que pretendia aprovar a lei de remessa de lucros. Grosso modo, a lei previa limitar o envio de lucros das empresas multinacionais para seus países de origem, pois essas transferências interferiam nas possibilidades do Brasil desenvolver-se com independência, já que além de nossos recursos naturais serem explorados e exportados, o lucro dessas atividades também não ficava no país. Tratava-se de uma prática imperialista que impedia que o trabalho realizado aqui beneficiasse a moeda e o povo brasileiro.116

116 A organização Memórias Reveladas publicou em sua página oficial que: “Documento secreto (cód. 1316335_52554), datado de 1962, estabelece "recomendações para políticas e operações" do governo norte- americano frente às eleições parlamentares brasileira de 1962. Entre as recomendações, consta a de apoiar "elementos que estão trabalhando para modificar ou derrotar a lei que limita a remessa de lucros" (por parte de empresas multinacionais). Esse e outros documentos foram desclassificados pelo governo norte-americano em 2015 e entregues ao governo brasileiro. Podem ser consultados por qualquer pessoa no Arquivo Nacional. (BRASIL, s/d) e (BRASIL, 2010)

Em 1962, outra questão delicada que colaborou com o clima de “paranoia” foi a crise dos mísseis, quando a URSS iniciou a instalação de mísseis na ilha cubana em resposta à instalação de mísseis pelos EUA nas fronteiras da cortina de ferro, especificamente na Turquia.

Todo esse clima de instabilidade que vivia a região da América Latina tinha relação direta com a questão da implantação de um regime socialista no lugar que era o antigo “quintal” dos Estados Unidos. Concomitantemente, a região também despertava para o surgimento e fortalecimento de outros movimentos sociais de esquerda, como as “Ligas Camponesas” no Brasil ou o “Sendero Luminoso” no Peru, provocando o aumentou das atividades de espionagem e vigilância dos Estados Unidos. Foi nessa época, que o imperialismo passou a fomentar ilegalmente oposições aos governos que se atreviam a conduzir seus países autonomamente, mesmo que tivessem sido eleitos democraticamente, como foi o caso de Salvador Allende no Chile.

Nesse sentido, a estratégia de dominação dos Estados Unidos na América Latina envolvia três táticas principais: o treinamento militar por meio da chamada doutrina “antiinsurrecional”, a promoção de golpes de Estado e o combate à pobreza por meio de programas sociais que objetivavam a modernização capitalista dependente, atrelados aos interesses dos EUA. Entre eles estavam a Aliança para o Progresso, lançada em 1961, a USAID e os corpos da paz (Peace corps117). Na época, Robert Mcnamara, secretário da defesa dos EUA (1961 a 1968), afirmava que o crescimento econômico do Brasil e seus vizinhos era condição de segurança dos Estados Unidos, pois a pobreza era a semente da revolução socialista, tal como aconteceu em Cuba, e por isso era necessário, por todos os meios, evitar o surgimento de uma nova Cuba no continente americano. (FICO, 2008, p. 26)

Com o lançamento da Aliança para o Progresso, em 13 de março de 1961, na presença de embaixadores de todo o continente, Kennedy passaria a galvanizar as atenções dos governos latino-americanos. (...)Ademais, a administração da Aliança seria confiada à Agência para o Desenvolvimento

117Criado na gestão de John Kennedy, esse programa tinha o objetivo de selecionar jovens norte-americanos,

especialmente estudantes, para atuar em programas sociais em países pobres ao redor do mundo, incluindo o Brasil. O Peace Corps era uma vitrine eficiente para propagar no mundo uma imagem positiva dos EUA, especialmente em áreas carentes e propícias ao sentimento nacionalista e anti-imperialista de esquerda. “Os integrantes dos Corpos da Paz ensinavam noções de higiene, técnicas de cultivo e trabalhavam até na alfabetização. No Brasil, os primeiros grupos chegaram em 1962.” (MOTTA, 2014, p. 88). Em 1967, havia 632 norte-americanos atuando em projetos de merenda escolar, cooperativas agrícolas e controle de esquistossomose, entre outros. [...] no final de 1970, havia 450 voluntários no país e, entre 1973 e 1975, o número caiu ainda mais, oscilando entre 300 e 400. Noventa por cento dos participantes eram jovens recentemente graduados em cursos universitários. A maioria trabalhava com formação de cooperativas agrícolas e outras atividades de apoio à população rural, ou em projetos de habitação, serviço social e educação. ” (FICO, 2008, p. 30-31)

Internacional (U.S Agency for Intenational Development – USAID), que, no final de 1961, estava apenas começando suas atividades, pois, em setembro, o Congresso norte-americano havia reorganizado todos os programas de assistência externa até então existentes, inclusive separando aqueles de natureza militar dos demais, e a USAID foi estabelecida em novembro para cuidar da assistência econômica. A inexperiência norte- americana em relação à América Latina e uma administração excessivamente burocratizada – que estava longe de corresponder aos anseios transformadores dos operadores de projetos específicos – foram a causa de muitos equívocos iniciais. Além disso, a contradição básica da abordagem de Kennedy dificultava a realização da Aliança para o Progresso como um todo: por mais que muitos de seus executores se engajassem sinceramente nos projetos voltados para a melhoria das condições de vida na América Latina, a moldura ideológica imposta por seus formuladores – que a delineavam sobretudo como um instrumento de combate ao comunismo no contexto da Guerra Fria – terminava por limitá-la (FICO, 2008, p. 27-28) ”

Os militares (exército e polícia) do Brasil e outros países latino-americanos foram fortalecidos e passaram a receber financiamentos e treinamentos teóricos e práticos por militares dos Estados Unidos, especialmente na Escola das Américas sediada no Panamá, famoso centro de ideologização anticomunista. (FICO, 2008, p. 25)

As teorias da modernização não se ocupavam apenas de mudanças sociais, elas também incluíam políticas de segurança: era preciso dotar os Estados latino-americanos de forças repressivas modernas, capazes de fazer frente às ações do comunismo, que, afinal, era inimigo perigoso por seus laços com a URSS, potência capaz de rivalizar com os Estados Unidos no campo militar. Se a modernização econômico-social não fosse suficiente para conter a revolução, as forças militares e policiais deveriam estar preparadas. Daí os programas de treinamento para policiais e militares nos Estados Unidos e no Panamá, a venda de equipamento e o envio de assessores para treinar as forças policiais. ” (MOTTA, 2014, p. 112)

Por isso, em resposta a Cuba e ao perigo que o socialismo representava aos interesses capitalistas de Washington, ao mesmo tempo em que se reforçava o exército e a polícia anti- comunista, foram lançados programas de modernização econômica e social por meio de grossos investimentos, que foram acentuados no período posterior ao golpe de 1964

Em 1962, na área da educação e extensão agrícola, cabe mencionar outro projeto dos EUA com filosofia semelhante. Foi o Rural Industrial Technical Assistence (RITA), projetado pelo professor Morris Asimow, da Universidade da California, Los Angeles (UCLA). Por meio de financiamento do governo dos EUA via USAID, foi estabelecido na região Nordeste do Brasil (especialmente no Cariri cearense) um projeto para o incentivo de atividades econômicas entre os pobres por meio de formação técnica e estimulação de

abertura de empresas. Consta que esse projeto foi posteriormente exportado para outros países da América Latina (MOTTA, 2014, p. 88)

Nesse mesmo contexto histórico, conforme indicam os documentos históricos, a ESALQ/USP desempenhou papel de destaque para os EUA na área da educação, pesquisa e extensão agrícola, sendo que a ponta de lança era o programa “Aliança para o Progresso”, posteriormente substituído pela USAID.

A seguir, conforme podemos constatar por meio de fotografias, a ESALQ/USP foi “assediada” pelo governo dos Estados Unidos por meio de técnicos da United States Agency for International Development (USAID), funcionários do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (United States Department of Agriculture -U.S.D.A) e também da embaixada e representação consular dos EUA, ou seja, presença direta do Estado estrangeiro no campus USP de Piracicaba, especialmente no ano de 1961, mesmo contexto da criação da “Aliança para o progresso” e da USAID pelo presidente Kennedy.

Figura 8: Pré-golpe: Reunião entre a diretoria da ESALQ/USP e a comitiva do Departamento de Agricultura do governo dos Estados Unidos (U.S.D.A). Fotografia realizada no dia 4 de Julho de 1961 no campus de Piracicaba (s/a) (Acervo do

Figura 9: A fotografia foi realizada no dia 16 de junho de 1961, no prédio central da ESALQ/USP. Estão presentes o professor Hugo de Almeida Leme (centro), Roberto Cano, Consul dos Estados Unidos e Professor Dunli Ometto. (s/a) (Acervo do Museu “Luiz de Queiroz”)

Figura 10: Consul dos Estados Unidos e comitiva estadunidense juntamente com os esalqueanos. Fotografia realizada no dia 26 de junho de 1961 nas escadarias do prédio central da ESALQ. (s/a) (Acervo do Museu “Luiz de Queiroz”)

Figura 11: Diretoria da ESALQ/USP junto dos membros do Departamento de Agricultura do governo dos Estados Unidos (U.S.D.A). Fotografia realizada no dia 4 de julho de 1961 no campus de Piracicaba (s/a) (Acervo do Museu “Luiz de Queiroz”)

Figura 12: Documento oficial do Consulado dos EUA convidando o CALQ para jantar reservado em 1961. (Arquivo do CALQ-ESALQ/USP)

Como podemos constatar no documento digitalizado na página anterior, para além de encontros com professores e demais burocratas da escola, a embaixada dos Estados Unidos também procurou atrair os estudantes esalqueanos, convidando o Centro Acadêmico “Luiz de Queiroz” na figura de seu presidente, Roberto Cano de Arruda, para um jantar no Hotel mais luxuoso da cidade.118

Nesse contexto histórico pré-golpe de 1964, instituições brasileiras em conjunto com órgãos do Estado Norte-Americano programavam uma série de ações no movimento estudantil como influenciar eleições de associações de professores, centros acadêmicos de universidade e grêmios estudantis de segundo grau, por meio de infiltração de espiões e agitadores de direita. Esses militantes de direita e demais movimentos reacionários eram treinados e financiados pela articulação binacional IPES/IBAD e o serviço de inteligência dos Estados Unidos (CIA). No meio cultural, estas ações da direita organizada foram efetivadas através do patrocínio de feira de livros, publicação de “didáticos”, ligação com universidades e centros culturais, estágios, educação de jovens e adultos e publicações variadas. (DREIFUSS, 1981)119

Sempre propagavam a doutrina anticomunista e fomentavam o clima “paranoico” de caos social, crise e a cubanização em curso do Brasil, distante da realidade reformista conservadora do período, dentro dos marcos do capitalismo.

Segundo documentos revelados recentemente nos Estados Unidos, disponíveis para consulta pública no National Archives and Records Admistration, unidade II, localizados no College Park, Estado de Maryland, sob a inscrição: RG 306-250-62-o-6, CX 14, pasta 1:

Pesquisas de opinião realizadas por agências americanas nos anos 1960 mostram com nitidez o fenômeno da esquerdização dos jovens universitários, revelando que eles compunham o grupo social mais receptivo a ideias radicais e socialistas. Enquetes de vários tipos começaram a ser aplicadas antes de 1964, identificando os tipos de leitura mais influentes entre jovens e utilizando técnicas de discussão em grupo, para captar seu pensamento e vocabulário. Os resultados mostravam que o comunismo ao estilo soviético atraía apenas a minoria; não obstante, um grupo majoritário era simpático a reformas sociais e a algum tipo indefinido de socialismo. Para a surpresa dos pesquisadores, os universitários mostraram-se mais insatisfeitos com os problemas sociais do Brasil que os próprios camponeses nordestinos, então considerados o grupo mais suscetível à radicalização, e que foram submetidos a estudos e métodos semelhantes (...) Essas pesquisas anteriores ao golpe causaram preocupação

118 Essas articulações nos remetem aos estudos sobre a “sociedade civil” de Antonio Gramsci.

119 Segundo o historiador e cientista político uruguaio René Armand Dreifuss em seu extenso trabalho que

totaliza 813 páginas, instituições como o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) assistidos pela Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos (CIA), foram fundamentais para fomentar o radicalismo da direita. (DREIFUSS, 1981)

entre os diplomatas americanos, que contrataram um psicólogo da Universidade de Princeton para vir ao Brasil estudar a situação in loco. Esse profissional entrevistou oitocentos universitários no Rio de Janeiro e em São Paulo, no segundo semestre de 1964 (National Archives and Records Admistration, unidade II, em College Park, Maryland – RG 306-250-62-o- 6, CX 14, pasta 1 apud MOTTA, 2014, p. 63)

Essas informações são fundamentais para compreendermos o período pré-golpe de 1964, quando a doutrinação ideológica visou a colocar as massas, principalmente de classe média, contra o governo Goulart, na época taxado de comunista e anticristo.

Portanto, dentro da logística do golpe, os estadunidense em conjunto com os brasileiros anti-Goulart se utilizaram de táticas de instrumentalização ideológica que compreendeu atividades de doutrinação geral anticomunista por meio da guerra psicológica midiática; infiltração de ideólogos profissionais para atuar no convencimento de empresários, militares, estudantes, jornalistas, professores, políticos e utilização da cultura como propaganda dos ideais antipopulares (cooptação de artistas). Já a prática de doutrinação específica anticomunista compreendeu infiltrações em instituições religiosas, clubes sociais, sindicatos, movimentos sociais, organizações patronais, escolas, colégios e universidades. Também foram realizados cursos, conferências, simpósios e revistas para doutrinar as classes médias, os políticos, os movimentos sociais e sindicais, direcionando seus ataques sempre contra a esquerda e a centro-esquerda, vistos como corruptos.

Outro fator decisivo nesta empreitada de tomada de poder por meio do bloco burguês multinacional/associado foi a mobilização das classes médias e o apoio feminino, ambos instrumentalizados como massa de manobra via IPES. Assim, fomentando o pânico anti- comunista o IPES custeou e “profissionalizou” organizações femininas, principalmente de donas-de-casa da classe média, “um rolo compressor que não parava” (DREIFUSS, 1981, p. 294). “O auge desta mobilização foi a marcha da família com Deus pela liberdade (...)menos de duas semanas depois, Jango foi deposto” (idem, p. 297).

No contexto pré-golpe, a elite orgânica também lutou para barrar a politização rural e desorganizar as mobilizações camponesas inquietas. Por meio do financiamento e orientação da C.I.A/USAID e suporte da igreja e sindicatos, o IPES criou o serviço de orientação rural de Pernambuco (SORPE) cujo objetivo foi conter e desmobilizar os movimentos camponeses de esquerda. Nesse sentido, foram treinados líderes camponeses capazes de combater organizações políticas de esquerda. Esta reação da burguesia também criou cursos de alfabetização contrários ao Movimento de Educação de Base (MEB) e o método Paulo Freire.

A ação entre as classes trabalhadoras industriais também objetivou conter a mobilização popular por meio de sua desorganização e desconscientização de classe, o que colaborou para quebrar a “espinha dorsal” da militância de esquerda do período pré-golpe de 1964. Um dos grandes artifícios para esta empreitada foi a estratégia que o convênio CIA/ IPES utilizou por meio da propaganda e doutrinação geral: “culpabilizar o governo Federal de João Goulart e não os capitalistas, a classe patronal/empresarial pela exploração da classe trabalhadora” e crise econômica. Esse discurso ideológico colaborou para a desestabilização

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