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CAPÍTULO I – PREVENÇÃO E CONTROLO DE INFEÇÃO

1.2. Principais medidas de prevenção e controlo de infeção

1.2.1. Precauções Básicas de Controlo de Infeção

As PBCI são práticas fundamentais de prestação de cuidados que constituem o alicerce das boas práticas clínicas. O objetivo principal da sua aplicação é a prevenção da transmissão cruzada de microrganismos, de forma direta ou indireta, através de medidas aplicáveis a todos os intervenientes nos cuidados de saúde (doentes/ profissionais/ visitantes).

O risco de transmissão existe em todos os momentos da prestação de cuidados de saúde, pelo que se devem aplicar a “todos os utentes independentemente de se conhecer o estado infecioso dos mesmos” (Portugal, 2013a, p. 10).

A aplicação das PBCI durante a prestação de cuidados é determinada pelo nível de interação entre o prestador de cuidados e o doente, e o grau de exposição que se prevê ao sangue ou outros fluidos orgânicos (excluindo o suor), pele não íntegra, mucosas, assim como qualquer material ou equipamento do ambiente de prestação de cuidados, passível de contaminação com essas fontes, o que significa que, devem ser implementadas consoante os procedimentos clínicos e os seus riscos inerentes.

O princípio subjacente às PBCI é de que “não há doentes de risco, mas sim, procedimentos de risco” (ibidem, p. 10).

Todos se devem empenhar na implementação dos comportamentos necessários para prevenir e controlar a infeção e, por isso, “na admissão à unidade de saúde, deve assumir-se que todo o doente está potencialmente colonizado ou infetado com microrganismos “problema” e podem constituir-se reservatório ou fonte potencial para transmissão cruzada de infeção.” (ibidem, p. 3).

A Norma n.º 029/2012 – Precauções Básicas do Controlo da Infeção (Portugal, 2013a), atribui responsabilidades aos dirigentes das unidades prestadoras de cuidados de saúde a vários níveis, e aos profissionais, nomeadamente adquirir conhecimentos básicos sobre as PBCI, a cadeia epidemiológica da infeção e avaliação do risco, a seleção dos EPI em função do contacto previsto e do risco esperado e, fazer educação para a saúde ao doente e familiares/ visitantes.

Em 2014 foi realizada a auditoria às PBCI, em 197 unidades de saúde, permitindo conhecer a adesão dos profissionais de saúde e identificar e priorizar medidas de intervenção adequadas para melhoria dos processos (Portugal, 2015e).

As PBCI constituem, no seu conjunto, os padrões de boas práticas nos cuidados de saúde seguros e de qualidade, enunciados na Norma n.º 029/2012 da DGS (Portugal, 2013a), sendo compostas pelos 10 ítens:

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 Colocação do doente, minimizando o risco

Na admissão do doente deve ser avaliado o risco de transmissão de agentes infeciosos. Se houver risco acrescido de transmissão cruzada, deve ser colocado num local que minimize o risco, e observadas regras de segurança durante o seu transporte.

Segundo o relatório de auditoria às PBCI (Portugal, 2015e), 59,7% das unidades de saúde referiram ter já implementado um sistema de avaliação de risco, havendo condições para isolamento dos doentes em 81,5% das Unidades.

 Higiene das mãos

Os profissionais devem proceder à higiene das mãos de acordo com o modelo concetual proposto pela OMS, designado por os “Cinco Momentos”, aos quais correspondem as indicações ou tempos em que é obrigatória a higiene das mãos na prática clínica (antes do contacto com o doente, antes da realização de procedimentos assépticos, após risco de exposição a fluidos orgânicos, após contacto com o doente e após contacto com o ambiente envolvente do doente), cumprindo, ainda, os princípios relativos às técnicas adequadas a este procedimento e aos produtos a utilizar na higiene das mãos (Portugal, 2010).

Constitui um dos componentes essenciais das PBCI, continuando a ser considerada uma das medidas mais simples, acessível, rápida e mais efetiva na redução das IACS, e simultaneamente “considerada uma medida com impacto indireto no controlo das resistências aos antimicrobianos” (Portugal, 2010, p. 2).

A sua importância mereceu a sua inclusão nas iniciativas da OMS sobre segurança do doente que têm vindo a ser desenvolvidas desde 2004, como foi, por exemplo o desafio Clean Care is Safer Care, com o objetivo de prevenir as IACS e tendo como mensagem “medidas simples salvam vidas”. Portugal aderiu a esta campanha, em outubro de 2008, declarando formalmente o seu compromisso na adoção destas medidas e implementando uma estratégia multimodal para a higiene das mãos a nível nacional (Portugal, 2010).

Em 2016, a OMS colocou o foco principal na melhoria das práticas de higiene das mãos em todos os serviços cirúrgicos, BO, cirurgia de ambulatório, e até mesmo nos cuidados após alta hospitalar do doente cirúrgico, com a mensagem “Cirurgia Segura Salva Vidas: prioridade à melhoria das práticas de higiene das mãos em todos os serviços cirúrgicos”, como medida essencial de prevenção da infeção do local cirúrgico (WHO, 2016).

A ação de higienizar as mãos é conhecida por ser a principal medida para prevenir as IACS, pelo que a adesão ao cumprimento rigoroso das técnicas de

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higienização das mãos, é uma prioridade no continuum de cuidados desde a admissão ao pós-alta hospitalar do doente com ferida cirúrgica.

Krediet [et al.] (2011) avaliaram a frequência da higiene das mãos e a utilização de luvas na sala cirúrgica pela equipa não-estéril, constatando baixa adesão a esta prática, referindo a potencial exposição do doente à transmissão microbiana e risco de aquisição de IACS. Muito esforço é investido na manutenção e esterilidade do campo operatório pela equipa estéril, mas menos atenção é dada às potenciais fontes de transmissão cruzada de infeção através da equipa não-estéril.

A adesão à higiene das mãos é um bom indicador, mas é também necessário que seja adotada a técnica correta para uma adequada higienização, sendo importante incluir no plano de formação de cada unidade de saúde, a formação básica em higiene das mãos e PBCI para os novos colaboradores de todos os grupos profissionais e “encontrar estratégias e/ ou metodologias que mais se adequem aos grupos de profissionais menos envolvidos – os médicos e outros técnicos” (Portugal, 2015e, pág.24).

De acordo com Pina [et al.] (2010), a auditoria à higiene das mãos, para além de determinar as taxas de adesão gera indicadores de qualidade, permite avaliar a qualidade de desempenho do procedimento e alerta os profissionais para a importância deste ato, conseguindo-se um efeito imediato de promoção do mesmo, ao demonstrar interesse na sua monitorização.

A adesão à monitorização da prática de higiene das mãos pelas unidades de saúde tem vindo a aumentar desde 2011 (Portugal, 2015e).Em 2014, a taxa global de adesão à higiene das mãos dos profissionais de saúde dos hospitais públicos foi de 69,4% (ibidem), observando-se heterogeneidade relativamente à adesão ao longo dos cinco momentos preconizados para a higiene das mãos (ibidem).

Tem-se verificado um aumento da adesão em todos os momentos, sendo consistentemente mais elevada no terceiro momento, “após risco de exposição a sangue ou fluidos orgânicos” e mais baixa no primeiro e último momentos, “antes do contacto com o doente” e “após contacto com o ambiente envolvente do doente” (ibidem).

Relativamente à taxa de adesão por grupo profissional a nível hospitalar, observa- se que tem vindo a aumentar de forma gradual, para quase todos os grupos, sendo o grupo dos enfermeiros o que evidencia maior adesão, comparativamente com o grupo dos médicos, assistentes operacionais e outros técnicos (Portugal, 2015e).

Analisando o progresso entre 2011 e 2014, verificou-se simultaneamente uma nítida subida do consumo de Solução Antissética de Base Alcoólica (SABA) (ibidem). O recurso a estas soluções é recomendado como primeira escolha pois é considerado mais eficaz na prestação de cuidados a doentes com microrganismos multirresistentes (Portugal, 2007a).

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A evolução anual da taxa de adesão dos profissionais de saúde à higiene das mãos, mostra que esta prática tem vindo a aumentar de forma consistente, mas não satisfatória, tendo em conta a meta definida pela OMS (90%) (Portugal, 2015e).

Através de uma revisão sistemática da literatura de janeiro de 1980 a dezembro de 2013, a OMS avaliou a evidência sobre o impacto das intervenções de melhoria da higiene das mãos para reduzir a transmissão e/ ou infeções por MMR, tendo concluído que a higiene das mãos de acordo com as recomendações, é a medida mais importante de entre as PBCI. Os estudos onde a higiene das mãos foi utilizada como principal intervenção demostraram uma diminuição substancial das infeções e/ ou taxas de colonização por MRSA. Mas, para serem bem-sucedidas, essas intervenções precisam ser multimodais e sustentadas ao longo do tempo (WHO, 2014).

 Etiqueta respiratória

Os profissionais de saúde devem cumprir e promover a aplicação do conjunto de medidas destinadas a conter as secreções respiratórias, junto de todos os que apresentem sintomas respiratórios.

Segundo a DGS (Portugal, 2015e), 76,0% das unidades de saúde referiram desenvolver ensino e formação sobre a etiqueta respiratória.

 Utilização de EPI

O EPI é constituído por várias barreiras a utilizar individualmente ou em combinação, que incluem luvas, avental, bata de manga comprida, proteção ocular/ facial (óculos ou máscara com viseira), máscara cirúrgica, protetor respiratório, calçado e cobertura de cabelo, e devem proporcionar proteção adequada, de acordo com o risco associado ao procedimento a efetuar (Portugal, 2013a). Este só é eficaz se utilizado corretamente, pelo que a sua escolha deve ser efetuada com base na avaliação de risco de transmissão cruzada de microrganismos, no risco de contaminação do fardamento, pele ou mucosas dos profissionais de saúde com sangue, líquidos orgânicos, secreções e excreções do doente (Pina et al., 2010).

O EPI deve ser usado em complementaridade com as restantes recomendações (higiene das mãos, higiene ambiental, entre outros), sendo da responsabilidade de cada profissional escolher e adequar o EPI a cada situação, sendo “importante que se tenha a consciência de que os EPI reduzem mas não eliminam o risco de transmissão cruzada de microrganismos” (Pina et al., 2010, p. 33).

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De acordo com o relatório de auditoria às PBCI (Portugal, 2015e), a disponibilidade dos EPI foi satisfatória, embora haja a salientar várias inconformidades, nomeadamente, os EPI não adequados aos procedimentos. Os EPI que obtiveram uma taxa de cumprimento mais baixa foram os aventais de uso único (61%) e os sapatos do fardamento inadequados (64,5%), seguindo-se os óculos/ proteções oculares (73,6%), as batas de manga comprida (74,3%), as máscaras/ respiradores (83,4%), sendo a taxa de cumprimento mais elevada relativa ao uso de luvas.

 Descontaminação do equipamento clínico

O equipamento clínico utilizado pode ficar contaminado com fluidos orgânicos e agentes infeciosos. Se mal descontaminado após a utilização, pode servir de veículo de transmissão cruzada durante a prestação de cuidados (Portugal, 2013a).

Segundo a DGS (Portugal, 2015e), em 91,0% das unidades existia protocolo interno de descontaminação dos materiais e equipamentos, e em 9,9% das unidades ainda eram reutilizados materiais de uso único.

 Controlo ambiental

O ambiente deve encontrar-se em bom estado de conservação e ser limpo regularmente de acordo com as especificações, evitando que as áreas de prestação de cuidados funcionem como reservatórios para a transmissão de microrganismos.

Os profissionais devem ter conhecimento dos procedimentos de limpeza, e conhecer as suas responsabilidades específicas no processo (Portugal, 2013a).

Segundo a DGS (Portugal, 2015e), o nível de limpeza foi considerado adequado (91,2%). Existia norma interna para a higiene ambiental em apenas 78,6% das unidades, estando definidas as responsabilidades deste procedimento (79,2%). Os profissionais referiram conhecer os protocolos internos em 79,8% das unidades.

 Manuseamento seguro da roupa

A roupa usada deve ser considerada como contaminada e manuseada com cuidado de forma a não contaminar o ambiente e/ ou o fardamento.

Os sacos com roupa suja não devem exceder 2/3 da sua capacidade para permitir o correto encerramento, e devem ser colocados em local apropriado.

A roupa limpa deve ser acondicionada numa área reservada para o efeito (Portugal, 2013a).

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Segundo a DGS (Portugal, 2015e), verificou-se correto acondicionamento da roupa lavada (86,4%), cumprimento da boa prática de não encher demasiado os sacos (86,0%) e um adequado circuito de remoção da roupa suja, em 88,3% das unidades.

 Recolha segura de resíduos

Os resíduos provenientes da prestação de cuidados de saúde devem ser triados e eliminados junto ao local de produção, não devendo ser manipulados depois de acondicionados no saco e/ou contentor. Tanto os sacos de resíduos, como os contentores de corto-perfurantes, não devem exceder 2/3 da capacidade, de modo a possibilitar o seu encerramento seguro.

Os contentores devem permanecer fechados, ser facilmente e periodicamente higienizados, e permitir a sua abertura sem o uso das mãos (DGS, 2013a).

Verificou-se que em 88,6% das unidades havia um local de armazenamento dos resíduos nos serviços, e 85,7% dos contentores eram de fácil limpeza. Contudo, 19,7% dos contentores de resíduos não foram considerados adequados (Portugal, 2015e).

 Práticas seguras na preparação e administração de injetáveis

Na preparação e administração de injetáveis deve-se usar técnica assética e utilizar preferencialmente embalagens de dose única. Se for necessário usar embalagens de doses múltiplas, todos os materiais usados para aceder à embalagem, devem estar estéreis (Portugal, 2013a).

Segundo a DGS (Portugal, 2015e), ainda eram utilizadas algumas embalagens de medicação injetável de dose múltipla (10,0%), mas verificando-se o cumprimento da técnica asséptica pela quase totalidade.

 Exposição a agentes microbianos no local de trabalho

O risco de exposição a agentes microbianos transmissíveis pelo sangue e fluidos orgânicos é um importante risco a que os profissionais de saúde estão sujeitos.

Todos os profissionais devem conhecer os procedimentos a seguir no caso de ocorrer exposição significativa, nomeadamente traumatismo percutâneo com cortantes ou perfurantes contaminados, exposição de feridas ou outras lesões da pele e exposição das mucosas a salpicos de sangue ou outros fluidos orgânicos (Portugal, 2013a).

Segundo a DGS (Portugal, 2015e), destacou-se um défice de conhecimento global dos profissionais sobre o protocolo de atuação em acidentes por picada ou corte, com maior preocupação para os assistentes operacionais e os profissionais da limpeza.

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Existia protocolo interno para prevenção de acidentes por picada ou corte (72,5%), mas apenas 57,1% dos profissionais conhecia ou evidenciou ter conhecimento do mesmo.

A implementação das PBCI constitui uma estratégia primária de eficácia comprovada, na minimização do risco de infeção. No entanto, não previnem de forma eficaz a transmissão de todos os agentes infeciosos, e em casos específicos, estão indicadas algumas medidas adicionais, que não substituem as PBCI, mas que as complementam – PBVT (Portugal, 2013a).