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4. PREFERÊNCIAS E DESEJOS DE LEITURA DE CRIANÇAS E JOVENS NOS

4.4. Preferências entre diferentes gêneros

Esmiuçando um pouco mais os gostos dos pesquisados e para entender o que eles preferiam ler, Cecília Meireles elaborou uma pergunta referente às preferências e aos interesses das crianças e jovens quanto aos gêneros na 10ª pergunta: “Quais são os livros que você acha mais interessantes: os de histórias, de viagens, de ciências, de aventuras, romances ou fábulas?”.

O quadro abaixo traz a tabulação das respostas oferecidas para esta questão, que consta no Relatório do Inquérito (MEIRELES, 1934, p. 71 - 72):

Respostas Mas. % Mos. % Total %

Histórias 380 40,7 141 31 521 37,7 Aventuras 242 25,9 178 39 420 30,2 Ciências 160 7,1 95 20,9 255 18,3 Romances 181 19,6 31 6,8 212 15,2 Fábulas 141 16 60 13,2 201 14,4 Viagens 113 12 72 16 185 13,3 Todos 13 1,3 2 0,4 15 1,08 Versos 2 0,21 - - 2 0,14

Todos, menos romances 2 0,21 1 0,2 3 0,2 Todos, menos fábulas 1 0,1 - - 1 0,07 Prefiro os livros descritivos 1 0,1 - - 1 0,07

Em prosa 1 0,1 - - 1 0,07

Deixaram de responder 10 1,07 11 2,4 21 1,5 Respostas inaproveitáveis 4 0,4 5 1,1 9 0,6

Cecília Meireles, nesta pergunta, parece tentar se acercar das respostas das crianças de maneira a delinear o gosto para a prosa. Neste sentido, ela subdivide esta categoria em algumas tipologias: histórias, aventuras, viagens, fábulas, etc, e não mais o escolar, fantasia e literatura.

O quadro, de maneira geral, indica a grande preferência pelas “histórias” (37,7%), seguida pelas “aventuras” (30,2) e uma quantidade quase mínima de leitores que preferem os versos, apenas duas meninas (0,14%).

Como autores preferidos, citam Olavo Bilac, José de Alencar e Erasmo Braga, contudo, entre os gêneros, mencionam aventuras e histórias, o que nos permite pensar que, ao citarem Olavo Bilac, as crianças referem-se à prosa deste autor e não aos poemas.

Considerando as diferenças de interesse entre os sexos, notamos que enquanto as meninas preferem as “histórias” (40,7%), os meninos preferem as “aventuras” (31%). Em terceiro lugar no gosto dos meninos temos “ciências” (20,9%), enquanto na preferência feminina encontramos os “romances” (19,6%).

A preferência pelo gênero “aventura” e “história” nos leva a questionar a preferência anteriormente citada por Olavo Bilac, José de Alencar e Erasmo Braga. Olavo Bilac teria se destacado, então, pela prosa e não pelos versos? José de Alencar estaria dentro de “aventuras”?

O Relatório do Inquérito traz um quadro elaborado por Cecília Meireles indicando as diferenças nas preferências entre meninos e meninas, trazendo os seis gêneros que crianças e jovens afirmaram ser mais interessantes (MEIRELES, 1934, p. 71):

Meninas Meninos Histórias Aventuras Aventuras Histórias Romances Ciências Ciências Viagens Fábulas Fábulas Viagens Romances

Não há grandes diferenças entre as preferências de gêneros entre meninos e meninas, ambos destacam os mesmos seis gêneros. Mas, enquanto os romances são mencionados quase três vezes mais pelas meninas que pelos meninos (Mas. 19,6% e Mos. 6,8%), as “ciências” são citadas quase três vezes mais pelos meninos (Mas. 7,1% e Mos. 20,9%).

O gosto das meninas delineia-se em torno das histórias, aventuras e romances - os românticos e a literatura cor-de-rosa - enquanto o dos meninos configura-se a partir das aventuras, das histórias e das ciências, talvez mais ligados à ideia de leitura com a função de instruir, de ampliar conhecimentos, de buscar informações.

As questões do Inquérito que trouxemos para a discussão até o momento referem-se às obras e autores que crianças e jovens diziam ter ou com os quais tinham efetivo contato por meio da escola ou da família e por isso podiam expressar seus conhecimentos, seus gostos, aversões, etc. Contudo, Cecília Meireles destacou ainda neste Inquérito, um ponto que considerava importante para entender melhor o gosto infantil: o plano do ideal, da vontade, do desejo de ler.

Por isso ela introduz a 6ª questão “Tem vontade de ler algum livro? De que?”65. Tal questão, direcionada ao plano do ideal, nos leva a uma Cecília Meireles que é escritora e também educadora. Para ela interessa conhecer se o mercado editorial estava adequado e preparado para gostos infantis distintos dos adultos, distintos do que lhes tem sido oferecido pela escola e pela família.

No entanto, novamente, tal como foram organizadas as respostas, no plano ideal, da vontade, do desejo das crianças e jovens, encontramos o mesmo de que já afirmaram gostar: as “histórias” (43,9%), “romances” (8,3%), “aventuras” (8%) e a marca de autores legitimados como Bilac e Casimiro. O plano ideal não difere muito do plano construído a partir do indicado como lido, conhecido ou oferecido às crianças. Tal qual ele reafirma o plano da legitimidade.

Em comparação com a questão anterior, em que as tipologias foram dadas por Cecília Meireles, o que surge de novo neste quadro é a presença de livros de: “Estudos”, “Leitura”, “História do Brasil”, “História Sagrada”, “De guerra” e “Anedotas”. Outros gêneros não previstos, talvez, por Cecília Meireles, que dão uma ideia mais ampliada do repertório já conhecido nas demais questões. Amplia também para outra finalidade de leitura que não seja só a de instruir ou a de fruição, trazendo a leitura religiosa e aquela que faz rir.

Esta é uma das poucas questões em que Cecília Meireles optou por registrar todas as respostas oferecidas pelas crianças que, segundo ela, seriam aproveitáveis. Esta opção foi explicitada por ela para considerar a importância disso, pois “é o momento de se definirem as preferências” (MEIRELES, 1934, p. 51). Não podemos ignorar que tal deferência por parte de Cecília Meireles no registro mais minucioso dessas respostas pode ter sido orientada pelo seu desejo como escritora de livros para crianças ou como educadora ligada à Escola Nova, que defendia a criança como ser autônomo, livre, feliz.

Que livros eram esses que as crianças desejavam ler? Eram escolares? Livros de literatura? De fantasia? Podemos dizer que o interesse das crianças, no plano do desejo de ler, voltava-se preferencialmente aos livros de fantasia (56,06%), seguido pelos escolares (20,9%), pelos de literatura (12,1%) e pelos de religião (0,4%). 66

65 As respostas estão concentradas num quadro que se encontra no Anexo 4.

66 O quadro referente à questão “Tem vontade de ler algum livro? De que?” (MEIRELES, 1934, p. 53), com os percentuais por categoria: fantasia, escolares, literatura e religião encontra-se no Anexo 5.

Parece-nos que não há muitas diferenças entre aquilo que as crianças e jovens diziam ter o desejo de ler e os livros lidos e lembrados. Nesses dois casos, segue-se a mesma ordem de preferências (embora os livros religiosos só tenham aparecido nesta questão analisada, referente às vontades de ler, e por isso, para compararmos, foi subtraído): livros de fantasia, livros escolares e por fim os de literatura.67

Entretanto, se compararmos o percentual que sintetiza os desejos de ler com o que informa sobre os livros de que as crianças e jovens mais gostavam, analisado no tópico 4.1 deste capítulo, temos uma importante constatação: entre os livros preferidos estão em primeiro lugar os escolares, enquanto que nos desejados estão os livros de fantasia68. Crianças e jovens leem livros de fantasia, desejam ler mais livros de fantasia, mas afirmam gostar dos escolares, tanto entre os meninos como entre as meninas.