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(continua) Descrição da Cena 1.2.2: No encontro dia 04/07/2017, como descrito nas cenas 1.1 2 e

1.1.5, a pesquisadora-formadora propôs que os estagiários avaliassem o ECS III – observação do EM, e expusessem suas expectativas para a realização do próximo estágio, ECS IV – regência no EM. Na cena temos parte das discussões desencadeadas a partir desta proposição.

1. Pesquisadora-formadora: Eu gostaria que vocês falassem desse sentimento de agora,

de se preparar para o próximo estágio. Que avaliação vocês fazem do estágio III deste semestre e quais as expectativas para o estágio IV.

2. Luana: Sensação de medo.

3. Mariposa: Eu particularmente estou preocupado, eu acho que por eles serem um pouco

mais velhos...

4. Pi: Quase da nossa idade.

5. Mariposa: Eles estão desafiando muito mais o professor, pelo que eu vi. 6. Pesquisadora-formadora: Em relação ao estágio do ensino fundamental?

7. Mariposa: Em relação ao estágio passado. Eu vi que eles queriam meio que se impor,

desafiar, entre aspas, a autoridade do professor, sempre acontece uma coisinha ou outra em aula, uma coisa que não tinha observado na minha turma no ano passado. Isso me preocupa, como que eu vou lidar com isso.

8. Pesquisadora-formadora: Teu sentimento é de preocupação?

9. Mariposa: É preocupação caso eu venha a me estressar. Porque tem um período na

faculdade que a gente fica estressado, se eu hoje estivesse lá em regência, eu estaria com pavio curto e isso é uma coisa que a gente...

Cena 1.2.2 – Preocupação com os alunos

(continuação)

Se dá uma coisinha errada lá a gente já fica com receio. Eu que sou uma pessoa super

zen, agora nesse fim de semestre, eu já não vejo a hora de acabar esse semestre.

11. Pesquisadora-formadora: Esse sentimento que estão relatando é só por essa situação

que estão vivenciando agora, por essa semana de finalização do semestre, ou isso já vem de antes?

12. Pi: Esse medo de ser desrespeitado é até por a gente ser estagiário, já tem um

preconceito.

13. Luana: Principalmente por causa da idade, tem alunos que são mais velhos, da nossa

idade praticamente. Eu acho que eles ficam pensando: “O que que essa ai da minha idade tá querendo?”

14. Pi: “Tá querendo mandar em mim? Me dar aula?”

15. Pesquisadora-formadora: Mas no Ensino Fundamental vocês não sentiram isso antes

de começar a regência?

16. Pi: Não.

17. Convexo: Com certeza, não.

18. Mariposa: Eles eram um pouquinho mais infantis. 19. Bruna: Eu tenho um aluno de 19 e eu tenho 20. [risos]

20. Luana: Eu achei a turma do Ensino Médio que eu observei melhor que a do Ensino

Fundamental, porque eu esperava alguma coisa aterrorizante. Eu achei eles muito diferentes. Porque no Ensino Fundamental, eles ficavam falando: lá vem a estagiária. E no ensino médio, eles são maiorzinhos, eu acho que será mais tranquilo.

21. Bruna: Eles são mais conscientes, mais maduros. Eu vejo no Ensino Fundamental

aquela coisa que eles nem sabem porque estão ali, no [Ensino] médio, eles geralmente têm um propósito: “vou sair daqui e vou trabalhar ou vou fazer um curso”. Ou o aluno te ignora totalmente... Eles têm preguiça, eu também era assim. [...]

22. Mariposa: Eu estava pensando aqui... Que eu vou ter que me provar para os alunos.

Porque eu não tenho credibilidade com eles ainda, tenho com um ou outro que já conheço e me relaciono mais, converso. Tem um que me pede questões de vestibular e de concurso militar para resolver. Ele sabe que eu tenho capacidade de fazer, de desenvolver, mas tem alunos na turma que ficam pensando: “será que ele sabe mesmo?” Ficam “com um pé atrás” comigo. Isso é uma preocupação.

23. Pesquisadora-formadora: Por ser estagiário?

24. Mariposa: É, mas eu acredito que eu vou conseguir. Na primeira semana ou segunda

eu vou ter essa dificuldade, de ter que conquistar eles. [...]

25. Pesquisadora-formadora: Vocês estão se preparando para um novo estágio. Vocês

acham que se já estivessem na escola como professores, trabalhadores da educação, estariam preparados?

26. Pi: Totalmente preparado eu acho que não.

27. Bruna: É diferente, porque se vai estagiar, vai substituir aquela professora, por um

determinado tempo que é bem curto. Daí tu tem que ver mais ou menos como é que ela faz, eles [alunos] vão te julgar, vão te comparar com essa professora. Tu vai ter que trabalhar mais ou menos como ela e avaliar como ela. E tem outras coisas que eu acho que dificultam mais no estágio. Agora se a turma é tua, não vai ter ninguém te fiscalizando ali...

28. Luana: Tu vai chegar no primeiro dia, não vai chegar na metade do ano.

29. Bruna: Vai chegar dizendo: “eu sou a professora, eu sou a autoridade aqui”. No estágio

isso acaba não acontecendo, porque fica ali só aquele tempo, e daqui a pouco acaba e volta tudo ao normal. Passa, e é só uma fase que eles nem perceberam, “é verdade, teve uma estagiária...” nem lembram. É um tempo curto, mas se a gente entrasse agora como professor a gente ia ter dificuldade eu acho, todo mundo tem uma dúvida, “como que eu vou trabalhar isso? eu sei tudo?”, tudo a gente tem que estudar! Mas com relação a ter domínio de turma seria tudo mais fácil, a gente teria mais segurança de chegar: “agora é a minha turma, eu vou fazer assim, eu vou fazer assado”. Não vai ter ninguém para me dizer

Cena 1.2.2 – Preocupação com os alunos

(conclusão)

que é para fazer de outro jeito.

30. Pesquisadora-formadora: Vocês concordam?

31. Mariposa: Autoridade é uma coisa relativa, na minha turma de estágio do ano passado,

eu vi bastante problema com a professora, eles não tinham respeito por ela. Comigo eles tinham bastante. Mas eu acho que, sendo o professor titular da turma, é mais tranquilo, para eles te verem como professor. Porque o estagiário tem que ter um período do estágio que tu tem que se provar professor para eles.

32. Pi: É, eu acho que é pouco tempo para conhecer a turma, como professor já podemos

saber como é. [...]

33. Mariposa: Isso aconteceu comigo, a professora falou se eu podia explicar a questão no

quadro [negro, lousa], mas eu estava observando os alunos, não estava prestando atenção no que ela havia escrito no quadro. Daí fui lá na frente e fiquei olhando para a questão e um aluno já falou: “até parece que não sabe” e outro aluno achando que eu não sabia mesmo... Daí eu peguei o giz e disse: “então vem aqui e me explica...” Eles riram muito.

Fonte: Dados da pesquisa (Áudio_170704)

Para os estagiários, o professor deve ser sempre respeitado pelos alunos. A possibilidade de que isso não ocorra lhes causou preocupação. Segundo eles, o enfrentamento e a imposição de certa “autoridade” aos alunos com idades bastante próximas às deles tornam o momento difícil, como afirmou Bruna (Cena 1.2.2, f. 19): “Eu tenho um aluno de 19 e eu tenho 20.”. Além de conhecer o conteúdo matemático a ensinar, eles também precisariam demonstrar uma postura diferente daquela que apresentaram aos alunos do Ensino Fundamental. Luana (Cena 1.2.2, f. 20) demostrou isso quando disse: “Eu achei a turma do Ensino Médio que eu observei melhor que a do Ensino Fundamental, porque eu esperava alguma coisa aterrorizante. Eu achei eles muito diferentes”. Sua ideia de que seria mais difícil estagiar com adolescentes, por pensar que eles não a respeitariam, é que pode tê-la influenciado a pensar que os alunos do Ensino Médio eram diferentes de suas expectativas. Percebemos na cena anterior que receiam ensinar nessa etapa da escolarização, pois para eles os alunos do Ensino Médio criam expectativas maiores do que os do Ensino Fundamental com relação ao conhecimento matemático do professor.

Mariposa também demonstrou o mesmo medo de Penélope, com relação ao ser capaz de ensinar, pois, segundo ele, os alunos “ficam ‘com um pé atrás’” e questionam o seu conhecimento, por ser o estagiário e não o professor da turma, e isso o preocupa. Assim, ele se desafia a provar aos alunos que sabe e que é capaz de ensinar matemática. Na fala de Bruna (Cena 1.2.2, f. 27) também percebemos

isso. Segundo ela, ou o aluno do Ensino Médio está comprometido com a sua aprendizagem, visando sua preparação para o trabalho ou estudos futuros, exigindo mais do professor, ou o ignora totalmente, comparando-os ao seu próprio comportamento enquanto aluna.

Os estagiários comparam-se tanto com seus alunos quanto com os professores, julgam terem vivenciado uma melhor ou pior experiência no estágio, em detrimento da experiência anterior, de acordo com a qualidade das relações que estabeleceram com eles. Essa consideração vai ao encontro do que informam Silva e Cedro (2015, p. 48): “[...] o estágio não é uma ocasião de aprendizagem solitária. Ao contrário, é um cenário onde suas diversas personagens podem produzir conhecimento na teia das relações interpessoais”.

Quando o acadêmico é convidado pelo professor a participar da aula durante o período de observações, seja olhando planos de aula e avaliações, dialogando sobre a aula e os alunos, seja corrigindo exercícios na lousa, ele se sente acolhido, como percebemos na fala de Mariposa na Cena 1.2.2, quando se refere ao fato de a professora regente convidá-lo a participar da aula; e na fala de Bruna (Cena 1.2.2, f. 29), quando menciona o quanto a sua recepção na escola por parte da professora influenciou o desenvolvimento da sua regência. Segundo ela, por ser tratada da mesma forma como a professora tratava os alunos, ou seja, sem ser apresentada à turma como estagiária, o primeiro estágio não foi tão bom quanto o segundo. Diante do sentimento de desconforto mencionado por alguns acadêmicos quanto à forma como foram recebidos e tratados pelos seus professores supervisores, identificamos em um dos Encontros Formativos que Alemão menciona que o seu contato com a professora supervisora, embora não tenha ocorrido como ele esperava, foi fundamental para os contatos posteriores que ele realizou na escola com outras pessoas fora do ambiente da sala de aula. A Cena 1.2.3 retrata tal situação.