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Ninguém ignora, pois é assunto debatido no mundo inteiro, que o problema social é uma preocupação que comove não somente os governantes, estadistas, filósofos e escritores, mas também a toda a sociedade humana. Já não se fala deste problema incluindo nele, em amplos estudos sobre costumes, cultura, necessidades, tendências e prerrogativas de cada povo, a toda a sociedade; tampouco se fala de achar soluções que coloquem ponto final ao problema. Dir-se-ia que ninguém se atreve a enfrentá-lo de forma definitiva.

Será isso porque se chegou ao convencimento de que nada pode ser edificado com miras permanentes, em terras tão movediças como são as pretensões humanas? O certo é que não há ser humano que possa quebrar a inexorabilidade das leis. Jamais poderá pôr num recipiente mais água do que ele possa conter, por mais poderoso que seja; a água excedente será derramada inevitavelmente. Do mesmo modo se derramará, porque é inevitável, toda melhora que ultrapasse os limites da capacidade humana de compreender e aproveitar tal melhora, sem fazer mau uso dela. Daí que seja tão necessário, como temos aconse- lhado sempre, que, paralelamente à ajuda que se faça chegar às classes dos trabalhadores, as instrua, para que saibam usar e não abusar dela. Somente assim haverão de desfrutar com folga o bem que recebem, pois com a compreensão de seus deveres, assegurarão seu futuro não o expondo à insegurança por não saberem administrar-se na nova posição em que se encontram.

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O problema social, em nossos dias, atinge exclusivamente ao trabalhador. Os demais membros da família humana parecem estar excluídos, no que se refere a este problema. E aqui queremos fazer menção à classe média que, por ser a mais sofrida e compreensiva, talvez prefira não representar uma carga que aumente ainda mais o peso das preocupações que afligem os governantes e estadistas de todas as nações do mundo. Esta classe é a que sempre teve de suportar a pressão dos que estão por cima dela e dos que, achando-se por baixo, empurram-na para situações quase insustentáveis.

Este fenômeno tem-se repetido sem variação alguma no seio de todos os povos da terra. Entretanto, grande número de operários e filhos de operários passa a fazer parte dessa classe média quando se tornam comerciantes, industriais ou abraçam alguma profissão e também aqueles que, tendo alcançado por seus esforços uma colocação na classe alta ou aristocrática, voltam a ela por falta de adaptação às exigências dessa vida social, com sua sequela de compromissos e obrigações.

Focalizado, pois, o problema social exclusivamente no operário, os outros focos e estudos que não incidem diretamente nele, tal como hoje se encara, devem ser relegados a segundo termo.

Não faz muito, ao celebrar-se o primeiro aniversário da assunção ao governo pelas autoridades atuais, o Chefe de Estado pronunciou um discurso no qual reiterava a preocupação que lhe ocasionava o problema social em nosso país. Sua palavra foi dirigida especialmente às massas operárias, sempre ávidas de novas melhoras e conquistas. Havia nas manifestações do Presidente um caloroso desejo de inculcar compreensões básicas sobre a questão, desde que exortava a todos, em tom vibrante, a “trabalhar e produzir”.

“Trabalhar e produzir”, eis aí o lema que cada homem de trabalho deve cumprir para não ser um elemento dissolvente na sociedade. Bem se sabe que os que mais trabalham e produzem são os que menos gritam, protestam e desperdiçam, porque seus pensamentos tendem mais ao cumprimento de suas obrigações e deveres que ao abuso de seus direitos. Por conseguinte, encaminhar os homens na disciplina do trabalho, guiando-os pelos caminhos da ordem, será um meio eficaz para conseguir, com miras permanentes, tudo o que se aspira neste sentido.

Elogiável e digna de colaborar nela haverá de ser toda obra que tenda a ajudar às classes trabalhadoras; mas, da mesma forma que se tem contido e até reprimido os abusos do capitalismo, também devem, por força de lei, conter-se e reprimir-se os abusos dos que, chamando-se trabalhadores, dificultam o trabalho dos demais e buscam todo tipo de ocasiões para fazer menos e exigir mais. Daí que a exortação do Chefe de Estado, de “trabalhar e produzir”, seja de verdadeira oportunidade.

Já é tempo de que a família argentina se una na consciência de suas responsabilidades, deveres e direitos. E entendemos que isto chegará a ser alcançado quando cessarem os privilégios gerais que colocam os maus em igualdade de méritos com os bons, desorientando e desesti- mulando os últimos, diante da situação de inferioridade que tal estado de coisas lhes cria.

Quando os homens alentam a esperança de ser mais do que são e de possuir mais do que têm, não se limitam a cruzar os braços ou levantá- -los ao alto para reclamar, sem esforço de sua parte, para conseguir o objetivo buscado. O homem que trabalha busca o estímulo no próprio trabalho, superando suas condições e capacidades para conseguir avanços, os quais jamais lhe foram negados, para alcançar posições cada vez mais destacadas.

É de se esperar que a compreensão das situações e do problema social em si se veja facilitada pelas solenes declarações sobre os direitos do trabalhador que o General Sr. Juan D. Perón formulou no acontecimento citado e que nos compraz transcrever, como segue:

“I. Direito de trabalhar. O trabalho é o meio indispensável para satisfazer às necessi-

dades espirituais e materiais do indivíduo e da comunidade; a causa de todas as conquistas da civilização e o fundamento da prosperidade geral; daí que o direito de trabalhar deve ser protegido pela sociedade, considerando-o com a dignidade que merece e provendo ocupação a quem dela necessite.

II. Direito a uma remuneração justa. Sendo a riqueza, a renda e o juro do capital

frutos exclusivos do trabalho humano, a comunidade deve organizar e reativar as fontes de produção de forma a possibilitar e garantir ao trabalhador uma remuneração moral e material que satisfaça a suas necessidades vitais e seja compensadora do rendimento obtido e do esforço realizado.

III. Direito a capacitação. O melhoramento da condição humana e a proeminência

dos valores do espírito impõem a necessidade de propiciar a elevação da cultura e da aptidão profissional, a fim de que as inteligências possam orientar-se para todas as direções do conhecimento; e incumbe à sociedade estimular o esforço individual proporcionando

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direito de aprender e aperfeiçoar-se.

IV. Direito a condições dignas de trabalho. A consideração devida ao ser humano, a

importância de que o trabalho se reveste como função social e o respeito recíproco entre os fatores participantes da produção consagram o direito dos indivíduos a exigir condições dignas e justas para o desenvolvimento de sua atividade, e a obrigação da sociedade de velar pela estrita observância dos preceitos que as instituem e regulamentam.

V. Direito à preservação da saúde. O cuidado da saúde física e moral dos indivíduos

deve ser uma preocupação primordial e constante da sociedade, à qual corresponde velar para que o regime de trabalho reúna os requisitos adequados de higiene y segurança, não excedendo as possibilidades normais do esforço e possibilitando a devida oportunidade de recuperação pelo repouso.

VI. Direito ao bem-estar. O direito dos trabalhadores ao bem-estar, cuja expressão

mínima se concretiza na possibilidade de dispor de residência, vestimenta e alimentação adequadas e de satisfazer sem angústias suas necessidades e as de sua família, de modo que lhe permita trabalhar com satisfação, descansar livre de preocupações e gozar come- didamente de expansões espirituais e materiais impõe a necessidade social de elevar o nível de vida e de trabalho com os recursos diretos e indiretos que permitam o desenvol- vimento econômico.

VII. Direito à seguridade social. O direito dos indivíduos a ser amparados, nos casos

de diminuição, suspensão ou perda de sua capacidade de trabalho, promove a obrigação da sociedade de tomar unilateralmente a seu cargo as prestações correspondentes ou de promover regimes de ajuda mútua obrigatória, destinados, uns e outros, a cobrir ou complementar as insuficiências ou inaptidões próprias de certos períodos da vida ou as causadas por infortúnios provenientes de riscos eventuais.

VIII. Direito à proteção de sua família. A proteção da família responde a um natural

desígnio do indivíduo, desde que nela se geram seus mais elevados sentimentos afetivos, e todo empenho tendente a seu bem-estar deve ser estimulado e favorecido pela comunidade como o meio mais indicado de propender ao melhoramento do gênero humano e à conso- lidação de princípios espirituais e morais que constituem a essência da convivência social.

IX. Direito ao melhoramento econômico. A capacidade produtiva e o empenho de

superação acham um natural incentivo nas possibilidades de melhoramento econômico, pelo que a sociedade deve apoiar e favorecer as iniciativas dos indivíduos tendentes a esse fim e estimular a formação e utilização de capitais enquanto constituam elementos ativos da produção e contribuam para a prosperidade geral.

X. Direito à defesa dos interesses profissionais. O direito de associar-se livremente

e de participar em outras atividades lícitas, tendentes à defesa dos interesses profis- sionais, constituem atribuições essenciais dos trabalhadores, que a sociedade deve respeitar e proteger, assegurando seu livre exercício e reprimindo todo ato que possa dificultá-lo ou impedi-lo.”

Ficam, agora, por ver o que de tais pensamentos vá consumando-se e os resultados que sobrevenham. O anelo de todos é que aconteça o melhor, para o bem dos habitantes do solo argentino, nobre e grande pátria que todos devem servir desde seu posto de luta, com amor e perseverança invariável.

(Abril 1947 – página 19)

a boa

estreLa

da

repúbLica