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2.1 Mecanismos de afastamento da coisa julgada

2.1.1 Ação rescisória

2.1.1.2 Pressupostos

Para que seja proposta a Ação Rescisória, o autor deve preencher um pressuposto genérico, ou seja, aquele previsto no art. 485, caput do CPC. Se a ação visa desconstituir a coisa julgada material, a mesma só é cabível de sentença definitiva, de mérito e que já tenha transitado em julgado.

Conforme Donizetti (2012), o termo sentença empregado no referido artigo, é entendido em seu sentido lato, qual seja, decisão que analise o mérito. Cabível então, não somente de sentenças, mas de acórdãos, decisões monocráticas e decisões interlocutórias.

Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça,

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. REAJUSTE DE 26,05%. AÇÃO RESCISÓRIA. PROPOSITURA CONTRA RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO DE DECISÃO DE NATUREZA INTERLOCUTÓRIA. CABIMENTO. EXCEÇÃO. ART. 485, CAPUT, DO CPC. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE.

[...] 2. Segundo o art. 485, caput, do CPC, cabe ação rescisória de sentença de mérito transitada em julgado. Por conseguinte, em regra, não se presta para desconstituir acórdão proferido em recurso especial que julga, em última análise, decisão de natureza interlocutória. 3. Hipótese em que se apresenta aplicável a exceção à regra. O acórdão rescindendo, proferido pela Sexta Turma nos autos do REsp 230.694/SE, ao julgar incabível a concessão do reajuste de 26,05%, reformou decisão interlocutória que, em execução, determinara a citação da União e o cumprimento da obrigação de fazer, consistente em implantar nos proventos do autor o reajuste em tela. 4. Por conseguinte, além de examinar o próprio mérito, acabou por impedir a percepção do reajuste pelo autor da ação rescisória, já assegurado em sentença transitada em julgado. Assim, incorreu em julgamento extra petita

30 e contrariou a coisa julgada, violando, de forma literal, os arts. 128 e 460 do Código de Processo Civil. 5. Pedido julgado procedente.

(BRASIL, 2007)

Já nos incisos do art. 485 do CPC, encontram-se os pressupostos específicos da Ação Rescisória. São as situações que ensejam a procedência do pedido para que seja rescindida a sentença. Passamos à análise de cada uma das nove situações.

Pode se dar quando a sentença é dada por prevaricação, concussão ou corrupção do juiz, quando constatado algum dos tipos penais previstos, respectivamente, nos seguintes artigos do Código Penal:

Art. 316 - Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida.

Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem. Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.

A existência de algum dos delitos pode ser comprovada no curso da Ação Rescisória, sem a necessidade de que exista instauração da ação penal contra o magistrado no momento do ajuizamento da ação. Segundo Souza e Silva (2009), se sobrevir sentença condenatória ou absolutória, essa influenciará a ação de impugnação, salvo se a absolvição se fundar na falta de provas. Ainda, no caso de rescisão de acórdão, é fundamental que o vício macule o voto vencedor, faltando interesse processual se estiver viciado o voto vencido.

Ainda, quando a sentença é proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente, nas hipóteses do artigo 134 do CPC:

É defeso ao juiz exercer as suas funções no processo contencioso ou voluntário: I - de que for parte; II - em que interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como órgão do Ministério Público, ou prestou depoimento como testemunha; III - que conheceu em primeiro grau de jurisdição, tendo-lhe proferido sentença ou decisão; IV - quando nele estiver postulando, como advogado da parte, o seu cônjuge ou qualquer parente seu, consangüíneo ou afim, em linha reta; ou na linha colateral até o segundo grau; V - quando cônjuge, parente, consangüíneo ou afim, de

31 alguma das partes, em linha reta ou, na colateral, até o terceiro grau; VI - quando for órgão de direção ou de administração de pessoa jurídica, parte na causa.

Além das causas de impedimento, cabe a Ação Rescisória quando o juiz atua em desrespeito aos critérios da matéria, da pessoa e do critério funcional, ou seja, fora dos limites da sua jurisdição. Conforme Donizetti (2012, p. 837) exemplo disso é: “[...] o juiz da justiça estadual é absolutamente incompetente para julgar causas em que a União figure num dos polos.”

Ressalta-se que tanto a suspeição como a incompetência relativa devem ser arguidas por meio de exceção própria. Não ensejam assim, possibilidade para rescindir a decisão.

Cabe também, da sentença que resultar de dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou de colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei. Ensina Souza e Silva (2009, p. 427): “há dolo toda vez que a parte vencedora, faltando a seu dever de lealdade e boa-fé, dificulta a atuação processual do vencido ou influencia a formação do convencimento do juiz, afastando-o da verdade.” Por colusão entre as partes, entende-se o dolo bilateral, o qual ambas as partes praticaram a fim de fraudar a lei (DONIZETTI, 2012).

No caso em que a sentença ofende a coisa julgada, poderá ser rescindida a nova decisão que reforma o que foi decidido em julgado anterior. Há controvérsia de entendimento quando não existir a rescisão da segunda decisão. Segundo Gonçalves (2012), a solução almejada por Vicente Greco Filho seria de que a segunda decisão deve ser executada sem que o juiz evite sua eficácia, pois o trânsito em julgado impede a discussão da sua validade. Porém, para o autor, no caso da existência de coisas julgadas antagônicas, entende que deve prevalecer a primeira, em decorrência de que a segunda foi prolatada quando já existente decisão definitiva a respeito.

Quando a decisão viola literal disposição de lei cabe a sua rescisão. Segundo Gonçalves (2012, p.454), “É indispensável que haja afronta direta e induvidosa à lei.”

32 Para Donizetti (2012), súmulas vinculantes editadas pelo Supremo Tribunal Federal devem ser tratadas como lei, pois possuem eficácia erga omnes e vinculam os demais órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública Direta e Indireta. E ainda que a Súmula 343 do STF disponha que: “Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de Lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.” O próprio Supremo tem admitido a ação rescisória fundada em violação à interpretação definitiva de matéria constitucional pelo STF, ainda que posterior à ação rescindenda, desde que na época já existisse a controvérsia sobre a temática.

Ademais, a decisão pode confrontar com a lei material ou processual. Para a Ação Rescisória com base em violação da lei processual, é necessário que o vício seja pressuposto de validade da sentença e não posterior a ela. Em conformidade com isso, tem-se a ementa do Acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais:

AÇÃO RESCISÓRIA - CAUSAS DE RESCINDIBILIDADE PREVISTAS NO ART. 485 DO CPC - NÃO-CONFIGURAÇÃO - VÍCIO POSTERIOR À DECISÃO - NÃO-CABIMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA - FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL - PETIÇÃO INICIAL - INDEFERIMENTO. (MINAS GERAIS, 2007)

Cabe ainda, a impugnação da decisão que se funda em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou provada na própria Ação Rescisória. Não importa se trata de falsidade material ou ideológica, ou seja, respectivamente, se a falsidade incide sobre a integridade do papel ou se versa sobre o conteúdo intelectual do documento. É fundamental que essa prova tenha sido decisiva no resultado do julgamento. Conforme Gonçalves (2012, p. 455),

É indispensável que a prova falsa tenha sido determinante do resultado, que este não possa subsistir sem ela. Se o julgamento está fundado em vários elementos ou provas variadas, e a falsidade de uma delas não seja decisiva para o resultado, não haverá razão para a rescisória.

É possível, também, ser rescindida, se depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava ou de que não pode fazer uso e que seja

33 capaz por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável. Refere-se tal dispositivo ao autor da rescisória, podendo ter figurado na ação originária como autor ou réu. Esclarece Gonçalves (2012, p. 456),

O documento novo não é aquele cuja constituição operou-se após a decisão transitada em julgado, mas cuja existência, embora anterior, era ignorada pelo autor da ação rescisória, ou de que ele não pôde fazer uso, por circunstâncias alheias à sua vontade.

Quando houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação em que se baseou a sentença. Conforme Donizetti (2012) há um equívoco na disposição ao se referir à desistência, vez que essa constitui causa de extinção do processo sem resolução do mérito. Deve ser entendida como renúncia ao direito sobre que se funda a ação ou ao reconhecimento da procedência do pedido.

Portanto é pressuposto quando a confissão, a transação, a renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação ou o reconhecimento da procedência do pedido conter algum dos defeitos previstos no art. 171 do Código Civil, são eles: a incapacidade relativa do agente, erro, dolo, coação, estado de perigo e lesão ou fraude contra credores. Porém, há entendimento pacífico na jurisprudência de que das sentenças homologatórias de transação cabe ação anulatória, estendendo aos casos de homologação da renúncia sobre o direito que se funda a ação ou ao reconhecimento da procedência do pedido.

Conforme Donizetti (2012, p. 843), “É importante frisar que a ação anulatória se dirige contra o negócio jurídico em si, sendo eficaz para invalidá-lo antes do trânsito em julgado da sentença.” Após o trânsito em julgado, só a rescisão é eficaz para desconstituir a coisa julgada, depois de rescindida a sentença é possível o julgamento da lide, diferente da anulação, em que o conflito restaria sem solução (DONIZETTI, 2012).

A última previsão do artigo em acompanhamento é a hipótese de rescisão da sentença fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa. Ocorre erro quando a sentença admite fato inexistente ou quando considera inexistente fato que efetivamente ocorreu. É indispensável que o erro esteja

34 comprovado de plano, pois não se admite que sejam produzidas novas provas do erro na Ação Rescisória, e que a existência ou inexistência não tenha sido expressamente apreciada na sentença (GONÇALVES, 2012).

Ainda que se trate de rol taxativo, segundo Didier Junior, Cunha (2012), é cabível a ação rescisória nos casos de sentença que julga a partilha, conforme dispõe o art. 1030 e incisos do CPC: “É rescindível a partilha julgada por sentença: nos casos mencionados no artigo antecedente; se feita com preterição de formalidades legais; se preteriu herdeiro ou incluiu quem não o seja.” A primeira hipótese se refere ao art. 1029, caput do referido Código, que dispõe o seguinte: “A partilha amigável, lavrada em instrumento público, reduzida a termo nos autos do inventário ou constante de escrito particular homologado pelo juiz, pode ser anulada, por dolo, coação, erro essencial ou intervenção de incapaz.”

No documento Relativização da coisa julgada (páginas 30-35)

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