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Parte I Enquadramento Teórico

Capítulo 1 – Violência doméstica

1.6. Prevalência da violência doméstica

A verdadeira dimensão do problema da VD permanece uma incógnita. Os dados disponíveis sobre violência contra as mulheres variam dependendo da natureza metodológica (Krug et al., 2002) e dos parâmetros usados para definir o termo “violência doméstica” (Gazmararian, et al., 1996), o que explica as diferentes taxas de prevalência entre os países (Krug et al., 2002). Outro grande obstáculo para identificar a extensão desta questão são os casos não reportados de VD (Newton,2001). Deste modo, as estatísticas são ainda contraditórias. Se, por um lado, existem investigadores que defendem que a violência teve uma ligeira diminuição, por outro lado, outros acreditam que houve um aumento, o que pode dever-se ao facto de as mulheres estarem mais sensibilizadas a denunciar os abusos (Berry, 2000). Além disso, as taxas de prevalência de abuso entre relações de coabitação e namoro começam a ser consideradas (Deal & Wampler, 1986; Makepeace, 1983).

De acordo com a WHO (2013) estima-se que uma em cada três mulheres em todo o mundo tenham sido vítimas de alguma forma de violência pelo parceiro íntimo em algum momento da sua vida. Estas mulheres têm duas vezes mais tendência de fazer um aborto, quase duas vezes mais probabilidade de sofrer de depressão, e em algumas regiões, 1,5 vezes mais probabilidade de contrair o vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), comparadas com as mulheres que não sofrem ou sofreram qualquer forma de violência.

Segundo Tjaden e Thoennes (2000), nos Estados Unidos da América (EUA) aproximadamente dois milhões de mulheres são vítimas de algum tipo de violência todos os anos por parceiros íntimos. Estes valores são superiores, na cultura latina, 34% das mulheres referem ter sofrido VD no país de origem ou nos EUA. Berkmane e Glass (2000) acrescentam que a VD é frequentemente um crime oculto em famílias negras e

de minorias étnicas, isto porque as famílias isolam socialmente as vítimas das redes de apoio, ou seja, é um crime predominante de subculturas nos EUA (Matthews, 2004).

É, igualmente, importante salientar, que segundo Eastman, Bunch, Williams, e Carawan (2007) este problema não afeta apenas as minorias pobres que estão em situação de mal-estar social ou o crescente número de hispânicos que emigram para os EUA e sim a população em geral (Kakar, Bassani, Romer, & Gunn, 1996; Murray & Lopez, 2000). No entanto, Matthews (2004) defende que as taxas de VD são cinco vezes superiores entre as famílias que vivem abaixo do limiar de pobreza e existe duas vezes mais hipóteses de serem cometidos por homens desempregados do que por homens que trabalham em tempo integral. A VD ocorre igualmente em áreas urbanas, suburbanas e rurais, sem ter em conta a dimensão socioeconómica (McCue, 2008).

Na Austrália, a Agência de Estatística Australiana (2017)9 estimou que as mulheres

a partir dos 15 anos tem aproximadamente três vezes mais probabilidade de sofrer algum tipo violência dos seus parceiros atuais e/ou anterior com quem convivem do que os homens. Já os países asiáticos e do Pacífico, como a Índia e o Japão registaram as maiores taxas de prevalência com 45% a 59% respetivamente (Kapoor, 2000), seguindo- se os países africanos onde as taxas de prevalência variam entre 28 e 37% (Ntaganira et al., 2008).

De acordo com a Agência para os Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA), na União Europeia (UE, 2014)

Una de cada tres mujeres (33%) ha experimentado violencia fisica y/o sexual desde los 15 anos de edad (…). De todas las encuestadas con pareja (actual o anterior), el 22% han experimentado violencia física y/o sexual por parte de la pareja desde los 15 anos. (p. 17)

Dentro da UE, o Reino Unido parece ser o país onde se verificam mais crimes sexuais violentos (64.500, dos quais 35.800 foram violações [55%]), seguidos pela

9http://www.abs.gov.au/ausstats/abs@.nsf/Lookup/by%20Subject/4906.0~2016~Media%20Release~AB

Alemanha (34.300, dos quais 7.000 foram violações [20%]); França (32.900, dos quais 13.000 foram violações [40%]) e a Suécia (17.300, dos quais 5.500 foram violações [33%])10.

O Eurostat adverte que estes números podem não refletir propriamente o número real dos crime praticados, mas sim as denúncias registadas pela polícia, ou seja, a variação pode ser influenciada pela conscientização geral e atitudes em relação às ofensas de violência sexual.

Em Portugal, em 2016, as estatísticas revelam que em média 14 mulheres sofreram maus tratos físicos, psíquicos e/ou sexuais por dia11.

Segundo o relatório anual da associação supracitada, em 2017, verificaram-se 18 homicídios de mulheres (1,6 por mês) sendo que 50% dos crimes foram praticados pelo marido, companheiro, namorado e 22% foram cometidos pelo ex-marido, ex- companheiro, ex-namorado. Os crimes foram cometidos com arma de fogo e arma branca (União de Mulheres Alternativa e Resposta [UMAR], 2017).

A VD ocorreu de forma continuada em 75% dos casos, sobretudo na residência comum, na residência da vítima e/ou via pública,12. Em cerca de 46% dos casos foi

formalizada denúncia/queixa junto das autoridades competentes (idem).

Quanto ao perfil das vítimas elas são maioritariamente mulheres com idades compreendidas entre 25 e os 54 anos (38,9%). Eram maioritariamente casadas (28,2%), seguindo-se o grupo das solteiras (23,1%) e pertenciam a um tipo de família nuclear com filhos/as (33,4%). No que toca às habilitações e à situação profissional, o grau mais mencionado foi o ensino superior (8,4%), mais de 30% das vítimas eram profissionalmente ativas13. 10http://ec.europa.eu/eurostat/web/products-eurostat-news/-/EDN-20171123- 1?inheritRedirect=true&redirect=%2Feurostat%2Fnews%2Fwhats-new 11 https://apav.pt/apav_v3/images/pdf/Estatisticas_APAV_Violencia_Domestica_2013-2016.pdf 12 Idem 13 https://apav.pt/apav_v3/images/pdf/Estatisticas_APAV_Violencia_Domestica_2013-2016.pdf

Já os agressores eram sobretudo do sexo masculino (80%), tinham idades compreendidas entre os 35 e os 54 anos (23,3%), eram casados (30%) e tinham uma ocupação profissional (32,1%) (idem).

Apesar dos dados serem aterradores, a responsável pela UMAR, Elisabete Brasil refere que

É o terceiro ano [2017] que registamos uma diminuição na incidência de femicídio (…) congratulamo-nos com o facto e achamos que é uma evolução muito positiva, mas ainda é muito cedo para falarmos de uma tendência (…) 18 mulheres assassinadas é sempre muito, nem que fosse uma era sempre muito 14.

14https://www.lusa.pt/article/23300969/dezoito-mulheres-assassinadas-este-ano-n%C3%BAmero-mais-

Capítulo 2 – Educar para prevenir a VD