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3 EXAME DOS PRINCÍPIOS REGENTES DAS MEDIDAS EXECUTIVAS

3.5 Princípio da Subsidiariedade e o prévio esgotamento da via típica

A subsidiariedade dos meios executivos atípicos significa que, somente após a utilização infrutífera dos meios típicos é que se poderia analisar o cabimento dos meios atípicos, não podendo estes serem aplicados de forma direta e imediata.

Nesse aspecto, é importante elucidar que a parcela da doutrina que defende essa aplicação subsidiária das medidas executivas, sustenta que o extenso regramento da execução por quantia certa não poderia se tornar facultativo, uma vez que sua desconsideração ocasionaria inúmeras incongruências.

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Essa desarmonia é exemplificada por Didier Júnior (2017, p. 107) no caso da suspensão da execução pela ausência de bens penhoráveis e sua relação com a prescrição intercorrente, veja-se:

A ausência de bens penhoráveis acarreta a suspensão da execução durante um ano, findo o qual começa a correr o prazo de prescrição intercorrente, que constitui causa de extinção do processo executivo. Ora, se a atipicidade fosse a regra, a ausência de bens penhoráveis não deveria suspender a execução, bastando ao juiz determinar outras medidas necessárias e suficientes à satisfação do crédito. Como, porém, a penhora, a adjudicação e a alienação são as medidas típicas que se destinam à satisfação do crédito, a ausência de bens penhoráveis impede o prosseguimento da execução, não sendo possível, nesse caso, a adoção de medidas atípicas que lhes sirvam de sucedâneo para que se obtenha a satisfação do crédito do exequente. Essa necessidade de prévio esgotamento dos meios executivos típicos é sustentada pela maioria da doutrina, fato este que pode verificado por meio, por exemplo, da sua consagração no enunciado nº 12 do Fórum Permanente de Processualistas Civil, cujo teor é o seguinte:

A aplicação das medidas atípicas sub-rogatórias e coercitivas é cabível em qualquer obrigação no cumprimento de sentença ou execução de título executivo extrajudicial. Essas medidas, contudo, serão aplicadas de forma subsidiária às medidas tipificadas, com observação do contraditório, ainda que diferido, e por meio de decisão à luz do art. 489, § 1º, I e II (DIDIER JÚNIOR et al, 2017).

Ressalta-se que também tem predominado esse posicionamento no âmbito jurisprudencial, conforme pode ser constatado no julgamento do Recurso Especial nº 1782418, cuja relatora – Ministra Nancy Andrighi – sustentou, em seu voto, que:

De se observar, igualmente, a necessidade de esgotamento prévio dos meios típicos de satisfação do crédito exequendo, tendentes ao desapossamento do devedor, sob pena de se burlar a sistemática processual longamente disciplinada na lei adjetiva1.

Na prática, afigura-se que seria necessário o exequente demonstrar que a busca por ativos financeiros por meio de sistemas eletrônicos foi infrutífera, que não foram encontrados bens imóveis executáveis em nome do executado, que não houve a localização de bens móveis por meio do sistema Renajud, que ocorreu protesto judicial e a inscrição do devedor nos órgãos de proteção ao crédito e, por fim, que há indícios de ocultação de bens.

1 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (3 Turma). Recurso Especial nº 1782418/RJ, Relatora Ministra Nancy

Andrighi, julgado em 23 abril 2019, Diário de Justiça Eletrônico, 26 abril 2019. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/713190274/recurso-especial-resp-1782418-rj-2018-0313595-7/inteiro- teor-713190284. Acesso em: 4 ago. 2020.

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Somente após percorrer todo esse trâmite é que poderiam ser utilizadas medidas executivas atípicas, ou seja, mesmo diante da análise que, no caso concreto, uma medida não tipifica em lei seria mais adequada, não seria possível sua utilização se não houvesse o prévio esgotamento das medidas típicas.

É importante elucidar, no entanto, que são feitas críticas contundentes a esse entendimento, sobretudo, no sentido de que, apesar da subsidiariedade poder ser aceita em grande parte das situações, não há razão para enraizar uma prévia limitação que não leva em consideração a possibilidade de existirem medidas atípicas que se adequem melhor ao caso concreto, permitindo uma execução mais eficiente e menos onerosa.

Nesse sentido, é evidente que, diante da complexidade do procedimento de execução, a padronização dos seus atos processuais se mostra como um caminho para trazer coesão e segurança jurídica a esse procedimento, o que, à primeira vista, pode se mostrar com um motivo que justifique a posição defendida pela doutrina majoritária.

Ocorre, contudo, que, assim como é explicado no capítulo 2 deste trabalho, um caminho pautado na previsibilidade não é o único capaz de assegurar segurança-jurídica, podendo esta ser garantida por meio, por exemplo, de uma análise pautada nos princípios da proporcionalidade, da menor onerosidade e da efetividade e do contraditório.

Nesse passo, Rosado (2018, p. 268), ao defender que a segurança jurídica não está inexoravelmente ligada à aplicação de modelos legais pré-estabelecidos, mas sim na análise da medida no caso concreto, sustenta que:

Não faz sentido buscar refrear o potencial da cláusula geral executiva sob o receio do cometimento de arbitrariedades, em desprestígio à interpretação de que a norma em questão, na verdade, impõe ao juiz o dever de adoção das medidas necessárias, adequadas e eficientes à promoção prática de direitos, por influência imediata do direito fundamental à tutela jurisdicional executiva, sem obviamente dispensar o resguardo àqueles valores.

Defende-se, portanto, que o sistema jurídico deve ser analisado como um organismo harmônico de normas coerentes entre si que orbitam ao redor de um eixo comum, sendo imprescindível o estabelecimento de diretrizes sobre a utilização das medidas atípicas, com o objetivo de evitar condutas arbitrárias e não simplesmente reduzir a efetividade de tais meios, sob argumento de que a previsibilidade reduz os riscos de uma atuação judicial desalinhada.

A utilização dos meios atípicos, portanto, não tem o condão de tornar inócuas as demais regras que governam a execução por quantia certa, mas sim garantir a integridade do sistema jurídico, permitindo que, no caso concreto, seja tomada a medida mais adequada.

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a efetividade e, por isso, atipicidade dos meios executivos não romperia o sistema, mas sim o restabeleceria:

Nessa ordem de ideias, o sistema de execução civil há muito mantém como seu eixo direcional o princípio da efetividade. A execução realiza-se no interesse do exequente (CPC/73, art. 612; CPC/15, art. 797); é articulada com a missão de satisfazer o crédito, seja ele de que natureza for. Se é assim, como defender que a atipicidade dos meios executivos compromete a integridade do sistema? Ora, se o sistema executivo tem como plano precisamente a satisfação do credor, como defender que a generalização da atipicidade dos meios o maltrata? Ao contrário, a abertura do código para a técnica dos tipos abertos antes promove a efetividade da execução e restabelece o sistema Frente ao exposto, entende-se que, de fato, a utilização dos meios executivos atípicos sem que houvesse a necessidade de prévio esgotamento dos meios típicos se mostra como a posição mais adequada na busca por um processo executivo que, ao mesmo tempo, prestigie a segurança-jurídica e a efetividade.

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4 ANÁLISE DE DECISÕES JUDICIAIS ACERCA DAS MEDIDAS EXECUTIVAS

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