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CAPITULO I  FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.3 Coerência

1.3.2 Princípio de interpretabilidade

A coerência, segundo Koch e Travaglia (2005, p.11), “diz respeito ao modo como os elementos subjacentes à superfície textual constroem na mente dos interlocutores uma configuração veiculadora de sentidos”. Já a coesão, segundo os autores, pode ser descrita como “o fenômeno que diz respeito ao modo como esses elementos lingüísticos presentes na superfície textual encontram-se interligados, por meio de recursos também lingüísticos, formando seqüências veiculadoras de sentido” (2005, p. 13). Por outro lado, a coerência está diretamente ligada à possibilidade de estabelecer um sentido para o texto, ela é o que faz com que um texto faça sentido para os usuários, devendo, portanto, ser entendida como um

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princípio de interpretabilidade, ligada à inteligibilidade do texto numa situação de comunicação e à capacidade que o receptor tem para calcular o sentido deste texto. A coerência está, pois, ligada à compreensão, à possibilidade de interpretação daquilo que se diz ou escreve.

Segundo Koch e Travaglia (2005, p.12),

a coerência é profunda, subjacente à superfície textual, não linear, não marcada explicitamente na estrutura de superfície. Ela tem a ver com a produção do texto, a medida que quem o faz quer que seja entendido por seu interlocutor. A coerência, portanto longe de se constituir mera qualidade ou propriedade do texto é resultado de uma construção feita pelos interlocutores, numa interação dada, pela atuação conjunta de uma série de fatores de ordem cognitiva, sociocultural e interacional. (KOCH e TRAVAGLIA, 2005 p.12).

Os autores supracitados demonstram que a coerência teria a ver com a “boa formação” do texto, em termos da interlocução comunicativa, sendo, assim, estabelecida na interação, em situação comunicativa entre dois usuários.

Assim, a coerência seria a possibilidade de se estabelecer uma forma de relação ou unidade no texto, que se apresentaria como uma unidade de sentido, o que caracterizaria a coerência como global, referente ao texto como um todo.

Segundo esses autores, a construção da coerência decorre de uma multiplicidade de fatores das mais diversas ordens: lingüísticas, discursivas, cognitivas, culturais e interacionais, tais como: elementos lingüísticos, conhecimento de mundo, conhecimento compartilhado, inferências, fatores de contextualização, situacionalidade, informatividade, focalização, intertextualidade, intencionalidade, aceitabilidade, consistência e relevância, chamados fatores de coerência.

Os elementos lingüísticos servem como pistas, marcas para a ativação dos conhecimentos armazenados na memória. Eles constituem o ponto de partida para a

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elaboração de inferências, ajudam a captar a orientação argumentativa dos enunciados que compõem o texto. Esses elementos lingüísticos são mecanismos de estruturação do texto e correspondem à coesão, sendo importantes para o estabelecimento da coerência.

O conhecimento de mundo, outro fator de coerência, é aquele que adquirimos a medida em que vivemos baseados no mundo que nos cerca e nas experiências que vivenciamos. Tais experiências são armazenadas em blocos na nossa memória, formando o conhecimento de mundo, que se torna crucial para o estabelecimento da coerência, porque se o texto apresenta assuntos desconhecidos pelo receptor, esse não conseguirá calcular-lhe o sentido, ou seja, a coerência.

Já os fatores de contextualização “são aqueles que ancoram o texto em uma situação comunicativa determinada” (KOCH & TRAVAGLIA, 2004, p.81). Eles são fatores que não estão dentro do corpo do texto, como: data, local, assinatura, elementos gráficos, timbre, título, autor, início do texto e que ajudam a situar o texto e, portanto, desempenham um papel importante no estabelecimento da coerência.

A situacionalidade, por sua vez, diz respeito tanto à adequação do texto à situação sociocomunicativa, com a utilização de uma linguagem apropriada, quanto à adequação da situação para o texto, sabendo que a situação comunicativa tem interferência direta na maneira como o texto é construído, sendo responsável, portanto, pelas variações lingüísticas. A situacionalidade exerce relevante papel na construção da coerência, visto que uma seqüência lingüística considerada incoerente em uma situação pode ser coerente em outra.

A informatividade é outro fator que interfere na construção da coerência. Diz respeito ao grau de previsibilidade da informação contida no texto. É importante que o texto se mantenha em um nível mediano de informatividade, no qual se alternam ocorrências de processamento imediato que falam do conhecido, com ocorrências de novidade. É preciso, também, que o texto apresente todas as informações necessárias para que seja compreendido

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com o sentido que o produtor pretende, não contendo apenas informações esperadas, previstas ou redundantes e que deixe inequívocos todos os dados necessários à sua compreensão.

Quanto à focalização, esta diz respeito à delimitação do tema, na concentração dos usuários (produtor e receptor) em apenas uma parte do seu conhecimento, bem como com a perspectiva da qual são vistos os componentes do mundo textual. Diferenças de focalização podem causar problemas sérios de compreensão, impedindo o estabelecimento da coerência. É necessário que na construção do texto o produtor delimite o assunto, focalizando-o e definindo um objetivo para seu texto.

Já a intertextualidade é vista como um fator de coerência, que se recorre ao conhecimento prévio de outros textos. Ela fica evidente quando a construção de um texto possui como base um outro, produzido anteriormente, há um cruzamento de diferentes textos, podendo ser de forma ou de conteúdo. A intertextualidade de forma ocorre quando o produtor de um texto repete expressões, enunciados ou trechos de outros textos ou então, o estilo de determinado autor ou de determinados gêneros de discurso. Quanto à intertextualidade de conteúdo, podemos afirmar que ela é uma constante: os textos de uma mesma época, de uma mesma área do conhecimento, de uma mesma cultura, dialogam uns com os outros.

A intencionalidade e a aceitabilidade são também fatores de coerência. A intencionalidade refere-se à maneira como o produtor organiza seu texto de forma a realizar suas intenções, produzindo os efeitos desejados. A aceitabilidade, em contrapartida, refere-se ao esforço que o receptor faz para calcular o sentido do texto, utilizando as pistas fornecidas pelo produtor, seu conhecimento de mundo e da situação.

Por fim, temos a consistência e a relevância sendo os dois últimos fatores de coerência citados por Koch e Travaglia (2004). Esses fatores exigem que cada enunciado de um texto seja consistente com os enunciados anteriores, sendo verdadeiros e não contraditórios dentro de um mesmo mundo ou dentro dos mundos representados no texto. Além disso, é necessário

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que o conjunto de enunciados que compõe o texto seja relevante para um mesmo tópico discursivo subjacente, isto é, que os enunciados sejam interpretáveis como falando de um mesmo tema.

É importante ressaltar que o que Koch e Travaglia (2004) estão chamando de fatores de coerência, Beaugrande e Dressler (1981) nomearam de fatores de textualidade, considerando a coerência como um desses fatores. Há uma estreita relação entre esses fatores, já que a textualidade é um fenômeno lingüístico que se constitui a partir da coerência e da coesão presentes nos textos produzidos, nas práticas sociais nas quais se encontram inseridos. Nesse sentido, a coerência envolve todos os outros fatores de textualidade já apresentados por Beaugrande e Dressler (1981) e é construída pela soma e interação entre todos eles.

Segundo os autores a coerência se estabelece na interação entre o texto e seus usuários em uma situação comunicativa, por meio de todos os fatores mencionados.

Apresentaremos a seguir a concepção de Charolles sobre texto, coerência e coesão, analisando as semelhanças existentes entre as idéias desse autor com as idéias de Beaugrande e Dressler (1981) e as de Koch e Travaglia (2004).

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