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Capítulo 03: Os dez princípios da impressão 3D aplicados à arquitetura

3.1 Princípios da impressão 3D

3.1.4 Princípio 4 Tempo de entrega é zero

Esse princípio possui amplos impactos, incluindo grandes vantagens para o meio ambiente e possíveis mudanças no comportamento social quanto ao consumo. Sabendo que a construção civil é responsável por 50% da produção de CO², a arquitetura, tendo grande responsabilidade dentro desse cenário - na especificação de matérias e na eficiência energética do edifício – relaciona-se e favorece a humanidade e o ecossistema com esse princípio da manufatura aditiva, que possui como principal resultado a redução de gasto energético no transporte. Para tanto, é preciso conhecer as limitações e as possibilidades desse princípio. Lipson e Kurman apontam a capacidade de impressão sob demanda, ou seja, a impressão de um objeto de imediato, apenas quando preciso, reduz a necessidade de estocagem em companhias. Por exemplo, é possível que uma empresa aeronáutica, ao necessitar de uma peça específica que não possui em estoque, imprima-a no local, tornando desnecessários a encomenda e os custos e gastos ambientais envolvidos nesse processo. Nesse cenário, um navio em trânsito pode imprimir uma peça danificada durante a viagem, repor e seguir o seu trajeto, sem que seja necessário manter estoque.

A arquitetura pode usufruir desse benefício. O escritório DUS Architects possui, no projeto para a Casa do Canal, em Amsterdam, uma impressora no local de construção. Nesse caso, a função da impressora é produzir as peças no local, com a vantagem de por exemplo, se uma das peças for danificada, o tempo e o custo de transporte ao solicitar-se a peça em um local distante acarretariam atrasos e despesas extras. Além disso, o transporte do material em estado bruto é muito mais facilmente deslocado do que o transporte de peças prontas, que demandam logísticas de embalo, envolvem o risco de quebra e ocupam mais espaço que o material compactado.

O apoio a vítimas de catástrofes naturais é tema recorrente ao se pensar sobre os potenciais da impressão 3D. O princípio de “tempo de entrega é zero” é o maior vinculador dessa discussão. Muito se fala sobre a possibilidade de usar a impressora 3D para ajudar vítimas a reconstruírem hospitais e casas rapidamente,

131 mas Tim Minshall aponta que a vantagem está justamente em conseguir produzir objetos cuja demanda é imprevisível, como por exemplo uma peça hidráulica para substituir um cano estourado que pode estar impossibilitando o transporte de água encanada para toda a região.

Figura 109 – Interface do aplicativo para customização de peças hidráulicas sob demanda para conectar tubos de diferentes diâmetros (FIELD READY, 2015)

Um dos fundadores da organização de ajuda humanitária em zonas de desastres “Field Ready”, Ashley Dara Dotz ressalta a intenção da organização, que utiliza impressoras 3D para produzir equipamentos médicos sob demanda, como um simples parafuso que pode ser tudo que falta para um equipamento funcionar corretamente. Dara (2015) diz que uma impressora 3D, em casos como esses, pode servir como um catálogo infinito de todo suprimento de equipamento médico necessário fabricáveis instantaneamente sob demanda e customizáveis. Os materiais podem ser reciclados e produzidos com ABS disponível no local.

Projetos com lógicas parecidas já foram realizados na arquitetura, como o TrussFab que utiliza pequenas conexões para a fabricação de grandes estruturas com garrafas pet de diversos formatos (Kovacs, 2017).

132 Treinando a comunidade local é possível que os doadores circulem o dinheiro na própria comunidade afetada. Os objetos produzidos no local, reciclados um após o outro, possuem um custo menor que os vindos de fora. É economicamente mais viável aos doadores de ajuda financeira contratar a comunidade local para produção dos objetos. Enviar peças únicas a lugares remotos é custoso e leva tempo. Capacitar pessoas no local é um modelo muito mais eficiente para que a população supere mais rápido, una forças e aumente sua resiliência.

Figura 111 - Objetos sendo impressos em um equipamento portátil ligado na bateria de um veículo, (FIELD READY, 2015)

Outro projeto de aplicação de impressoras 3D doméstica para a realização de estruturas arquitetônicas com elementos de conexão que podem ser usados como referência para a aplicação no cenário de construção emergencial é a estrutura comissionada ao SOFTlab pela empresa 3M. A estrutura modular foi feita a partir de tubos de alumínio conectados por mais de 1200 conexões impressas.

Figura 112 - Pavilhao 3M, New York (SOFTLAB, 2015)

O salto exponencial nesse princípio é a união da produção e do consumo em um mesmo local. O que ocorre hoje é que muito se produz em locais onde a mão

133 de obra é barata. Muitas vezes o local onde o material é disponível não corresponde àquele cujo a mão de obra é mais barata, sendo claro o gasto de energia necessário ao transporte da matéria-prima para onde ela será processada, transformada em produto e retornada muitas vezes ao próprio país de origem da matéria-prima. Ou seja, se a impressora 3D for usada em um local distante da obtenção do material, há “uma viagem” de economia de combustível, se o material for retirado do local onde foi impresso, ou seja, o produto construído com matéria-prima local, acarreta a economia de “duas viagens”.

Imagina-se este cenário: o material sai do Brasil, é produzido na China e volta para o Brasil. Houve duas viagens de economia: uma no transporte do material e outra no transporte do produto.

Imagina-se um outro cenário: o material é obtido na China, e enviado ao Brasil para fabricação. Ainda assim, há economia, pois, o volume do material transportado é menor que o volume do produto transportado.

A economia só é verdadeira se feita com materiais locais. Pensando nisso, é preciso entender que o maior benefício ambiental desse princípio para a arquitetura é a impressão de casas com material local. O projeto proposto pela empresa italiana WASP baseia-se nessa lógica ao propor a construção de casas com argila e palha, até agora, no entanto os desenvolvimentos da proposta vêm enfrentando dificuldades.

Esse princípio, juntamente com o pouco desperdício proveniente do uso da impressão 3D, como veremos no “Princípio 8”, fundamenta as bases da construção 3D de modo ecológico.

O princípio de “zero tempo de entrega”, aliado à construção com material local, é o que está por trás da proposta de construção em outros planetas, em estudos dirigidos pela NASA. Esse princípio é elevado quando realizamos a simulação de economia de energia possível na hipótese de construção em solo lunar com material local: o combustível necessário para levar um tijolo ao espaço é 1000 litros, ou 10.000 dólares. E a possibilidade do artigo escrito junto com a NASA foca principalmente na análise da viabilidade de se construir com o regolito, o mineral em pó presente em abundância em toda superfície a lunar. O regolito é o segundo material com mais publicações acadêmicas a respeito no campo da AEC, ficando atrás apenas do concreto.

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Figura 113 - Infográfico da mudança da cadeia de distribuição (LASALLE, 2013)

Além da economia de recursos, há aí uma mudança fundamental de paradigma na concepção humana do século passado e na concepção humana deste século, de como se produz e como se consome, de como pensamos onde produzimos e onde consumimos.

Não precisar de estoque, custo de envio zero por download, tempo de envio zero, rompem um paradigma importante, o que constitui uma das óticas revolucionárias da impressão 3D. O aspecto digital dos arquivos, tende a posicionar a impressora 3D em patamares de revolução digital semelhante aos alcançados pelo MP3 e PDF, na forma como mudaram o modo de acessar música e leitura.