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2. OS PRINCIPIOS NOTARIAIS E REGISTRAIS E OS PRINCIPIOS DA

2.4 Princípios e regras da mediação e da conciliação

Para o estudo destes conceitos basilares, nos servimos do catálogo estabelecido pela Resolução 125, de 2010, do Conselho Nacional de Justiça, que regulamenta e disciplina, em âmbito nacional, a atividade de mediação e conciliação. Os arts. 1º e 2º da referida norma administrativa serão, a partir de agora, objeto de nossas considerações:

Art. 1º, Res. 125/10, CNJ. São princípios fundamentais que regem a atuação de conciliadores e mediadores judiciais: confidencialidade, decisão informada, competência, imparcialidade, independência e autonomia, respeito à ordem pública e às leis vigentes, empoderamento e validação.

I - Confidencialidade - dever de manter sigilo sobre todas as informações obtidas na sessão, salvo autorização expressa das partes, violação à ordem pública ou às leis vigentes, não podendo ser testemunha do caso, nem atuar como advogado dos envolvidos, em qualquer hipótese;

II - Decisão informada - dever de manter o jurisdicionado plenamente informado quanto aos seus direitos e ao contexto fático no qual está inserido;

III - Competência - dever de possuir qualificação que o habilite à atuação judicial, com capacitação na forma desta Resolução, observada a reciclagem periódica obrigatória para formação continuada;

IV - Imparcialidade - dever de agir com ausência de favoritismo, preferência ou preconceito, assegurando que valores e conceitos pessoais não interfiram no resultado do trabalho, compreendendo a realidade dos envolvidos no conflito e jamais aceitando qualquer espécie de favor ou presente;

V - Independência e autonomia - dever de atuar com liberdade, sem sofrer qualquer pressão interna ou externa, sendo permitido recusar, suspender ou interromper a sessão se ausentes as condições necessárias para seu bom desenvolvimento, tampouco havendo dever de redigir acordo ilegal ou inexequível;

VI - Respeito à ordem pública e às leis vigentes - dever de velar para que eventual acordo entre os envolvidos não viole a ordem pública, nem contrarie as leis vigentes;

VII - Empoderamento - dever de estimular os interessados a aprenderem a melhor resolverem seus conflitos futuros em função da experiência de justiça vivenciada na autocomposição;

VIII - Validação - dever de estimular os interessados perceberem-se reciprocamente como serem humanos merecedores de atenção e respeito.

Além dos princípios, a Resolução 125/10 também estabeleceu as regras que devem ser seguidas por mediadores e conciliadores para alcançar a composição dos conflitos:

Art. 2º, Res. 125/10, CNJ. As regras que regem o procedimento da conciliação/mediação são normas de conduta a serem observadas pelos conciliadores/mediadores para o bom desenvolvimento daquele, permitindo que haja o engajamento dos envolvidos, com vistas à sua pacificação e ao comprometimento com eventual acordo obtido, sendo elas:

I - Informação - dever de esclarecer os envolvidos sobre o método de trabalho a ser empregado, apresentando-o de forma completa, clara e precisa, informando sobre os princípios deontológicos referidos no Capítulo I, as regras de conduta e as etapas do processo;

II - Autonomia da vontade - dever de respeitar os diferentes pontos de vista dos envolvidos, assegurando-lhes que cheguem a uma decisão voluntária e não coercitiva, com liberdade para tomar as próprias decisões durante ou ao final do processo e de interrompê-lo a qualquer momento;

III - Ausência de obrigação de resultado - dever de não forçar um acordo e de não tomar decisões pelos envolvidos, podendo, quando muito, no caso da conciliação, criar opções, que podem ou não ser acolhidas por eles;

IV - Desvinculação da profissão de origem - dever de esclarecer aos envolvidos que atuam desvinculados de sua profissão de origem, informando que, caso seja necessária orientação ou aconselhamento afetos a qualquer área do conhecimento poderá ser convocado para a sessão o profissional respectivo, desde que com o consentimento de todos;

V - Compreensão quanto à conciliação e à mediação - Dever de assegurar que os envolvidos, ao chegarem a um acordo, compreendam perfeitamente suas disposições, que devem ser exequíveis, gerando o comprometimento com seu cumprimento.20

Como já ponderamos, diante dos pontos de contato existentes entre os princípios e as regras acima elencadas, passaremos a discorrer sobre ambas as normas fazendo um paralelo com a atividade exercida e os alguns dos já estudados princípios que regem notários e registradores.

20 A Lei 13.140/15 enuncia também os princípios da mediação e da conciliação: “Art. 2º. A mediação será

orientada pelos seguintes princípios: I - imparcialidade do mediador; II - isonomia entre as partes; III - oralidade; IV - informalidade; V - autonomia da vontade das partes; VI - busca do consenso; VII - confidencialidade; VIII - boa-fé. § 1º. Na hipótese de existir previsão contratual de cláusula de mediação, as partes deverão comparecer à primeira reunião de mediação. § 2º. Ninguém será obrigado a permanecer em procedimento de mediação”.

A confidencialidade é princípio já observado por notários e registradores dentro da função que exercem. O sigilo profissional é dever expresso dos delegatário, exigindo-se destes “guardar sigilo sobre a documentação e os assuntos de natureza reservada de que tenham conhecimento em razão do exercício de sua profissão” (art. 30, inc. VI, LNR).

O princípio da decisão informada estabelece o dever do mediador ou conciliador de explicar os direitos e a realidade fática referente à casuística a ser composta pelas técnicas de resolução de conflitos. De modo muito semelhante, tal princípio já é observado por notários e registradores sendo dever dos mesmos de explicar os efeitos de cada operação notarial e registral e deixar os usuários sempre a par das situações fáticas existentes, além de ser dever dos delegatários a emissão de certidões a quaisquer pessoas interessadas, como regra, sem exigir qualquer comprovação de legítimo interesse. Ademais, de modo mais abrangente, a regra da informação exige que todos os procedimentos da mediação e da conciliação, bem como a forma de trabalho, sejam explicados de modo minucioso, facilitando a vida dos interessados, deveres que, outrossim, são inatos às atividades extrajudiciais.21

Sob outra perspectiva, é pertinente frisar que se aplica à mediação/conciliação a regra que prevê a ausência de obrigação de resultado, podendo não se firmar, após conclusa a atividade mediativa ou conciliatória, uma transação entre as partes, o que lhes permitirá buscar outros meios de solução do conflito se desejarem, seja por meio de demanda judicial, seja por intermédio de arbitragem, por exemplo.

O dever de competência, princípio que exige a devida qualificação por parte do mediador e conciliador, vai ao encontro da qualificação profissional exigida dos delegatários de notas e de registro, os quais são profissionais do direito com

21 Art. 225, CC [...] § 1º, [...], VI – declaração de ter sido lida na presença das partes e demais

comparecentes, ou de que todos leram. Art. 1.528, CC. É dever do oficial de registro esclarecer os nubentes a respeito dos fatos que podem ocasionar a invalidade do casamento, bem como sobre os diversos regimes de bens. Art. 17, LRP. Qualquer pessoa pode requerer certidão do registro sem informar ao oficial ou ao funcionário o motivo ou interesse do pedido. Art. 198, LRP. Havendo exigência a ser satisfeita, o oficial indicá-la-á por escrito [...]. Art. 31, LPT. Poderão ser fornecidas certidões de protestos, não cancelados, a quaisquer interessados, desde que requeridas por escrito.

conhecimento jurídico em várias áreas, que enfrentaram árduo e disputado concurso público, demonstrando capacidade de modo meritório. Desse modo, estão o tabelião e o oficial de registro instados “ao seu particular desenvolvimento intelectual, sendo próprio da natureza de sua função o necessário aprimoramento acadêmico e o estudo contínuo dos institutos jurídicos aplicados ao seu mister” (CHAVES; REZENDE, 2013, p. 64), exigindo-se, ademais, que contribuam intelectualmente para o aperfeiçoamento do notariado e dos registros públicos, bem como das instituições essenciais à justiça.

Em outras palavras, não há dúvida que profissionais do direito, como é o caso dos notários e registradores, estão aptos e possuem competência bastante para presidir audiências e sessões de mediação e conciliação, conforme exige o princípio da competência.

Outro princípio que é atendido naturalmente pela atividade notarial e registral é a imparcialidade, vez que os notários e oficiais de registro têm o dever de se manterem equidistantes das partes, jamais devendo colocar interesses pessoais ou de pessoas próximas na frente de interesses dos seus clientes. A fim de preservar esta imparcialidade, aliás, o art. 27 da LNR predispõe que “nos serviços de que é titular, o notário e o registrador não poderão praticar, pessoalmente, qualquer ato de seu interesse, ou de interesse de seu cônjuge ou de parentes, na linha reta, ou na colateral, consanguíneos ou afins, até o terceiro grau”.

Vale frisar que, como corolário da imparcialidade que deve reger a relação do presidente da sessão de mediação/conciliação em relação aos interessados, independentemente da profissão jurídica desempenhada por notários e registradores, estes deverão atuar desvinculados de sua profissão de origem, não podendo prestar um aconselhamento ou assessoramento advocatício às partes, deixando claro que sendo imperiosa a orientação ou aconselhamento direto as partes dever-se-á contratar ou nomear o profissional respectivo para tal finalidade, a fim de que o mediador/conciliador não se retire de sua posição equidistante em relação aos interessados.

O dever de independência e autonomia permite ao mediador e ao conciliador o pleno desenvolvimento da atividade de composição de litígios, tendo em vista que pode analisar sem pressões exteriores ou das próprias partes a melhor forma de conduzir a mediação ou a busca da conciliação. Para os tabeliães e oficiais, a independência no exercício de suas atribuições é direito imanente (art. 28, LNR) e, por certo, do mesmo modo que tal independência é conduzida em suas atividades típicas hoje, também seria implantada na mediação e conciliação extrajudicial nas serventias de notas e registro.

De outra sorte, a legalidade dos atos do mediador e conciliador, assim como dos notários e registradores, deve ser observada, a fim de legitimar os seus atos (art. 30, incs. IV e XIV, LNR). Por tal motivo, o princípio do respeito à ordem pública e às leis vigentes é princípio também naturalmente exigido na atividade notarial e registral, tanto em suas funções típicas, como atípicas, como a mediação e a conciliação.

O princípio do empoderamento retira do mediador/conciliador o protagonismo na busca da solução amigável da contenda, atribuindo este papel às próprias partes, maiores interessadas na melhor solução. Complementa tal princípio a regra jurídica da autonomia da vontade, que exige o respeito do mediador/conciliador ao pensamento de cada um dos interessados, dando liberdade às partes de se expressarem e de decidir de comum acordo. Com efeito, ocorre aqui algo parecido com o que faz o tabelião de notas quando lhe é requerida a formalização de determinado negócio jurídico, cuja função, em um primeiro momento se restringe ao aconselhamento e assessoramento das partes, fornecendo-lhes os caminhos juridicamente possíveis de serem alcançados, de modo a atender o melhor interesse destas, às quais, de comum acordo, chegam a uma decisão conjunta, cabendo ao notário apenas instrumentalizá-la, dando fé pública ao ajuste de vontades.

O último princípio previsto na normativa, o princípio da validação, informa um dever de estímulo dos interessados de se reconhecerem mutuamente como sujeitos de direitos, como seres humanos merecedores de atenção e respeito. Trata-se de um princípio teórico diretamente ligado ao dever de “atender as partes com

eficiência, urbanidade e presteza”, dever expresso dos agentes do notariado e da registratura (art. 30, inc. II, LRP). Do mesmo modo, também diz respeito à aproximação das partes por meio de um terceiro intermediador que deve fazer de tudo para que haja o reconhecimento entre as partes dos direitos de cada um, bem como de que elas reciprocamente merecem consideração, a fim de que, após a composição, possam ao menos manter respeito entre elas. Há aqui uma linha de interseção com o princípio da cautela e da paz social, essência da atividade notarial e de registro.

Tal princípio, além do mais, também se relaciona com a regra determinativa da compreensão quanto à conciliação e à mediação. Isso porque é exigido do mediador/conciliador que promova a ciência e cognoscibilidade das disposições resolvidas entre os interessados, fazendo-os conhecer do direito acordado, e tornando hígido o instrumento de transação para que possa ser executado em caso de descumprimento ou inadimplemento por alguma das partes. É dizer, o cumprimento de tal regra jurídica depende da instrumentalização adequada do termo de mediação ou de conciliação, o que é tarefa desempenhada também – diga-se – pelos notários e registradores em suas atividades típicas.

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