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O problema da morosidade processual

4.3 A COMPATIBILIDADE DO INSTITUTO COM AS

4.3.3 O problema da morosidade processual

Por inúmeros fatores - dentre os quais a insuficiência das estruturas poder judiciário, a displicência dos magistrados, o abuso das partes quanto ao seu direito ao contraditório, a chicana dos procuradores e as próprias disposições legais – o tempo em que o processo deveria tramitar, a de se garantir a efetividade do mesmo, não tem sido observado258.

257 BOTTINI, Pierpaolo & RENAULT, Sergio Rabello Tamm (coordenadores). Reforma do Judiciário. São Paulo: Saraiva 2005.

258 Kazuo Watanabe alerta para a necessidade de ampliação do foco dos estudos sobre a problemática, não devendo os mesmos se limitarem ao mero aspecto organizacional, sua estrutura e funcionalidade. Na sua lição,

Segundo Cruz e Tucci, as principais causas que contribuem para a demora na prestação jurisdicional podem ser agrupadas em três categorias: fatores institucionais; fatores de ordem técnica e subjetiva e fatores derivados da insuficiência material.259

Os fatores institucionais são aqueles que decorrem, segundo o autor, da ideologia “conservadora, mesquinha e extremamente personalista” que predomina entre os políticos brasileiros e impede uma “mobilização destemida” dos mesmos para lograr meios e alternativas visando implementar a operatividade da lei processual260.

Já os fatores de ordem técnica decorrem, também, segundo Cruz e Tucci, do desprestígio da sentença de primeiro grau e da ampla recorribilidade das decisões propiciada pelo sistema recursal brasileiro; enquanto os fatores de ordem subjetiva advêm do despreparo técnico e intelectual dos magistrados, descumprimento por estes dos prazos (impróprios) que lhes são impostos, em total desprezo ao papel social que desempenham261.

Por fim, quanto aos fatores derivados da insuficiência material, o processualista em comento aponta a precariedade das instalações do Judiciário, as condições de trabalho de seus operadores, as más estruturas dos tribunais e dos órgãos de justiça em geral, comparando-os a verdadeiros labirintos kafkanianos262.

No mesmo sentido posiciona-se Arruda, ao afirmar que esses fatores, numa “avaliação grosseira”, podem ser separados em três distintas categorias: “os relacionados a imperfeições do ordenamento jurídico, os problemas de complexidade de um particular processo (ou da conduta das partes nele interessadas), e, finalmente, os que dizem respeito à estruturação do sistema judicial e ao acúmulo de processos.”263

Dentre tais fatores, os que mais interessam ao presente trabalho são os fatores apontados por Cruz e Tucci como “institucionais” e “de ordem técnica” e por Arruda como os “relacionados a imperfeições do ordenamento jurídico” e “acúmulo de processos”, já que o dispositivo objeto deste estudo constituiu-se numa alteração legislativa visando à implementação da

novas estratégias de tratamento dos conflitos de interesses têm sido analisadas e até mesmo postas em prática, procurando-se soluções alternativas aos meios tradicionais em uso, como juízo de conciliação, os juízos arbitrais e a participação de leigos na administração da justiça. Watanabe, Kazuo.Da cognição no processo civil. 3.ed. rev. E ampliada. São Paulo: Dpj editora, 2005, p.32.

259 CRUZ e TUCCI, José Rogério. Ob. cit., p. 99. 260 CRUZ e TUCCI, José Rogério. Ob. Cit., p.100-102. 261 CRUZ e TUCCI, José Rogério. Idem, p. 102-104. 262 CRUZ e TUCCI, José Rogério. Id., p. 105-110. 263 ARRUDA, Samuel Miranda. Ob.cit., p. 273.

“operatividade da lei processual” (institucional), privilegiando a atividade jurisdicional de primeiro grau e diminuindo o tempo da marcha processual, no intuito de sanear “as imperfeições do ordenamento jurídico” e diminuir o “acúmulo de processos”.

Claro que apenas a criação de dispositivos legais objetivando diminuir a ampla recorribilidade propiciada pelo ordenamento pátrio, bem como a implementação da Improcedência Prima

facie de mérito não solucionará a problemática da morosidade processual se não vier

acompanhada de uma mudança nas estruturas do poder judiciário, na preparação dos magistrados e ainda na conduta das partes e seus procuradores264.

No que concerne à insuficiência das estruturas do Judiciário, não apenas na grande São Paulo, onde milita o autor e processualista (Cruz e Tucci) que a aponta como um dos principais fatores da morosidade, encontram-se instalados cartórios, gabinetes e outras estruturas que muito se assemelham às descritas por Franz Kafka em sua famosa obra “O processo”, podendo tal problemática ser constatada nas estruturas judiciárias de praticamente todo o país. Quanto ao despreparo dos magistrados e à falta de comprometimento destes com a função que exercem é sabido que, pela própria falibilidade do sistema de avaliação dos candidatos à magistratura, estes acabem por ingressar em tal carreira ─ atraídos pela estabilidade, status e boa remuneração do cargo ─ sem qualquer vivência jurídica265 e ainda sem consciência do importante papel social que desempenham.

Tal inexperiência e descomprometimento, aliados ao despreparo técnico, muitas vezes nos

264 Criticando a atribuição da morosidade processual aos recursos Egas Moniz de Aragão afirma que “Os que criticam os recursos [...] apóiam-se basicamente em aspectos patológicos do funcionamento do Poder Judiciário, em que sua morosidade assume relevante importância. Todavia o combate à lentidão processual não se faz com a supressão de vias de recorrer, mas com a aceleração generalizada da marcha da máquina judiciária. Se esta, no seu todo, funciona devagar e ninguém se preocupa com o porquê, devagar continuará a funcionar, embora reduzido o número de recursos. Mesmo que se chegue à extinção absoluta, que deixará os tribunais entregues à ociosidade, perdurará a lentidão na primeira. Tenho insistido – em vão, reconheço – que é preciso diagnosticar a causa da demora para poder equacionar e solucionar adequadamente o problema em seus múltiplos aspectos. O que mais adeptos atrai, no entanto, são as soluções imediatistas, elucubradas em gabinetes, as quais, com o tempo, revelam-se muitas vezes insatisfatórias.” (ARAGÃO, Egas Moniz de. Demasiados Recursos? Revista de Processo. Ano 31, n. 136, julho de 2006, p. 20-21.)

265 A esse respeito insta observar que a Emenda Constitucional n° 45/2004 alterou os artigos 93 e 129 da Constituição da República, de modo a estabelecer como requisito para o acesso às carreiras da Magistratura e do Ministério Público o desempenho de atividade jurídica pelo bacharel em direito por, no mínimo, três anos. Em atendimento à referida exigência os editais dos respectivos concursos têm exigido certidões, expedida pela OAB e por cartórios, nas quais se atestam, respectivamente, quanto tempo o candidato está inscrito junto àquele órgão, bem como em quais processos atuou como procurador. No entanto, para obtenção de referida certidão junto à OAB basta que o candidato esteja inscrito neste órgão de classe há pelo menos três anos até o ingresso na carreira de magistrado ou promotor de justiça. Já o efetivo exercício da atividade jurídica será auferido através da certidão dos cartórios onde tramitam processos em que o candidato figurou como patrono de uma das partes, as quais podem ser obtidas, ainda que o candidato só tenha assinado em conjunto com outro advogado, efetivo responsável pelo “exercício da atividade jurídica”. Assim, ante a fácil burla às disposições da emenda 45, fácil também é a constatação de que a mesma pouca contribuição trouxe ao problema da insuficiência técnica e subjetiva dos juízes.

mesmos encontrados, dá ensejo a decisões desarrazoadas e equivocadas, as quais suscitam, por conseguinte, a interposição de inúmeros incidentes e recursos que em muito contribuem para a lentidão da tramitação processual.

Ademais, não se pode negar ainda a contribuição das partes e seus procuradores para demora na prestação jurisdicional, que se valem de expedientes legais, não para buscar o seu direito, mas exclusivamente para retardar o reconhecimento e efetivação do direito da parte contrária. Na sociedade coetânea os bons advogados não são os que, se valem de expedientes éticos, na defesa dos interesses de seus clientes, mas os que se valendo de escusas legais (embora da maneira com que são utilizadas, muitas vezes beirem à ilicitude) conseguem procrastinar o feito “ad eternum”.

Enfim, muitos são os fatores que contribuem para a demora na prestação jurisdicional, mas o que mais importa para o presente trabalho, como já apontado, é analisar acuradamente o instituto da Improcedência liminar de mérito e suas principais imbricações.