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4.2 A metodologia de Mi-Suen Lee

5.1.1 Os problemas de agrupamento perceptivo

Uma breve cr´ıtica ao m´etodo de Guy, realizada por Thornber & Williams [THO 96], sugere que sua abordagem n˜ao pode modelar a distribui¸c˜ao inicial das trajet´orias poss´ıveis de conex˜ao por defin´ı-las de forma determinista. Segundo Williams & Hanson [WIL 96], Guy utiliza somente aspectos limitados do problema de conex˜ao ilus´oria, como a forma dos contornos. Tanto esses quanto v´arios outros trabalhos tentam caracterizar a distribui¸c˜ao das poss´ıveis trajet´orias de forma estoc´astica ao inv´es de utilizar campos fixos [WIL 99].

Outras abordagens ao problema [GRO 87, HEI 93, LEO 97] sugerem que tais con- tornos n˜ao podem ser decididos apenas com trajet´orias de conex˜ao. Em contrapar- tida, sua proposi¸c˜ao de n˜ao realizar decis˜oes locais, ao contr´ario de v´arios trabalhos [AHU 89, MOH 89], se mostrou pertinente na busca da solu¸c˜ao.

Obviamente, a contribui¸c˜ao de Guy no campo de agrupamento perceptivo est´a legi- timada. Utilizando dados sint´eticos, ele provˆe resultados favor´aveis quanto ao problema de detec¸c˜ao de contornos ilus´orios e, principalmente, quanto ao problema de fechamento de contornos. Sua abordagem constitui um novo paradigma metodol´ogico para essa classe de problemas e, desse modo, uma importante contribui¸c˜ao cient´ıfica.

Isso n˜ao quer dizer que o m´etodo seja vi´avel em problemas reais de agrupamento. 71

Cap´ıtulo 5. Epistemologia cr´ıtica 72

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E importante salientar que as aplica¸c˜oes acima carecem de uma adapta¸c˜ao especial do m´etodo proposto para a reconstru¸c˜ao. Campos de influˆencia especiais e um processo intermedi´ario para encontrar pontos finais em segmentos s˜ao necess´arios para a detec¸c˜ao de contornos ilus´orios. Como conseq¨uˆencia, o m´etodo final ´e espec´ıfico e n˜ao robusto. Absolutamente o contr´ario do reinvindicado por Guy.

O m´etodo de reconstru¸c˜ao tamb´em deve ser adaptado ao problema de fechamento de contornos. A presen¸ca de ru´ıdo estruturado nas imagens, i.e., pequenos segmentos, podem perturbar as conex˜oes mais relevantes. Durante a extra¸c˜ao de m´aximos locais, n˜ao se pode determinar quais contornos s˜ao v´alidos. Como os campos de influˆencia tˆem extens˜ao fixa, as regi˜oes de baixa densidade de pontos podem n˜ao ter contornos extra´ıdos, enquanto as de alta podem gerar bordas aberrantes. O m´etodo ´e, portanto, invi´avel para imagens com contornos complexos.

5.1.1.1 Uma visada epistemol´ogica

Para explicar as considera¸c˜oes feitas acima deve-se questionar de forma mais apro- fundada:

• o m´etodo e as no¸c˜oes matem´aticas empregadas por Guy s˜ao capazes de expressar princ´ıpios de percep¸c˜ao por ele argumentados?

• definir e aplicar a continuidade circular por meio de campos vetoriais pode imitar a percep¸c˜ao pr´e-atenciosa?

Observe que n˜ao se discute leis da percep¸c˜ao. Muito avan¸co foi feito no sentido de se evidenciar o seu processo natural, mas n˜ao se tem tal n´ıvel de esclarecimento.

Baseando-se na teoria das modalidades c´osmicas de Dooyeweerd [DOO 58, MAR 99], o fenˆomeno de percep¸c˜ao visual ´e, no m´ınimo, sujeito na modalidade bi´otica que ´e regida por leis pr´oprias, possui rela¸c˜oes pr´oprias e caracter´ısticas que lhe s˜ao irredut´ıveis a qual- quer outra modalidade. Contudo, tal fenˆomeno depende das modalidades precedentes: f´ısica, cinem´atica, espacial e num´erica.

Ora, as solu¸c˜oes de Guy s˜ao regidas pela modalidade espacial e, por conseq¨uˆencia, num´erica. Segundo Martins Jr. [MAR 99], “...a matem´atica por se apresentar na base dos fenˆomenos da existˆencia ´e portanto universal e serve para descrever qualquer coisa. N˜ao goza, todavia, da propriedade de esgotar a possibilidade de descri¸c˜ao de algum fenˆomeno de qualquer modalidade que seja...”. Portanto, no melhor dos casos poder-se-ia responder as quest˜oes acima com: sim, mas n˜ao s´o.

Conclui-se que o m´etodo de Guy, ao inv´es de realizar “organiza¸c˜ao perceptiva”, rea- liza “organiza¸c˜ao espacial”. O instrumento matem´atico somente representa os princ´ıpios de agrupamento perceptivo. Isso explica sua aplicabilidade limitada em problemas de percep¸c˜ao e a necessidade de adapta¸c˜oes para esse fim.

5.1.2 Reconstru¸c˜ao de estruturas

O m´etodo de Guy realiza uma reconstru¸c˜ao de curvas em 2D baseado em princ´ıpios de agrupamento perceptivo. Isto ´e o resultado de sua tentativa de “prover um m´etodo intermedi´ario entre algoritmos de baixo e alto n´ıvel em processamento de imagens”. O

5.1. Discuss˜ao sobre o trabalho de Guy 73

m´etodo s´o ´e reconhecido como tal por Medioni et al. [MED 00] que ainda o relaciona aos problemas de percep¸c˜ao.

Pode-se considerar que a extens˜ao do m´etodo para reconstruir superf´ıcies em 3D ´e circunstancial. Ou seja, n˜ao ´e inerente ao problema original, mas `as circunstˆancias geradas pela solu¸c˜ao dada. O m´etodo de reconstru¸c˜ao em 2D foi estendido para 3D porque seus fundamentos s˜ao compat´ıveis com o problema de reconstru¸c˜ao de superf´ıcies.

Todavia, Guy argumenta que seu m´etodo de reconstru¸c˜ao em 3D busca emular a inferˆencia de formas realizada pela vis˜ao humana. Isso pode ser especula¸c˜ao, nem mesmo plaus´ıvel, sob a perspectiva da ´area de agrupamento perceptivo. A partir de uma re- ferˆencia epistemol´ogica, ´e um exagero pensar que o m´etodo proposto codifica fun¸c˜oes de um processo visual complexo.

Isso demonstra que o trabalho convergiu para o problema de reconstru¸c˜ao mas suas id´eias permaneceram estacionadas nos fundamentos de percep¸c˜ao. Isso induz uma com- preens˜ao de acordo com a perspectiva dessa ´area.

Focalizando o problema de reconstru¸c˜ao de superf´ıcies, coloca-se a seguinte quest˜ao: os fundamentos de percep¸c˜ao podem fornecer parˆametros, como a forma do campo ou a metodologia de acumula¸c˜ao, que sejam ´otimos para se reconstruir superf´ıcies? Observe que a problem´atica envolvida no m´etodo de reconstru¸c˜ao proposto n˜ao explica fundamentos de percep¸c˜ao e tampouco pode ser explicada por esses.

Acredita-se que a influˆencia de temas de vis˜ao computacional levou rapidamente aos excelentes resultados obtidos em reconstru¸c˜ao, mas discuss˜oes mais profundas sobre as possibilidades e limites de suas propostas seriam extremamente pertinentes. V´arias quest˜oes topol´ogicas, geom´etricas e de representa¸c˜ao restam abertas.