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Como parte dos procedimentos metodológicos, estabelecemos um roteiro para coleta e um plano de análise com o objetivo de orientar o percurso da pesquisa. Nosso objetivo nesta seção, a partir do método que optamos, é fornecer um descritivo dos processos e critérios de seleção do campo e dos depoentes, da elaboração e aplicação dos instrumentos de coleta, bem como exemplos da análise e interpretação das informações levantadas.

A escolha da metodologia das Representações Sociais, amparada na técnica do Discurso do Sujeito Coletivo se deu a partir de nosso anseio por estudar a interdisciplinaridade no seu trânsito entre a política pública e a prática pedagógica, não exclusivamente como teoria, mas, especialmente, no seu papel enquanto Representação Social e elemento de identidade grupal, seja enquanto fazer científico ou “transformação vulgarizada de grandes teorias”. Tal fato nos motivou a trabalhar com a Teoria das Representações Sociais a partir da técnica do Discurso do Sujeito Coletivo, dada a sua capacidade de tratar dos conhecimentos utilizados pelos indivíduos e grupos sociais nas suas interações cotidianas e produzir, como dissemos anteriormente, um

corpus mais próximo da empiria.

O universo da pesquisa se constituiu nos Bacharelados Interdisciplinares do IHAC, unidade da UFBA. Optamos por restringir o contexto empírico aos quatro BIs, a saber Artes, Ciência & Tecnologia, Humanidades e Saúde porque além de apresentarem um novo modelo de arquitetura institucional e curricular relacionada ao REUNI, sua expressão numérica é considerável dentro do contexto da UFBA. Conforme dados disponibilizados pela Diretoria do

Instituto referentes ao semestre 2016.1, o IHAC é composto por 29 (vinte e nove) servidores e servidoras técnico-administrativos, 58 (cinquenta e oito) docentes efetivos – o banco de vagas do Instituto é de 69 (sessenta e nove), mas 11 (onze) estão em fase de concurso para seleção docente -, 06 (seis) substitutos e 4251 (quatro mil, duzentos e cinquenta e um) estudantes, 930 (novecentos e trinta) ligados ao BI de Artes, 1058 (mil e cinquenta e oito) matriculados no BI de Ciência e Tecnologia, 1376 (mil trezentos e setenta e seis) no BI de Humanidades e 887 (oitocentos e oitenta e sete) no BI de Saúde.

Parte de nosso desafio foi estabelecer critérios que, diante de um contingente tão elevado, fossem capazes de constituir uma amostra significativa qualitativamente. Para tanto, nosso enfoque foi a relação de sentido que se estabelece entre o problema investigado e a escolha dos participantes, de modo que a seleção dos depoentes considerou não apenas a quantidade, mas também a variabilidade e a qualidade dos mesmos, já que, conforme Lefevre e Lefevre, a escuta por diferentes ângulos é capaz de tornar uma amostra representativa “não

pela quantidade dos entrevistados, mas pela sua variabilidade na composição do tecido social”

(LEFEVRE e LEFEVRE, 2012, p. 116). Buscamos assim realizar um levantamento cuidadoso da relação entre sujeitos, suas especificidades e o nosso de problema de pesquisa, que foi facilitada por nossa experiência pessoal como servidor-técnico administrativo no IHAC.

Diante disto, escolhemos – a partir da posição que os sujeitos ocupam no campo pesquisado - quais e quantos sujeitos seriam necessários para configurar o campo social de modo que pudessem reconstituir minimamente a polifonia existente em determinado tempo e espaço de estudo. Para que esta reconstrução da multiplicidade de discursos existentes no universo pesquisado seja potencializada, nossa pesquisa enfocou pessoas que pelo seu envolvimento prático no contexto pesquisado estivessem aptas a emitir julgamentos, posicionar e argumentar sobre a temática e a dar opiniões com riqueza de detalhes, de modo a constituírem depoimentos interessantes e ilustrativos o suficiente para compor e reconstruir o Discurso do Sujeito Coletivo.

Portanto, optamos por garantir a presença dos três segmentos – docentes, discentes e técnicos -, enfocando aquelas e aqueles do corpo funcional com ligações com a gestão e, dentre estudantes, pessoas com pelo menos 04 (quatro) semestres de vivência nos BIs, preferencialmente que tivessem tido contato com processos de gestão institucional e/ou estudantil. No intuito de garantir a representatividade dos 04 (quatro) BIs, mas sem perder a profundidade da entrevista, decidimos por entrevistar 02 (dois) estudantes de cada curso, totalizando 08 (oito) estudantes. Utilizamos esta margem de referência na hora de selecionar docentes e técnicos-administrativos em contato com a gestão, que com a inclusão em cada um

dos dois grupos de 01 (um) depoente formalmente desligado de suas funções, mas fortemente indicado pelos outros entrevistados devido a seus acúmulos sobre a temática, chegamos ao número de 09 (nove) gestores e 09 (nove) servidores técnico-administrativos.

Conforme caracterizados na Tabela 08 os 26 (vinte e seis) depoentes se dividem em três grupos quanto a sua relação com os Bacharelados Interdisciplinares: 08 (oito) discentes que lá estudam ou estudaram, 09 (nove) docentes que exercem ou exerceram cargos de gestão nos mesmos e 09 (nove) integrantes do corpo técnico-administrativo que trabalham ou trabalharam diretamente em setores ligados à gestão e planejamento acadêmico. Todas e todos colaboraram de forma voluntária para pesquisa. A faixa etária dos informantes está entre 21 e 64 anos de idade; quanto ao sexo, 09 (nove) são do sexo feminino, 15 (quinze) do masculino e 02 (dois) não declarados; a cor/raça auto-atribuída foi de 08 (oito) como branca, 15 (quinze) como negra – a soma de pretos e pardos, conforme classificação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – e 03 (três) não declarados; o tempo na instituição varia de cerca de um ano até aproximadamente 40 (quarenta) anos, sendo que os discentes participantes tinham no mínimo 02 (dois) anos de convivência com os BIs, entre os gestores 03 (três) se vincularam ou já estavam vinculados à UFBA quando da criação do IHAC e o mesmo se dá com 01 (um) dos técnicos-administrativos

No que toca à formação acadêmica, todos os gestores possuem doutorado, sendo que 02 (dois) possuem pós-doc; entre os técnicos-administrativos, 01 (um) possui doutorado, 03 (três) mestrado e os demais graduação; entre os discentes, 03 (três) estão cursando os BIs e 05 (cinco) já concluíram o bacharelado, 04 (quarto) migraram e 01 (um) está pleiteando vaga nos CPLs; 02 (dois) já possuíam outra graduação antes dos BIs e 01 (um) iniciou outro curso superior antes dos BIs mas abandonou. Entre os discentes, 04 (quatro) estão ou estiveram envolvidos com aspectos da gestão institucional ou estudantil através de participação nos C.A.s, DCE, Congregação e demais Conselhos ou Fóruns da UFBA.

Tabela 08 - Caracterização de depoentes

Depoente Sexo Idade Cor/Raça Grau Acadêmico Tempo na instituição

Discente01 F 36 Preta Graduação 04 anos

Discente02 M 23 Negra Graduação 03 anos

Discente03 M 21 Parda Graduação (em curso) 02 anos

Discente05 M 22 Preta Graduação 04 anos

Discente06 F 21 Parda Graduação 42 meses

Discente07 M 32 Preta Graduação 30 meses

Discente08 M 25 Branca Graduação (em curso) 03 anos

Gestor00 M 50 - Doutorado 09 anos

Gestor01 F 48 Branca Doutorado 06 anos

Gestor02 M 44 Branca Doutorado 06 anos

Gestor03 M 45 Branca Doutorado 08 anos

Gestor04 F 41 Negra Pós-doutorado 03 anos

Gestor05 M 57 Negra Doutorado 07 anos

Gestor06 M 64 Branca Pós-doutorado 40 anos

Gestor07 - 43 Branca Doutorado 05 anos

Gestor08 M 45 Parda Doutorado 30 meses

Técnico00 M 29 Parda Graduação 04 anos

Técnico01 F 51 Parda Doutorado 03 anos

Técnico02 F 30 Negra Graduação 18 meses

Técnico03 F 31 - Graduação 02 anos

Técnico04 M 33 Branca Graduação 06 anos

Técnico05 F 42 Parda Mestrado 09 anos

Técnico06 F 45 Parda Graduação 11 meses

Técnico07 - 51 - Mestrado 05 anos

Técnico08 M 31 Branca Mestrado 06 anos

Fonte: o próprio autor.

Enquanto pesquisa de caráter descritivo e exploratório, nosso estudo não pretendeu generalizar os resultados, mas, antes, aprofundar conhecimentos acerca da temática problematizada.

Para o levantamento de informações realizamos entrevistas semiestruturadas, baseadas em um questionário com perguntas abertas, de modo a potencializar a emergência de depoimentos, discursos e narrativas capazes de refletir atitudes, comportamentos, interações e pensamentos dos depoentes no contexto dos BIs no que se refere a interdisciplinaridade, a fim

de que pudéssemos compreender suas Representações Sociais. A partir do que preconiza Lefevre e Lefevre (2012) sobre a construção técnica e criativa de instrumentos de pesquisa, buscamos elaborar um questionário considerando o perfil dos depoentes e a natureza do tema pesquisado, capaz de obter respostas mais autênticas e através do qual os depoentes pudessem constituir um rico material discursivo, amplo o suficiente para amparar os objetivos da investigação, elemento necessário ao método do DSC e consonante com fundamentos da pesquisa qualitativa.

Os instrumentos (VIDEANEXOSB,CeD) foram elaborados em três versões similares: uma para docentes em papel de gestão, outra para discentes e uma terceira para servidores técnico-administrativos. Todas constaram de um breve texto de apresentação, um cabeçalho de identificação para ser preenchido com dados biográficos, acadêmicos e profissionais de cada informante e um conjunto de questões abertas, agregadas em 04 (quatro) grandes blocos, especificados na tabela abaixo com seus respectivos objetivos:

Tabela 09 - Tópicos e Objetivos

Fonte: próprio autor.

Para a realização das entrevistas elaboramos um roteiro e um protocolo, entramos em contato com os potenciais depoentes e marcamos encontros presenciais. Todas as entrevistas

TÓPICOS DE DISCUSSÃO OBJETIVOS

Trajetória, relação com o tema e aspectos conceituais

Investigar a formação acadêmica, a noção de interdisciplinaridade, como se deu o contato com a

mesma e com o projeto do IHAC.

A prática interdisciplinar Identificar como se dá e quais as condições criadas para a prática interdisciplinar nos BIs

Política pública, gestão e aspectos estruturais

Dimensionar o papel do REUNI e da gestão institucional e suas relações com a

interdisciplinaridade

Perspectivas Identificar os impactos, obstáculos, processo avaliativo e desdobramentos possíveis da

foram realizadas pelo pesquisador, geralmente sozinho, sendo 04 (quatro) delas acompanhadas também por bolsistas. A maioria foi conduzida na UFBA, no Campus de Ondina, em espaços reservados, sendo que apenas duas delas foram realizadas fora da universidade, devido à solicitação dos entrevistados. Todas foram, com a permissão dos depoentes via termo de consentimento circunstanciado e esclarecido, gravadas e transcritas integralmente, perfazendo aproximadamente 27 horas e 30 minutos de depoimentos.

Tabela 10 - Protocolo de entrevista PROTOCOLO DE ENTREVISTA

Agradecimento pela colaboração voluntária com a pesquisa sobre o tema da interdisciplinaridade; Apresentação do estudo e de informações sobre a participação do depoente, incluindo o método do DSC; Questionamento sobre dúvidas, ficando disponível para perguntas. Após isto, solicitamos a assinatura do termo

de consentimento;

Apresentação do instrumento para a entrevista semiestruturada, fornecendo o roteiro escrito; Questionamento sobre dúvidas acerca do roteiro, caso negativo, informamos o início do registro de áudio e

procedemos a entrevista, realizando apontamentos durante a mesma;

Após a conclusão do roteiro de entrevistas, perguntamos se há considerações finais, agradecemos e finalizamos o encontro.

Fonte: próprio autor

Buscamos conduzir as entrevistas de maneira a deixar o informante confortável, seguindo o protocolo e roteiro de entrevista pré-estabelecidos, e registrando os depoimentos através de apontamentos e um gravador digital. Para facilitar o processo de análise e identificação, durante toda a realização das entrevistas, bem como na transcrição, os depoentes foram referenciados pelo nome, que foram então substituídos por uma numeração de 00 a 08, distribuída aleatoriamente entre os três tipos de depoentes quando alimentamos o programa

DSCsoft. Os DSCs sofreram também pequenos ajustes, como omissões de nomes e expressões,

de modo a preservar as identidades dos informantes.

Para o tratamento dos depoimentos e consequente tabulação dos dados foi utilizado o

DSCsoft, programa especialmente desenvolvido para dar suporte à técnica do Discurso do

Sujeito Coletivo, agilizando as tarefas mecânicas da pesquisa, tais como: cadastros (dados e bancos de dados de entrevistados, pesquisas, perguntas, grupos etc.), análises (quadros e processos que permitem a realização de todas as tarefas necessárias à construção dos DSCs), ferramentas (exportação e importação de dados e resultados de pesquisa), relatórios (organiza os resultados de pesquisa). Foram seguidos, na ordem, os seguintes passos metodológicos conforme recomendados por Lefevre e Lefevre (2012) para a construção dos DSCs:

Tabela 11 - Tabulação de dados TABULAÇÃO DE DADOS

a. Ler algumas vezes o conjunto das respostas a uma questão, ou artigo de jornal, ou a matéria da revista etc.;

b. Ler cada resposta em particular, identificando as Expressões Chave (ECH);

c. Identificar a ou as Ideias Centrais (IC) de cada resposta, artigo etc.;

d. Analisar todas as Ideias Centrais/Ancoragens (AC), buscando agrupar as semelhantes em conjuntos homogêneos ou categorias;

e. Nomear as Categorias do conjunto homogêneo;

f. Construir o ou os Discursos do Sujeito Coletivo (DSCs) de cada Categoria obtida na etapa <e>;

g. Para construir um DSC é preciso “discursivar” ou sequenciar as ECH, obedecendo a uma esquematização clássica do tipo: começo, meio e fim ou do mais geral para o menos geral e mais particular.

4 CAPÍTULO IV – INTERPRETAÇÃO DOS DADOS E DISCUSSÃO

Como pano de fundo para a apresentação, interpretação e discussão dos dados levantados em estudo de campo, buscamos entrelaçar três eixos orientadores, a saber: o problema de pesquisa e as questões postas a partir deste; o enquadramento conceitual trazido por nossas opções teóricas; e as orientações procedimentais e metodológicas da abordagem adotada.

Constituiu o corpus da pesquisa o produto discursivo coletado em entrevistas semiestruturadas com 26 (vinte e seis) informantes, compondo aproximadamente 27 (vinte e sete) horas de depoimentos gravados que, após processados, foram analisados de acordo com a metodologia previamente aludida.

Procedemos as interpretações dos depoimentos extraídos das entrevistas por meio da técnica do Discurso do Sujeito Coletivo, conforme descrito no capítulo anterior, utilizando o

DSCsoft para desenvolver, para cada pergunta, o processo de análise de primeiro (IAD1) e de

segundo nível (IAD2). A partir destas, confeccionamos os DSCs para cada pergunta, que apresentamos e discutimos abaixo conforme suas categorias.

Retomando os descritores conceituais das dimensões e modalidades de interdisciplinaridade apresentados na seção 1.2.1 do primeiro capítulo, buscamos relacionar, nas três primeiras perguntas que se referem diretamente à mesma, os DSCs com nosso quadro teórico de modo a identificar quais descritores preponderantes nas Representações Sociais expostas nos discursos. Na sessão subsequente, após a descrição e análise das perguntas, é feito um balanço do conjunto das mesmas.