• Nenhum resultado encontrado

2. Método

2.1. Delineamento teórico-metodológico

2.1.6. Procedimentos de análise do corpus

A análise e discussão dos resultados da pesquisa foram desenvolvidas em um trabalho conjunto com a professora Sheila McNamee, Ph.D, durante estágio de pesquisa com duração de três meses realizado na Universidade de New Hampshire, EUA, com apoio da FAPESP.

Como propõe Guanaes (2006), consideramos que a análise das informações da pesquisa tem seu início no momento da transcrição do material, o qual é uma forma de contato com o material de pesquisa que inclui aspectos relevantes para a interpretação das informações, tais como entonações, inflexões de voz e outras particularidades que permitem ao pesquisador atribuir sentidos às conversas.

Após as transcrições, foram realizadas leituras sistemáticas e repetidas das entrevistas, visando a familiarização com o material da pesquisa, a apropriação de assuntos e temas tratados durante as entrevistas e a reflexão acerca de semelhanças e diferenças entre o que foi dito por cada entrevistado. Uma vez realizadas estas leituras, demos início à sistematização dos dados obtidos. Esta sistematização foi pautada em uma análise temática, inspirada pela proposta de Spink (2010) sobre sentidos atribuídos por fumantes a campanhas antitabagistas. As leituras das entrevistas nos sensibilizaram para duas importantes dimensões de análise, a partir das quais os dados foram sistematizados e analisados.

Dimensão 1: Criando uma versão útil dos conceitos construcionistas

Na primeira dimensão de análise, descrevemos como os participantes atribuem sentidos ao construcionismo social. Esta dimensão levantou a necessidade de analisar o

no âmbito teórico. Elegemos, assim, duas obras de Kenneth Gergen: o artigo The Social

Constructionist Movement in Social Psychology (Gergen, 1985), que tem sido considerado

por diversos autores como o marco da entrada das ideias construcionistas na Psicologia e onde ele apresenta as ênfases comuns às diferentes descrições do movimento construcionista; e o livro Realities and Relationships (1997), em que o autor apresenta a proposta construcionista social para as ciências humanas de forma mais detalhada.

Assim, as principais perguntas que nortearam este momento da análise foram: como o construcionismo aparece descrito no relato dos participantes? Sob quais aspectos suas descrições mais se aproximam da proposta teórica construcionista, e em que aspectos estão mais distantes? Como esta discussão nos permite construir sentidos sobre a difusão do construcionismo entre estes terapeutas familiares? Quais são as implicações destas apropriações teóricas em seus posicionamentos como terapeutas familiares?

Consideramos que propor uma discussão que busca articular os pressupostos descritos por Gergen (1985, 1997) com o corpus da pesquisa é um desafio marcante em nossa pesquisa, pois nos colocou diante do exercício de definir limites teóricos que podem convidar a pensar que tais definições do construcionismo são estanques. Reconhecemos, assim, possíveis fragilidades desta proposta de análise, sobretudo por esta encontrar-se em um campo fluido e complexo de definições teóricas – o que, inclusive, nos convidou a delimitar nossos referenciais para tais articulações. Ao mesmo tempo, reconhecemos a relevância de nosso exercício de aproximações entre o corpus da pesquisa e tais pressupostos teóricos, por darem visibilidade a aspectos da difusão destas ideias entre os participantes.

Outro ponto importante se refere ao modo como conversamos sobre estes pressupostos nas entrevistas. Não foi realizada nenhuma pergunta direta acerca do que eles compreendem como sendo o construcionismo social ou os pressupostos deste movimento. Em geral, perguntávamos quais ideias, conceitos e práticas relacionadas ao construcionismo eram mais presentes em suas práticas. Este aspecto é importante porque cria uma possibilidade de conversa em que, muitas vezes, os participantes não se viam implicados em um posicionamento de extensa elaboração teórica acerca destas ideias, sendo que narravam o modo como a compreensão do construcionismo norteia sua ações na clínica. Além disso, é importante destacar que o contato com os participantes e a realização das entrevistas partiu do posicionamento destes terapeutas familiares como “construcionistas”, o que, de maneira indireta, convidou tanto a pesquisadora como os participantes a estabelecerem conversas sobre as propostas construcionistas. No entanto, como afirmamos acima, não propusemos conversas em busca de verificação de conceitos e premissas. Provavelmente, se os

participantes tivessem sido convidados a explorar diretamente estas ideias, suas respostas seriam mais elaboradas em relação a estes temas. As entrevistas falam, ao contrário, da relação mais direta e pessoal dos participantes com o construcionismo

Esta análise nos permitiu criar cinco temas: “Construção social da realidade”,

“Caráter performático da linguagem”; “Relativismo moral”; “Eu relacional”; e “Terapia focada nos recursos da família”. Na análise descritiva destes temas, buscamos reconhecer nas

entrevistas trechos que os representem, de modo que a fala de todos os participantes pudesse ser representada na apresentação da análise.

Partindo do entendimento de que as diferentes descrições da realidade possuem implicações nas relações entre as pessoas e destas com os fenômenos à sua volta (McNamee, 2010), buscamos, paralelamente à esta análise temática, descrever as implicações que tais descrições do construcionismo têm no posicionamento dos participantes como terapeutas. Este momento da análise foi sintetizado no quadro 1, apresentado no próximo capítulo8, em que descrevemos os aspectos teóricos do construcionismo relacionados à prática dos participantes, as formas como tais conceitos são manejados nos atendimentos clínicos, e os participantes com os quais produzimos sentidos sobre os referidos temas.

Uma vez finalizada a análise temática desta primeira dimensão, elaboramos o quadro 2, também apresentado no capítulo seguinte, que sintetiza as informações discutidas ao longo da análise dos cinco temas propostos, destacando informações ligadas ao posicionamento dos terapeutas em seus atendimentos a partir do uso dos diferentes conceitos teóricos analisados. Assim, este quadro resume informações discutidas ao longo da seção em que está inserido, não trazendo ao trabalho novos aspectos de análise.

Dimensão 2. Construcionismo e trajetória profissional: implicações deste encontro

Na segunda dimensão de análise do estudo, nosso foco foi descrever implicações do contato com o construcionismo social na trajetória profissional dos participantes. As perguntas que nortearam este momento da análise foram: quais as principais mudanças que o contato com o construcionismo gerou na prática dos participantes? Como eles se relacionam

8

Optamos por apresentar os quadros apenas no capítulo seguinte, uma vez que eles são materiais relevantes para o leitor situar-se na análise proposta. Assim, evitamos repetir a apresentação de recursos gráficos em partes distintas de um mesmo texto.

com os autores e a literatura construcionista no campo da terapia familiar? Como eles utilizam o construcionismo social e outras escolas da terapia familiar em sua prática clínica?

Assim, a análise deste eixo possibilitou a criação de três temas: “O terapeuta como

facilitador de conversas”; “O terapeuta sensível ao caráter aplicado do conhecimento”; e “O terapeuta sensível ao diálogo com diferentes abordagens”. A análise descritiva destes temas

também buscou reconhecer nas entrevistas trechos que representassem cada temática, de modo que a fala de todos os participantes pudesse ser representada na discussão dos resultados. Em relação a este aspecto, o leitor poderá notar que em alguns momentos da descrição da análise, ao dar visibilidade aos sentidos produzidos com os participantes sobre algum tema, utilizamos como recurso a descrição sintética de como foram as conversas com os participantes sobre a temática em questão, sem que tenham sido apresentados trechos das entrevistas.

Uma vez finalizada a análise temática da segunda dimensão, elaboramos o quadro 3, apresentado no capítulo seguinte, o qual sintetiza as informações discutidas ao longo da análise dos três temas propostos.

™