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PROCEDIMENTOS PARA A COLETA DE INFORMAÇÕES

CAPÍTULO III OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS

3.2 PROCEDIMENTOS PARA A COLETA DE INFORMAÇÕES

Buscando lugares e pessoas diferentes, tomamos a aleatoriedade como princípio para a definição de entrevistas e do perfil dos entrevistados. Não houve lugar nem hora marcados para nosso encontro. Nossa escolha de entrevistados não foi pautada por características físicas, sociais, de cor, idade, ocupação/profissão, ou mesmo escolaridade. Nossa postura, neste sentido, visou justamente não cair na armadilha que detectamos quando fizemos o levantamento de artigos e teses: a de adjetivar o preconceito a partir de categorias de pessoas, como negros, mulheres, homossexuais, deficientes etc.

Nosso objetivo foi pesquisar como o preconceito circula no cotidiano das pessoas através dos discursos e dos processos de produção de sentidos. Para alcançarmos nossa meta, norteamos nossos encontros dialógicos a partir de três questões principais: 1) o que você entende por preconceito?; 2) você já sofreu

preconceito?; 3) você já se flagrou tendo preconceito?6 As entrevistas não foram

fechadas; ao contrário, à medida que a pessoa respondia e a conversa ia fluindo, outras possibilidades de diálogo iam acontecendo, sempre em torno do eixo norteador, ou seja, o preconceito e seus desdobramentos na vida da pessoa.

Pode parecer estranho o uso concomitante dos termos "entrevista" e "conversa". No referencial adotado, contudo, não nos parece nem confuso, nem impossível. Se considerarmos a estrutura das perguntas relacionadas aos objetivos a serem alcançados (MINAYO, 2000), fizemos entrevistas. Mas, no enquadre da Psicologia Discursiva, podemos considerar que também foram conversas, pois buscamos entender a linguagem em uso em encontros casuais e fortuitos, ou as práticas discursivas como linguagem em ação. Ou seja, centramo-nos no que dizem essas pessoas em relação ao preconceito e nas formas pelas quais elas produzem sentidos sobre as experiências relativas a este tema.

A pesquisa foi feita em duas cidades. A primeira foi Curitiba, no Paraná, no primeiro semestre de 2005, onde conversamos com 14 pessoas. A maioria delas encontrava-se no prédio da Universidade Federal do Paraná. Algumas faziam atividades relacionadas a canto-coral, outras a trabalho voluntário. A abordagem aconteceu da seguinte forma: em primeiro lugar, me apresentava como pesqui- sadora. Falava da pesquisa que pretendia fazer para obtenção do doutorado,

6 Nem todas as pessoas responderam a esta questão, pois ela não constava do roteiro, ao

realizar as entrevistas em Curitiba. Como uma pessoa deliberadamente contou um evento de comportamento preconceituoso, achei que seria importante introduzir esta pergunta na segunda leva de entrevistas, realizadas em Belo Horizonte durante o congresso nacional da ABRAPSO (Associação Brasileira de Psicologia Social), e inclui esta pergunta aos entrevistados.

explicando os objetivos da tese, e como seriam usadas as informações, caso me concedessem a entrevista. A partir do aceite da pessoa, o consentimento era formalizado verbalmente pela mesma ao afirmar que se prontificava a responder às perguntas. Portava um gravador pequeno, que apresentava à pessoa, perguntando se ela permitiria o uso do aparelho durante a conversa. Se houvesse consentimento7, ligava o aparelho e dava início à entrevista. É importante

ressaltar que, durante a apresentação dos objetivos e solicitação de consentimento do uso da entrevista na tese, esclareci a postura ética da pesquisa e o compromisso de minha parte, como pesquisadora, de não explicitar nome, sobrenome, ou algum dado que pudesse identificar a pessoa em sua instituição de trabalho, ou alguma outra particularidade que revelasse sua identidade pessoal. Após todos os esclarecimentos e o aceite do entrevistado, iniciava a entrevista com as três perguntas norteadoras.

A segunda rodada de entrevistas foi feita na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais, por ocasião do XIII Encontro da Associação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO), no segundo semestre de 2005. Nesta ocasião, foram entrevistadas 11 pessoas, seguindo os procedimentos usados na cidade de Curitiba: aleatoriedade de escolha, tipo de abordagem, questões éticas, consentimento verbal do entrevistado, e a conversa propriamente dita. As entrevistas foram feitas no campus da Univer- sidade, tanto na praça de eventos artísticos, como nos prédios onde aconteciam os cursos e palestras. Como resultado das entrevistas, tivemos então:

CIDADE FEMININO MASCULINO TOTAL

Curitiba 11 03 14

Belo Horizonte 08 03 11

TOTAL GERAL 19 06 25

QUADRO 2 - NÚMEROS DE PARTICIPANTES POR CIDADE

Pude observar, no desenrolar das entrevistas, que a maioria das pessoas entrevistadas foi trazendo histórias de suas vidas, além de suas noções sobre preconceito, o que enriqueceu muito o material de pesquisa. A intenção era justamente esta: deixar a pessoa com liberdade para expressar suas vivências cotidianas em relação ao tema da pesquisa, dando vazão aos seus sentimentos a esse respeito.

Fiz a transcrição das entrevistas, levando em conta as expressões orais exatamente como foram emitidas. Não exclui conteúdos nem fiz correção ortográfica nas falas. Essa preocupação de minha parte foi devida à diversidade de pessoas que entrevistei: de serventes de pedreiro a professores universitários.

Para se ter uma visualização, ainda que resumida, do que estamos dizendo sobre a aleatoriedade, apresentamos, no quadro 3, o panorama geral das pessoas entrevistadas, com sua idade, gênero, ocupação, lugar de origem e local da entrevista.

Esse quadro possibilita entender a aleatoriedade da escolha de participantes nesta pesquisa. Por uma questão de oportunidade, houve menos homens entrevis- tados do que mulheres, mas não entendemos isso como algo preocupante, uma vez que não tínhamos a preocupação com a questão de gênero. A faixa etária variou de 19 a 56 anos. As ocupações – que também refletem a escolaridade de cada um dos participantes da pesquisa – também são diversas, incluindo desde assistente de jardineiro a pessoas da área jurídica.

NOMES

(fictícios) IDADE SEXO OCUPAÇÃO

ESTADO DE ORIGEM

CIDADE ONDE SE DEU A ENTREVISTA 1. Zélia 42 fem. Estudante de Psicologia e técnica de

enfermagem Minas Gerais Belo Horizonte 2. Selma 40 fem. Psicóloga e professora Minas Gerais Belo Horizonte 3. Ceumar 51 fem. Psicóloga e professora São Paulo Belo Horizonte 4. João 48 masc. Pedreiro Minas Gerais Belo Horizonte 5. Simone 40 fem. Faxineira/serviços gerais Minas Gerais Belo Horizonte 6. Mônica 45 fem. Faxineira/serviços gerais Minas Gerais Belo Horizonte 7. Gal 19 fem. Estudante de Psicologia Santa Catarina Belo Horizonte 8. Ivan 23 masc. Recém formado Psicologia Rio de Janeiro Belo Horizonte 9. Ivete 43 fem. Do lar: trabalho temporário de serviços

gerais para o Congresso Minas Gerais Belo Horizonte 10. Marisa 39 fem. Do lar: trabalho temporário de serviços

gerais para o Congresso Minas Gerais Belo Horizonte 11. Vinícius 26 masc. Auxiliar de jardineiro Minas Gerais Belo Horizonte 12. Djavan 33 masc. Assistente administrativo Paraná Curitiba 13. Leandro 23 masc. Vendedor e músico Paraná Curitiba 14. Nana 30 fem. Comerciante Paraná Curitiba 15. Leila 22 fem. Farmacêutica Paraná Curitiba

16. Sueli 37 fem. Agrônoma Paraná Curitiba

17. Roberta 44 fem. Secretária Paraná Curitiba

18. Rolando 46 masc. Desenhista industrial/projetista Paraná Curitiba

19. Rita 26 fem. Bióloga Paraná Curitiba

20. Cecília 24 fem. Estudante de Arquitetura Paraná Curitiba 21. Cida 56 fem. Aposentada (área jurídica) Paraná Curitiba 22. Ana 41 fem. Aposentada (tribunal) Paraná Curitiba

23. Cora 38 fem. Dentista Paraná Curitiba

24. Marina 43 fem. Arte-educadora Paraná Curitiba 25. Daúde 45 fem. Professora/maestrina Paraná Curitiba QUADRO 3 - PANORAMA GERAL DAS PESSOAS ENTREVISTADAS

A aleatoriedade, como já dissemos anteriormente, foi importante para fugir daquilo que chamamos de preconceito adjetivado, relacionado a questões de gênero, raça, sexualidade etc. Desta forma, nossa preocupação era justamente não sair a campo com o propósito de encontrar pessoas com características previamente escolhidas. Fizemos isso porque buscamos o preconceito não nas pessoas, mas nos repertórios discursivos que permeiam as relações sociais cotidianas e suas produções de sentidos.