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RESUMO

Apresenta-se uma pesquisa-ação com um grupo de velhos em situação de vulnerabilidade social, participantes de uma Organização Não-Governamental em Salvador, Bahia. O objetivo deste artigo é descrever e examinar efeitos de um trabalho de oficinas de contação de histórias com esses sujeitos. Como objetivos específicos, destacam-se: investigar eventuais ganhos de construção de autonomia e melhoria de qualidade de vida e discutir efeitos da pesquisa-ação como ferramenta de ressignificação do processo de envelhecimento com pessoas em situação de vulnerabilidade social. Dentre os resultados obtidos, chamam a atenção alguns aspectos, dentre eles: as oficinas foram percebidas como promoção de uma participação mais engajada e inclusiva pelos sujeitos; ressignificação de estereótipos socialmente construídos sobre a velhice pelos sujeitos e demais usuários da ONG; ampliação do senso crítico e de exigências por condições de vida e relações sociais mais respeitosas; senso de independência; fortalecimento de perspectivas futuras de vida e realização de projetos pessoais; integração grupal e fortalecimento de vínculos, como aspectos que auxiliam no senso de pertencimento e autonomia; fortalecimento da memória; liberação da ludicidade, espontaneidade e criatividade, como aspectos que geram sensações de bem-estar e razoável sentido de emancipação.

Palavras-chave: Pesquisa-ação; Envelhecimento; Contação de histórias; Psicologia do

INTRODUÇÃO

A longevidade vem constituindo o destino humano cada vez mais comum no mundo e no Brasil. Esse fato é facilmente verificável ao ser analisado o número crescente de velhos que, no Brasil, já ultrapassa os 9,7%, quando em 1900 não chegava a 1% (Celich & Bordin, 2008; Costa, 1998; Felipe & Sousa, 2014, Hamilton, 2002; Menezes & Frota, 2012; Kalache, 2007). Viver mais, contudo, não é sinônimo de viver com qualidade de vida. Valentini e Ribas (2003), Hamilton (2002) e Costa (1998) revelam que esse contingente apresenta com muita frequência alterações psíquicas, depressão, ansiedade, hipocondria, tendências suicidas, baixa autoestima e autoimagem, desinteresse pelo quotidiano e/ou humor irritadiço. Já Costa (1998) e Goldenberg (2013) indicam que o velho saudável é aquele que continua vivendo e usufruindo do que a vida pode oferecer, não focalizando apenas perdas ou o que não pode mais atingir, preservando desejos de realização pessoal.

Hamilton (2002) aponta estudos que revelam que pessoas velhas têm pior desempenho nas tarefas de pensamento divergente, ou seja, aquelas que envolvem criatividade. Por outro lado, argumenta que o pensamento divergente não necessariamente é resultado de pior desempenho, mas se torna em geral menos importante, conforme as pessoas envelhecem e passam a dar maior ênfase a aspectos gerados pela experiência pessoal. Se levarmos em conta, no entanto, que ludicidade, criatividade e saúde são instâncias correlacionadas na existência humana, e os processos de criação, por sua qualidade transformadora, têm potencial terapêutico intrínseco (Ciornai, 2004), pode-se inferir que o distanciamento do pensamento divergente no idoso também contribui para o embotamento, aumentando a dificuldade em solucionar novos conflitos.

Costa (1998) sugere que em pessoas com vida criativa, intelectual ou artística, a deterioração intelectual e imaginativa se produz mais tardiamente e com maior lentidão. Complementa, afirmando que muitos problemas psicológicos de velhos provêm de conflitos afetivos e frustrações de épocas anteriores, de forma que dificuldades se acumulam como efeito do processo de vida e não como resultado da própria velhice (Costa, 1998), fortalecendo a ideia de que não existe modelo correto sobre como envelhecer bem. Ao invés, trata-se de uma construção, com aspectos singulares e distintos para cada indivíduo.

Não se pode negligenciar um aspecto estrutural da lógica capitalista contemporânea que induz a ocupar o tempo livre por meio de discursos e práticas sobre, por exemplo, exercitar-se para alcançar qualidade de vida e seguir um determinado modelo de envelhecimento “bem

sucedido”. Esse padrão fortalece a imagem preestabelecida sobre pessoas velhas, que embasa determinadas ações sociais com foco na medicalização e na saúde física (Domingues, 2014). Debert (2002) destaca, na mídia brasileira, a coexistência de anúncios que reforçam a imagem de uma velhice dependente, antiquada, com outros que realçam prestígio, poder e participação, percebendo crescente tendência em representar o velho de forma positiva. Essa visão estimula a percepção de que a velhice depende de escolha individual, voluntarista e, consequentemente, caberia ao indivíduo e não à sociedade (o Estado) escolher entre envelhecer passivamente ou reagir e rejeitar o envelhecimento. A juventude transforma-se em um ideal em si, um bem valioso a ser conquistado, enquanto a velhice seria efeito da negligência de indivíduos que não se engajaram em atividades motivadoras e não consumiram produtos e serviços que combatem o envelhecimento. Envelhecer torna-se sinônimo de desleixo diante de tantos recursos disponíveis, mecanismo que reforça e mantém iniquidades sociais (Bosi, 2004; Debert, 2002).

Nesse contexto, o envelhecer seria o negativo da atividade, da vida saudável, “bem sucedida”; a experiência da velhice passa a ser abordada por discursos especializados. Tal perspectiva impõe mecanismos de controle baseados no estabelecimento prévio de padrões de condutas esperados naquele estágio da vida, incluindo formas padronizadas de envelhecer e invisibilizando experiências singulares (Domingues, 2014). Essa concepção da velhice encobre a heterogeneidade do envelhecer, esvaziando os sentidos construídos em outras direções. Em cada marca corporal, nas rugas e nos cabelos brancos, muitas vezes encobertos por procedimentos estéticos, estão as marcas da passagem do tempo que o velho pode apresentar como testemunha de uma história e um tempo.

Na contramão dessa lógica, experiências nas quais se garanta ao velho o lugar de narrador privilegiado das transformações ao longo do tempo e das relações interpessoais e geracionais podem propiciar saúde, bem-estar e percepções positivas de pertencimento (Bosi, 2004; Domingues, 2014). A criação artística por meio de oficinas de contação de histórias de vida reflete o que May (1975) denomina a coragem de criar. Trata-se de um convite para realizar algo novo e, por isso mesmo, sem guias ou referências, a não ser suas próprias histórias. May (1975) considera criatividade como “a manifestação básica de um homem realizando o seu eu no mundo” (ibid, p. 38), sugerindo que deve ser estudada como a representação do nível mais alto de saúde emocional, expressão de si na ação de atingir a própria realidade.

A estratégia metodológica que adotamos foi a pesquisa-ação2 que, conforme Engel (2000), configura um tipo de pesquisa participante engajada, distinta da pesquisa tradicional, considerada “independente”, “não-reativa” e “objetiva”. Como o próprio nome diz, a pesquisa-ação procura unir a pesquisa à ação prática, isto é, desenvolver o conhecimento e a compreensão como parte de uma prática. É, portanto, uma maneira de investigar em situações nas quais o pesquisador também deseja melhorar a compreensão e a dinâmica de um determinado grupo (Engel, 2000; Thiollent, 2008). A perspectiva aqui assumida considera que toda e qualquer investigação implica uma intervenção, na medida em que tanto o pesquisador como os demais participantes são afetados pela situação de pesquisa. Szymanski e Cury (2004) refletem que as pesquisas que acompanham a implementação de práticas educativas e clínicas em instituições educacionais e/ou de saúde têm sempre um caráter de intervenção e fomentam um processo de construção de uma metodologia apropriada aos fenômenos estudados em seus contextos naturais, respeitando o rigor dos procedimentos, o compromisso com a construção do conhecimento científico, a ética da prática profissional e a responsabilidade social de oferecimento de serviços de qualidade para o grupo em questão.

Este artigo tem por objetivo descrever e examinar efeitos de oficinas de contação de histórias com sujeitos velhos, em situação de vulnerabilidade social, frequentadores do Programa de Idosos de uma Organização Não-Governamental (ONG) no Subúrbio Ferroviário de Salvador, Bahia, desenvolvida por uma Gestalt-terapeuta e uma diretora de teatro. Como objetivos específicos, destacam-se: investigar eventuais ganhos de construção de autonomia e melhoria de qualidade de vida e discutir efeitos da pesquisa-ação para ressignificação do processo de envelhecimento com esses sujeitos.

Na primeira parte, descreveremos a pesquisa-ação e, em seguida, destacaremos a estruturação, organização, planejamento e desenvolvimento das oficinas de contação de histórias propostas com os velhos. Por fim, discutiremos os resultados obtidos, a partir de uma reflexão sobre a condução do processo, tanto por parte das facilitadoras quanto dos sujeitos que aceitaram participar das oficinas.

A contação de histórias, baseadas em relatos de vida e reconstruções de lembranças, pode constituir, segundo nossa hipótese, importante ferramenta para desenvolver bem-estar, autonomia e emancipação, reposicionando o velho na sociedade, devolvendo-lhe o lugar de testemunha e narrador de seu tempo (Domingues, 2014). A memória é considerada neste

2 No âmbito das metodologias ativas, difere da pesquisa-intervenção que, tem como foco a rede de poder e o jogo

estudo como fonte inesgotável de experiências, construídas juntamente com a passagem do tempo e o modo de viver configurado por cada um numa coletividade (Bosi, 2004; Domingues, 2014).

CONFIGURANDO O DESAFIO DE UMA PESQUISA-AÇÃO

Na década de 1960, na área de Sociologia, rapidamente tomou corpo a ideia de que o cientista social deveria sair de seu isolamento, assumindo as consequências dos resultados de suas pesquisas, colocando-as em prática com vistas a interferir no curso dos acontecimentos (Engel, 2000; Franco, 2005). Influenciado por esse contexto, um dos pioneiros da pesquisa- ação foi o psicólogo alemão Kurt Lewin (1890-1947) que, ao propor essa estratégia metodológica, ousou ir além do estudo ou da observação do problema in loco, mas participar dele, conviver com a dor dos sujeitos para compreender clinicamente seus problemas; observar, descrever, analisar e devolver a escuta na busca do conhecimento (Lewin, 1978). Barbier (1985) defende que a gênese social precede a gênese teórica, afirmando que assim como a sociologia americana investigou problemas sociais em zonas urbanas após a Primeira Guerra Mundial, a pesquisa-ação se desenvolveu após a Segunda Guerra Mundial, a partir do doloroso e criminoso processo de genocídio do povo judeu. Tal acontecimento repercutiu diretamente nas escolhas metodológicas de Kurt Lewin (Barbier, 2007). Com efeito, segundo Mailhiot (1985), Lewin, em 1933, por ser judeu, fora forçado pelos nazistas a abandonar a Alemanha com sua família, pagando para não ser recolhido a um campo de concentração. Para esse autor, a indignação de Lewin com o nazismo o estimulou a tentar compreender como os judeus puderam suportar essa situação (Mailhiot, 1985). Sendo sujeito do próprio processo que questionava, Lewin propôs que ele próprio, que poderia ser considerado objeto de pesquisa, se tornasse sujeito e, assim, usufruísse diretamente da investigação, resolvendo seus próprios problemas para aprender a pesquisar e se apropriar da sua realidade. A comunidade se torna, assim, o próprio pesquisador em ação, mediado pelo proponente inicial (Melo, Maia Filho & Chaves, 2016).

Zuniga (1981) refere-se a duas modalidades de pesquisa-ação: uma, inaugurada por Kurt Lewin, constitui-se numa reação à separação entre pensamento e ação; a segunda ligada a um “projeto político crítico, reivindicativo e marginal” (Zuniga, 1981, p. 40) tendo em Paulo Freire seu fundador. O caráter participativo da pesquisa-ação, tal como a define Zuniga

(1981), começa pela palavra com que designa os sujeitos envolvidos: “participantes, que devem ser considerados sujeitos ativos, devendo conhecer os produtos da pesquisa e defender os critérios de utilidade para a comunidade ou grupo” (p. 35).

Engel (2000) diz que esse tipo de pesquisa constitui um meio de desenvolvimento profissional de “dentro para fora”, pois advém de preocupações e interesses dos sujeitos intrincados na prática, envolvendo-os em seu próprio meio. Não há verdades científicas absolutas, pois todo conhecimento é provisório e dependente do contexto histórico, dentro do qual os fenômenos podem ser observados e interpretados (Engel, 2000). Dessa maneira, fenômenos sociais só se revelam quando pesquisadores estão dispostos a se engajar pessoalmente, observando, diagnosticando e intervindo nos processos (Lewin, 1965). Dito de outra forma, fenômenos sociais não podem ser observados do exterior nem de modo estático, porque assim não se tornam perceptíveis ao pesquisador que os apreende participando de sua construção.

Ardoino (1988) discute a pesquisa-ação como alternativa metodológica e epistemológica, pois está em questão uma visão de mundo. Segundo sua visão, trata-se de uma mudança de paradigma. Ele distingue pesquisas que transformam dados do tipo fenômeno em dados científicos, daquelas, mais complexas, cujos dados correspondem a práticas sociais. Uma das características desse tipo de pesquisa é que através dela se procura intervir na realidade de modo inaugural, no decorrer do próprio processo de pesquisa e não apenas como possível consequência de uma recomendação na etapa final do projeto (Engel, 2000; Seibel, 1988; Thiollent, 2008). A pesquisa-ação encontra um contexto favorável, quando pesquisadores não querem limitar suas investigações a aspectos acadêmicos e burocráticos da maioria das pesquisas convencionais. “Com a pesquisa-ação os pesquisadores pretendem desempenhar um papel ativo na própria realidade dos fatos observados” (Thiollent, 2008, p. 18).

Barbier (2007) amplia ainda mais a definição de pesquisa-ação quando afirma que se trata de um estudo psicológico cujo objetivo é a transformação psicossocial, a partir do trabalho de campo. Melo, Maia Filho e Chaves (2016) entendem como psicossocial o fenômeno que é simultaneamente social e psicológico, em que o efeito da interação social é assumido pelo sujeito como sendo seu e sentido pelo grupo social, como a unidade dessa diversidade. É nesse âmbito que a pesquisa psicológica de campo ou a pesquisa-ação implica a “clínica do social”. Para Lewin (1978, p. 220), “é preciso estabelecer processos de averiguação de fatos, olhos e ouvidos sociais, bem no interior dos corpos de ação social”. A temática de intervenção e transformação está vinculada à aspiração de tornar a psicologia social uma ciência da ação. Barbier (1985) situa a pesquisa-ação entre a psicologia clínica e a sociologia clínica,

afirmando que “o objetivo do método clínico em ciências sociais é […] explorar o comportamento e as representações de um sujeito ou de um grupo de sujeitos diante de uma situação concreta, para compreender-lhes o sentido, colocando-se alternadamente na perspectiva de observador e na de sujeitos-atores e de sua vivência” (ibid, p. 46).

Deve-se levar em conta que a pesquisa-ação visa gerar autonomia nos membros de um grupo e, com isto, maior independência na resolução de problemas (Machado et al., 2015), o que é de extrema importância para aquela comunidade.

Além da aplicação no contexto anglo-saxônico, a pesquisa-ação conquistou reconhecimento especialmente na América Latina, como metodologia participativa, mas sobretudo emancipadora, ancorada fortemente na Teologia da Libertação (Padilla, 2017). Como afirma Selener (1997, p. 17), trata-se de “um processo pelo qual membros de um grupo ou uma comunidade oprimida, coletam e analisam informação, e atuam sobre os seus problemas com o propósito de encontrar soluções e promover transformações políticas e sociais”. Conforme Padilla (2017), existe uma tênue linha diferenciadora entre a escola anglo-saxônica e a latino- americana; contudo, ambas pretendem a mudança e o envolvimento crítico e autoconsciente dos participantes, incluindo o papel ativo do próprio investigador.

Em resumo, a pesquisa-ação é ao mesmo tempo uma metodologia de resolução de problemas psicossociais e uma investigação científica e teórica sobre um problema. Sua premissa é que se somos parte do problema, o grupo como um todo dinâmico do qual fazemos parte pode investigá-lo e propor soluções melhores do que um pesquisador isolado e externo ao grupo. Em outras palavras, os sujeitos envolvidos na investigação são uma parte significativa do problema pesquisado e a sua resolução será atravessada pela mudança de comportamento deles na comunidade (Melo, Maia Filho & Chaves, 2016). Nesse processo, instaura-se ou, mais que isso, evidencia-se a natureza psicossociológica do fenômeno, pois é o sujeito em ação na interação com o outro que modifica a si, ao outro, ao grupo e à sociedade. Portanto, sociedade, grupo e sujeito já não se encontram mais em oposição. Teoria e prática não se separam, mas se reconstroem em uma unidade que paradoxalmente não era visível.

Lewin (1978) cunhou o termo “dinâmica de grupo” e definiu seus primeiros contornos com o objetivo de viabilizar a realização da pesquisa-ação. O termo “dinâmica” vem do sentido que a física lhe empresta, qual seja, contrário ao conceito de estática, que significa sem movimento. Assim, dinâmica remete à ideia de movimento, ou seja, a concepção de que, nos grupos, ocorrem fenômenos que lhe dão movimento, vida.

O fato da pesquisa-ação ocorrer sempre em interação grupal exigiu a compreensão desse trabalho coletivo. Para Haguette (1997, p. 115), o envolvimento entre a pesquisa-ação e a dinâmica dos grupos é tal que o pesquisador “deve dominar as técnicas de dinâmica dos grupos e as teorias subjetivas que a informam”. Afinal, a pesquisa-ação é literalmente a ação dinâmica dos grupos com o pesquisador.

FIO QUE VAI SENDO BORDADO DA FALA À CORPOREIDADE: O ENVOLVIMENTO NAS OFICINAS

Este trabalho aconteceu em uma ONG localizada num bairro do Subúrbio Ferroviário de Salvador, Bahia. Seu objetivo institucional é assegurar a proteção social dos moradores da região, por meio de atividades socioassistenciais e socioeducativas com vistas à promoção integral de famílias e de velhos inscritos em sua unidade. Faz parte de um programa nacional que reúne unidades da mesma ONG3 em diversos estados do Brasil. Segundo entrevistas com a supervisora e trabalhadores da unidade, o trabalho realizado por esse espaço tem caráter contínuo, busca fortalecer laços sociais e vínculos familiares, e é organizado por faixas de atendimentos definidas pela política de Assistência Social de proteção básica ou proteção social especial.

O Programa de Promoção Integral do Idoso é o único programa dessa ONG em que os participantes não precisam estar vinculados a uma família cadastrada, e conta com ações que visam ao fortalecimento de vínculos, à prevenção da institucionalização e ao acesso a benefícios e serviços previstos nas políticas públicas nacionais. Segundo a coordenadora da instituição, os usuários que chegam até a ONG são cadastrados, entrevistados e recebem visita domiciliar para a seleção dos mais vulneráveis socialmente. Os critérios para avaliar o grau da vulnerabilidade social envolvem condições financeiras, de saúde, alimentação, moradia, violência, apoio social e familiar. Atualmente esse Programa conta com 50 pessoas inscritas e 30 frequentadores regulares, que comparecem um dia na semana para atividades propostas pela instituição e seus parceiros (universidades, biblioteca do bairro, posto de saúde etc.). Muitos usuários precisam se afastar em determinados momentos por motivos pessoais, como internações ou limitações físicas. Somente em caso de morte, a vaga é aberta para novos participantes.

Participantes e procedimentos para coleta de dados

Este trabalho foi uma produção a muitas mãos. As oficinas foram pensadas, apresentadas e coordenadas por três pessoas: Bruna Improta, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal da Bahia e Fernanda Colaço, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal da Bahia, orientadas pela professora Denise Coutinho que participa de ambos os PPGs. As duas primeiras foram as facilitadoras das oficinas. Na tentativa de borrar as fronteiras hierárquicas, a cada encontro, como já foi dito, modificações podiam acontecer em função da disponibilidade de cada participante, sem perder contudo a ideia de uma produção colaborativa, socialmente referenciada e com vistas à produção de uma encenação, momento culminante deste trajeto criativo-investigativo. Tivemos também sempre em nosso horizonte que não se tratava de um trabalho com finalidade terapêutica, embora evidentemente produza efeitos dessa natureza. O propósito central foi potencializar a criação e a invenção de nós mesmas em grupo, com o grupo e nunca para ou sobre o grupo.

Os participantes são sujeitos acima de 60 anos, frequentadores do Programa. Os sujeitos se inscreveram pelo interesse espontâneo em participar das oficinas, após apresentação da proposta e dos objetivos. No total contamos com 17 mulheres e um homem, entre 60 e 90 anos de idade, com média de participação entre 13 e 15 pessoas por encontro. O projeto foi aprovado no Comitê de Ética (Plataforma Brasil), sob o número 1.916.799. A atividade ocorreu em um período de três meses, entre fevereiro e abril de 2017, com encontros semanais de 2h30min., totalizando sete encontros. Cada oficina foi subdividida em três principais momentos (discriminados no Apêndice 4):

 Encontro de avaliação diagnóstica, apresentação das facilitadoras, da proposta de trabalho e organização do cronograma de atividades. Construção do planejamento (flexível e adaptado em cada encontro), aplicação do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e do questionário sociodemográfico4.

 Oficinas de contação de histórias com temáticas relativas às histórias de vida e o processo de envelhecer. O andamento do processo foi constantemente discutido e avaliado pelos participantes.

4

O questionário sociodemográfico é um instrumento de autoaplicação (quando os sujeitos são alfabetizados) elaborado com o objetivo de coletar informações do participante que ajudem na compreensão do seu contexto