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Os processos de ensino e aprendizagem da natureza realizada no manejo com as roças tradicionais

Cultivar, cuidar das plantas, enfim, preservar a natureza em comunidades indígenas, é algo que se aprende muito cedo na vida, à medida que as crianças acompanham os adultos às roças e tomam parte nas tarefas cotidianas. E quem se acostuma a plantar, dificilmente deixa de exercer tal atividade, pois aprende que cultivando a roça irá colher os frutos que a terra, tão sagrada para si, fornecera para a sua sobrevivência. Sem dúvida, a cultura em relação aos mitos sobre as roças ou alimentos indígenas variam muito de etnia para etnia, mas o que é certo é que seja qual for a etnia indígena, as crianças aprendem desde cedo o valor do trabalho através do cultivo dos alimentos nas roças e o que é mais certo ainda, é que eles aprendem também a importância de fazê-lo de forma a não prejudicar demasiadamente o meio ambiente local.

Segundo Magalhães (1994), as comunidades indígenas têm uma relação diferenciada com seu meio ambiente, e esta diversidade está intimamente relacionada às diferentes formas de organização social desses povos, e no que isso tem implicado, ao longo do tempo, em sua relação com a natureza.

Independente da etnia, os povos indígenas procuram ao longo das gerações, transmitirem aos seus descendentes os seus conhecimentos tradicionais orientando-os como devem relacionarem-se com o seu meio ambiente no processo de cultivo das roças. No Estado de Mato Grosso, identifica-se uma similaridade de processos de ensinamentos e aprendizagens entre as etnias pesquisadas.

Roças Indígenas e Sustentabilidade Muñoz (2003), ao estudar o saber indígena e meio ambiente, identificou formas da memória organizada em atos que se ativam em saberes. Segundo a autora o mundo oral rememora mediante a representação, reproduz e intercambia conhecimentos através de experiências que, ao se transformarem em comunitárias, formam redes de saber coletivo.

A ação mediante a qual são colocadas em prática conforma uma série de estratégia, de habilidades, que bem podem ser entendidas como uma pedagogia comunitária, já que se baseiam principalmente na experiência e nas práticas de ensinar que fazem do trabalho e que dão sentido aos saberes (Muñoz, 2003).

A autora afirma ainda que, o saber indígena vem de práticas comunitárias do saber ser, saber estar, saber dar uso, de um mundo que se reconhece na convivência e nas práticas.

Nesse processo de construção de conhecimentos, os anciões e os pais, por meio de contos, histórias e práticas cotidianas exemplares, ensinam os mais jovens e a seus filhos como devem trabalhar no cultivo do seu alimento e ao mesmo tempo usufruindo e interagindo harmonicamente com os elementos da natureza.

Para Muñoz (2003), da interação com o meio ambiente, a pessoa comunitária extrai saber; um saber ser; saber estar ou saber fazer que através da convivência vai expressando o modo ético comunitário de estar no meio.

“O conhecimento da cultura das roças tem sido transmitido para as novas gerações através dos anciões, eles explicam para os mais jovens o processo todo, sobre o calendário (constelação).

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Roças Indígenas em Mato Grosso

Os pais também são responsáveis por ensinar os filhos, por isso as crianças e os jovens devem participar do cultivo para aprenderem o processo” (Aweti).

Do outro lado, nesse mesmo processo de construção de conhecimentos, temos os aprendizes, que aqui são representados pelos jovens, filhos, netos e sobrinhos. Estes através da observação participante assimilam os ensinamentos tradicionais vivenciados no cotidiano.

“A cultura das roças são ensinados oralmente pelos adultos e anciões e também observando o que os adultos fazem” (Paresi).

“Nós temos uma casa que é só para os homens então senta lá e fala para eles, ou pode ser no pátio da casa, ou na casa da família mesmo” (Rikbaktsa).

“Eles vão com a gente na roça e a gente conversa muito com eles e vai mostrando na prática” (Rikbaktsa).

Para Muñoz (2003), a vida que os índios reconhecem na natureza é tão diversa como a humanidade mesma; nela identificam formas de representação e sentido com as quais a humanidade indígena interatua, e da convivência surgem situações de aprendizagem e intercâmbio.

“Isso daí vem da própria importância da alimentação, daí toda família participa, a criança acompanha os pais e tudo vem da experiência observando e participando” (Kalapalo).

Roças Indígenas e Sustentabilidade “A gente sempre ensina a criança levando elas na roça para elas ver como é, ele tem que acompanhar o pai, o avô, tem que ensinar a cultura para quando chegar a hora ele saber fazer e dar continuidade no que os pais tem feito” (Bakairi).

O saber cotidiano, não somente como aprovação isolada de técnicas e conhecimentos, mas por que também envolve a pessoa e o seu meio, a natureza, a vida vegetal e animal: nessa convivência pratica-se o respeito, que ensina diversas estratégias de apropriação do entorno, da natureza (Muñoz, 2003). Muñoz (2003), ao estudar comunidades indígenas, identifica a noção de “aprendizagem” e a sua importância comunitária com base na observação do mundo da vida social, em que a comunidade indígena revela ao olhar antropológico uma diversidade de experiências compartidas que vão conformando o sentido e identidade, arraigo a esse mundo próprio em que a pessoa aceita e conota saberes e um sentido compartido de aprender e conhecer em solidariedade. Diante das mudanças culturais que vem ocorrendo nas comunidades indígenas de Mato Grosso, torna-se fundamental que os professores indígenas trabalhem temas relacionados com seus conhecimentos tradicionais, manejo das roças de toco, seus mitos e alimentos cultivados, com o objetivo de resgatar e incentivar as práticas culturais dentro das próprias comunidades.

Os professores podem trabalhar nas escolas indígenas temas relacionados aos manejos das roças e seus produtos, através de pesquisas feitas com os anciões da aldeia, também podem estar abordando os benefícios que os produtos cultivados na roça trazem para a saúde, isto pode ser feito através de pesquisas em livros, literaturas ou referencial bibliográfico. Através dessas atividades os

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Roças Indígenas em Mato Grosso

professores podem incentivar o consumo de alimentos produzidos na própria aldeia. Este trabalho feito pelos professores é importante para demonstrar aos alunos indígenas a importância dos conhecimentos tradicionais de seu povo.

O manejo das roças indígenas e sua relação com o