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Produ¸c˜ ao de part´ıculas por buracos negros

1.4 O efeito Hawking

1.4.2 Produ¸c˜ ao de part´ıculas por buracos negros

Sabemos, da teoria da relatividade geral, que um colapso gravitacional ir´a produzir um buraco negro. Este, rapidamente, ir´a assumir um estado de equil´ıbrio estacion´ario e axi- sim´etrico, caracterizado completamente por sua massa, carga el´etrica e momento angular. Durante a forma¸c˜ao do buraco negro, entretanto, o espa¸co-tempo associado a um corpo colapsante n˜ao ´e estacion´ario. Este ´e o ponto chave para que se espere a forma¸c˜ao de part´ıculas, por buracos negros: o fato de que durante o colapso gravitacional, o espa¸co- tempo ser caracterizado por uma m´etrica dependente do tempo.

Este fluxo de part´ıculas pode continuar em instantes posteriores ao colapso, desde que, devido `a dilata¸c˜ao temporal infinita no horizonte de um buraco negro, as part´ıculas criadas durante o colapso, podem demorar um tempo arbitrariamente longo para ser emitidas.

Em um instante de tempo no passado distante do in´ıcio colapso gravitacional, o espa¸co-tempo ´e do tipo Minkowski, exceto nas proximidades da estrela que dar´a origem ao buraco negro. Dessa forma, podemos assumir que os campos se encontram em um estado quˆantico, que chamaremos de | 0iℑ−, em que ele n˜ao possui part´ıculas nas proximidades de ℑ−. A estrela, ent˜ao, colapsa para formar o buraco negro. Mostraremos, agora que

pr´oximo a ℑ+, haver´a um fluxo t´ermico de part´ıculas, as quais chamaremos de radia¸c˜ao

Hawking.

Schwarzschild, o qual obedece `a equa¸c˜ao de campo (1.32). Vamos escrever uma base de fun¸c˜oes que defina estados de part´ıculas, em um instante de tempo no passado dis- tante do in´ıcio colapso gravitacional. Para isso, vamos escolher uma base ortonormal completa (fω, fω′) da equa¸c˜ao de onda (1.32) em ℑ−, de forma que o campo escalar φ seja escrito, sobre ℑ−, como:

φ = Z

dω(aωfω+ a†ωf ∗

ω) (1.51)

e o estado de v´acuo |0iℑ− ´e tal que

aω |0iℑ− = 0 (1.52)

para todo ω > 0. Notemos que este estado ´e aniquilado por aω em qualquer instante de

tempo.

No sentido de definir um conjunto completo de estados de part´ıculas em instantes posteriores ao colapso, precisamos definir modos tanto sobre ℑ+, como sobre o horizonte

de eventos H+, desde que ℑ+ n˜ao ´e em si uma superf´ıcie de Cauchy, mas H+S ℑ+ o ´e.

Dessa forma, o campo escalar passa a ser escrito como:

φ = Z

dω{pωbω+ p∗ωb†ω+ qωcω+ qω∗c†ω} (1.53)

onde {pω} definem estados de part´ıculas sobre ℑ+, enquanto {qω} definem estados de

part´ıculas sobre H+.

Vamos examinar as solu¸c˜oes para a equa¸c˜ao de onda (1.32) em uma geometria do tipo Schwarzchild. Podemos escrever φ como o produto

φωlm(t.r∗, ω) = ψ(r∗)Ylm(Ω)e−iωt , (1.54) onde r∗ = r + r gln  r rg − 1 

´e a coordenada Tortoise, enquanto Ylm s˜ao os harmˆonicos

esf´ericos.

Dessa forma, a equa¸c˜ao (1.32) se reduz `a equa¸c˜ao radial

[∂t2− ∂r2∗ + W (r)]ψ = 0, (1.55)

W (r) = (1 − rrg)(rg r3 +

l(l + 1)

r2 ) . (1.56)

Podemos notar que

W (r) →    l(l+1) r2 se r → ∞, r∗ → ∞ er∗rg se r → r g, r∗ → −∞ ,

de forma que, tanto no infinito, como nas proximidades do horizonte, as solu¸c˜oes φωlms˜ao

ondas planas em t ± r∗

, ou ondas planas em u = t − r∗ e v = t + r. Estas solu¸c˜oes ser˜ao

usadas para definir as bases para o espa¸co de Hilbert.

Dessa forma, vamos considerar os estados sobre ℑ+ como as solu¸c˜oes da equa¸c˜ao de

onda com condi¸c˜oes de contorno tais que

pω(u, v) → e−iωu sobre ℑ+ (1.57)

onde u ´e o parˆametro afim para geod´esicas nulas em ℑ+.

Estaremos, aqui interessados em encontrar uma forma para as fun¸c˜oes {fω}, as quais

formam uma base para o campo escalar em ℑ−. Para isso, vamos considerar uma apro-

xima¸c˜ao de ´otica geom´etrica na qual a linha mundo de uma part´ıcula pode ser interpre- tada como um raio de luz γ. Vamos ent˜ao, considerar a continua¸c˜ao desse mesmo raio na dire¸c˜ao do passado a partir de ℑ+.

O modo (1.57) propaga-se atrav´es do raio γ, o qual sai de ℑ+ ao longo de uma

geod´esica u = u1, passando pr´oximo ao horizonte do buraco negro H+. O raio passa

atrav´es da estrela colapsante e propaga-se na dire¸c˜ao de ℑ−, ao longo de uma geod´esica

v = v1, pr´oxima a v = 0 . 4

O raio γ est´a conectado a H+e a v = 0 atrav´es do vetor ǫnacom ǫ pequeno e positivo.

Na parte do caminho em que o raio passa junto a H+, na´e tangente `as geod´esicas nulas,

as quais, sobre H+ s˜ao do tipo “ingoing”. A normaliza¸c˜ao ´e fixa pela condi¸c˜ao nal

a = −1,

onde la ´e um gerador de geod´esicas nulas em H+.

Notemos que u assume um valor infinito nas proximidades do horizonte de eventos e, portanto, o mesmo n˜ao corresponde a uma boa coordenada a ser utilizada na situa¸c˜ao

4Consideraremos o instante de tempo v = 0 como o ´ultimo em que uma geod´esica nula pode deixar

ℑ−, passar pelo interior da estrela e encontrar ℑ+. Raios que porventura saiam do interior da estrela em

\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/ \/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/ I+ i 0 I- H+ U 0 U = - ε, u = - (1/κ) ln ε

Continuação, na direção do passado, da geodésica nula geradora de H+

v = 0 v = - ε v raio de luz Figura 4:

que estamos analisando. Por outro lado, U = −e−κu´e finito sobre o horizonte de eventos,

de forma que vamos usar esta coordenada como parˆametro afim. Ao longo de γ, U = −ǫ de forma que, a express˜ao (1.57) fica escrita como

pω → e

κln(ǫ) em ℑ+ (1.58)

Vamos tra¸car, agora, o raio γ atrav´es da estrela colapsante, com o mesmo sendo refletido, em seguida, na origem do sistema de coordenadas, seguindo, a partir dai, uma geod´esica nula de fase constante v < 0 na dire¸c˜ao de ℑ−. Sendo γ

H o gerador de geod´esicas

nulas de H+, temos que os vetores n e l sofrem, simplesmente um trasporte paralelo, ao

longo da continua¸c˜ao de γH na dire¸c˜ao de ℑ−. Considerando que esta mesma continua¸c˜ao

encontra ℑ− em v = 0, obteremos que as duas geod´esicas, v < 0 e v = 0, s˜ao, ainda,

conectadas pelo vetor ǫna e, desde que o espa¸co-tempo ´e aproximadamente plano nessa

regi˜ao, que

v = −ǫ = e−κu. (1.59)

desde que s˜ao aprisionados pelo buraco negro.

Dessa forma, como solu¸c˜ao da equa¸c˜ao (1.32) que tem, como condi¸c˜ao de contorno, pω ∼ e−iω em ℑ+, temos, sobre ℑ−,

fω(v) ∼    0 se v > 0 expiωκln(−v) se v < 0 . (1.60)

Antes de calcularmos o n´umero de part´ıculas produzidas pelo buraco negro e chegando a ℑ+, precisamos ter em mente que o potencial gravitacional em torno do buraco negro

pode provocar o espalhamento dessas mesmas part´ıculas. Um pacote de onda com pico em torno de uma frequˆencia ω que se propaga de ℑ− na dire¸c˜ao do horizonte de um

buraco negro eterno, pode ter uma fra¸c˜ao sua, 1 − Γω, sendo espalhada pela curvatura

do espa¸co-tempo propagando-se, logo em seguida, para ℑ+, sem ter a sua frequˆencia

alterada. Uma outra parte, Γω, pode propagar-se paralelamente a H+, sendo absorvida

pelo buraco negro. ´E essa segunda fra¸c˜ao que est´a relacionada `a produ¸c˜ao de part´ıculas. Podemos, portanto, escrever fω = fω(1)+ fω(2), onde os ´ındices (1) e (2) denotam as duas

partes do pacote de onda (espalhada e absorvida) descritas acima. Podemos definir, da mesma forma, as fun¸c˜oes qω e pω. 5

Os coeficientes de Bogoliubov podem, ent˜ao, ser escritos como

αωω′ = α(1)ωω+ α(2)ωω , βωω′ = βωω(2) (1.61)

Al´em disso, o coeficiente de espalhamento Γω ´e definido como

Γω = Z dω′ (| α(2)ωω′ | 2 − | β(2) ωω′ | 2) (1.62)

No c´alculo do n´umero de part´ıculas produzidas por um buraco negro, deve-se ignorar a primeira componente da onda. Por simplicidade, no que se segue, vamos omitir os ´ındices (1) e (2).

Os coeficientes de Bogoliubov s˜ao dados por

5O coeficiente Γ

ω, obtido por calculo direto, ´e dado por:

Γω→  1 se ωM ≫ 1, A 4πω 2 se ωM ≪ 1.

αωω′ = (pω, fω′)− = 1 2π√ωω′ Z 0 −∞  ω′ ω κv  eiω′veiωκln(−v) (1.63) = 1 iπ√ωω′(iω ′ )−iωκΓ  1 + iω κ  βωω′ = −iαω,−ω′ (1.64)

Tomemos, agora, a transformada de Fourier da fun¸c˜ao fω(v), definida pela equa¸c˜ao

(3.4.1) ˜ fω(−ω′) = Z ∞ −∞ eiω′vfω(v)dv (1.65) = Z 0 −∞

expniω′v +

κ ln(−v) o

dv

Consideremos a ramifica¸c˜ao da fun¸c˜ao logaritmo que aparece na express˜ao (1.65) como estando no eixo real de um plano complexo relacionado `a vari´avel v. Para ω′ > 0, vamos

percorrer o contorno, mostrado na figura, em dire¸c˜ao `a parte negativa do eixo imagin´ario e, ent˜ao, tomar v = −ix(rota¸c˜ao de Wick). Com isso, n´os obtemos:

˜ fω(ω′) = −i Z ∞ 0 expn− ωx + iω κ ln(xe −iπ/2)odx (1.66) = −exp πω Z ∞ 0 expn− ωx + iω κ ln(x) o dx

Para ω′ < 0, iremos percorrer o contorno, mostrado na figura, em dire¸c˜ao `a parte

positiva do eixo imagin´ario, tomando, ent˜ao, v = ix. Com isso, n´os obtemos:

˜ fω(ω′) = i Z ∞ 0 expnω′x + iω κ ln(xe iπ/2)odx (1.67) = exp −πω 2κ  Z ∞ 0 expnω′x + iω κ ln(x) o dx

\/\/\/\/\/\/\/\/\/| Branch cut ∞ ∞ Contorno de integração Para ω' < 0. Contorno de integração Para ω' > 0. X Figura 5: ˜ fω(−ω′) = −e −πω κ f˜ω(ω′) . (1.68)

O resultado obtido acima nos diz que um modo de frequˆencia positiva ω em ℑ+ corres-

ponde a um misto de modos positivos e negativos em ℑ−.

Obtemos, ainda

βωω′ = −iαω(−ω) = −exp 

−πωκ αωω′ para ω′ > 0 (1.69)

E da rela¸c˜ao (1.44) e (1.51), obtemos, ent˜ao, o n´umero de part´ıculas emitidas pelo buraco negro hNω(ℑ+)i = Z dω′ | βωω′ |2 = Γω e2πω/κ− 1 (1.70)

onde Γω ´e o coeficiente de espalhamento.

A equa¸c˜ao (1.70) descreve o espectro de um corpo negro com temperatura

T = ℏ κ

onde κ = 1/4M para um buraco negro de Schwarzschild.

N´os conclu´ımos, portanto, que um buraco negro pode irradiar sua energia a uma temperatura dada por (1.71). Este resultado faz com que os teoremas da mecˆanica dos buracos negros e as leis da termodinˆamica passem a ter entre si muito mais que uma mera analogia.

Dos resultados acima, podemos, ainda, atribuir uma entropia ao buraco negro, a qual ´e dada por:

SBH =

A 4l2 P

(1.72)

Outro resultado interessante que queremos acrescentar aos nossos coment´arios, decorre da lei de Stephan. Para um buraco negro podemos escrever:

dE dt ⋍−σAT 4 H,  σ = π 2k4 B 60ℏ3c2  , (1.73)

onde A ´e a ´area do horizonte de eventos. Usando o fato de que

E = M c2, kBTH ∼ ℏc 3

GM. (1.74)

E, para um buraco negro de Schwarzchild

A = 4π M G c2 2 , (1.75) n´os obtemos dE dt ∼ ℏc4 G2M2 (1.76)

o que nos implica em um tempo de vida finito para o buraco negro:

τ ∼ G

2

ℏc4



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