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O professor em formação inicial relaciona as teorias aos documentos oficiais

CAPÍTULO III PRODUÇÃO E APLICAÇÃO DOS PRIMEIROS CASOS PARA

4.3 O professor em formação inicial relaciona as teorias aos documentos oficiais

Verifiquemos agora como os graduandos relacionam as teorias aos documentos oficiais na resposta de CN 2 à questão de número um do caso para o ensino “Gosto quando é mais mastigadinho”. Nesta questão foi solicitado que ele identificasse que concepções de língua ancoravam as resistências dos professores ao livro didático “Português: ensino de língua e contextos de produção” defendido pelo docente Jorge Luís.

CN 2 As duas primeiras concepções de língua. A primeira, baseada na LDB n. 4024/6, toma a língua como representação do pensamento, enquanto a segunda, baseada na LDB n. 5692/71, toma a língua como instrumento de comunicação (único viés de interpretação). É importante lembrar que a segunda concepção é vista como evolução da primeira, visto que esta trabalha com a prescrição de regras do sistema linguístico, enquanto a outra trabalha com a descrição dessas mesmas regras.

O colaborador identifica a concepção de língua defendida pelos professores Marta, Denilson e Ana Lúcia, que, por sua vez, se opunha a escolha do livro didático defendido pelo professor Jorge Luís. Ele afirma que esses docentes assumem a língua enquanto expressão do pensamento ou instrumento de comunicação, no segundo segmento utiliza um quadro mediador para trazer a voz da legislação, atribuído à lei a responsabilidade enunciativa “baseado na LDB n. 4024/6” e “baseada na LDB n. 5692/71”. Ele identifica que o saber teórico do docente pode ser oriundo das leis que se ancoram em abordagens teóricas.

No terceiro segmento iniciado por “é importante”, o colaborador assume a responsabilidade enunciativa através do uso da modalidade avaliativa. E segue explicando que as concepções de linguagem são evoluções uma da outra.

CN2 ao solucionar a questão de número um do caso para o ensino, que solicitava a identificação das concepções de língua dos professores Marta, Denilson e Ana Lúcia, faz referência a duas primeiras concepções de língua, ou seja, a língua como expressão do pensamento e a língua como instrumento de comunicação, e ao retomar conceitos teóricos ele afirma que essas teorias estão presentes na Lei de Diretrizes e Bases da Educação em duas diferentes épocas. Desta forma, ele percebe como as teorias podem chegar ao docente não apenas pela formação acadêmica, mas também pela apropriação da lei. Como afirma Tardif (2011, p.263) “ele (o professor) se apoia também naquilo que podemos chamar de

conhecimentos curriculares veiculados pelos programas, guias e manuais escolares” e o professor ainda em formação consegue perceber como é diversa a fonte dos saberes docentes e ainda como é mutável visto que ao longo dos anos a própria lei afirmou concepções de língua diferentes.

Analisemos agora a resposta fornecida pelo colaborador CN 4 ao solucionar a questão de número três do caso para o ensino “Gosto quando é mais mastigadinho”, nesta questão foi solicitado que os graduandos analisassem os anexos dos livros defendidos por Ana Lúcia e por Jorge Luís e indicassem qual deveria ser escolhido para ser utilizado na escola.

CN 4 Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais, os textos a serem selecionados são aqueles que, por suas características e usos, podem favorecer a reflexão crítica, o exercício de formas de pensamento mais elaboradas e abstratas, bem como a fruição estética dos usos artísticos da linguagem, ou seja, os mais vitais para a plena participação numa sociedade letrada. Sendo assim, o modelo interacionais deve se sobressair na escola do livro didático. Além de que os PCNs também abordam a escolha dos gêneros textuais escritos: “a seleção de textos deve privilegiar textos de gêneros que aparecem com maior frequência na realidade social e no universo escolar, tais como notícias, editoriais, cartas argumentativas, artigos de divulgação científica, verbetes enciclopédicos, contos, romances, entre outros.”

CN4 ao resolver a questão de número três do caso para o ensino relaciona o que ele chama de “modelo interacionista”, que ele defende ser a concepção adequada para a escolha do livro, com os Parâmetros Curriculares Nacionais. Ele representa a voz desse documento através uso do discurso direto utilizando uma citação e também fazendo afirmações sem citação sobre este documento como é possível verificar nos trechos “Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais” através do uso de um quadro mediador e “os PCNs também abordam a escolha dos gêneros textuais” através do uso de uma mediação epistêmica. Desta forma, ele traz a voz dos PCNs e coloca neste documento a responsabilidade enunciativa.

O colaborador consegue utilizar os PCNs como documento oficial em defesa da concepção de linguagem por ele adotada, buscando assim dar credibilidade a escolha que faz do livro didático, o que corrobora novamente que uma das fontes de onde provém o saber dos

professores (mesmo ainda em formação) são os documentos oficiais que recuperam as teorias e o nosso colaborador identifica isso com clareza.

Abaixo um trecho da resposta do colaborador CN 8 fornecida na resolução da questão de número três do caso para o ensino “Gosto quando é mais mastigadinho”.

CN 8 – Para indicar o livro a ser utilizado na Escola Marechal Deodoro da Fonseca é necessário que saibamos alguns detalhes. No estudo de caso vimos que o PPP “objetiva interferir, positiva e eficazmente, na formação da comunidade escolar; e busca fazer com que dialoguem entre si – perspectiva interdisciplinar. Especificamente em Língua Portuguesa (doravante LP), os professores afirmam, em seus planejamentos anuais, que se baseiam, inclusive, nos Parâmetros Curriculares Nacionais”. Ao lermos os PCNs vemos que eles instigam para que a educação desenvolva no aluno competências, uma delas é a discursiva, um de seus aspectos é que o sujeito seja “capaz de utilizar a língua de modo variado, para produzir diferentes efeitos de sentido e adequar o texto a diferentes situações de interlocução oral e escrita.”. Agora vejamos novamente o que diz o professor Jorge Luís: “Nossa Língua é viva, os alunos usam a língua nas mais diversas situações comunicativas, a língua é atividade, é prática discursiva.” A pretensão em demonstrar estes aspectos é para situar que o contexto dessa escola se enquadra, teoricamente, no contexto interacional.

O colaborador ao solucionar a questão três inicia afirmando que para indicar um livro didático para escola é necessário levar em consideração alguns fatores. Ao afirmar “é necessário” ele utiliza a modalidade lexema avaliativo e assume a responsabilidade enunciativa. Em seguida, ele cita inicialmente o PPP da escola fazendo uso do discurso direto retirado de um fragmento do caso e dando a este documento a responsabilidade enunciativa. Neste segmento, ele seleciona um fragmento do caso que destaca a relação dos professores com os documentos, seja local (PPP) ou nacional (PCNs) e destaca que eles “devem” se pautar nos PCNs. No segmento seguinte, afirma “Ao lermos os PCNs” e assume a responsabilidade enunciativa através do índice de pessoa, primeira pessoa do plural, e também traz a voz dos documentos para sua enunciação, dando a estes a responsabilidade enunciativa. CN 8 segue explicando que os documentos oficiais sugerem uma prática docente que foque no desenvolvimento da competência nos alunos. Em seguida, ele utiliza o discurso direto,

reafirmando a responsabilidade enunciativa dos PCNs e mostra como esse documento traz uma carga teórica que dá orientações para o trabalho docente. Mais adiante ele relaciona a concepção teórica dos PCNs com as afirmações do professor Jorge e conclui afirmando que a escola tem um contexto interacionista. O contexto interacionista é justificado pelo fato de o PPP da escola apresentar afirmações que comungam com essa abordagem, e pelos professores afirmarem se pautar nos PCNs que comungam com a visão interacionista, e ainda pelo fato do professor Jorge Luís demostrar ter essa concepção. O colaborador textualiza que os documentos oficiais seguem uma orientação teórica e defende que esses documentos devem ser considerados pelos docentes.

Adiante temos a resposta concedida por CN 17 à questão de número dois do caso para o ensino “Material didático: trilho ou trilha?”. Nesta questão foi solicitado que o colaborador analisasse a abordagem de ensino de textos no material didático da escola em que João trabalha.

CN 17 – Não há presença de gêneros na abordagem de ensino de textos no material da escola. Já que o livro só aborda tipologias. É relevante ressaltar a importância do trabalho com os gêneros textuais no livro didático. Pois, como aponta nos PCNs, todo texto está inserido num gênero, ou seja, todo texto se organiza dentro de um determinado gênero em função das intenções comunicativas.

O colaborador ao analisar a apostila do colégio Maximus conclui que ela não aborda os gêneros textuais no ensino de língua portuguesa. Ele traz a voz do autor da apostila para sua enunciação concedendo a ele a responsabilidade enunciativaao recorrer a uma mediação epistêmica quando afirma “o livro só aborda tipologias”. Em seguida, ele toma para si a responsabilidade enunciativa através do uso da modalidade lexema avaliativo “é relevante”, e chama a atenção para como esse documento considera importante o ensino de gêneros textuais nas aulas de língua portuguesa. E para conferir credibilidade ao seu dizer, ele se apoia nos documentos oficiais ao trazer a voz deles passando para eles a responsabilidade enunciativa com o uso de um quadro mediador “como aponta nos PCNs”, a partir do uso de “como”. CN 17 toma os documentos oficiais como fonte de respaldo teórico mostrando que ele vê nos documentos oficiais teorias de sua área de formação.

A análise de trechos de questões dos casos para o ensino nos permitiu verificar a existência de mais uma categoria analítica, a saber: a percepção que os professores em

formação inicial têm da teoria está contida em documentos oficiais sobre o ensino. Analisamos que eles textualizam que as teorias estudadas durante a formação mantêm fortes relações com os documentos oficiais. Em seus enunciados, os colaboradores constantemente trazem a voz da teoria com a responsabilidade enunciativa. Para os colaboradores, tais documentos estão diretamente associados à prática docente, pois como afirmou um deles, os professores devem considerar esses documentos.

4.4 O professor em formação inicial se projeta no lugar do docente e toma decisões