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Professores de literatura do Brasil e do Uruguai também foram ouvidos por meio de questionário, o que permite apontar algumas características por eles expostas quanto aos seus alunos e a metodologia por eles utilizada, a partir da pesquisa oitiva, para enriquecer os dados colhidos no instrumento preenchido por escrito.

Com o objetivo de identificar o profissional da área de literatura que atende as escolas pesquisadas, foi aplicado um questionário a alguns professores dessas escolas. A participação foi voluntária e mediante assinatura do termo de compromisso (pela parte da pesquisadora e dos professores participantes). Percebeu-se uma boa acolhida ao projeto em si e à pessoa da pesquisadora. Todos os professores respondentes relataram satisfação ao participar, fizeram questionamentos e comentaram sobre o desempenho dos alunos e a forma de trabalho com a

disciplina de literatura. Alguns desses comentários foram colhidos e relatados como parte da pesquisa, de caráter oitiva.

Quanto ao instrumento de pesquisa (questionário), ele foi desenvolvido para pesquisar o perfil do professor (qual é a área específica de atuação, os níveis para os quais leciona e o tempo de trabalho). Em uma segunda parte, foca-se o programa de ensino e seu conteúdo, destacando os tópicos e autores sugeridos e questionando sobre os hábitos de leitura dos alunos (autores e obras). Na terceira parte do instrumento, pretende-se acessar a visão dos professores quanto à possível inclusão de novos autores e seus comentários a respeito das aulas de literatura. Ele foi respondido por seis professores, três uruguaios e três brasileiros. Esses profissionais trabalham, ou já trabalharam, em escolas públicas e privadas, e em mais de uma escola.

A primeira pergunta: “Qual é a disciplina que você leciona?” teve a intenção de verificar se o professor tem formação e experiência específica na área de literatura ou se é um professor de língua que, também, leciona literatura. Os 3 professores uruguaios responderam que sua disciplina é literatura. Dentre os brasileiros, dois responderam literatura e um, língua portuguesa e literatura. Também foram questionados quanto aos níveis (ou anos) para os quais dão aulas e há quanto tempo lecionam. Os dados aparecem no quadro 17.

Quadro 17 – Disciplinas e níveis em que os professores lecionam

Professores Disciplina Níveis Tempo que leciona

UY1 Literatura 4o 5o e 6o anos De 10 a 15 anos

UY2 Literatura 6o ano Mais de 15 anos

UY3 Literatura 6o ano Mais de 15 anos

BR1 Literatura e Língua Portuguesa 1o 2o e 3o anos De 5 a 10 anos

BR2 Literatura 1o e 2o anos Menos de 5 anos

BR3 Literatura 1o ano Mais de 15 anos

Fonte: Elaborado pela autora.

A pergunta seguinte do questionário visa a conhecer aquilo que cada currículo contempla, em termos de obras e autores. No Brasil, os currículos variam de um município a outro, ou até de uma escola a outra. No Uruguai, apesar de serem mais homogêneos, em termos de conteúdo, também dão a possibilidade que o professor inclua autores ou obras que deseje trabalhar.

Quadro 18 – Programas e autores trabalhados no Uruguai: voz dos professores Professores Programa contempla literatura brasileira/portuguesa Autores trabalhados Os alunos leem

alguma obra? Obras lidas

nenhum

UY2 Não (em geral)

Guimarães Rosa, Pessoa, Machado de Assis (ocasionalmente) Só as que são dadas em aula

A hora da estrela, Pai contra mãe. A terceira

margem do rio. UY3 Sim Guimarães Rosa, Jorge Amado, Clarice Lispector, Vinícius de Moraes, F. Pessoa Sim Capitães da areia. A rosa de Iroshima. (Vinícius) Mensagem de M. Bethânia Fonte: Elaborado pela autora.

Quadro 19 – Programas e autores trabalhados no Brasil: voz dos professores Professores Programa contemplaliteratura hispano-

americana

Autores trabalhados

Os alunos leem

alguma obra? Obras lidas

BR1 Não

BR2 Não

BR3 Sim

Pablo Neruda, Julio Cortázar,

García Márquez Sim

Poesias de Neruda (declamação em aula).

Continuidade dos parques, de Cortázar

(análise)

Crônica de uma morte anunciada, G.

Márquez (Leitura) Fonte: Elaborado pela autora.

Analisando as respostas dos professores (quadros 18 e 19), percebe-se que, tanto no Brasil quanto no Uruguai, os docentes não coincidem quanto ao conteúdo dos programas. É possível que, nas escolas privadas, o programa seja mais flexível, ou, ainda que apesar de existir flexibilidade nos programas, os professores tenham por hábito trabalhar somente os autores que figuram como “obrigatórios”.

Para complementar o estudo comparativo, na última pergunta, pede-se que os sujeitos analisem a viabilidade e importância de trabalhar com autores portugueses e brasileiros no Uruguai e de autores espanhóis ou hispano-americanos no Brasil. Para analisar as respostas, utiliza-se a análise textual discursiva, já que as respostas são livres.

Emergem da análise, duas categorias bem definidas, no pensamento e exposição dos professores. A primeira diz respeito ao ponto de vista do aluno. Isto é, pensando no aluno, o professor identifica que é importante que ele conheça os autores hispanos ou lusos devido a que a

matriz linguística é a mesma, conhecer clássicos e contemporâneos é de grande valia cultural, a proximidade do Brasil e do Uruguai é um elemento que contribui para essa necessidade, somado ao estudo da língua portuguesa, que está em expansão, no Uruguai. A segunda categoria refere-se ao

ponto de vista dos professores. Um professor do Uruguai relatou que responder ao questionário

despertou o interesse por incluir autores brasileiros ou portugueses no programa de sexto ano. Os professores se mostraram abertos para responder ao questionário, interessaram-se pela pesquisa e incentivaram os alunos a responder ao questionário seriamente. Todos expressaram achar viável trabalhar com autores hispanos no Brasil e lusos no Uruguai. Alguns, contudo, revelaram que nem sempre há tempo hábil para trabalhar com outros autores, além daqueles considerados obrigatórios.

Um dos professores relatou que o ano mais propício para incluir autores lusos, no Uruguai, seria o sexto ano, no qual trabalha-se com literatura contemporânea. No quinto ano, o trabalho com a literatura clássica supõe a presença dos gregos, além de Shakespeare, Dante e Cervantes. No quarto ano, mescla-se a literatura contemporânea espanhola e uruguaia e os românticos espanhóis dos séculos XIX e XX. No terceiro ano, trabalha-se a literatura rio-platense.

Outro professor destaca que se faz um rodízio de autores. Um ano trabalhou com A rosa de

Hiroshima, de Vinícius de Moraes, e outro ano com Capitães da Areia, de Jorge Amado. Grande Sertão Veredas, de Guimarães Rosa também esteve presente durante alguns anos. Fernando Pessoa

resulta mais “difícil” para os alunos compreender, entende um participante. A narrativa parece mais “fácil”. Contudo, destaca que, habitualmente, não são incluídos autores brasileiros nos programas.

Com o objetivo de refletir sobre possibilidades de interação, que essa caminhada compartilhada entre alunos e professores proporciona, apresenta-se a seguir a análise dos relatos dos professores. Na pergunta 8, do questionário respondido pelos professores participantes, já caracterizados, perguntava-se: Você considera que seria importante ou viável trabalhar com

autores espanhóis e sul-americanos (ou brasileiros e portugueses)? Comente.

Os relatos dos professores mostram que todos estão dispostos, abertos e conscientes da importância de trabalhar com autores do país vizinho. Apresentam-se somente três depoimentos, daqueles professores que responderam que não trabalham com esses autores. Os outros três participantes dizem trabalhar com autores brasileiros, no Uruguai, ou hispanos, no Brasil. Um professor do Uruguai revela que, a partir, da resposta ao questionário, chega a refletir sobre a possibilidade de incorporar algum autor luso ao seu programa de literatura de sexto ano. Essa constatação é um ponto a favor da proposta que este estudo apresenta, baseada na interação por meio da experiência literária, que é tecida no capítulo 7.

A categorização feita nos relatos dos alunos participantes é reflexo dos relatos dos professores, no sentido que se consideram aspectos como importância, necessidade, estudo da língua estrangeira e uma reflexão já voltada à ação: penso na possibilidade de incluir autores….

Essas considerações, somadas à receptividade à pessoa do pesquisador e à vontade de colaborar com a participação no preenchimento do questionário, são indícios que uma proposta voltada para uma aproximação será considerada. Seguem os relatos:

Sim. É de suma importância para os alunos conhecerem os autores latino-americanos, visto que a matriz linguística é a mesma. (RP1)

Sim. Acho importante conhecer autores nacionais e internacionais, contemporâneos e clássicos.(RP2)

Creo que es una literatura que debemos incorporar a nuestros programas, teniendo en cuenta la cercanía con Brasil y el estudio cada vez mayor de la lengua portuguesa. A partir de este cuestionario, pienso en la posibilidad de incluir autores como Pessoa o Andrade en los programas de sexto año. (RP3)

Há unanimidade na intenção ou possibilidade de estudar e apresentar autores não tão comuns nos currículos atuais. Essa observação dos professores, aliada à curiosidade dos alunos de Ensino Médio constitui uma brecha de ação, no sentido de interagir por meio da experiência literária.

5.6.1 Análise de Resultados

Com base na pesquisa feita, expõe-se aqui a percepção geral sobre o ensino de literatura no Brasil e no Uruguai. Para isso, analisa-se a voz do aluno e a do professor. É possível dizer que os alunos leem obras diferentes em um e outro país. Ainda que os clássicos da literatura universal sejam estudados nos dois países, quando aproximamos as culturas locais, apresenta-se uma distância facilmente visível. Tanto as obras estudadas na escola, quanto naquelas que os participantes possam ter lido por conta própria, dificilmente coincidem. Alguns professores relatam trabalhar com alguns autores de língua portuguesa no Uruguai e de língua espanhola, no Brasil, de forma esporádica, já que não é obrigatório fazê-lo. Na voz dos alunos, isso acontece de forma tímida. Coincide com a indicação na legislação e programas, de ambos países, que proporcionam uma abertura para que o professor introduza esses autores conforme seu critério.

É curioso observar, como já foi comentado, as semelhanças entre o perfil, os hábitos de leitura e o nível de interesse pela literatura dos participantes de ambos países. No recorte utilizado (alunos de anos finais de ensino médio) no Brasil e no Uruguai, os números são equivalentes e os dados produzidos perecem pertencer a um mesmo espaço geográfico.