• Nenhum resultado encontrado

Professor/professor

No documento 2014CarinaCopatti (páginas 145-148)

5.2 Relações interpessoais na escola

5.2.1 Professor/professor

Essa dimensão evidenciou-se no contato com os professores que atuam nesse aldeamento. As relações vivenciadas no ambiente escolar foram bastante agradáveis, em nenhum momento os professores demonstraram cansaço, irritação ou qualquer outra expressão de desagrado em relação ao seu trabalho ou aos educandos. Costumam falar de alguns alunos que apresentam problemas na escola, mas, sem criticar, os comentários apenas salientaram os fatos que devem ser levados em consideração pelo grupo.

Entre os educadores há relações de bastante diálogo e um convívio harmonioso, com brincadeiras e conversas alegres, inclusive em relação aos educadores não indígenas, pois neste ambiente todos se conhecem há bastante tempo e trabalham juntos na escola há muitos anos. Grillo salienta que:

Para dar conta do ensino, a docência apresentas-se como uma atividade complexa, pela convergência concomitante de questões teóricas e práticas, com origens no enfrentamento do cotidiano escolar – a dimensão interna – e ainda na reflexão pedagógica sobre o homem e suas finalidades – adimensão externa -, indagando sobre a quem, para que e o que ensinar. Ultrapassa os limites da sala de aula e enfrenta outros maiores, que lhe atribuem um caráter educativo mais amplo do que a simples instrução. Abandona-se uma visão reducionista da ação docente apoiada na racionalidade técnica com vistas a um sentido de globalidade, resultante da interação do docente, pessoa e profissional com a pessoa do aluno, um ser em formação.

A autora afirma ainda que “a docência, portanto, envolve o professor em sua totalidade; sua prática é resultado do saber, do fazer e principalmente do ser, significando um compromisso consigo mesmo, com o aluno, com o conhecimento e com a sociedade e sua transformação” (2004, p. 58). Nesse processo, o professor precisa desenvolver inúmeras habilidades e competências, que vão além dos conhecimentos em torno da disciplina que ministra, exige a compreensão do processo didático-pedagógico que envolve a educação, as relações interpessoais em sala de aula, com os colegas e em relação aos demais membros da comunidade escolar. É no cotidiano do trabalho que, gradativamente, constrói-se como educador, precisando, continuamente, refletir sobre sua práxis, a fim de melhorar o seu trabalho. Nóvoa considera que:

O aprender contínuo é essencial em nossa profissão. Ele deve se concentrar em dois pilares: a própria pessoa do professor, como agente, e a escola, como lugar de crescimento profissional permanente. Sem perder de vista que estamos passando de uma lógica que separava os diferentes tempos de formação, privilegiando claramente a inicial, para outra que percebe esse desenvolvimento como um processo. Aliás, é assim que deve ser mesmo. A formação é um ciclo que abrange a experiência do docente como aluno (educação de base), como aluno-mestre (graduação), como estagiário (práticas de supervisão), como iniciante (nos primeiros anos da profissão) e como titular (formação continuada). Esses momentos só serão formadores se forem objeto de um esforço de reflexão permanente (2001, p.12).

Nessa perspectiva, compreendemos que a formação docente não se inicia somente quando este se insere em um ambiente escolar, mas apresenta influências de sua formação de base, amplia-se durante o processo de formação como docente e continua sendo ampliada a partir das vivências cotidianas no ambiente onde está inserido. Mas, para que essa formação seja cada vez melhor e tenha melhor qualidade, é importante que este professor preocupe-se com a formação continuada, refletindo constantemente e transformando a sua profissão no melhor que puder ser. Nesse sentido, o educador deve acreditar na possibilidade de mudança, na sua capacidade de transformar a si mesmo e ao contexto onde atua.

Apesar das dificuldades do contexto escolar cotidiano, é importante considerar que é possível e viável uma educação sensibilizadora e dialógica. Freire considera que:

É a partir deste saber fundamental: mudar é difícil, mas é possível, que vamos programar nossa ação político-pedagógica, não importa se o projeto com o qual nos comprometemos é de alfabetização de adultos ou de crianças, se de ação sanitária, se de evangelização, se de formação de mão-de-obra técnica. (1996, p. 88).

Educar, no contexto kaingang, exige dos profissionais um constante exercício de olhar para o lugar onde o processo educativo ocorre e compreender que ele ocorre diferentemente em outras culturas. Assim, precisa-se olhar para o seu aluno, observando sua cultura, seus costumes e as expectativas que este tem no contato com a escola. Libâneo considera que:

O professor não apenas transmite uma informação ou faz perguntas, mas também ouve os alunos. Deve dar-lhes atenção e cuidar para que aprendam a expressar-se, a expor opiniões e dar respostas. O trabalho docente nunca é unidirecional. As respostas e opiniões mostram como eles estão reagindo à atuação do professor, às dificuldades que encontram na assimilação dos conhecimentos. Servem, também, para diagnosticar as causas que dão origem a essas dificuldades. (1994, p. 250).

Na instituição escolar pesquisada, a maioria dos professores é de etnia kaingang, contratados a partir da formação adequada para a docência, considerando-se as necessidades estabelecidas em conjunto com a Coordenadoria Regional de Educação (CRE), direção da escola e liderança.

Entre os educadores de etnia kaingang, as relações pessoais são agradáveis, todos se conhecem e tem contato no aldeamento, pois convivem desde pequenos, não só no ambiente escolar, mas também no contexto comunitário. Na convivência cotidiana, demonstram ser bastante prestativos, embora a grande maioria fale pouco, preferindo ouvir mais que falar. Entre eles não se houve conversas em tom de voz alto, apresentando-se bastante calmos e simpáticos.

Na escola, há também vários professores não indígenas, estes apresentam-se bastante receptivos e brincalhões com todos os colegas, além de demonstrarem-se acessíveis para o diálogo. Apesar de atuarem há anos no aldeamento, a maioria deles compreende pouco a língua kaingang e, por vezes, os professores de etnia indígena falam entre si na língua materna, dificultando a compreensão dos professores não indígenas.

Os professores costumam se ajudar no trabalho docente, na falta de algum professor, juntam-se as turmas para atendê-los, mantendo o trabalho normalmente. Os professores, em geral, são bastante alegres, simples e tranquilos.

Durante as visitas, mantivemos contato com a coordenadora, uma professora não indígena do turno da tarde a qual realiza diversas atividades, atuando como secretária e diretora quando necessário, visto que, na época da pesquisa, ambas estavam em licença da escola. Assim, a coordenadora atende os alunos durante o intervalo, toma os cuidados nos horários de entrada e saída, distribui materiais, dá os recados nas turmas, conversa com os

alunos, atende os pais, quando contatam a escola, organiza os horários dos professores, faz cópias de materiais, dentre outras atividades diárias. Atua junto aos professores indígenas sempre solicitando suas opiniões e adequando os trabalhos à realidade do grupo.

Em relação aos professores de geografia, estes apresentaram-se, inicialmente, pouco acessíveis, comentando pouco sobre a realidade escolar e cultural do aldeamento. No entanto, no decorrer da pesquisa, os mesmos foram fornecendo informações, comentando sobre fatos do cotidiano e assuntos da comunidade.

O professor titular da turma, com o qual não havia contato anterior à pesquisa, no decorrer dos encontros, nos deixou a par de inúmeros fatos, inclusive comentou sobre suas atividades como pesquisador, além das atividades que desenvolve como uma das lideranças da comunidade. Assim, demonstrou-se receptivo, aberto ao diálogo e consciente da importância da formação continuada dos educadores. Ainda, disponibilizou horários flexíveis, visto que, atua com as disciplinas de história e geografia, organizando os horários para melhor realizarmos a pesquisa com a turma de 6º ano. Esse educador é bastante calmo, possui um conhecimento vasto na área em que atua e costuma participar de vários eventos que envolvem ensino e cultura indígena.

No documento 2014CarinaCopatti (páginas 145-148)