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CAPÍTULO II – Fundamentação da Temática em Estudo

5. O profissional docente do Pré-Escolar e 1.º Ciclo face aos estereótipos de género

É importante ter em conta que o trabalho efetuado neste contexto abrange inúmeras vertentes e, deste modo, cabe ao/à profissional de educação ter a capacidade de fazer a sua articulação, modificando-as, tendo por base as questões e os estereótipos de género. A título de exemplo, podemos considerar a aplicabilidade dos conteúdos curriculares, a organização de grupos de trabalho, a disposição dos diversos espaços de sala de aula, entre muitas outras situações.

Todos/as nós devemos ter a consciência de que este é um processo moroso e trabalhoso; no entanto, não devemos baixar os braços e aguardar que as coisas se modifiquem por si próprias. É essencial promover a alteração de conceitos, gradualmente, como se das metamorfoses de uma borboleta se tratasse. Devido às constantes mudanças que ocorrem na sociedade atual devemos ter a consciência de que as mesmas não ocorrem de forma rápida, pois estão demasiado embrenhadas nos valores e desígnios inerentes a cada indivíduo.

As crianças, com quem trabalhamos, estão em idade de desenvolver os seus conceitos acerca do género, da sua identificação com indivíduos do sexo masculino ou feminino, bem como com a identificação de objetos, relação com o vestuário, com as cores, entre outras. Se é nesta fase que as crianças estão a formar a sua identidade é também a altura em que os/as profissionais de educação têm a oportunidade de trabalhar de forma a promover o desenvolvimento de cidadãos e cidadãs conscientes e despertos/as para qualquer que seja a diferença, tomando consciência de si e dos outros (Cardona, s.d: 50-51). Muitos são “os autores e autoras que defendem que a definição da identidade e dos papéis sexuais começa muito antes das crianças irem para a escola” (Castanho, 2009: 102). Neste sentido, explica a autora que

a reprodução de estereótipos sexistas e a manutenção de formas de desigualdade, assentes na variável género, fazem ainda parte dos modelos e práticas pedagógicas de muitos contextos escolares em todos os níveis de ensino pelo mundo fora e em Portugal também.

Mais recorda a autora (idem) que, muitas das vezes, estes/as profissionais de educação não têm consciência deste facto.

Os/As educadores/as e professores/as assumem um papel fundamental no que se refere ao estabelecimento de estratégias potenciadoras da coeducação, devendo assumir um papel dissuasor ao nível da

reprodução ou subversão de concepções e comportamentos estereotipados e discriminatórios”, ou seja, não devem agir e atuar de forma diferenciada para os meninos e para as meninas, devem sim promover um ensino igualitário e integrador (Ferreira, 1999: 49).

Na prática educativa das escolas ainda são visíveis determinados aspetos que levam à existência de desigualdades de género, no entanto é importante que estes sejam colmatados e extintos (Castanho, 2003).

Parafraseando Fernandes (1987: 60), podemos referir que, os/as agentes de educação são elementos importantes a nível da elaboração e transmissão do currículo (tanto o latente como o oculto), sendo este o instrumento norteador e auxiliar da(s) sua(s) prática(s). No entanto este deverá possuir um caráter contra-hegemónico, ou seja, deve encontrar-se livre de estereótipos e ser promotor da igualdade. Reforçando esta ideia, Marques e Palma (1990: 24) são da opinião que “a interacção de professores e alunos e o currículo oculto apresentam geralmente barreiras enormes à igualdade”.

Como exemplos ilustrativos de práticas conotadas pela estereotipia podemos referir: o nível da linguagem dos manuais escolares, tal como expõe Montenegro (cit. in Margarido, 2006: 8 – 10), “é lenta a incorporação das mudanças sociais nos textos escolares” que, deviam ser potenciadores de uma linguagem igualitária e livre de estereótipos e preconceitos, ainda “(…) continua a ser transmitido às crianças que há atividades, espaços e características próprias das mulheres e outras próprias dos homens”. No sentido de ultrapassar estes ideais sexistas, os educadores/as e professores/as são os responsáveis por quebrar estas barreiras. Montenegro assume que

“A educação para a cidadania, hoje tão proletada, só se tornará efectiva se o próprio discurso reflectir as mudanças de paradigmas prevalecentes na sociedade”.

Castanho (2003) e Margarido (2006) referem que, ao nível das profissões, também é bem visível a existência de estereótipos: as mulheres são associadas aos trabalhos do lar/domésticos, ao cuidado à família, o que é retratado nos manuais escolares tanto a nível de discurso como de imagens. Margarido (2006: 84) esclarece que “é clara a divisão das profissões: as mulheres são enfermeiras e professoras; os homens são médicos, polícias, carpinteiros, sapateiros, agricultores, engenheiros, etc”.

As Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (ME, 1997: 19) defendem que

o respeito pela diferença inclui as crianças que se afastam dos padrões “normais”, devendo a educação pré-escolar dar resposta a todas e a cada uma das crianças. Nesta perspectiva de “escola inclusiva”, a educação pré-escolar deverá adoptar a prática de uma pedagogia diferenciada, centrada na cooperação, que inclua todas as crianças, aceite as diferenças, apoie a aprendizagem, responda às necessidades individuais.

Uma vez que esta é uma temática atual e possui um nível de incidência bastante alargado nos comportamentos dos indivíduos, seria essencial que os/as profissionais de educação tivessem espírito critico e a verdadeira consciência das repercussões provenientes da estereotipia nas escolas e nas salas de aula, em particular. Assim, Marques e Palma (1990: 44) fazem uma crítica à formação dos/das docentes e profissionalização dos/as mesmos/as, na medida em que não recebem “nenhuma formação no sentido de desenvolver conhecimento, compreensão e competências práticas para lidar com o problema do sexo na escola”.

Deste modo, também cabe ao/à profissional de educação explorar, estudar, e proceder a leituras em áreas específicas, no sentido de se manterem atualizados/as relativamente às problemáticas vigentes na sociedade que o/a envolve. É importante que os/as mesmos/as demonstrem interesse em inovar as suas práticas de forma a colmatar eventuais lacunas, tão prejudiciais como são as desigualdades de género.

Entendendo o assunto noutra perspetiva, é importante que durante a formação docente sejam oferecidas unidades curriculares atuais e atualizadas que vão ao encontro

da realidade laboral com que os/as futuros/as docentes se vão confrontar, de modo a que a mesma seja conducente com a realidade.